Paulo Ricardo Machado Weissbach
A participação do poder público no setor turístico ganha importância na razão de que cabe a ele, entre outras medidas, regular a atividade a fim de que ocorra um desenvolvimento econômico e sócio-cultural equilibrado. “A função do governo é um aspecto importante e complexo do turismo e envolve políticas e filosofias políticas.” (LICKORISH; JENKINS, 2000, p. 2370). Tendo em vista a repercussão que o turismo causa em atividades socioeconômicas é que o poder público não pode ficar indiferente. “Muitas vezes o turismo está sujeito à intervenção governamental direta e indireta em decorrência das possibilidades de geração de emprego e renda que apresenta e, portanto, do seu potencial de diversificar e contribuir para as economias nacionais e regionais.” (HALL, 2001, p. 39). A relevância do setor público no turismo é apresentada por Castelli (2001, p. 53), pelos seguintes motivos:
- insuficiência da iniciativa privada por falta de interesse para operações a longo prazo, risco excessivo, carência de mentalidade e consciência dos problemas enfocados;
- necessidade de favorecer estímulo à iniciativa privada tanto nos aspectos econômicos da exploração como na tecnologia profissional, investigação, planificação, programação, etc;
- carência de inversões suficientes no setor privado para a realização de planos considerados como mais adequados para o bom desenvolvimento do setor;
- falta de rentabilidade ou a inapropriada canalização dos capitais privados fazem com que sejam necessárias medidas de caráter fiscal e financeiro;
- inadequação das atividades privadas às funções de planejamento geral ou regional, seguindo princípios de concentração ou distribuição geográfica que estudos econômicos assinalam como de escassa ou contraproducente viabilidade;
- necessidade de regular o adequado funcionamento das empresas do setor público em matéria de turismo, da seguinte forma: normativa, sancionadora, de ajuda e estímulo, de gestão direta em caso de insuficiência da iniciativa privada.
Faz-se prudente observar que o setor de turismo nunca esteve entre as prioridades das políticas públicas nos três níveis de governo, sendo que o órgão público de turismo tem servido mais como uma moeda de troca nas composições políticas. Além de outros problemas apontados por Beni (2006, p. 22) em relação ao poder público: “descontinuidade de gestão e inexistência de diretrizes e macroindicações claras, objetivas e reproduzíveis em todos os níveis para os atores públicos e privados e comunidades [...].”
A publicação Introdução ao Turismo da Organização Mundial de Turismo (OMT, 2001, p. 72) indica as atuações políticas governamentais como ações para o desenvolvimento turístico, dentre as quais a criação de infra-estrutura e apoio à atividade. Por outro lado, a ação dos governos também pode impedir o desenvolvimento da atividade pela falta de apoio ou pela criação de medidas restritivas.
Considerando que políticas são “[...] orientações específicas para a gestão permanente do turismo, abrangendo os inúmeros aspectos operacionais da atividade”, (BENI, 2000, p. 166) os espaços turísticos que tem um interesse para a atividade turística devem estar sujeitos a uma política que ordene, regule, promova, desenvolva e controle esta transformação para tal uso com um detalhado planejamento, onde se incluem os espaços rurais, próprios para a prática turística (MONTEJANO, 1991, p. 213).
Sinteticamente, conforme Liu apud Fennel (2002, p. 138), em relação ao turismo, o poder público deve:
1. Facilitar uma atividade eficiente do setor privado, reduzindo a interferência no mercado e valendo-se da competição como um meio de controle;
2. Assegurar um bom ambiente macroeconômico;
3. Garantir a lei e a ordem e a solução justa de disputas;
4. Assegurar a provisão de infra-estruturas adequadas;
5. Assegurar o desenvolvimento de recursos humanos;
6. Proteger o interesse público sem obstruir a atividade do setor privado com regulamentação exagerada;
7. Promover a atividade do setor privado, não competindo na arena dos negócios dos empreendimentos privados;
8. Reconhecer o papel dos pequenos empreendedores e facilitar suas atividades.
Com pontos concordantes aos apontados acima por Fennel, Ignarra (1999, p. 125) cita as seguintes atribuições do poder público quanto à intervenção nos rumos do turismo:
a) planejamento e fomento da atividade;
b) controle de qualidade do produto;
c) promoção institucional da destinação;
d) financiamento dos investimentos da iniciativa privada;
e) capacitação de recursos humanos;
f) controle do uso da conservação do patrimônio turístico;
g) captação, tratamento e distribuição da informação turística;
h) implantação e manutenção da infra-estrutura urbana básica;
i) prestação de serviço de segurança pública;
j) captação de investidores privados para o setor;
l) desenvolvimento de campanhas de conscientização turísticas;
m) apoio ao desenvolvimento de atividades culturais locais, tais como o artesanato, o folclore, a gastronomia típica, etc.
n) implantação e manutenção de infra-estrutura turística voltada para a população de baixa renda;
o) implantação e operação de sistemas estatísticos de acompanhamento mercadológico.
Montejano (1991, p. 25-26) admite a intervenção do setor público na atividade turística em três níveis: total, parcial ou nulo. No primeiro o Estado exclui a participação de iniciativas privadas, no segundo há um equilíbrio entre os atores públicos e privados quanto às várias ações necessárias ao desenvolvimento turístico e, no terceiro, inexiste a participação do Estado. O mesmo autor enfatiza que a participação do setor público deve se dar no âmbito da ordenação de recursos e da oferta; na implementação de infra-estrutura, no planejamento, na promoção, na gestão, na fiscalização, no controle, em ajuda, em crédito e subvenções. Já Ruschmann (2002, p. 117) atribui aos organismos estatais a responsabilidade do planejamento turístico, argumentando que este possui mais recursos financeiros e técnicos, porém não descarta a participação ampla de outros setores devido ao caráter multidisciplinar da atividade.
A OMT (2003, p, 192) admite que o poder público deva empreender ações que podem ser grupadas nas seguintes categorias: políticas, planejamento, desenvolvimento e regulamentação. Em cada uma destas áreas o poder público pode desempenhar um papel de facilitador ou de desestimulador da atividade turística.
A partir de 1994, com a criação do Plano Nacional de Municipalização do Turismo (PNMT), iniciou-se um processo importante no sentido de descentralizar as ações que envolvem o desenvolvimento do turismo. Conforme este plano os municípios têm o poder para planejar e agir sobre a localidade com a finalidade de desenvolver o turismo. Além disso, o Ministério do Turismo admite a atividade turística dentro de uma gestão pública descentralizada e participativa em nível municipal. (MTUR/PNT, 2005).
Sinteticamente, pode se dizer que as ações do poder público, relacionadas ao turismo, são o planejamento, a regulação e a divulgação do produto turístico. Quanto à regulação, os seguintes tópicos farão parte desta etapa importante: o ordenamento do espaço geográfico onde ocorre a atividade turística, a preservação dos bens (naturais e humanos, tangíveis e intangíveis) e a criação de regulamentos legais. Quanto à divulgação, limita-se a dizer que, independente das iniciativas privadas, cabe ao poder público por meio de seus instrumentos promover a divulgação turística como um serviço prestado para a comunidade.
O raciocínio corrente conduz para a idéia geral de que o poder público deve estar engajado para proporcionar o máximo de bem-estar aos cidadãos. Neste sentido, a administração pública, em relação ao turismo, deve criar e manter as condições necessárias e adequadas para desenvolver turisticamente o seu município.
Sendo a instância executiva mais próxima do povo, a prefeitura torna-se mais sensível aos anseios populares imediatos, de forma que as ações do poder público responderão diretamente às partes interessadas, tornando clara a relevância do município na tarefa executiva. Coelho (1997, p. 47), expõe:
O município é, hoje, uma subdivisão territorial com funções político-administrativas para fins de desempenhar funções próprias de governo e da gestão pública local. Com sua capacidade de autogoverno (como entidade administrativa que se orienta por si mesma respeitando os preceitos constitucionais), o município traz, no contexto geral, uma nova visão que está se inserindo radicalmente no debate municipal, isto é, uma vertente municipalista (movimento que visa ampliar a autonomia municipal através do fortalecimento do poder político da comuna e da revitalização da vida financeira local) que prega necessariamente um novo perfil para o município.
Esse fortalecimento do poder decisório, em termos turísticos, encontra respaldo no PNMT (Plano Nacional de Municipalização do Turismo). Com o PNMT todo o município que desejar ter atividade turística como um vetor de desenvolvimento deverá municipalizá-la, criar um órgão específico para tal – Conselho Municipal de Turismo – com o apoio técnico dos governos estadual e federal. As bases do PNMT são de que o turismo ocorre localmente e que o diferencial é a individualidade do local.
Ruschmann (1999, p. 155) expõe:
Os objetivos das ações governamentais são de fundamental importância se o desenvolvimento turístico é enfocado do ponto de vista econômico, a forma de abordagem será baseada no mecanismo dos preços, numa visão eminentemente comercial. Entretanto, os aspectos sociais, culturais e ambientais da atividade não podem ser neglicenciados e exigem envolvimento direto e estudo por parte das entidades governamentais. Historicamente, o êxito do turismo em uma destinação depende da ação do Estado.
Em raciocínio análogo, Almeida e Blós (1997, p. 48) argumentam acerca da necessidade de investimentos do setor público no suporte infra-estrutural, demonstrando a relevância do poder municipal na concretização dos investimentos turísticos. Desta forma, torna-se desejável que uma localidade ao empreender seu desenvolvimento por meio do turismo, não se limite aos aspectos infra-estruturais, mas também no tocante à conscientização de sua população, sobretudo com respeito aos valores culturais. Assim, uma política turística que preveja a educação do povo para a prática turística, além da dotação de uma infra-estrutura básica, antes de ser um mero instrumento de fomento e regulação, transmuda-se em fator de extrema necessidade.
Na execução turística, a atuação do setor público assume fundamental importância, pois a existência de um plano de desenvolvimento da atividade, onde haja a seleção das prioridades para a sua evolução harmoniosa, determinará as suas dimensões ideais. O planejamento turístico para ter viabilidade, deverá contar com uma equipe de profissionais de várias áreas na sua elaboração ou consecução, ou seja, não será exclusividade do setor público esta tarefa, mas de pessoas e órgãos que tenham interesse na atividade. Igualmente, o planejamento não deverá ser primazia de alguns profissionais, mas de toda uma gama de elementos, de uma equipe de trabalho, que através de seus conhecimentos, melhor estruturem a implantação e o desenvolvimento turístico. O CONTUR (Conselho Municipal de Turismo), talvez seja o organismo que mais se aproxime do ideal para realizar tal tarefa, uma vez que abriga diversos setores e profissionais diretamente ligados e interessados no turismo no município.