TURISMO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO: UMA ANÁLISE URBANO-REGIONAL BASEADA EM CLUSTER
Jorge Antonio Santos Silva
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1.1.4 A localização das atividades econômicas no espaço
Joahann Heinrich Von Thünen, contribuiu com idéias pioneiras para o desenvolvimento da análise econômica espacial, tendo o seu trabalho seminal “O estado isolado” (Der isolierte staat in beziehung auf landwirtschaft und nationalokonomie, 1826), influenciado uma expressiva quantidade de estudos, fundamentados na sua formulação teórica sobre a formação e a estruturação do espaço agrícola.
Outro autor pioneiro e de central importância na análise da localização da empresa industrial foi Albert Weber (Uber den standort des industrien, 1909), sugerindo à época que três fatores determinariam tal localização: o custo de transporte, os custos do trabalho e as vantagens associadas à aglomeração (economias de aglomeração).
Para o objetivo deste trabalho, não se procederá uma análise detalhada dos contributos de Von Thünen e Weber. Será tomado como ponto de partida as primeiras observações empíricas de Walter Christaller, 1933, que começaram a formatar a idéia de que as atividades econômicas e as populações se distribuem no espaço de forma ordenada, dando origem a hierarquias, redes ou sistemas urbanos.
Uma empresa procura, normalmente, localizar-se no centro geográfico do seu mercado, em virtude do princípio da centralidade geográfica. As empresas que querem fornecer às mesmas populações, mesmo que sejam produtos diferentes, têm interesse em se agrupar. Desse modo, as empresas que tenham áreas de mercado comparáveis, irão se agrupar no mesmo local, formando um determinado lugar central. Quanto maior for a população a ser abastecida e de mais longe vierem os clientes, maior importância terá o lugar central.
A decisão de centralizar ou não a produção num só lugar é, em grande parte, como já comentado, reflexo da comparação entre economias de escala e custos de transporte. Quanto mais relevantes forem as economias de escala e mais baixos os custos de transporte, maior será a probabilidade de se centralizar a produção em um só lugar.
No caso de produtos ou serviços de consumo final – no setor do comércio varejista e dos serviços pessoais, é, em geral, o consumidor que assume ou internaliza os custos de transporte envolvidos nos deslocamentos que realiza para se abastecer, o que determina e fixa um limite muito bem definido para as possíveis áreas de mercado. O custo real dos deslocamentos, incluindo o custo de oportunidade, será influenciado pela freqüência do consumo e pela importância da despesa correspondente no orçamento do consumidor. O consumidor percorrerá distâncias maiores para adquirir determinados produtos e serviços que outros, decorre daí, que nem todos os produtos e serviços têm a mesma importância, sendo possível então, estabelecer-se uma hierarquia entre eles.
Christaller considera então, que os bens e serviços podem ser hierarquizados de acordo com a sua importância. Quanto menor for a velocidade ou o ritmo de repetição do consumo de determinados produtos mais elevados eles se situarão na hierarquia, e vice-versa. No caso do consumo ser frequente os produtores tendem a localizar-se próximos dos consumidores, conformando regiões complementares aos lugares centrais, de reduzida dimensão. No caso do consumo ser de caráter ocasional os produtores se localizarão a uma maior distância média dos consumidores, e entre eles, visando a rentabilidade de sua escala de produção, neste caso, se definirão regiões complementares que se apresentarão com uma maior dimensão.
Uma outra relevante colocação de Christaller refere-se a que, desde quando a produção de produtos e serviços é realizada em lugares centrais, a importância dos lugares será tão maior quanto maior for a importância dos produtos e serviços situados em elevada posição hierárquica e que sejam fornecidos a partir desses lugares centrais. Há, portanto, uma relação direta entre a relevância dos lugares centrais e a importância dos produtos e serviços por eles disponibilizados.
Outro ponto a destacar é o fato de que um lugar central de ordem superior está em condições de fornecer não apenas todos os bens que lhes correspondem na hierarquia dos produtos e serviços, mas também, todos os bens que são fornecidos por todos os centros de ordem inferior. Os consumidores que se deslocam até esses centros de ordem superior aproveitam para adquirir não só os bens de consumo menos frequente, de maior hierarquia, como os de consumo de maior ocorrência ou de ordem inferior, visando minimizar o esforço, o custo e o tempo dos seus deslocamentos.
Distinguem-se, deste modo, produtos e serviços superiores de produtos e serviços inferiores. Um produto ou serviço de ordem superior caracteriza-se, suscintamente, por representar:
economias de escala importantes, com o mínimo de mercado ou de produção situando-se em expressivo patamar;
consumo pouco freqüente, representando um produto cujo custo de transporte é significativo em relação à renda do consumidor;
custos de transporte baixos, o custo será tanto mais baixo quanto menor seja a necessidade de deslocamento frequente do consumidor;
vontade do consumidor de se deslocar por grandes distâncias para adquirir o produto desejado, desde quando tenha condições orçamentárias para fazê-lo.
Para um produto ou serviço de ordem inferior, as relações se invertem: economias de escala pequenas, consumo freqüente ou produto barato, custos de transporte elevados e consumidores pouco dispostos a se deslocar.
Um outro expressivo estudioso dos aspectos relacionados com a localização das atividades econômicas no espaço foi August Lösch (The economics of location, 1967), edição original em alemão de 1939). Sua teoria dedica especial atenção à definição das áreas de mercado e o determinante da escolha da localização é a maximização do lucro dos produtores, divergindo neste ponto de Christaller, para quem o determinante é a minimização dos custos de deslocamento dos consumidores. Lösch entende que existem economias de aglomeração que tendem a agrupar as empresas produzindo bens para diferentes mercados, o mesmo sucedendo com os custos de transporte, por efeito da redução das distâncias a percorrer.
Enquanto Christaller privilegia o interesse dos consumidores, Lösch dá maior ênfase à eliminação dos lucros excedentes.
No que diz respeito às funções que são exercidas por cada centro, Christaller, ao procurar minimizar o esforço dispendido pelos consumidores privilegia o agrupamento dos fornecedores (coincidência absoluta dos fornecedores), mesmo que daí resulte algum sacrifício relativamente ao objetivo da eliminação dos lucros excedentes. Esta postura tem como conseqüência o desenvolvimento de um sistema urbano multipolar [...] implicando uma multiplicidade de lugares centrais da ordem mais elevada, ou seja, multiplicidade de metrópoles [...].
Lösch, ao dar maior importância à eliminação dos lucros excedentes, embora sem descurar a minimização do esforço dos consumidores, sacrifica-a, em relação à primeira preocupação (coincidência máxima dos fornecedores) daí resultando, em relação às características dos centros de uma determinada ordem, um sistema urbano mais flexível. Cada um dos centros não tem que ter disponíveis, necessariamente, funções totalmente idênticas às de um outro centro da mesma ordem, embora elas tendam a aproximar-se [...] havendo uma tendência à existência de uma única metrópole, logo tratando-se de um sistema urbano unipolar. Logo, o sistema de Christaller é mais descentralizado, ou menos hierarquizado que o de Lösch [...], [grifo nosso]. (ALVES, 2002, p. 136).
Segundo Polèse (1998), várias são as razões que fazem as hierarquias urbanas afastarem-se de um modelo desejado ou idealizado:
os obstáculos institucionais entravam a integração do espaço econômico do país;
o poder de compra e as preferências do consumidor não são homogêneos em todo o território;
a localização das atividades não comerciais obedece a uma lógica diferente da dos lugares centrais;
o impacto das infra-estruturas sobre as decisões de localização;
o impacto das economias ou deseconomias de aglomeração podem contrariar o modelo;
a indústria de transformação não se integra necessariamente em modelos de localização do tipo dos lugares centrais.
A necessidade do consumidor ou do produtor se deslocar afeta setores e atividades como saúde, educação, turismo, cultura (bibliotecas, teatros, museus, etc.), serviços financeiros, restaurantes e o comércio atacadista.
O modelo dos lugares centrais não é aplicável quando os custos de produção, montagem ou extração excedem os custos de transporte do produto final. Uma atividade irá se instalar em um local em que os seus custos de produção sejam mais baixos, o qual não corresponderá, necessariamente, ao centro do seu mercado, como é o caso da indústria de transformação e da indústria extrativa.
No entanto, pode-se dizer que quanto mais uma indústria for sensível ao seu mercado, ou quanto maior importância tiver os custos de transporte no preço do produto final, mais o seu modelo de localização tende a se orientar segundo a teoria dos lugares centrais.
Polèse utiliza o termo “escritório” para identificar unidades de produção cujos modelos de localização podem diferir dos aplicáveis a fábricas ou lojas, limitando-se aos escritórios privados prestadores de serviços comercializáveis: consultoria de administração, agências de publicidade, bancos de investimento, companhias de seguros, sociedades de gestão de ativos financeiros, empresas de contabilidade, etc.
A comercialização desses serviços, denominados serviços superiores modernos, não exige o deslocamento do consumidor, esse aspecto dificulta a delimitação das áreas de mercado dos escritórios das empresas que prestam tais serviços. Para melhor caracterizar este setor da economia, dos serviços superiores, pode-se falar, em conformidade com Polèse (1998), em serviços às empresas, serviços à produção ou serviços de intermediação, que são serviços destinados a outras empresas, no que distinguem-se dos serviços ao consumidor (terciário tradicional). Este setor, que envolve atividades que incorporam massa crítica e informação, pode ser chamado também de terciário superior ou terciário motor, cuja produção é exportável, representando um potencial de geração de efeito multiplicador local.
Um escritório, para produzir, tem que recolher os inputs e expedir os outputs, como faz uma fábrica, com a diferença que os seus inputs e outputs são de natureza intangível, podendo ser denominados de “informação”, ou seja, um escritório compra, transforma e vende informação, processo geral que também implica em custos de transporte que, neste caso, podem ser chamados de custos de comunicação – transporte ou distribuição da informação.
Uma cidade moderna carateriza-se por sua diversidade de empresas, de consultores e, principalmente, de informações. Esta diversidade constitui uma das bases das economias de aglomeração, justificando porque a não padronização da procura é um fator de aglomeração.
Um outro nome de destaque para a presente análise corresponde ao de Walter Isard, que com seu trabalho seminal – Location and space-economy: a general theory relating to industrial location (1956), teve o mérito de integrar as aportações da escola dos geógrafos alemães à questão espacial com a análise microeconômica da minimização de custos ou da maximização do lucro.
Motivado por sua inconformidade com a economia neoclássica auto-confinada a “a wonderland of no spacial dimensions”, Isard criou a Ciência Regional (Regional Science), uma construção de caráter interdisciplinar que obteve uma considerável importância prática no âmbito do planejamento regional, [tradução livre nossa]. (MONCAYO JIMÉNEZ, 2001, p. 14).
Conforme Spinola (2003), Isard indica no prefácio do livro acima destacado que o seu objetivo “consiste em melhorar a estrutura espacial e regional das diferentes ciências sociais, especialmente a Economia, mediante o estabelecimento de uma teoria geral mais adequada da localização e do espaço econômico [...]” (SPINOLA, 2003, p. 37).
Isard, ainda segundo Spinola, realiza um grande trabalho ao [...] introduzir os problemas de espaço na teoria econômica através do conceito de insumos de distância (o movimento de um peso unitário sobre uma unidade de distância). O preço de um insumo de distância é a taxa de transporte e, como no caso de insumos de capital, uma redução no preço causa um efeito de escala e de substituição. Para Isard, os insumos de distância são simplesmente considerados como um outro fator de produção, cujo preço é a taxa de transporte e cuja combinação ótima com outros fatores pode ser determinada pelos princípios de substituição.
Considerando que existem diferentes estruturas regionais de produção, o fator transporte poderá ser incluído nas diversas funções de custo como input com a consequente vantagem da sua consideração explícita. Assim, em virtude da sua própria natureza, condicionará a orientação locacional no marco da teoria convencional da produção. (SPINOLA, 2003, p. 37).
Spinola, mesmo alertando sobre o risco de imprecisão, informa que o debate teórico sobre a questão locacional pode ser dividido em dois períodos distintos. O primeiro, que termina em fins da década de 1960, compreende duas correntes teóricas. Uma que considerava os mercados, conforme Spinola (2003), como puntiformes – os consumidores se concentrariam em pontos discretos do espaço geográfico; e outra que considerava os consumidores dispersos em áreas de mercado de diversos tamanhos.
A primeira abordagem caracterizava-se por ser estática, não levar em conta a interdependência locacional e focar o mercado sob o regime de concorrência perfeita. Já a segunda vertente possuía um caráter dinâmico, considerava a interdependência locacional e abordava o mercado sob a ótica da concorrência imperfeita.
Spinola indica como principais expoentes na formulação dos contributos teóricos mais relevantes da primeira corrente os nomes de Johann Heinrich Von Thünen, Alfred Weber e Walter Christaller, e da segunda corrente os nomes de August Lösch, Harold Hotelling, Tord Palander e, de forma destacada, Walter Isard. Para os objetivos desta tese, as contribuições seminais desse grupo de estudiosos, considerados como fundadores da teoria locacional e precursores da ciência regional, foram apresentadas com os limites de aprofundamento que se tomaram como adequados ao escopo do presente trabalho.
O segundo período, de acordo com Spinola, inicia-se na década de 1980, sendo movido, de um lado, “pela revolução tecnológica que se pronunciava e, de outro, pela ruptura, no mundo desenvolvido, com o modelo de produção taylorista/fordista, iniciando-se uma nova era, [...] denominada como da especialização flexível” (PIORE e SABEL, 1994, apud SPINOLA, 2003, p. 29). Este segundo período, com seus diferenciados desdobramentos teóricos e metodológicos, será objeto de análise ao longo desta tese.