Júlio Fernando Seara Sequeira da Mota Lobão
Os testes de causalidade, de aplicação mais recente ao estudo do contágio, atendem à noção de contágio mais lata segundo a qual o fenómeno se traduz, simplesmente, na transmissão internacional de choques (definição 6 da secção 2.1). Nesta acepção, os testes de causalidade abrangem todos os instrumentos estatísticos que permitem captar as relações de interdependência entre os mercados: testes de raíz unitária e de cointegração, testes de causalidade de Granger e testes baseados em modelos de vectores autoregressivos. A principal vantagem dos testes de causalidade, em particular dos testes baseados em modelos VAR, é a de permitirem ter em conta a dimensão temporal no estudo do fenómeno do contágio. De facto, a variável tempo não é considerada nas metodologias de teste abordadas anteriormente o que priva a análise de uma visão dinâmica sobre os efeitos de interacção entre os mercados. Como salientam, por exemplo, De Bandt e Hartmann (2001, pp. 45), «os testes de correlação contemporânea não medem directamente o contágio, fenómeno que, em princípio, requereria o estudo da transmissão dos choques ao longo do tempo». Apesar das vantagens apresentadas pelos testes de causalidade, poucos esforços têm sido aplicados, até muito recentemente, na análise da existência e direcção das causalidades entre os mercados.
Estes testes também têm limitações. É importante sublinhar que a causalidade estabelecida pelos testes estatísticos pode não reflectir, necessariamente, a existência de uma lei económica subjacente. A causalidade econométrica que relaciona as variáveis entre si indica, simplesmente, que o conhecimento dos valores pretéritos de uma das variáveis aumenta a capacidade de previsão das restantes.
Estudos Empíricos
As primeiras aplicações de testes de causalidade, ao estudo de contágio, remontam a Edwards (2000), Nagayasu (2001) e Bazdresch e Werner (2001).
Edwards (2000) utilizou modelos VAR, a decomposição da variância e modelos de causalidade de Granger para estudar a relação entre as taxas de juro do Chile e de outros mercados emergentes entre os anos de 1994 e de 1999. Todos os testes permitem concluir que, a partir de 1997, coincidindo com as principais crises financeiras, se fizeram sentir efeitos significativos de contágio.
Nagayasu (2001), com o recurso a dados diários referentes aos mercados de câmbios e acções da Tailândia e Filipinas, durante os anos de 1996 e de 1998, examinou a relação de causalidade entre esses mercados servindo-se de testes de raíz unitária, testes de cointegração, modelos VAR e testes de causalidade de Granger. O autor demonstrou que os movimentos de preços de alguns sectores dos mercados accionistas da Tailândia (nomeadamente no sector bancário e financeiro) constituíram a causa estatística das variações da divisa das Filipinas.
Bazdresch e Werner (2001) recorreram ao cálculo de modelos VAR e à decomposição da variância para explicar a transmissão de choques de rendibilidade entre os mercados de acções, taxas de câmbio e dívida, provenientes do México, durante as crises da Ásia, Rússia e Brasil. Os resultados evidenciam que o contágio esteve presente durante todos os episódios de crise, em especial nos mercados de acções e de dívida.
Gelos e Sahay (2001), Khalid e Kawai (2001) e Yang (2002) utilizaram modelos VAR e testes de causalidade de Granger para examinar os mercados de acções, de câmbios, dívida e taxas de juro.
Gelos e Sahay (2001) investigaram os efeitos de contágio entre as economias da Europa Central e do Leste Europeu, Rússia e Báltico, a partir do ano de 1993. Concluíram que os comportamentos dos mercados emergentes europeus, no seguimento da crise da Rússia de 1998, foram semelhantes aos que evidenciaram muitos mercados asiáticos e latino-americanos durante a crise Asiática. Os choques provenientes do mercado de acções da Rússia apresentaram-se como a causa estatística dos movimentos nos mercados da República Checa, Hungria e Polónia. No entanto, os autores rejeitaram a hipótese de existência de contágio da República Checa, Ásia e Rússia para os mercados financeiros da União Europeia.
Khalid e Kawai (2001) não encontraram sinais significativos de contágio entre os mercados de acções, de câmbios e taxas de juro de nove países asiáticos durante a crise de 1997.
Yang (2002) aplicou os testes de causalidade a dados diários relativos aos mercados de acções de vários países asiáticos entre os anos de 1990 e de 2000. Os resultados apontaram para a existência generalizada de efeitos de contágio na sequência da crise Asiática de 1997.
Kaminsky e Reinhart (2001) e Sander e Kleimeier (2003) aplicaram testes de causalidade de Granger ao estudo das taxas de juro e câmbio e ao estudo dos spreads da dívida, respectivamente.
Kaminsky e Reinhart (2001) mostram, a partir de dados com frequência diária, que os padrões de causalidade entre os mercados de câmbios e de taxa de juro da Indonésia, Malásia, Filipinas, Coreia e Tailândia se alteraram significativamente no decorrer da crise Asiática no sentido de um aumento da sua interdependência.
Sander e Kleimerer (2003) dedicaram-se ao estudo do comportamento dos mercados de obrigações de onze economias emergentes durante as crises da Ásia e da Rússia. Os resultados corroboram as conclusões de Kaminsky e Reinhart (2001) no que diz respeito à crise da Ásia e indicam que a crise da Rússia provocou alterações significativas nos padrões de causalidade entre os mercados.
Mais recentemente, Diez de los Rios e Herrero (2003), Dreher et al. (2004), Herz e Tong (2004) e Gande e Parsley (2005) recorreram aos testes de causalidade de Granger para estudar os padrões de interdependência entre os mercados de dívida e os mercados cambiais.
Diez de los Rios e Herrero (2003) testaram a existência de contágio nos spreads semanais das obrigações de 11 mercados emergentes, entre Janeiro de 1995 e Novembro de 2001, tendo encontrado sinais significativos de causalidade entre vários países. Em particular, verificou-se que os mercados da Argentina e Brasil se constituíram como causa significativa da evolução do mercado mexicano.
Dreher et al. (2004) utilizaram dados de 80 países não industrializados referentes ao período 1975-2000, enquanto que Herz e Tong (2004) consideraram 74 países em desenvolvimento entre os anos de 1975 e 2001. Em ambos os estudos, os resultados da aplicação de testes de causalidade permitiram concluir que os episódios de crise nos mercados de dívida anteciparam a ocorrência de crises nos mercados cambiais.
Por último, Gande e Parsley (2005) debruçaram-se sobre os padrões de interdependência nos spreads das obrigações diários dos mercados de 34 países entre os anos de 1991 e 2000. Detectaram-se efeitos significativos de contágio que os autores relacionam com os fluxos de capitais existentes entre as economias.