TURISMO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO: UMA ANÁLISE URBANO-REGIONAL BASEADA EM CLUSTER
Jorge Antonio Santos Silva
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AGRUPAMENTOS X AGRUPAMENTOS AVANÇADOS
Características
Aglomeração de empresas com determinado grau de articulação e que apresentam afinidade setorial ou temática. Aglomeração de empresas industriais e de serviços com alto grau de interação, e com a cadeia produtiva adensada e verticalizada (bens de capital, serviços produtivos, etc.).
Morfologia
Em forma de rede ou radial. Em forma de rede ou radial.
Eficiência Coletiva Baseada em
Vantagem competitiva estática (escala de comercialização de insumos, transporte de produtos, etc.). Vantagens competitivas dinâmicas (inovação tecnológica de produto e processo).
Confiança
Fundamentada na tradição e pouco exercitada. Consolidada e exercitada cotidianamente nas transações locais e internacionais.
Interatividade
Pouco freqüente, dos agentes econômicos entre si e com o sistema nacional de inovação. Freqüente, dos agentes econômicos entre si e com o sistema nacional de inovação.
Quadro 2.9 Tipos de Agrupamentos
Fonte: CNI, 1998, apud Pires, 2001, p. 87.
Quadro 2.10 Fatores que Geram Competitividade para as PMEs em Clusters
Fonte: Bertini, 1998, apud Pires, 2001, p. 89.
Na medida que um cluster vai se tornando mais avançado, suas vantagens competitivas vão se ampliando.
Comparativamente, pode-se dizer que as vantagens competitivas presentes no agrupamento [menos avançado] são de caráter predominantemente estático (por exemplo, as economias de escala obtidas em compras conjuntas de insumos ou no transporte de insumos e produtos acabados), enquanto que no agrupamento avançado estas vantagens são dinâmicas, porque envolvem inovações tecnológicas de produtos e de processos e mudanças na própria estrutura da oferta. Neste sentido, se diz que em um agrupamento o crescimento é endógeno, autodeterminado, [grifo nosso]. (CNI, 1998, apud PIRES, 2001, p. 89).
Desse modo, enfatiza-se, concordando com Pires, que as iniciativas de cluster não podem ser copiadas de regiões de sucesso, pois elas dependem de aspectos históricos, culturais e territoriais de base local. “[...] o formato de um cluster não pode ser pré definido, pois é fruto do comportamento endógeno do próprio sistema [produtivo] local [...]” (PIRES, 2001, p. 90). Entretanto, apesar das caracteristiscas do cluster resultarem de elementos própios de um contexto regional específico – identidade regional, pacto territorial e capital social, há a possibilidade de se induzir iniciativas de clusters, criando-se um ambiente propício ao seu desenvolvimento.
Um distrito industrial [cluster], na concepção que aqui se quer considerar (inserido na dinâmica de um ambiente histórico, social e cultural), não pode ser promovido [diretamente] pelo Estado ou por instituições governamentais. No entanto, uma vez que um distrito [cluster] esteja em funcionamento, a ajuda daqueles torna-se fundamental, pois auxílios como parques tecnológicos ou incubadoras de negócios, promoção de feiras e outros, podem tornar-se um impulso essencial. Assim, as instituições públicas ou privadas que queiram promover a industrialização [ou outras atividades econômicas, o turismo por exemplo], devem fazê-lo nas regiões onde um cluster esteja em franco desenvolvimento, [grifo nosso]. (GALVÃO e VASCONCELOS, 1999, apud PIRES, 2001, p. 90).
Em sua análise do desenvolvimento local em um mundo globalizado, privilegiando uma perspectiva de construção de territórios competitivos e inovadores, Lira indica que a construção de capacidades competitivas pode, efetivamente, vincular-se às políticas territoriais e, mais precisamente, ao desenvolvimento de uma cultura territorial que integre os sistemas locais de empresas e que permita, em alguma medida, ajudar a superar a situção de maior deterioração dos territórios mais atrasados [...] É dizer, se bem é certo que são as empresas que competem, essa qualidade se pode ver reforçada, se o entorno territorial facilita esta dinâmica e se, por sua parte, as empresas também sentem a importância de ser empresas “do território” a cujas pessoas e habitantes também se deve a sua existência, mais que empresas “no território” desvinculadas totalmente de seus projetos de futuro e desenvolvimento, [tradução livre nossa]. (LIRA, 2003, p. 43).
No plano territorial, segundo Lira (2003), se torna imprescindível desenhar instrumentos e políticas públicas de gestão dirigidas a estimular o aproveitamento dos recursos locais endógenos para impulsionar novos estilos de desenvolvimento baseados nas potencialidades das economias locais como complemento indispensável das políticas nacionais de desenvolvimento. [...] é importante compreender como desde o local a gestão pública induz, ou pode induzir, o desenvolvimento de redes de empresas organizadas localizadas em um determinado território (clusters), onde a colaboração e o associativismo entre as empresas são elementos centrais para impulsionar a sua competitividade, [tradução livre nossa]. (LIRA, 2003, p. 44).
Para Lira, uma das formas sob a qual se pode organizar uma resposta desde a base, para aproveitar as vantagens que oferecem as novas tecnologias, por exemplo, é por meio da articulação de redes de produção que possam potencializar suas possibilidades competitivas, com uma de suas possíveis versões sendo os chamados clusters de produção.
Lira analisa que a dinâmica do processo de globalização atua sobre os territórios de duas distintas formas, uma segundo as conexões do território com outros lugares do mundo – numa lógica vertical; outra segundo a capacidade do território de construção de redes ou organizações no seu próprio interior – numa lógica horizontal (Figura 2.13).
A segunda destas lógicas está intimamente relacionada com a idéia de construção social dos territórios e, mais concretamente, com a idéia de construção de territórios inovadores e competitivos, na medida que a estrutura econômica nacional se pode expressar em torno das cadeias produtivas locais que propiciam o desenvolvimento de pequenas e médias empresas e que tende a buscar formas associativas e articuladas para conseguir vantagens competitivas, seja sobre o impulso de aglomerações de empresas organizadas sobre o território, ou de outros tipos de associações produtivas, onde a consecução de economias de escala se concebe como externas às empresas, porém internas aos territórios, [tradução livre nossa]. (LIRA, 2003, p. 47).
Figura 2.13 Desenvolvimento Local: Círculo Virtuoso
Fonte: Lira, 2003, p. 44.
Referindo-se aos clusters, Lira informa que o termo indica uma concentração geográfica de empresas e instituições, na qual a interação gera e sustenta vantagens competitivas, no entanto, ele comenta sobre a não existência de um consenso sobre a tradução da palavra cluster, com a mesma sendo utilizada, às vezes com significados diferentes, como equivalente a “agrupamentos industriais”, “distritos industriais” e “grupos ou conjuntos locais”, tendo a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL) recomendado chamá-lo de “conglomerado” (Figura 2.14).
A idéia principal é que por meio do desenvolvimento de um conglomerado, ou agrupamentos industriais, se poderia gerar vantagens competitivas avançadas (principalmente, conhecimento e inovação), de particular relevância para os grupos de pequenas e médias empresas concentradas sobre um território, [tradução livre nossa]. (LIRA, 2003, p. 47).
Figura 2. 14 Clusters e Desenvolvimento Local
Fonte: Lira, 2003, p. 47.
Como uma crítica à elaboração porteriana do cluster, Lira destaca que a ação governamental no modelo de Michael Porter é exógena, ou seja, pode incidir na competitividade, de forma positiva ou negativa, não servindo, no entanto, para explicá-la. De acordo com Lira, a ação governamental, nesta visão, tem um papel similar aos aspectos fortuitos, à casualidade, o que “não é satisfatório para quem desenha e implementa ações coletivas e políticas públicas, particularmente quando hoje em dia, se resgata a necessidade de impulsionar a articulação público-privada para potencializar o desenvolvimento destas organizações de empresas [...]” [tradução livre nossa], (LIRA, 2003, p. 48).
Formulando uma idéia sobre o conceito de competitividade territorial, Lira avalia que um fator fundamental de competitividade, particularmente nesta nova sociedade da informação e do conhecimento, “é a capacidade de aprendizagem e inovação, a mesma que se espera encontre-se imbuida (embedded), amalgamada, em instituições e organizações locais, em forma latente, e que com certa habilidade se possa e se deva explorar [...]” [tradução livre nossa], (LIRA, 2003, p. 48)
A idéia que se trata de transmitir é que na vizinhança de um território podem conviver uma quantidade de empresas que, se se organizam, podem desenvolver a capacidade de associar-se, competir, cooperar, encadear-se, aprender, especializar-se, para, dentro do possível, explorar toda a cadeia de valor de um determinado processo produtivo. Estas redes empresariais, para poder fortalecer-se necessitam, no âmbito local e regional, da ativação de duas vertentes da competitividade, que assumem melhor sentido e toda sua dimensão, particularmente no plano territorial, e que são os níveis meso e micro econômico da competitividade sistêmica. [...] No nível microeconômico se trata de introduzir as mudanças tecnológicas factíveis e necessárias para repotencializar o aparato produtivo local, para o qual se pode recorrer a distintos meios. No nível da meso economia territorial, no entanto, se trata de impulsionar um entorno inovador para o fomento empresarial, que implica o desenvolvimento de toda uma institucionalidade local que efetivamente possa enfrentar este desafio, [grifo do autor], [tradução livre nossa]. (LIRA, 2003, p. 48).
Na opinião de Ribeiro (2001), a globalização da atividade econômica e a tendência das empresas que operam em áreas de negócios afins se localizarem e atuarem em proximidade, têm tornado-se forças motrizes do desenvolvimento econômico. Neste contexto, a globalização tem se revelado compatível com a “localização” de vantagens competitivas em diversas atividades industriais e de serviços.
Por outro lado, a necessidade de ajustamento à competição local tem levado as autoridades nacionais e regionais de vários países a promover políticas públicas que favoreçam processos de clusterização, ou seja, de estímulo à formação de clusters.
Segundo Ribeiro, a OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico), define cluster como “redes de produção de empresas fortemente interdependentes (incluindo fornecedores especializados), ligadas entre si numa cadeia de produção de valor adicionado [ou agregado] ” (OCDE, 1999, apud RIBEIRO, 2001, p. 111).
As políticas de clusterização devem ser dirigidas, de acordo com o autor, ao estímulo e apoio à emergência deste tipo de redes; ao reforço das ligações entre as diferentes partes que compõem essas redes; ao acréscimo do valor adicionado pela atuação dessas partes.
Ribeiro distingue quatro tipos de clusters e quatro definições derivadas:
Micro Cluster ou Cluster Local – é um conjunto geograficamente próximo de empresas e instituições, inter-relacionadas por elementos comuns e complementaridades, atuando num campo particular de atividades (no mesmo setor ou eventualmente no mesmo segmento de um setor); essas empresas simultaneamente concorrem entre si no mercado dos produtos (ou serviços) e são capazes de cooperar entre si, e ao fazerem-no aumentam a competitividade do conjunto; o caso dos “Distritos Industriais italianos” cabe nesta noção, em que a focalização das empresas num leque reduzido de atividades ou de segmentos de atividades é uma característica-chave;
Cluster Industrial [...] ou simplesmente cluster – é um conjunto de empresas inter-relacionadas, de fornecedores especializados, de prestadores de serviços, de empresas pertencentes a indústrias relacionadas e de instituições associadas (desde Universidades a centros de certificação de qualidade e a associações comerciais) que desenvolvem a sua atividade em campos diferentes, recorrendo a tecnologias distintas mas complementares, e que pela inovação que uma gera se concretizam benefícios para as outras, beneficiando-se todas da melhoria da competitividade das partes;
Cluster Regional – é no essencial um cluster industrial cujas articulações principais funcionam no interior de um dado espaço regional (subnacional), podendo essas articulações repetir-se total ou parcialmente noutras regiões do mesmo país; a este nível são mais pertinentes os efeitos de proximidade geográfica sobre a dinâmica da interação entre os atores e ao nível da competitividade e inovação do conjunto;
Mega Cluster – é um conjunto de atividades distintas, mas cujos bens ou serviços satisfazem a procura de uma mesma grande Área Funcional da Procura Final, recorrendo a competências básicas complementares e podendo explorar vantagens de interligação e articulação em rede, entre si e com outras entidades, nomeadamente as que permitem a acumulação do “capital imaterial” para o conjunto das empresas envolvidas, [grifo nosso]. (RIBEIRO, 2001, p. 111-112).
As Áreas Funcionais correspondem aos Mega Clusters identificados na economia de um país, quer efetivos ou potenciais, que se caracterizam por apresentar, segundo o autor, forte procura mundial e nos países desenvolvidos, além de expressivo potencial de inovação. São exemplos de Áreas Funcionais ou Mega Clusters: Saúde, Informática e Comunicações, Instrumentação e Microtécnicas, Indústria Aeronáutica, Indústria Naval e Exploração Oceânica, Navegação e Teledeteção. A relação entre Mega Clusters e Clusters efetivos ou potenciais é mostrada no (Quadro 2.11).
Quadro 2.11 Portugal – “Mega Clusters” e “Clusters Industriais”
Fonte: Ribeiro, 2001, p. 125.
Segundo Ribeiro (2001), no interior de um Mega Cluster funcionam quatro tipos de relações:
uma relação de “fileira” (filière), relacionando de montante a jusante um conjunto de atividades que são compradoras ou vendedoras em cadeia, por sucessivas transformações dos materiais ou integração de componentes;
uma relação estabelecida pela exploração de bases tecnológicas comuns, mas com aplicações distintas, explorando o conceito de “árvores tecnológicas”;
uma relação através do fornecimento de bens de equipamentos, que materializam as tecnologias de processo dominantes em cada momento para as diversas atividades da Área Funcional, referindo-se em especial os casos em que existe uma forte inovação nesses bens de equipamento; e
uma relação entre produtos sem qualquer relação de fileiras, de tecnologias ou de equipamentos, tornada possível pela acumulação de capital simbólico desenvolvidos pelas empresas (a exemplo de marcas e redes de distribuição associadas).
Conforme o tipo de relações que se estabelecem entre empresas localizadas geograficamente próximas, em um determinado local, numa “contiguidade” ou em uma dada região, pode se diferenciar, conforme Ribeiro, três tipos de polarização geográfica:
Co-localização – consiste numa localização geograficamente próxima de empresas com fracas conseqüências funcionais; as empresas não dão importância ao local e às outras empresas nele presentes para a sua própria competitividade; neste caso são fracas ou inexistentes as relações [entre e dessas empresas];
Aglomeração – consiste numa localização geograficamente próxima de empresas que contribui para a sua competitividade, mas de um modo que se poderá designar como “passivo”; neste caso são fracas as relações entre as empresas que concorrem no mesmo setor, bem como entre fornecedores e clientes; predominam as relações com as Universidades locais (nomeadamente por razões de disponibilidade de recursos humanos qualificados), com o setor de serviços de suporte e com as infra-estruturas;
Clusterização – consiste numa localização geograficamente próxima de empresas em que funcionam com maior ou menor intensidade [todos os possíveis níveis de relações entre e dessas empresas, referidos no tipo de localização anterior], [grifo do autor]. (RIBEIRO, 2001, p. 114-115).
De acordo com a caracterização dos três tipos de polarização geográfica acima discriminados, não seria exatamente correta a consideração que diversos autores fazem, conforme consta e se concorda nesta tese, do termo agrupamento como tradução mais aceita ou mesmo um sinônimo do termo cluster. Mais uma vez se percebe a heterogeneidade de foco entre as diversas abordagens do tema.
Aos fatores de aglomeração anteriormente mencionados, e num contexto de globalização, combinam-se as virtualidades da Internet e do “ciberespaço”, germinando-se desse modo, um novo tipo de cluster:
Ciber-Cluster – entendido como um conjunto de empresas situadas a grande distância física umas das outras mas que trabalham em conjunto, realizando operações sucessivas num mesmo processo ou especializando-se em segmentos distintos desse processo, explorando as vantagens das diferenças de fusos horários, de forma a permitir uma produção initerrupta no cluster, 24 horas por dia, todos os dias, graças à utilização das telecomunicações e da Internet; a este nível, o fator “proximidade” é determinado não em termos geográficos mas de sequência temporal, [grifo nosso]. (RIBEIRO, 2001, p. 116).
Conforme Ribeiro, as economias desenvolvidas são influenciadas por um conjunto de processos que interagem entre si, acarretando conseqüências sobre a dinâmica dos clusters industriais e regionais. Nesse contexto, são três os principais processos de influência: a globalização da economia mundial, a vertiginosa mutação tecnológica e a terceirização das economias empresariais, com este último processo envolvendo aspectos relacionados à produção e circulação de conhecimento, informação, intermediação e capital simbólico. O dinamismo de tal cenário atua sobre a maior ou menor condição de competitividade, a nível internacional, nacional, regional ou local, das economias, dos clusters, das empresas e, inclusive, dos destinos turísticos envolvidos.
Na abordagem da clusterização, conforme Lobo e Melo (2002), o caminho que se seguiu no GEPE – Gabinete de Estudos e Prospectiva Econômica, do Ministério da Economia de Portugal, para definir o foco do cluster (no caso do automóvel) e em seguida identificar suas actividades constituintes, assentou na análise das matrizes das contas nacionais.
Analisando a indústria automobilística, as autoras delinearam a evolução da cadeia de valor do automóvel, para chegar à configuração do cluster do automóvel.
De uma integração vertical com competências bem definidas e funções sequenciadas, que terminavam no produto automóvel, tem-se gradualmente caminhado para uma gestão integrada de uma arquitetura multipolar, que visa seguir o produto ao longo de todo o seu ciclo de vida [...]. (LOBO e MELO, 2002, p. 28).
O cluster do automóvel, Figura 2.15, p. 250, agrupa as atividades tipificadas a seguir:
Foco (em cinza mais escuro) – Conjunto de atividades que originam o produto automóvel ou componentes diretamente relacionados com a fabricação do mesmo (essencialmente integração e montagem do automóvel);
Input (em branco) – Atividades relacionadas com os produtos necessários à produção do automóvel (produtos incorporados no próprio automóvel);
Suporte (em cinza mais claro) – Atividades cujos produtos/serviços são necessários ao processo de transformação, sendo incorporados ou não fisicamente no produto final, embora não se esgotem nele (em particular equipamentos fundamentais utilizados na produção – em cinza);
Complementar (mesclado em cinza e branco) – Atividades relacionadas com o produto final (foco) ou com o funcionamento empresarial. Não são indispensáveis ao processo produtivo, mas possibilitam um maior domínio da cadeia, sobretudo a jusante do foco (visando, entre outros aspectos, proporcionar uma melhor mobilidade individual), embora se reflitam também a montante (exemplo da reciclagem), [grifo nosso]. (LOBO e MELO, 2002, p. 35).
Figura 2.15 Cluster Automóvel
Fonte: Lobo e Melo, 2002, p. 35.
Nota: A dimensão dos círculos não tem qualquer significado.
Em uma abordagem analítica distinta, para Monfort Mir (2000), o conceito de êxito competitivo unifica os conceitos de competitividade empresarial e de êxito ou sucesso empresarial, significando, de modo sintético, capacidade para competir. De forma mais desenvolvida, por êxito competitivo “se entende a capacidade de uma empresa para configurar uma oferta de produtos que resulte atrativa para uma quota significativa do mercado [...]” [tradução livre nossa], (MONFORT MIR, 2000, p. 35).
Tal capacidade permitirá que a empresa desenvolva uma vantagem competitiva que deve ser sustentada no tempo, de maneira que um negócio possa alcançar uma posição competitiva favorável, possibilitando a manutenção e o aumento de sua participação no mercado, ao mesmo tempo conseguindo resultados financeiros superiores e um crescimento do rendimento gerado.
O conceito de êxito competitivo vincula-se à idéia de excelência, a qual está associada ao alcance de níveis máximos de eficácia e eficiência por parte da empresa, sendo que, no âmbito do turismo se trata de aplicá-lo a destinos turísticos, numa perspectiva global, ainda que, conforme Monfort Mir, no final, sejam as empresas e seus respectivos negócios os protagonistas com capacidade real de interiorizar e tornar aplicável esta “excelência” a qualquer destino turístico.
O conceito de competitividade empregado no estudo elaborado por Monfort Mir, refere-se ao compromisso essencialmente estratégico da competitividade, ou seja: melhora da eficiência, crescimento da quota de mercado e da renda, e conformidade com umas condições mínimas para o correto funcionamento dos mercados – ausência de barreiras e restrições à concorrência e consideração do âmbito competitivo desde uma perspectiva internacional [...], [tradução livre nossa], (MONFORT MIR, 2000, p.36).
Pelo exposto, a abordagem de Monfort Mir concorda e recorre aos conceitos porterianos de competitividade e de vantagem competitiva.
[...] a vantagem competitiva aglutina características diferenciais de uma empresa que a distinguem diante de potenciais concorrentes, as quais, por sua vez, proporcionam a esta empresa um valor que é reconhecido por seus clientes: valor que se manifesta em forma do menor preço do seu produto, apesar de proporcionar benefícios similares [aos produtos dos concorrentes]; ou pode traduzir-se em atributos exclusivos do produto da empresa em questão que implicam um maior lucro, capaz de absorver o custo adicional deste produto, [tradução livre nossa]. (MONFORT MIR, 2000, p. 36).
A origem e a sustentabilidade das diferenças em resultados e em vantagens competitivas entre empresas, deram lugar, de acordo com Monfort Mir, a várias alternativas de análise da competitividade, as quais podem agrupar-se, com base em sua capacidade explicativa da competitividade internacional da empresa, a partir de cinco tipos de variáveis causais: “vantagens-país”, “vantagens-indústria/setor”, “vantagens-território”, “vantagens-produto” e “vantagens-empresa”, [tradução livre nossa]. (MONFORT MIR, 2000, p. 41).
No seu estudo, Monfort Mir adverte que utiliza com o mesmo sentido, referindo-se à classificação acima, os termos vantagens e efeitos. Esta classificação será objeto de análise mais detalhada no capítulo 3 desta tese, item 3.2.2, no que se refere à sua aplicação e funcionalidade em relação a diferenciados níveis e formas de competitividade de destinos turísticos.
A competição das empresas através dos agrupamentos ou clusters, segundo Rodríguez Dominguez (2001), representa uma forma de aproveitar-se tanto das vantagens país, como das vantagens de operar em um setor determinado e das vantagens derivadas da própria empresa, permitindo ainda, se por em prática o desenvolvimento de uma estratégia de flexibilidade adaptativa necessária também para a melhora competitiva que deverá produzir-se na atividade do turismo. De acordo com a autora, um cluster “é aquela associação de atividades industriais competitivas, conformada por diferentes empresas e setores, localizadas num espaço fechado, e com umas operações que são idoneamente complementares [...]” [tradução livre nossa], (RODRÍGUEZ DOMÍNGUEZ, 2001, P. 303).
Mas, questiona a autora, o que se entende exatamente por um espaço fechado?. Utilizando-se de uma classificação de Becattini, ela indica que os sistemas territorias articulam-se nos seguintes níveis:
o distrito industrial – lugar onde operadores pertencentes ao mesmo setor ou setores complementares se dedicam à integração de suas atividades com uma vizinhança muito próxima;
a cidade industrial – lugar da integração urbana entre um conjunto de empresas industriais, de grande e pequena dimensão, e o seu território interior de conjuntos urbanos, serviços e consumos;
a região – lugar das comunicações e interdependências entre o conjunto dos distritos e das cidades industriais situadas em posições contíguas na mesma zona de tráfego;
o Estado nacional – lugar da organização jurídica, política e cultural;
a economia-mundo – que contém todos os lugares anteriores e as suas diferenças.
Rodríguez Dominguez (2001), analisa que no estudo de Michael Porter sobre os clusters, ele trabalha com agrupamentos de empresas, porém sem precisar qual deve ser o âmbito geográfico destes clusters, ou seja, que empresas devem ser incluídas no cluster e quais as que não devem. Ele só faz referência àquelas empresas que com uma situação geográfica próxima mantenham relações de tipo empresarial (comprador-vendedor).
Porém, a proximidade das empresas é um termo muito relativo, afirma Rodríguez Dominguez. Assim, ainda que na sua abordagem Porter considere o cluster como um fenômeno local, há que se ter em conta que o seu modelo de vantagem competitiva opera no cenário global e que para o mercado internacional os fenômenos nacionais têm um certo caráter local. Por isso, continua Rodríguez Dominguez (2001), é necessário distinguir os clusters detetáveis à escala do país, dos outros fenômenos de interação produtiva à escala local, denominados distritos industriais. Nota-se aqui, que a autora diferencia o conceito de cluster, na ótica porteriana – o cluster de dimensão nacional, do conceito de distrito industrial, de foco local. Não obstante, reconhecer a autora que, mais recentemente Porter tem admitido a existência de um outro tipo de cluster, em nível mais reduzido, local, que tem lugar em economias avançadas, afirmando inclusive, que são os recursos locais os que realmente são capazes de sustentar vantagens competitivas duradouras para as empresa, dada a globalização da economia.
Buscando definir uma tipologia de clusters, em consonância com os níveis de articulação dos sistemas territoriais formulados por Becattini e acima apresentados, Rodríguez Dominguez afirma que
[...] no âmbito do distrito industrial, o conjunto de empresas relacionadas e semelhantes vão conformar o que seria um microcluster [considerado pela autora como sinônimo de sistema produtivo local e de distrito industrial]; no âmbito de uma cidade industrial encontra-se um conjunto de microclusters relacionados; no da região têm-se os clusters regionais; no do conjunto do Estado, clusters nacionais; e, por fim, a nível de economia-mundo poderia se falar de macroclusters, [grifo nosso], [tradução livre nossa]. (RODRÌGUEZ DOMÌNGUEZ, 2001, p. 304-305).
Atendendo a esta tipologia, a autora afirma que, em qualquer intento de realizar um diagnóstico geral de um setor seguindo a metodologia porteriana, e entendendo esta em seu sentido amplo, é dizer, em nível de cluster nacional, estará se pecando por parcialidade, já que só se poderá estudar aspectos genéricos do setor ou utilizar magnitudes muito agregadas. A extensão dos clusters deve ser caracterizada pela homogeneidade das empresas que os compõem. Por isso, Rodríguez Domínguez diz que, com base na análise tradicional de vantagens competitivas, podem acrescentar-se dois conceitos-chave:
Definem-se os segmentos estratégicos como a unidade de mercado onde tem lugar uma concorrência real e onde as empresas que nele se situam competem, têm problemas comuns e buscam solucioná-los. Desta forma, não tem validade o uso da tradicional classificação estatística das empresas segundo o seu código CNAE [Classificação Nacional de Atividades Econômicas]. Não se pode considerar, por exemplo, o conjunto de todos os hotéis da Espanha, já que podem estar competindo em segmentos distintos (... turismo de saúde, turismo de negócios, etc.);
Microclusters: trata-se de grupos de empresas e de atividades relacionadas num âmbito geográfico determinado, geralmente reduzido. Em muitas ocasiões, ocorre que as empresas que competem em um segmento estratégico, os setores relacionados e as infra-estruturas de apoio, se situam em áreas geográficas concretas e não muito extensas. São essas áreas que se denominam microclusters, e constituem a unidade de análise das fontes de vantagem competitiva.
[Nesta abordagem] se utilizará propostas e linhas de ação concretas e operativas, deixando [de lado] todas aquelas recomendações de tipo genérico que se vinha utilizando ao tratar os clusters nacionais e que conformavam estudos excessivamente agregados. Ao trabalhar com âmbitos geográficos mais reduzidos, se pode descrever com maior grau de detalhe o campo de atuação das empresas, tendo-se condições de indicar soluções precisas a problemas concretos, [tradução livre nossa]. (RODRÍGUEZ DOMÍNGUEZ, 2001, p. 305-306).
A autora descreve uma tipologia de clusters similar à apresentada por Ribeiro (2001). A principal distinção entre ambas reside no fato de que, no modelo de Ribeiro são enfatizadas as interdependências setoriais refletidas nas cadeias de produção de valor adicionado da economia do país, o que remete à utilização de critérios técnicos relacionados à contabilidade nacional. Este fato pode ser percebido, ainda com maior destaque e de forma bem definida, na abordagem do processo de clusterização realizada por Lobo e Melo (2002), onde a caracterização setorial do cluster deriva da classificação das atividades econômicas e das relações intersetoriais obtidas das matrizes das contas nacionais – matrizes insumo-produto. Já para Rodríguez Domíguez (2001), o recurso às técnicas de contabilidade nacional não tem validade para a delimitação de clusters, pois as mesmas resultam em um tratamento genérico e com um elevado grau de agregação, o que limita o conhecimento concreto da realidade dos clusters, notadamente, de acordo com sua tipologia, dos microclusters, e, de modo particular, dos microclusters cuja atividade econômica nuclear seja o turismo.
Após se ter examinado, nos capítulos 1 e 2, uma extensa literatura referenciada às questões do crescimento e do desenvolvimento regional, e à “Teoria dos Aglomerados”, enfatizando os conceitos de cadeias e de clusters, na visão de Michael Porter e em diversos outros enfoques, convergentes e divergentes com a mesma, se abordará no capítulo 3, de modo específico, à luz do referencial teórico até aqui trabalhado, o papel que a atividade turística pode desempenhar no processo do crescimento e do desenvolvimento regional, analisando-se inicialmente as categorias econômicas do turismo, se procurando também, contextualizar a coerência da vinculação e da aplicabilidade dos conceitos de cadeias e de clusters à atividade socioeconômica do turismo.
Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Ciências da Comunicação, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, ECA / USP, como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências da Comunicação.