Krongnon Wailamer de Souza Regueira
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Os bancos atuam como intermediários financeiros, captando a poupança dos agentes superavitários e fornecendo crédito para agentes dispostos a consumir ou investir. O spread corresponde à diferença entre a taxa que os bancos cobram pelo financiamento e a taxa com que remuneram os aplicadores. Diversos fatores afetam o spread bancário, como os custos administrativos, o percentual de depósito compulsório exigido pelo Banco Central, os impostos diversos, os juros que remuneram os títulos públicos e, principalmente, a inadimplência. ZAHRT (2003, p.6), descreve como os bancos captam e transferem recursos entre agentes com objetivos diversos:
Underlying insurance and credit markets is the reallocation of risk from individuals/households that do not have the independent means to mitigate negative income shocks to those that do. In a situation of pure market trading individuals with surplus units can make efficient contracts with those with deficit units at terms agreeable to both. Additionally, individuals can lend surplus units to themselves through intertemporal trade, or savings. Banks intermediate between surplus and deficit households to allocate surplus units over a more diverse portfolio, thereby reducing risk and information costs to any one surplus household.
Como um empreendimento que opera em uma economia de mercado, os bancos tentarão maximizar seus lucros dentro das restrições existentes, observados todos os aspectos legais. Alguns recursos bancários têm destinação certa, ainda que não sejam tão rentáveis, como investimento em habitação, financiamento para a agricultura, entre outras determinadas pela regulamentação do Banco Central.
CARVALHO (2005, p.18) rebate a propalada tese de que o sistema bancário brasileiro é ineficiente:
[...] pode-se argumentar que essas instituições [bancos] têm sido altamente eficientes no aproveitamento das oportunidades de lucro que lhes são oferecidas. [...] Na verdade, bancos são empresas e, como tais, são eficientes se capazes de maximizar seus lucros com o menor custo possível.
Ainda segundo este autor, o sistema financeiro brasileiro pode até ser taxado de disfuncional, uma vez que pouco contribui para financiar o investimento, mas jamais poderá ser qualificado de ineficiente.
O sistema financeiro brasileiro oferece um conjunto amplo de produtos e serviços, entretanto o crédito voltado para a produção não é privilegiado nesta oferta. Ademais, o crédito está concentrado nas grandes cidades, não atendendendo aos interesses da sociedade e das regiões menos desenvolvidas (ARBACHE, 2003).
Desta forma, para alcançar o maior lucro possível, os bancos procuram escolher as alternativas mais rentáveis, ponderando-as por um fator de risco. Este fator de risco está diretamente correlacionado com a taxa de juros. No caso dos informais, o banco somente se interessará por conceder crédito se houver um prêmio de risco elevado, o que reduzirá a viabilidade do empreendimento, aumentando as chances de inadimplência. Depreende-se daí que existe um ciclo vicioso, onde maior risco provoca maior taxa de juros o que por sua vez eleva a inadimplência e assim por diante.
Quando o crédito é escasso e existem falhas de mercado, tais como a informação assimétrica surgem outros meios para racioná-lo que não envolvem apenas o aumento da taxa de juros, como sugere ZAHRT (2003, p.6): “As a result credit must be rationed through means other than price, such as through the use of credit and income histories, collateral, and labor market experience”.
Que fatores provocam o aumento da inadimplência? Um estudo de FACHADA et al. (2003, p.13) mostra que quanto maior a possibilidade de recuperar um ativo dado como garantia, menor será a inadimplência e, por conseguinte, a taxa de juros:
Outro parâmetro fundamental para explicar a desproporção dos spreads entre as várias modalidades de crédito diz respeito ao papel das garantias. Tome-se o custo do crédito para a aquisição de veículos comparativamente aos demais contratos de financiamento para pessoas físicas. Embora na prática os tomadores sejam os mesmos e guardem igual risco de crédito, a diferença origina-se no fato de que o veículo financiado constitui em geral a garantia da operação e pode ser executado pelo credor, prerrogativa nem sempre assegurada pelas demais modalidades contratuais.
O Banco Central realizou uma pesquisa em 2001 junto a 93 empresas responsáveis por 93% do total do crédito livre na economia . A pesquisa abordou procedimentos operacionais relativos à concessão de empréstimos, garantias e prazos necessários para a recuperação de créditos não quitados. No caso dos empréstimos concedidos às empresas, o problema mais grave não dizia respeito à existência de garantia, mas sim à sua qualidade e à facilidade de cobrança. A maior parte das operações de crédito corporativo está lastreada em algum tipo de colateral. Por outro lado, os empréstimos para pessoas físicas são contratados, em sua maioria, sem alguma forma de garantia, o que explica o diferencial de taxas de juros. Esta diferença fica marcante quando se observam os juros cobrados em operações de cheque especial e cartão de crédito no Brasil, que pelo fato de não estarem cobertas por nenhuma garantia, apresentam spreads exorbitantes. Como foi citado anteriormente, o financiamento para compra de veículos é cem por cento coberto por garantia fiduciária, o que reduz o risco e, por conseguinte, o spread. Como destacam FACHADA et al. (2003, p.13), “a garantia fiduciária se configura como a forma mais eficiente de oferecer colateral, pois representa na prática a transferência da propriedade do bem financiado para o credor”.
ARBACHE (2007, p.37) relaciona o fato de as pessoas mais pobres aceitarem pagar juros elevados com a maior produtividade marginal do capital dos investimentos que estas realizam:
As pessoas pobres aceitam e podem pagar juros de mercado para ter acesso ao crédito. Para essas pessoas, o acesso oportuno e ágil ao crédito é mais relevante que a taxa de juros cobrada. A causa para tal é que a produtividade marginal do capital é extremamente alta nos micronegócios e muito forte a pressão por necessidades emergenciais e cíclicas da vida das famílias de baixa renda.
Como sugere SANTOS (2007, p.2): “Para o agente financeiro, por outro lado, a execução de garantias no caso de inadimplência, ocorre por meio de um processo moroso, de altos custos e com pequenas chances de sucesso”. Fornecer o imóvel como garantia, sem que haja uma agilidade maior do judiciário, pouco beneficiará as pessoas mais pobres que desejam buscar financiamento, como deseja De Soto. A incerteza jurídica reduz a probabilidade de recebimento do crédito por parte do agente financeiro. Adiciona-se a isso o fato de a justiça funcionar com morosidade em países como o Brasil. Esta mesma pesquisa do BACEN mostra que apesar da garantia fiduciária, os bancos brasileiros têm que enfrentar um longo processo para recuperar judicialmente os créditos não pagos há mais de sessenta dias, como exposto no quadro a seguir:
Ainda que a instituição financeira disponha de alguma forma de garantia, o tempo médio para resolver o processo nunca é inferior a um ano e meio e, no caso de uso de aval e fiança, pode superar os três anos.
A justiça brasileira, além da lentidão destacada por autores como PINHEIRO e GIAMBIAGI (2006), impõe custos elevados para a parte que deseja ser ressarcida de um prejuízo provocado por um não pagamento. Com isto, além do prazo elevado, o fornecedor do financiamento terá gastos adicionais consideráveis para reaver a dívida. O mesmo estudo do Banco Central analisou os diversos gastos para recuperar dívidas no Brasil. Como alguns gastos representam um custo fixo, que independe do valor da dívida, os agentes financeiros terminam por restringir o empréstimo de valores reduzidos, pois o custo incorrido para reavê-los acaba sendo muito elevado em termos proporcionais ao valor emprestado. Este cálculo leva em consideração não apenas estimativas para as despesas processuais diretas (custas, advogados, oficial de justiça e perícia, cartórios, entre outros), mas também a taxa de desconto intertemporal aplicada sobre o capital e arbitrada em 20% ao ano, segundo os autores da pesquisa.
No quadro que se segue é possível identificar os custos incorridos pelos credores para cobrar os valores devidos:
Observa-se que para valores até mil reais, os custos de recuperação, caso sejam percorridas todas as etapas, praticamente igualam o montante emprestado inicialmente. Em situações como esta, o empréstimo de pequenos valores demonstra-se inviável. Para um valor de 50 mil reais, transpostas todas as etapas, o percentual recuperado corresponderia a 24,1% da dívida inicial. Analisando a forma mais rápida e menos onerosa de recuperação do crédito, como a cobrança extrajudicial simples, a taxa de recuperação varia entre 56,8% a 83%. Os custos para cobrar a dívida nesta modalidade envolvem correio, protesto, negativação e comissão para o cobrador especializado (FACHADA et al., 2003). Desta maneira, mesmo as formas mais simples de cobrança envolvem valores elevados, o que restringe a opção de recorrer ao judiciário para recuperação de créditos financeiros.
Devido aos altos custos de recuperação judicial e a discrepância na avaliação do ativo dado como garantia, os bancos terminam por exigir colaterais muito acima do valor do empréstimo, o que dificulta ainda mais a obtenção de financiamento por parte dos informais e pequenos empresários legalizados (SANTOS, 2007).
Estudos econométricos apontam para a importância do papel da renda e da disponibilidade de informações sobre os demandantes de crédito, além de variáveis relacionadas ao emprego, sexo e papel no domicílio, como mostram KUMAR et al. (2004, p.16):
Riqueza e garantias também foram importantes na determinação do acesso ao crédito, já que ajudam no reembolso do empréstimo. Essa constatação pode também indicar que, na ausência de mecanismos de cumprimento adequados para reivindicações financeiras, os fatores apontados acima poderiam servir como indicadores de confiabilidade financeira. Portanto, as implicações são de que políticas que podem diretamente expandir informações sobre clientes expandiriam o acesso, como o compartilhamento de informações “positivas” [grifo do autor] em algumas formas de registros de crédito. Da mesma forma, procedimentos que agilizam o uso de garantias, crédito garantido, falência ou reembolso [grifo do autor] podem também ajudar a expandir o acesso.
No Brasil é comum a prática de exigência de comprovação de residência para a abertura de uma conta bancária ou o acesso a alguma forma de crédito, mesmo que seja para uma simples conta em uma loja. Normalmente são exigidos comprovantes de pagamento de serviços públicos, como contas de energia elétrica, água ou telefone. O grande problema é que muitos dos indivíduos que moram em áreas carentes não possuem acesso a esses serviços. Por outro lado, algumas pessoas fazem ligações clandestinas nas redes de água e energia, furtando um serviço público e deixando de dispor de um comprovante de residência no local. O fato de não poderem comprovar a moradia diminui o acesso ao crédito por parte das pessoas que residem em locais com estas características .
Alguns autores, como o próprio DE SOTO (1987, 2001), defendem a idéia de que mesmo não possuindo um histórico de utilização do sistema bancário, o pagamento de tarifas de serviços públicos por um período de tempo gera uma reputação positiva, que pode funcionar como um bom indicador de que a pessoa cumpre com suas obrigações financeiras. KUMAR et al. (2004) ressaltam que poderiam ser ofertados pacotes básicos de serviços bancários para as pessoas mais pobres, por meio de critérios especiais de exigência de documentação para pessoas de baixa renda, bem como com a criação de produtos focados neste mesmo público. Tais medidas garantiriam maior acesso ao mercado de crédito.
Uma vez concedidos os títulos de propriedade, seus detentores passam a assumir obrigações com despesas que antes não ocorriam quando seus imóveis não eram regularizados. Além dos títulos, as pessoas de baixa renda necessitam ter acesso ao mercado de trabalho para assegurar uma fonte de renda e poder manter a propriedade. KRUECKEBERG (2004, p.3) enumera três situações possíveis de ocorrer quando impostos sobre a propriedade e taxas referents a serviços municipais não são pagos: “(1) No taxes and fees are paid, leaving the ‘owner’ with an encumbered title; (2) The services are discontinued, which is tantamount to eviction; or (3) the title is sold, and the ‘owner’ is no an owner.” Os detentores de títulos de propriedade têm que se adequar às leis para que seus ativos possam vir a ser usados como colateral.
Nas condições apresentadas anteriormente, e considerando que o governo absorve grande parte do crédito livre emitindo títulos que remuneram com juros elevados e baixíssimo risco, poucas opções restarão para o setor privado, sobretudo quando se trata de credores com ativos de baixa qualidade para servirem de colaterais. Neste contexto, parece claro que os bancos cobrarão taxas mais elevadas do que a taxa básica de juros da economia, bem como procurarão devedores que possam oferecer garantias sólidas, o que não é o caso dos proprietários de residências informais.
Como afirma DE SOTO (2001), a elevada informalidade provoca uma diminuição no valor de mercado dos ativos dos pobres. Para NERI (2003), além do problema da quantidade e qualidade dos ativos os mais pobres em geral possuem uma renda baixa e instável, o que dificulta o acesso ao crédito. Esta instabilidade no fluxo de renda destas pessoas ocasiona um aumento da inadimplência.
Este racionamento de crédito, natural em países com características similares às do Brasil, dificultará o acesso ao financiamento bancário devido à rejeição dos ativos que os informais têm a oferecer e ao maior grau de risco envolvido na operação. O simples fato de a residência não ser regularizada dificulta a sua localização, o que em alguns países pode dificultar as formas mais simples de cobrança de uma dívida, que seria a notificação por meio do correio .
Mesmo o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) não apresenta uma proposta clara para incluir os informais no mercado de crédito. Como mostra SANTOS (2007), existem três tipos de pequenos empresários: micro e pequenas empresas formais consolidadas, com histórico de relacionamento com os bancos e sem dificuldades de acesso ao crédito, empresas pequenas e médias que não conseguem atender às exigências de garantias tradicionais dos bancos e para as quais a oferta de crédito não se ajusta e, por último, atividades informais que existem como estratégia de sobrevivência em decorrência da escassez de emprego ou da reduzida empregabilidade e das limitações dos seguros e políticas sociais de sustentação aos desempregados.
Como os bancos não estão dispostos a correr riscos desta natureza, SANTOS (2007, p.4) aponta outros caminhos para os informais:
Neste segmento [empresários informais], o acesso ao crédito depende de instituições especializadas em microfinanças que operem com tecnologia de crédito baseado em mecanismos de garantias e de incentivos apropriados à informalidade e aos pequenos volumes das operações.
O governo Lula lançou um programa de microcrédito, com o objetivo de fornecer financiamento para pequenos empreendedores e que foi denominado de Banco Popular. Como mostra reportagem da D`AMORIM (2006), a inadimplência do programa atingiu 30%. Em 2004 o prejuízo foi de 25 milhões de reais e em 2005 subiu para 62 milhões de reais. Ainda de acordo com esta mesma reportagem, uma corrente do governo defendia que o Banco Popular fosse incorporado pelo Banco do Brasil, contudo outra corrente considerava que se tal proposta fosse levada adiante, isso representaria um fracasso para o programa de microcrédito. No primeiro semestre de 2007 o prejuízo foi de 10,8 milhões de reais e a inadimplência se situava em 25% do total dos empréstimos (CRUZ, 2007). Uma outra proposta seria mudar o foco de atuação do Banco Popular, priorizando o microcrédito produtivo ao invés de atender somente informais que estavam excluídos do sistema de crédito, pois mantida a idéia original, o banco não se sustentaria.