POLÍTICA CAMBIAL E MACROECONOMIA DO DESENVOLVIMENTO
Paulo Gala
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Existe hoje uma considerável literatura empírica que trata da relação entre
poupança interna e externa. Vários autores procuraram medir a sensibilidade da poupança interna
em relação à utilização de poupança externa. O principal foco dos trabalhos é empírico e as
atenções se voltam, em geral, para os possíveis determinantes da poupança interna. A maioria
dos estudos aponta para o resultado de substituição de poupança interna pela
externa, no que parece constituir quase um consenso na literatura. Curiosamente, a questão
cambial é deixada de lado. A maioria dos trabalhos nessa área não se preocupa com o papel
do câmbio na determinação do nível de poupança interna ou externa, nem apresenta
uma teoria explicativa da taxa de substituição de poupança externa por interna. Limitam-se
a apresentar os resultados de suas pesquisas, que são significativos.
Um dos pioneiros estudos econométricos com o objetivo de medir os possíveis determinantes da poupança interna foi Fry (1978). Apesar de não se preocupar primordialmente com a relação entre poupança interna e externa, o autor fornece
resultados interessantes sobre o grau de substituição entre as duas em suas análises
empíricas. Formula a seguinte especificação econométrica: Sd /Y: poupança doméstica / PIB, g : taxa de crescimento do PIB, y : log natural
do PIB per capita medido dólares de 1970, r : taxa real de juros, Sf / Y : poupança
externa / PIB
Os resultados são obtidos com regressões de mínimos quadrados com dummies para
os diversos países. Os dados abordam 7 países asiáticos no período 1962-1972: Índia
(19621972), Coréia do Sul (1962-1972), Burma (1962-1969), Malásia (1963-1972), Filipinas (1962-1972), Cingapura (1965-1972) e Taiwan (1962-1972). Os resultados apontam
para um valor de aproximadamente -0,5 para a substituição de poupança interna pela
externa nos vários tipos de especificações do modelo. Ou seja, 50% da utilização de poupança
externa seria neutralizada por uma queda da poupança interna. O grau de substituição é
considerável para essa amostra de países no período em questão.
A partir de especificação semelhante, Edwards (1995) faz uma ampla análise sobre
determinantes da poupança privada doméstica. Além de discutir alguns aspectos
teóricos acerca das diversas explicações para distintos níveis de poupança doméstica,
apresenta uma extensa análise empírica. Faz estimações com dados em painel de 1970 a 1992 para
25 países em desenvolvimento e 11 desenvolvidos. Utiliza como variáveis
independentes e, portanto, possíveis candidatos na determinação da taxa de poupança privada
doméstica, uma extensa lista: taxa de dependência demográfica (população com menos de 15
anos + população com mais de 65 anos dividida pela população entre 15 e 65 anos),
população urbana, poupança pública, taxas de crescimento, GDP per capita, base monetária/GDP,
crédito para o setor privado, gastos do governo em previdência social, taxa de
juros real, poupança externa, inflação, distribuição de renda, estabilidade política. Nos
diversos modelos estimados encontra novamente um valor negativo em torno de 0,5 para o
coeficiente da poupança externa (mínimo 0,38, máximo 0,625), indicando
substancial substituição entre poupança interna privada e poupança externa.
Seguindo a literatura sobre o tema, Schmidt-Hebbelet al (1992) estudam o
comportamento da poupança doméstica a partir da perspectiva das “households”. Baseiam sua
análise empírica na poupança das famílias sobre a renda disponível ao invés de se
concentrarem na poupança agregada. Dentre as variáveis independentes para a estimação,
selecionam: renda per capita das famílias em níveis, taxas e tendência, taxas reais de juros,
taxas de inflação e poupança externa, entre outras. Os cálculos são feitos para 10 economias em desenvolvimento entre os anos de 1970 e 1985 com dados em painel utilizando-se
um modelo de efeitos fixos e aleatórios. Os coeficientes associados à poupança externa apontam para valores em torno de -0,2 , indicando algum grau de
substituição entre poupança externa e interna. Os autores chamam a atenção para esse fato,
“foreign savings, which acts as an external liquidity constraint, boosts private
consumption, as shown by its significantly negative influence on savings” (Schmidt-Hebbel et al
(1992), pg.543).
Ainda nesse registro, Reinhert e Talvi (1998) fazem uma comparação entre Ásia e
América Latina. Argumentam que os altos níveis de poupança na Ásia estão mais
relacionados a tendências históricas do que ao comportamento dos fluxos de capital. Encontram
resultados empíricos que se alinham com Schmidt-Hebbel (1992) e Edwards (1995) de que há
razoável grau de susbstituição entres as duas. A utilização de poupança externa
está negativamente correlacionada ao nível de poupança doméstica para ambas as
regiões. Utilizando uma especificação próxima de Fry (1978), onde a poupança interna é
definida como função da poupança externa e um vetor de outros determinantes, Uthoff e
Titelman (1998) também encontram coeficientes negativos que gravitam em torno do valor de
0,5. Os autores formulam a seguinte especificação econométrica:
S /Y = a0 +a1Ytk +a 2 DYTtk +a 3CRECtk + a4 INFLtk + a5 RDDtk + a6 FSTtk + a7
DFSTtk + a8 IRtk + e
tk : país k no período t, S / Y : poupança interna, YT : tendência do PIB per
capita, DYT : desvios da tendência do PIB per capita, CREC : taxa de crescimento do PIB per
capita, INFL: taxa de inflação, RDD : taxa de dependência demográfica, FST : tendência
da poupança externa, DFST : desvio de tendência da poupança externa, IR : taxa de
juros real.
As estimativas cobrem 15 países latino-americanos e do Caribe entre 1972 e 1993,
usando dados de “cross-section” e “time series” num total de 330 observações. As
estimações foram feitas utilizando-se os métodos de efeitos fixos e aleatórios com e sem
instrumentos. Os resultados em relação à poupança externa apontam para um coeficiente negativo
de -0,47 , altamente significante. Calculam também os impactos da poupança externa
sobre a interna a partir de uma separação entre tendência e desvio de tendência da
poupança externa. Novamente os resultados apontam para uma relação negativa em torno de
0,48, com valores entre –0,31 e –0,46 para o impacto do aumento de tendência e entre
–0,48 e
-0,49 para desvios de tendência.
Os autores chamam a atenção para o caso mexicano. Entre 1983-90 a 1992-94, a
utilização de poupança externa cresceu no México em 7,4 pontos percentuais de PIB, mas a
taxa de investimento cresceu em apenas 4,4 pontos percentuais. Grande parte dos recursos
externos foi utilizado para financiar o aumento do consumo e a poupança doméstica caiu.
Para a média da América Latina, a poupança externa aumentou em 2 pontos percentuais
entre 1983-90 e 1992-1994, enquanto a taxa de investimento aumentou 0,3% pontos
percentuais de PIB e a poupança interna caiu 1,7 pontos percentuais (Uthoff e Titelman, pg.36).
Cardoso e Helwege (1999, pg.13) também destacam a redução da poupança interna no
Chile, México e Brasil decorrentes das sobrevalorizações dos anos 90 e início
dos 80.
Apesar de não utilizar diretamente a taxa de câmbio nas medições econométricas,
os trabalhos acima fornecem evidências empíricas favoráveis, mesmo que de forma
indireta, para os argumentos teóricos apresentados neste trabalho. Assumindo-se que
situações de déficits em contas correntes são acompanhadas por apreciação cambial, podemos
concluir que em muitos casos a utilização de poupança externa está aliada à redução de
poupança interna e aumento de consumo, especialmente de bens importados.
Evidências empíricas da substituição da poupança interna pela externa