Câmbios reais ajustados por variações de produtividade
Tesis doctorales de Economía

POLÍTICA CAMBIAL E MACROECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO

Paulo Gala

 

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Câmbios reais ajustados por variações de produtividade

A metodologia de Easterly (2001) para a construção da série de câmbios reais não leva em conta variações na renda per capita em relação aos EUA. Ao extrapolar para frente e para trás o cálculo do câmbio real simplesmente levando em consideração a variação do câmbio nominal e preços internos e externos, Easterly (2001) ignora o efeito de variações de renda per capita. Um país que passou por consideráveis ganhos de renda per capita em relação aos EUA deveria, em tese, apresentar um câmbio real mais apreciado. Raciocinando novamente em termos de escassez relativa de fatores, um país mais produtivo em comercializáveis em relação a não comercializáveis e, portanto, com uma renda per capita PPP maior, deveria apresentar salários reais maiores, tudo mais constante. Salário s reais mais elevados se refletiria m em preços de não comercializáveis mais altos, elevando o câmbio real medido em PPP, como argumenta Dollar (1992). Países com renda per capita maior apresentariam câmbios reais mais apreciados, novamente o efeito Harrod-Balassa-Samuelson.

A evolução dos câmbios reais apresentada por Easterly (2001) só faria sentido se em todo o período analisado a renda per capita desses países tivesse permanecido constante em relação à americana nos níveis da média 1976-1985. Uma possível maneira de se checar essa hipótese seria comp arar a evolução da renda per capita entre os diversos países e os EUA. Países com aumento de proporção da renda per capita americana ao longo do período estariam passando, supostamente, por aumentos de produtividade. A tabela 3 do apêndice mostra a evolução dessa proporção para alguns países da amostra de Easterly. Alguns países como Brasil e Chile apresentam pequena variação em termos de renda relativa per capita real (medida em termos de PPP) em relação aos EUA, significando, portanto, pequenos desvios de produtividade. Para países com poucos desvios de renda per capita, a série construída por Easterly (2001) não apresenta grandes problemas. Para países como Taiwan e Coréia do Sul com considerável aumento de renda per capita real (medida em termos de PPP) e, portanto, produtividade no período, o índice de Easterly (2001) pode ser bastante distorcido. Por exemplo, a Coréia do Sul multiplicou sua renda per capita real relativa aos EUA por 5,32 e Taiwan por 4,7 no período.

A tabela 4 do apêndice apresenta esses dados de variação de renda per capita em índices tomando por base a média do período 76-85. A partir dessa base, pode-se avaliar a variação de produtividade entre cada país e os EUA medida pela “proxy” de renda per capita real relativa. Assim, por exemplo, o índice de Taiwan em 1999 de 207,9 mostra que a produtividade de Taiwan aumentou em 107,9% em relação a produtividade média do período 1976-1985; passou de 0,2875 para 0,5978, ou seja, aumentou de 28,75% da renda americana na média entre 1976-1985 para 59,78% em 1999. A série mostra o grande aumento da renda per capita dos asiáticos em relação ao período 76-85: Tailândia 67,2%, Malásia 35%, Coréia 125,2%, e Indonésia 23,9%. Os latino-americanos, com a exceção do Chile, perderam renda per capita real em relação aos EUA: o Brasil teve queda de 20%, o México 12,1% e a Argentina 21,2%.

Com esse cálculo é possível criar uma série de correção ou distorção cambial nos moldes do que faz Dollar (1992). Aumentos de renda per capita real podem ser tomados como uma “proxy” para aumentos de produtividade e salários reais e, como vimos, deveriam resultar, pelo menos em tese, em apreciações cambiais. Para se medir esse efeito, pode-se calcular quanto deveria ter sido a valorização (desvalorização) cambial para cada pa ís decorrente do aumento (redução) de sua renda per capita em relação aos EUA. Por exemplo, se a produtividade de Taiwan aumentou 107.9% em relação à sua posição relativa aos EUA em 1976-85 entre o período médio 76-85 e 1999, seu câmbio deveria ter se apreciado em alguma magnitude, refletindo o aumento relativo de salários ocorrido em Taiwan no período. Em outras palavras, o câmbio real de Taiwan deveria ter se aprec iado como reflexo do aumento relativo de seus preços de não comercializáveis.

No caso brasileiro, para 1999, o câmbio deveria ter se depreciado em 20% em relação ao período 1976-1985 para compensar a perda de produtividade da economia brasileira em relação à economia americana se assumíssemos uma transmissão de 100% de variação da renda per capita para o câmbio real. Seguindo essa linha de raciocínio, podemos então construir um série de distorção cambial medida como variação do câmbio real observado/variação da renda per capita relativa aos EUA. A tabela 5 do apêndice apresenta a construção desse índice para o Brasil. Por exemplo, em 1999 o índice de câmbio real deveria estar em 80 se ajustado pela produtividade relativa Brasil/Estados Unidos e o número encontrado por Easterly (2001) foi de 83,77. O índice estava 16,23% pontos abaixo do câmbio neutro e sua variação em relação à média 76-85 foi de (83,77/97)*100=86,3, uma queda de 13,7 pontos percentuais. Comparando-se essa posição com a variação de renda per capita chega-se ao resultado (86,3/80)=1,079, ou seja uma distorção de 7,9% acima da média 1976-1985. Como a média 1976-1985 estava 3% abaixo do equilíbrio de PPP segundo os cálculos de Dollar (1992), deve-se aplicar mais uma correção para encontrar a distorção final do câmbio em 1999 em termos de câmbio neutro, (1,0795*97)=104,70, uma distorção no sentido de apreciação de 4,71%. A tabela 6 do apêndice apresenta essas contas para toda a série de 10 países.

No caso de Taiwan, os dados de variação de renda per capita acima apontam para um câmbio ajustado por variações de produtividade 107,9% mais apreciado em 1999 do que na média 1976-1985. Easterly (2001) encontra um câmbio real calculado apenas tomando em consideração variações de preços e câmbio nominal de 117,96, ou seja, uma apreciação de 17,96% em relação ao ano de câmbio neutro e de 1,68% em relação a média de 1976-1985. Comparando-se o índice de Easterly de 101,68 com a variação de renda per capita relativa aos EUA de 207,9 chega-se ao resultado (101,68/207,9)=0,489. Haveria uma distorção no câmbio de Taiwan para esse ano que o colocaria numa posição de 48,9% do valor calculado a partir da variação de renda per capita relativa em relação a média 1976-1985. Como a média de Dollar (1992) para esse período apontava para uma pequena sobrevalorização do câmbio de Taiwan, podemos multiplicá-la por 0,489 para encontrar a distorção do câmbio de Taiwan, (0,489*116)=56,73. O câmbio estaria depreciado em relação a sua posição de equilíbrio calculada por Dollar (1992) na diferença (100-56,73)=43,27%.

No caso chileno, em 1979, o índice de variação da renda per capita relativa aponta para um câmbio de 104,8, ou seja 4,8% acima da média 1976-85 e o câmbio calculado por Easterly (2001) aponta para um valor de 105,27. Fazendo-se os mesmos cálculos podemos encontrar a distorção do câmbio chileno em relação a média 76-85, (105,27/104,8)=1,004. Nesse ano a moeda chilena estaria, portanto, praticamente em posição equivalente a média do período 76-85. Como para o Chile a média 76-85 de 100 equivale ao equilíbrio na metodologia de Dollar (1992), o câmbio também estava no seu equilíbrio em 1979, não havendo distorção.

O índice de distorção aqui proposto nada mais é do que o valor encontrado por Easterly (2001), deflacionado por um diferencial de produtividade (para índices com construções semelhantes ver Dollar 1992, Ong 1997 e Benaroya e Janci 1999). Uma qualificação é importante, entretanto. Para a construção desse índice, assume-se que 100% da variação de produtividade relativa aos Estados Unidos é transmitida para o câmbio real. Se um país tinha 20% da renda per capita americana em t e passa a 40% em t + s , seu câmbio real deveria se apreciar em 100% em relação ao dólar. Apesar da hipótese se aplicar à comparação de todos os países, o que em tese não deveria viesar os resultados, ela torna o índice bastante sensível a variações de renda per capita. Países com grandes aumentos de PIB per capita deveriam apresentar grandes apreciações cambiais, caso contrário o índice apontará para um câmbio real bastante depreciado como nos casos de Taiwan e Coréia do Sul.

A segunda série de gráficos do apêndice apresenta a comparação entre os índices calculados por Easterly (2001) representados por RER e os índices construídos de correção ou distorção cambial representados por RER * para alguns países da Ásia e América Latina. A terceira série de gráficos apresenta a combinação de pares ordenados de variação da renda relativa em relação aos EUA e variação do câmbio real no período 1960-1999 para alguns países da amostra. Os pontos à direita da linha de 45 graus estariam numa área de subvalorização e à esquerda numa área de sobrevalorização. O gráfico dá uma noção de variação do câmbio real em relação à variação da produtividade.


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