Noémi Marujo (CV)
1-INTRODUÇÃO
O turismo é considerado como um dos pilares mais importantes para a sustentabilidade social e económica de muitas regiões ou localidades. O seu impacto é forte em vários segmentos da sociedade, e consiste numa ótima fonte de rendimento e desenvolvimento socioeconómico para qualquer região ou país do mundo. A importância económica da atividade turística e a natureza sociocultural do fenómeno turístico são evidências incontestáveis nas sociedades onde o turismo se desenvolve.
A atividade turística, na Ilha da Madeira, é considerada por muitos como a tábua de salvação para o desenvolvimento da região. De facto o turismo, graças à sua importância económica e social, é um importante pilar para a economia e desenvolvimento da região, dado que constitui um mercado de excelência para os produtos locais. Torna-se, assim, o sector com mais peso na economia regional, arrastando consigo uma quantidade de atividades, quer comerciais, quer de serviços bastante relevantes.
A Ilha da Madeira (Figura I), localizada no Oceano Atlântico, contém uma orografia bastante acidentada, sendo os pontos mais altos o Pico Ruivo e o Pico do Areeiro que constituem lugares bastante atrativos para muitos turistas. É constituída por dez concelhos, e todos eles possuem recursos turísticos ligados ao património natural e cultural: Santa Cruz, Funchal, Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Ponta do Sol, Calheta, Porto Moniz, São Vicente, Santana e Machico.
A região, conhecida pelo seu clima ameno, é constituída por variadíssimos microclimas que derivam, essencialmente, da altitude e da exposição. A Ilha possui uma grande e rara variedade de fauna e flora indígena. O aspeto geológico e a sua localização geográfica contribuem para um clima agradável, o que faz com que esta ilha seja procurada como destino turístico durante todo o ano. O turismo na Madeira teve o seu início no século XV. Porém, a atividade turística só assumiu uma maior consistência nos finais do século XVIII e princípios do século XIX.
2- A MADEIRA E O TURISMO
O crescimento e desenvolvimento do turismo na Ilha da Madeira estiveram sempre ligados ao clima e à beleza da paisagem. Segundo Silva (1994), não é possível falar de turismo na Madeira antes do séc. XVII. O autor refere que antes do referido século “as pessoas deslocavam-se, admiravam novas terras, mas o seu fito era a exploração ou o comércio. Também não se fez sentir aqui o turismo aristocrático, o grand tour, a viagem nobre e seu tutor…” (Silva, 1994: 179). Contudo, há autores que afirmam que o turismo na Ilha da Madeira nasceu por volta do séc. XV. Ou seja, “percorrendo a história da Ilha, desde a sua descoberta até aos nossos dias, verificámos que o fenómeno do turismo, em termos de duração não é de origem recente. Ele nasce no séc. XV, introduzindo-se numa determinação estrutural pelos séculos posteriores, passando necessariamente por movimentos conjunturais que foram moldando a sua vocação primitiva” (Silva, 1985: 6). A autora, na obra “A Madeira e o turismo: pequeno esboço histórico”, refere duas épocas para o início do turismo madeirense: a “colonial” (séc. XV-XVIII) e a “terapêutica” (séc. XIX e início do séc. XX). Cada uma das épocas está ligada a conjunturas externas distintas. Todavia, as duas assentam na dependência da navegação atlântica, na atração exercida pela beleza paradisíaca da Ilha e no clima ameno (Silva, 1985).
Com a abertura das navegações e rotas oceânicas dos séculos XV ao XVIII, a Madeira surge como um suporte privilegiado de apoio ao tráfego comercial para a exploração de novos continentes, nomeadamente a América, Ásia e África. Destas viagens, surgiram descrições registando aspetos da sua geologia, fauna, flora, antropologia, clima e beleza paisagística, atribuindo-lhe slogans (‘A Ilha dos Amores’, ‘O Recanto do Paraíso’, ‘A Pérola do Atlântico’) que constituíam um excelente veículo propagandístico. Tal período foi considerado “…o aspecto turístico do colonialismo” (Silva, 1985: 6).
A propaganda turística atraiu curiosos de diferentes áreas, nomeadamente da medicina. Assim, em 1751, Thomas Hemberden observou, na “Philiosophal Transaction” de Londres, as qualidades do clima madeirense e os seus efeitos terapêuticos. Deste modo, foi dado o primeiro passo para que a classe médica começasse a recomendar a estada no Funchal como a mais propícia para determinados tratamentos (Silva, 1985). “O clima ameno da Madeira, manifestado pelas temperaturas mais ou menos constantes entre o dia e a noite e ainda a existência de fracas amplitudes térmicas diurnas e anuais, permitiram que a Ilha fosse recomendada” (Baptista, 2005: 36).A partir desta época, a Madeira passou a ser divulgada como uma espécie de clínica de cura para doenças pulmonares nos guias médicos internacionais do séc. XIX que, também, funcionavam como um meio de promoção turística da ilha. De acordo com Silva (1985), este período é testemunhado não só pelos livros escritos - “On Consumption Medical Observation” de Fothergill (1775); “Guide to Madeira with an account of the climate” de Adams (1801); “Observations on the natural history, climate and diseases of Madeira during a period of sixteen years” de William Gouklay (1811) - mas também pelas inúmeras visitas de intelectuais estrangeiros e nacionais (Júlio Diniz, Antero de Quental, Olavo Bilac, etc.), e ainda pelas personalidades ilustres no campo político (Príncipe Alexandre dos Países Baixos e a Princesa Amélia do Brasil). Tratava-se da chamada “…era do turismo terapêutico que depende também da conjuntura europeia de inícios dos séc. XIX, em que as guerras liberais europeias bloquearam as vias de acesso às estâncias de cura do sul da Itália e da França, desviando para a Madeira o fluxo marítimo destinado a tais áreas, integrando ingleses, americanos, alemães e russos” (Silva, 1985: 7). O clima, um elemento imaterial, tornava-se assim o principal elemento promotor das potencialidades turísticas da Ilha (Gama, 2011).
Durante a primeira metade do séc. XIX, a divulgação da Ilha passou a ser feita em cartas e guias destinados a serem consultados pelos doentes. Deste modo, a fama do chamado “turismo terapêutico” na região difundiu-se por toda a Europa. Segundo Câmara (2002), a maior parte dessas cartas e guias foram escritas sem objetivos comerciais embora tivesse existido, num ou noutro caso, intenções claras de publicidade deliberada. A autora considera que nesses guias e cartas misturavam-se recordações de estadas felizes marcadas pela calma e o sossego de uma terra, onde o tempo parecia ter parado com as preocupações de transmitir ao potencial visitante da Ilha um conjunto de informações. Ou seja, os guias 1 continham as informações indispensáveis (breves apontamentos sobre a história, os costumes, a fauna e a flora) para o acolhimento no Funchal e a viagem no interior da Ilha (Vieira, 1999).
Com os guias turísticos a região assistiu, na primeira metade do séc. XIX, ao lançamento de uma imagem com potencial para a sua futura vocação turística (Câmara, 2002). Tal imagem identificava-se essencialmente com o clima da Ilha recomendado para fins terapêuticos. Essa recomendação constituiu a base da primeira fase da publicidade feita à Ilha. De acordo com a autora, os mecanismos de divulgação funcionavam em círculo fechado e o número de pessoas que afluíram com intenções de recuperação à Madeira foi muito reduzido. No entanto, e segundo a autora, a partir de meados do séc. XIX, as próprias ações de divulgação destinadas aos doentes discutiam divertimento e saúde, deixando antever que se entrara num processo de transição. “A partir dos anos 80, a Madeira foi perdendo a conotação de estância de saúde e ganhou a de Ilha de férias” (Câmara, 2002: 177). Assim desde 1890, a Ilha era cada vez mais utilizada e apreciada por visitantes saudáveis e homens de negócios ativos. As referências dos guias turísticos projetavam a imagem de que, no final do séc. XIX e início do séc. XX, a Ilha da Madeira mantinha comunicações regulares e frequentes com diversas cidades inglesas, alemãs e do mediterrâneo. Por outro lado, o aumento da oferta de centros de turismo fez com que os guias turísticos passassem a realçar as vantagens comparativas da região face a outros destinos concorrentes (Câmara, 2002).
Até 1930, o fluxo turístico era constituído por aristocratas, homens da alta finança e figuras políticas de destaque (Príncipe de Gales e Churchill), onde incluía também resíduos da corrente turística terapêutica (Silva, 1985). Assim sendo, e conforme refere a autora, inaugurou-se um período de alteração que coincidia com a depressão económica universalizada que culminou na Segunda Guerra Mundial, passando a Ilha a ser utilizada como uma área de passagem pelos transatlânticos e visitada principalmente por ingleses e alemães abastados que fugiam da violência mundial procurando, desta forma, áreas geográficas menos conflituosas.
Em 1930, e devido à crescente importância do turismo, foi criada a ‘Comissão de Turismo’ com o objetivo de estudar as medidas necessárias para o desenvolvimento e propaganda do turismo. A ‘Comissão de Turismo’ expôs, em 1931, na grande Feira de Leipzig um stand retratando os ‘encantos da ilha’, a qual passou a ser visitada por jornalistas estrangeiros e nacionais que remetiam artigos publicitários para os seus jornais e revistas, tais como: o “Tatler” (1931); o “Time” (1933); o “Daily Mail” (1933); o “Daily Telegraph” (1939) e o “The National Geographic Magazine” (1939). Saliente-se ainda que, em 1934, a publicidade estendeu-se também aos canais de televisão alemã e inglesa. A conjugação destes dados permitiu concluir que a propaganda individual do hotel x ou y perdia terreno a favor da propaganda coletiva passando, desta forma, a Ilha a ser retratada como um todo e como estância de verão. Aliás, como instância turística de todo o ano, dado que a estação de Inverno nunca perdeu o seu potencial atrativo (Silva, 1985).
Silva (1985) sublinha que a atividade turística dos anos 30 do século passado levou, a 5 de Setembro de 1936, sob o Decreto-Lei 26980, a um esforço de modernização e de estruturação com a criação da Delegação do Turismo da Madeira. A política turística local passou, assim, a ser dirigida por esta delegação, que iniciou uma política turística mais racional, voltada para o exterior (propaganda e comunicações) e interior (montagem de infraestruturas hoteleiras, comunicações internas e recintos desportivos e de jogo). Uma vez instituída a publicidade, a Ilha da Madeira passou a figurar entre os centros potencialmente mais vocacionados para o turismo como uma estância turística durante todo o ano (Silva, 1985). A partir desta época desembarcaram no Funchal elementos dos grupos socioprofissionais mais destacados dos países exportadores de turistas, o que levou à chamada “…era do turismo desportivo, intelectual, congressional, universitário, académico, político (nacional e estrangeiro) que escolhe a Madeira para realizar excursões, congressos, jogos e, paralelamente, o turismo de lazer, enquadrando-se neste grupo os reformados e aqueles cujas disponibilidades económicas e sociais o permitem (…) Quer um quer outro procuram o exótico, o diferente” (Silva, 1985:12). A autora sublinha que até à Segunda Guerra Mundial, a Ilha da Madeira foi visitada por inúmeros transatlânticos, quer em viagens regulares de retorno da África do Sul e das Repúblicas Americanas, quer em simples cruzeiros turísticos, o que favorecia um grande fluxo de turistas à região.
A queda do sector turístico na região coincidiu com o eclodir da II Guerra Mundial, o que levou ao encerramento de muitos hotéis. Após a II Guerra Mundial, segundo Silva (1985), os transatlânticos (que escalavam regularmente o Porto do Funchal) começaram a procurar outros portos mais bem equipados e situados na área geográfica pela qual navegavam (Tenerife e Las Palmas). Todavia com o aparecimento das comunicações aéreas, sobretudo com a inauguração do aeroporto do Funchal em 1964, a Madeira assistiu a uma nova época do turismo. Isto é através dos voos domésticos, internacionais e charters, a região passou a receber turistas de diferentes países. Desta forma, o turismo madeirense conhece um novo ciclo caracterizado por uma elevada afluência de turistas, e pelo surgimento de novas infraestruturas hoteleiras (Baptista, 2005). Associado a este novo ciclo está também a criação da Secretaria Regional do Turismo, em 1978. Segundo o autor, as infraestruturas públicas (rodoviárias, aeroportuárias e portuárias) e a estabilidade política e social vivida na região constituíram os vetores fundamentais para o crescimento do sector turístico.
No que concerne às infraestruturas hoteleiras existiam apenas, em 1840, dois hotéis: ‘The London Hotel’ e o ‘Yate’s Hotel Familiy’ (Silva, 1985; Vieira, 1999). Com o aumento dos visitantes o número das unidades hoteleiras aumentou, em 1889, para dez: ‘Edinburg Hotel’, ‘Santa Clara Hotel’, ‘Milles Hotel’, ‘German Hotel’, ‘Boa Vista Hotel’, ‘Cardwell Hotel’, ‘Victoria Hotel’, ‘Hotel Central’, ‘Hotel Funchal’ e ‘Hotel Lisbonense’. Em 1891, e devido ao crescimento do turismo, surge mais dois hotéis: ‘Carmo Hotel’ e ‘Reid´s New Hotel’ (Silva, 1985). Pode-se verificar que as designações dos hotéis estavam associadas a lugares ou a nomes familiares.
A projeção turística nacional e internacional da Ilha da Madeira levou a um aumento no desenvolvimento de infraestruturas de alojamento na região. Na atualidade, o destino possui empreendimentos turísticos para acolher turistas durante todo o ano (Tabela I). Sublinhe-se, no entanto, que a maior concentração das unidades de alojamento encontra-se na cidade do Funchal. Refira-se ainda que dentro do alojamento, a região possui as tradicionais quintas que procuram preservar algum espólio da história da Madeira. A maioria delas é rodeada por grandes jardins.
Tabela I: Unidades de Alojamento
Categoria dos Estabelecimentos |
2009 |
2010 |
2011 |
2012 |
Hotéis |
60 |
58 |
60 |
61 |
Hotéis-Apartamento |
35 |
35 |
36 |
35 |
Apartamentos Turísticos |
31 |
31 |
29 |
10 |
Aldeamentos Turísticos |
1 |
1 |
1 |
1 |
Pousadas |
1 |
1 |
1 |
1 |
Estalagens |
23 |
23 |
21 |
18 |
Pensões |
50 |
48 |
47 |
35 |
Total |
201 |
197 |
195 |
161 |
Fonte: Estatísticas do Turismo da RAM-DRE/Estatísticas do Turismo do INE (2013)
No entanto, e através da Tabela (I), é possível verificar que existiu uma diminuição de algumas unidades de alojamento especialmente na categoria dos apartamentos turísticos e nas pensões. Por outro lado, há um aumento na categoria dos hotéis. Refira-se que a maior parte da concentração hoteleira situa-se na cidade do Funchal.
2.1-A OFERTA TURÍSTICA
A oferta turística de um país, região ou localidade engloba tudo aquilo que o destino tem para oferecer aos turistas. O conceito de oferta turística reveste-se de contornos relativamente indefinidos, uma vez que são muitos os elementos que fazem ou podem fazer parte dela. Assim, a oferta turística incorpora todo o tipo de elementos capazes de levar os consumidores a visitarem um determinado lugar. Nesses elementos destacam-se o transporte, as atrações e os equipamentos e serviços de apoio ao visitante. Logo, ela pode ser constituída por todos aqueles elementos que contribuem para a satisfação das necessidades de ordem psíquica, física e cultural que estão na origem das motivações dos turistas (Baptista, 1990).
Para Andrade (2002), a oferta turística é sensivelmente dependente da concorrência de mercado e da vontade do cliente que vê o turismo como um produto substituível e mesmo dispensável. O autor sublinha, ainda, que o sucesso cultural e comercial da oferta turística depende da qualidade e do grau de união e de colaboração de uma série de fatores relacionados com o funcionamento dos bens e serviços, da sua qualificação e dos seus preços. Portanto, a oferta turística apresenta um leque de opções que favorecem o desenvolvimento e a valorização de algumas ofertas em detrimento de outras. Assim, “os turistas, na função de consumidores, emitem juízos determinantes a respeito da qualidade dos bens que adquirem. No entanto, avaliam as ofertas turísticas (natural e artificial) separando-as e atribuindo-lhes valores expressos em escalas diferentes, porque a primeira é essencialmente imutável ou estática como atrativo específico, e a segunda é de natureza dinâmica e capaz de realizar ações de adequação sempre que necessárias ou oportunas” (Andrade, 2002:111).
De um modo genérico, a oferta turística pode ser definida como “o conjunto de todas as facilidades, bens e serviços adquiridos ou utilizados pelos visitantes bem como todos aqueles que foram criados com o fim de satisfazer as suas necessidades e postos à sua disposição e ainda os elementos naturais ou culturais que concorrem para a sua deslocação” (Cunha, 2001:174). Ou seja, a oferta turística é composta por um conjunto de fatores que formam o produto turístico 2 definido, como “...uma mistura de tudo quanto uma pessoa pode consumir, utilizar, experimentar, observar e apreciar durante uma viagem ou uma estada...” (Baptista, 1990:122). Ela pode ainda ser vista como oferta de produto turístico global e como oferta de produtos específicos. “A oferta de produto global compreende toda a cadeia de valor e outros aspetos ambientais do destino turístico, numa perspetiva de integração e de interação conducente à estruturação de uma imagem ou de um conceito sobre a estada, o destino e a região na sua totalidade. A oferta de produtos específicos resulta de processos produtivos das organizações, que traduzem experiências associadas a partes do sistema, a casos e situações que apenas dizem respeito a parcelas da cadeia de valor” (Henriques, 2003: 162).
Em suma, a oferta turística de um destino compreende essencialmente os seguintes componentes: Atrativos naturais e culturais; serviços turísticos (privados e públicos); infraestruturas. Esta diversidade de componentes, que integram a oferta turística, depende do seu grau de integração, do desenvolvimento alcançado e das potencialidades oferecidas pelo destino. Quanto aos atrativos turísticos, poder-se-á afirmar que eles constituem a componente fundamental da oferta e a base do desenvolvimento turístico de uma localidade, uma vez que eles determinam a atração da região e definem a suas potencialidades turísticas. “...estão relacionados com as motivações de viagens dos turistas e a avaliação que os mesmos fazem desses elementos” (Ignarra, 2001: 48).
A Madeira, para além do alojamento em que alguns constituem de facto fortes atrações turísticas, possui uma oferta cultural e paisagística bastante rica. Os principais elementos atrativos da Ilha são o clima, a paisagem e a cultura.
2.1.1- O CLIMA E O TURISMO
O clima aparece, muitas vezes, como um argumento principal para o desenvolvimento de uma série de atividades turísticas. Praticamente todas as modalidades turísticas se encontram influenciadas pelo tempo e pelo clima. Enquanto algumas delas se mostram sensíveis ao tempo meteorológico, outras são totalmente dependentes do clima. Numa perspetiva a curto prazo, é o tempo meteorológico que determina o momento adequado para realizar uma determinada prática turística ou programar toda uma série de atividades (Martín, 1999). Para este autor, “o clima é um importante recurso turístico natural já que é um elemento que, por intermédio da atividade humana e dos meios com que conta, torna possível a atividade turística e satisfaz as necessidades da procura” (Martín, 1999:25).
A presença de um bom clima pode constituir uma das maiores atrações turísticas de uma região. No caso da Madeira, ele é um recurso turístico bastante importante. Muitos dos turistas, nomeadamente da Alemanha e Reino Unido, deslocam-se à ilha por causa do seu clima ameno (Marujo, 2004). Portanto, o clima é considerado um fator fundamental nas definições estruturais e ambientais de qualquer destino, uma vez que “…possui influência preponderante na sazonalidade, na continuidade e na própria regularidade das correntes turísticas que se direcionam ou se dirigem ao núcleo recetivo” (Andrade, 2002:103). Assim sendo, pode-se afirmar que os fatores climáticos favorecem o turismo na região. Ou seja, o clima (estável) permite aos promotores do turismo o planeamento e gestão de diversos programas associados ao lazer. Por outro lado o clima, de acordo com as expetativas dos turistas, pode permitir o encontro destes com a natureza da Ilha.
2.1.2- A PAISAGEM E O TURISMO
O turismo e a paisagem são dois elementos que estão intimamente associados e, particularmente, ancorados no território. No turismo a paisagem, para além de constituir um recurso imprescindível para o desenvolvimento da atividade, é um elemento essencial para a promoção e captação de muitos turistas (Marujo e Santos, 2012).
A singularidade geográfica da Ilha da Madeira, associada ao seu testemunho histórico e cultural, é beneficiada pela sua envolvente paisagística. É na exuberância da paisagem que se encontra um dos maiores atrativos turísticos da Ilha da Madeira. A sua luxuriante vegetação continua a fascinar todos aqueles que mantêm um forte relacionamento com a natureza. Por isso, a paisagem é um recurso de grande valor na consolidação da oferta turística da Ilha, e constitui também uma das principais motivações dos turistas para visitarem a região. Sublinhe-se que são as singularidades de um lugar que atraem o ‘olhar’ do turista e, portanto, a autêntica experiência em turismo consiste naquela em que o turista direciona o seu ‘olhar’ para os diferentes cenários culturais da paisagem que visita (Marujo e Santos, 2012).
Nos atrativos da paisagem, pode-se destacar a Laurissilva e as Levadas 3 (Figura II). A Laurissilva (floresta indígena) da região, distinguida pela UNESCO como Património Natural Mundial (1999), funciona como um dos atributos promocionais do destino. Por outro lado as levadas, consideradas como um monumento vivo da cultural madeirense (Fernandes, 2012), “são as mais belas peças do património cultural da Ilha da Madeira e a expressão viva de como foi possível a intervenção humana sem criar ruturas significativas no funcionamento dos ecossistemas” (Quintal, 2011: 137).
Refira-se que a origem das levadas madeirenses remonta aos primeiros povoadores, que atraídos pela necessidade de cultivo, decidiram aproveitar as águas abundantes paras as culturas agrícolas e engenhos açucareiros (Fernandes, 2010). Hoje, e de acordo com esta autora, “as levadas são um espaço de consumo e fruição cultural pelos turistas” (Fernandes, 2010: 530) que as percorrem para experienciarem o património cultural e natural associado a elas. “As levadas desvendam uma Madeira majestosa que escapa ao turista apressado e ao residente acomodado ao automóvel. Através delas é possível descobrir recantos de beleza indescritível e estudar uma flora rica em espécies únicas no mundo” (Quintal, 2011: 137). De facto, os percursos pelas levadas da Ilha da Madeira proporcionam aos turistas a descoberta de uma flora com espécies únicas no mundo.
2.1.3- A CULTURA E O TURISMO
A cultura, na maioria dos casos, constitui um trunfo importante para o desenvolvimento do turismo. A cultura, num sentido mais amplo, é o quadro onde todo o turismo tem lugar. Num sentido mais restrito, é algo que pode ser considerado como uma atração para os turistas como, por exemplo, os museus, a música, o património, a religião (Macleod e Carrier, 2010) e os eventos culturais.
O turismo sempre teve um aspeto cultural. Aliás, sem cultura não há turismo. O turismo cultural valoriza a identidade de um território. Ele permite o acesso à história do património cultural, aos hábitos e costumes de uma comunidade. Em muitos casos, as diversidades culturais concretizadas através do património cultural material e imaterial, constituem o grande atrativo para o desenvolvimento do turismo regional ou local.
São inúmeras as motivações que levam o turista a praticar um turismo cultural na Madeira. Pode ser pela gastronomia típica madeirense, pelo artesanato, pelas festas, pelas visitas ao património arquitetónico e aos museus ou pelas manifestações culturais (danças e cantares típicos). De facto, o turismo cultural da região compreende uma infinidade de aspetos que podem ser explorados para a atração dos visitantes.
A música e as danças típicas são elementos que são bastante valorizados pelos turistas. Elas são uma forma de mostrar aquilo que os antepassados faziam, trajavam, dançavam e cantavam. “A caracterização da comunidade recetora, com a apresentação de manifestações folclóricas tem essa propriedade quase mágica de fazer o turista se encontrar com a sua cultura, perceber com mais clareza a linha que a separa das outras, encontrando o seu lugar no espaço global” (Dias e Aguiar, 2002:143).
A gastronomia típica é, também, bastante valorizada pelo turista. Daí, que a região tirou proveito da sua tradição e expressão cultural traduzidas na culinária para criar roteiros gastronómicos em diversas localidades. As festas gastronómicas que se realizam em alguns concelhos da região não só dão a conhecer a alimentação típica local, como também permitem a interação e o aumento da perceção do turista em relação a esses concelhos.
Outro elemento importante é o artesanato. “O visitante deseja comprar lembranças típicas dos locais que ele visita” (Ignarra 2001:120). Mas, também, mostra interesse em conhecer o fabrico desse artesanato. Para satisfazer esta necessidade dos turistas, a região possui alguns centros onde o visitante pode apreciar a produção do artesanato como, por exemplo, o vime e o bordado.
Os eventos culturais que existem na Madeira são também uma manifestação cultural que atrai muitos turistas. Hoje, as cidades, vilas e aldeias desenvolvem cada vez mais eventos culturais para celebrar a sua história e cultura porque há um sentimento generalizado de que, por um lado, os eventos possuem uma maior capacidade para oferecer espetáculos e atmosferas e, deste modo, atrair mais turistas, e por outro “satisfazem a necessidade de co-participação e a sensação de estar lá” (Richards e Palmer, 2010: 19). Os eventos, para além de constituírem uma atração turística, funcionam como elementos culturais que não só identificam e diferenciam o destino face a outros concorrentes mas, também, fortalecem a identidade cultural da região: Festa do Fim-de-Ano, Festa da Flor, Festival do Atlântico e Carnaval (Marujo, 2012). Para além destes, existem outros ligados às épocas agrícolas: Festa do Vinho, Festa da Cereja, Festa da Castanha, Festa do Pêro, Festa da Cana-de-Açúcar, etc.
A cultura e a história de um povo também estão, em muitos casos, retratadas nos museus ou em núcleos museológicos. A Madeira oferece alguns equipamentos culturais nesta área que podem funcionar como uma atração turística para os turistas: Museu do Brinquedo, Museu Etnográfico da Madeira, Museu da Baleia, Museu Quinta das Cruzes, Story Centre Museum, Museu de Electricidade – Casa da Luz, Museu do Institiuto do Bordado e Tapeçaria da Madeira, Núcleo Museológico da Madeira Wine, Núcleo Museológico do Museu Militar do Palácio de São Lourenço, etc. Todos os museus refletem a identidade cultural da Ilha. No entanto, necessitam de ser adaptados às novas exigências dos turistas.
2.2- A PROCURA TURÍSTICA
O conceito da procura turística varia de acordo com as perspetivas dos autores sobre o tema. Enquanto, por exemplo, os psicólogos veem a procura do ponto de vista da motivação comportamental, os economistas consideram a procura como sendo “a relação da quantidade de qualquer produto ou serviço que as pessoas queiram e possam comprar por cada preço específico, num conjunto de preços possíveis, durante um dado período de tempo” (Cooper et al, 2003: 56).
Segundo Baptista (1990), a procura turística não representa um grupo homogéneo de indivíduos que procuram viajar estimulados por idênticas motivações. Ou seja, a procura é “constituída por um conjunto de variáveis, por vezes conflituosas, como sejam desejos, necessidades, gostos, simpatias e antipatias” (Baptista, 1990: 69). Nesses desejos ou necessidades há, certamente, fatores que podem influenciar o turista a escolher determinados lugares como, por exemplo, as características atraentes do destino, que são detetadas pelas informações obtidas sobre o local, como o clima, a cultura e as imagens mentais que os indivíduos produzem a partir dessas informações. Outros fatores estão mais relacionados com cada indivíduo e com o ambiente em que vivem (Dias e Aguiar, 2002). Assim sendo, a procura turística apresenta-se dependente da atuação de fatores de natureza diversa como, por exemplo, os aspetos económicos, políticos, sociopsicológicos, tecnológicos, culturais e ambientais.
Já foi referido que até 1930, o fluxo turístico da Ilha era essencialmente constituído por aristocratas, Indivíduos da classe alta e figuras políticas de destaque. Com o desenvolvimento dos meios de transportes e comunicações, a região começou a receber turistas de todo o mundo. De acordo com a Tabela (II) é possível verificar que os dois principais mercados emissores internacionais que mais visitam a Ilha continuam a ser a Alemanha e o Reino Unido.
Tabela II – Hóspedes nos Estabelecimentos Hoteleiros por Países de Residência Habitual
Países |
Ano 2012 |
Alemanha |
191147 |
Portugal |
188554 |
Reino Unido |
172751 |
França |
118320 |
Espanha |
39409 |
Países Baixos |
37417 |
Finlândia |
25147 |
Bélgica |
22320 |
Dinamarca |
20748 |
Áustria |
18412 |
Suécia |
17071 |
Noruega |
16103 |
Itália |
12512 |
Outros Países |
114846 |
Total |
994757 |
Fonte: Estatísticas do Turismo da RAM-DRE/Estatísticas do Turismo do INE (2013)
3-CONCLUSÃO
A atividade turística coloca-se, muitas vezes, como a única possibilidade de desenvolvimento económico para uma região ou localidade, uma vez que cria emprego e lucro em diversos sectores, nomeadamente na hotelaria, na restauração, nas lojas comerciais, nas agências de viagens, etc. “De facto o turismo, graças à sua importância económica e sociocultural, é um importante pilar para a economia e desenvolvimento de muitas regiões, dado que arrasta consigo um conjunto de atividades bastante relevantes e, por isso, os governos regionais e locais interessados em promover o desenvolvimento local e regional veem no turismo um forte aliado na procura desse desenvolvimento” (Marujo e Carvalho, 2010: 148).
Na Ilha da Madeira o turismo é visto como um motor estratégico para o desenvolvimento económico da região. Por outro lado, ele contribui para a melhoria da qualidade de vida da população madeirense. De facto, à medida que a economia da Madeira cresce e se desenvolve, há uma tendência para um provável aumento nos níveis de vida da população.
Para além de contribuir para a economia da região, o turismo também é um excelente veículo da cultura regional. Em muitos casos, é através do turismo que a Ilha da Madeira valoriza os seus hábitos e costumes. Aliás, muitas das manifestações culturais (danças folclóricas, eventos culturais, etc.) são ressuscitadas através do turismo.
A singularidade geográfica que caracteriza a Ilha confere-lhe o status de um lugar diferente, um paraíso exótico e único que apela aos cinco sentidos dos turistas. A paisagem e o clima são os dois principais atributos das campanhas promocionais. No entanto, aconselha-se aos promotores do turismo a valorizarem mais os aspetos culturais da Ilha nas suas promoções porque o turista que visita a Madeira quer levar memórias ligadas à paisagem, mas também à cultura.
4-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Edição Autor: Funchal.
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CÂMARA, B. (2002): “A Economia da Madeira (1850-1914)”. Imprensa de Ciências Sociais: Lisboa.
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2 Saliente-se, que o produto turístico não é igual em todos os lugares ou regiões. No entanto, deve contar com certas características mais ou menos comuns que permitam satisfazer as necessidades dos turistas no seu destino.
3 Canais de irrigação que percorrem mais de 2150 km da ilha e que constituem um dos elementos mais ricos da identidade histórica da região.
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