Maria de Lourdes de Azevedo Barbosa (CV), Salomão Alencar de Farias (CV) y Anderson Gomes de Souza (CV)
A noção de experiência se transformou em um elemento chave para a compreensão do comportamento do consumidor e o fundamento principal de uma nova perspectiva para o marketing, representada pelo marketing experiencial. Tomando como referência que uma parcela significativa dos consumidores de hoje procura viver imersões em experiências que vão além de simples encontros com serviços e/ou produtos, identificar os atributos e o simbolismo desses eventos para esse indivíduo na experiência relacionada aos serviços constitui um relevante objeto de estudo teórico e empírico em marketing.
Para entender o que o consumidor vivencia a partir do que lhe é ofertado por uma determinada empresa, é necessário conhecer suas expectativas nos momentos anteriores ao consumo, os significados relativos às experiências vividas durante o consumo do serviço, e as lembranças que o consumidor guarda da sua experiência. A compreensão possibilitada por esse conhecimento permite, entre outras coisas, identificar os ícones que o consumidor deseja conservar na memória, considerando que a experiência de compra será vivenciada, algumas vezes, como um evento comum (utilitário) e, em outras, como um evento extraordinário (hedônico). O reconhecimento destes aspectos leva, neste artigo, à proposição de uma abordagem diferenciada, que distingue os atos de consumo de acordo com o tipo de experiência vivida pelos consumidores.
O setor de serviços tem sido marcado por uma série de modificações, sendo as empresas levadas, cada vez mais, a repensar a relação com os consumidores e a forma de vender seus serviços. Os ambientes das lojas tendem a não mais serem organizados para terem um caráter exclusivamente utilitário, pois a racionalidade do consumidor vem passando por um processo de transformação (FILSER, 2002). Esse contexto de mudanças leva os gestores das empresas a utilizarem novos meios para atrair o consumidor, estimulá-los a comprar e torná-los fiéis. Entretanto, o mesmo conjunto de transformações na racionalidade do consumidor tornou os clientes sujeitos que mesclam estilos e elementos ao seu próprio sabor, para afirmar a sua existência, sua diferença, sua personalidade, sua autenticidade, com toda a liberdade. Isso torna o seu comportamento mais difícil de prever e, portanto, de influenciar (HETZEL, 1995).
Na abordagem da presente investigação, as experiências de consumo de serviços podem ser conceitualmente ordenadas (sob o ponto de vista do consumidor) num contínuo que vai da experiência ordinária, num extremo, à experiência extraordinária, em outro. Na medida em que possam influenciar o processo, as empresas tentarão fazer com que os consumidores dos seus serviços considerem o ato de consumo como experiências satisfatórias – ou mais do que isto – pois, desta forma, suas vendas serão maiores, como maior será, também, a probabilidade de fazer os clientes retornarem e se tornarem fiéis. Assim, é preciso não só entender o processo genérico que envolve uma experiência, mas também o que leva a experiência a ser considerada como ordinária ou como extraordinária pelo consumidor. Uma experiência ordinária ocorre quando a ela estão associadas, na mente do consumidor, características meramente utilitárias, rotineiras (GUPTA; VAJIC, 2000), enquanto a experiência extraordinária caracteriza-se por conter um alto nível de intensidade emocional, sendo identificada como um evento fora do comum, altamente prazeroso (ARNOULD; PRICE, 1993).
A análise da experiência de serviços feita neste estudo parte do pressuposto de que, como regra, nem o prestador do serviço, nem o consumidor são capazes de antecipar com certeza se irão oferecer (no caso da empresa) ou vivenciar (no caso do consumidor) uma experiência extraordinária a qual, pode ou não ocorrer. Ao negar a possibilidade de que experiências extraordinárias sejam deliberadamente “produzidas” pelo prestador de serviços, enfatiza-se a participação do consumidor na produção de tais experiências, embora ele seja influenciado pelos aspectos objetivos do sistema de oferta que lhe é proposto pela empresa prestadora de serviços. Em certa medida, esta abordagem constitui uma nova interpretação para o marketing experiencial (CARÚ; COVA, 2003).
O sistema de oferta proposto ao consumidor não se limita ao serviço em si, mas inclui todo o ambiente - o lugar, a arquitetura, o cenário, os outros consumidores e os prestadores diretos dos serviços. Tudo isso concorre para criar uma atmosfera que poderá provocar reações positivas ou negativas e, em alguns casos, memoráveis (AUGÉ, 1995), mas, em última análise, o consumidor deve ser considerado como uma unidade de produção da experiência, já que é ele quem irá interpretar os serviços que o mercado lhe propõe.
É nesse aspecto que reside o interesse da abordagem experiencial do consumo adotada nesta pesquisa. Além de a empresa tentar gerenciar o processo de decisão do consumidor (ou seja, influenciar suas escolhas: a transação) e seu contexto (vale dizer, influenciar o ambiente de escolha: a relação), ela procura, também, atuar sobre a experiência do consumidor em si, sobre a produção do valor de consumo.
Partindo-se do pressuposto que a experiência está relacionada a avaliação subjetiva do consumidor, pode-se considerar que mesmo experiências de consumo que são vistas como “ordinárias” pelas empresas que as produzem, podem ser consideradas “extraordinárias” pelos consumidores. De forma reversa, as experiências que se pretendem “extraordinárias” quando vistas sob o ângulo das empresas que as ofertam, podem não ser avaliadas como tais pelos consumidores. Portanto, contrariamente ao que afirmam Pine e Gilmore (1999) não é qualquer experiência que pode ser interpretada como extraordinária, mas somente aquelas que o consumidor considera como tal.
Para a verificação desse fenômeno, de acordo com Holbrook (2000), as empresas ofertantes de serviços de alta complexidade são as mais adequadas para estudos que envolvem as experiências de consumo (HOLBROOK, 2000). Alguns ambientes de serviços são considerados complexos por apresentarem grande quantidade e formas variadas de elementos que estão relacionadas tanto às suas características físicas (o cenário de serviço) quanto de relações inter-pessoais (gestores, funcionários e clientes) (ZEITHALM; BITNER, 2003, pg. 235). O restaurante foi o tipo de empresa escolhida como foco de observação deste estudo, por oferecer um serviço de alta complexidade, de acordo com as características citadas por Zeithalm e Bitner (2003, pg. 235) e porque algumas dentre essas empresas se consideram como ofertantes de experiências diferenciadas ou extraordinárias.
Para uma experiência ser considerada como algo memorável, é preciso não somente estimular esse sentimento durante a visita a uma determinada empresa, mas cultivar uma lembrança na mente do consumidor, viabilizando o conjunto de ações suscetíveis de fazê-lo retornar e viver uma nova experiência (DUPUIS; SAVREUX, 2004). A satisfação em termos utilitários e cognitivos está na base desse sentimento, mas a felicidade, o re-encantamento e o inesperado são componentes afetivos fortes (OLIVER; RUST; VARKI, 1997).
O que se buscou foi entender melhor a natureza das experiências para esclarecer quais as diferenças existentes entre a satisfação (experiência ordinária) e o encantamento (algo memorável ou experiência extraordinária), a partir da percepção do consumidor. Esse conhecimento foi obtido verificando-se qual o significado do consumo de serviços de restaurante a partir da natureza (ordinária/extraordinária) da experiência vivida por esse sujeito.
É possível definir o contexto da experiência como o conjunto de princípios da organização que fornece sentido a uma situação. De um lado, a empresa representa um quadro de emissão de estímulos suscetíveis de serem diferenciados pelos consumidores a partir de um continuum que pode ir do hiper-estímulo (ex. um restaurante de luxo) ao hipo-estímulo (ex. um fast-food). De outro, cada produtor de serviços constrói um contexto específico de experiências, em que os consumidores formam um quadro de interpretação a partir do qual surgem as intenções de participação.
Dentro do consumo de qualquer produto e/ou serviço existe um componente hedônico da experiência e um componente funcional ou utilitário. A estratégia do produtor pode procurar enriquecer o posicionamento do serviço pelo desenvolvimento de um componente mais experiencial ou mais utilitário.
Holbrook (2000) coloca que principalmente aqueles produtos/serviços em que o componente da experiência é dominante, pode-se articular a tomada de decisão do consumidor em torno do imaginário, das emoções e do hedonismo, destacando quatro suportes da produção de experiência, que são: experiência, divertimento, exibicionismo e evangelismo, os quais possibilitam analisar a prática da experiência proporcionada pelos produtores e distribuidores de serviços de restaurantes, no caso específico desta pesquisa, conforme explicitado a seguir: a) A “experiência”, que está associada ao consumo da refeição como fonte de evasão da vida quotidiana, das emoções e do prazer; b) O “divertimento” relacionado ao restaurante em si, que é representado pelo ambiente, seus freqüentadores e que contribui para transformar a experiência de uma refeição em uma espécie de espetáculo encenado pela empresa.; c) O “exibicionismo” é um componente menos intuitivo, em que o produto (a refeição ou o prato) aparece prioritariamente pela sua realidade física, considera-se também como uma exposição do consumidor que se mostra aos outros indivíduos na sua relação com o produto; e d) o “evangelismo”, em que o restaurante exerce a função de exemplo e, nesse sentido, mostra como a refeição pode ser fabricada e como o seu conteúdo estritamente funcional (ex. rapidez e simplicidade na elaboração/preparação) pode ser enriquecido por uma função hedonista (ex. a decoração do prato e a arrumação da mesa), ou ser relacionado a uma esfera de consumo de forte conteúdo social (ex. a oferta de um bolo para a comemoração de um aniversário).
Evocar a produção de experiência do consumo pelo marketing parece contraditório com a definição de experiência de consumo proposta por Holbrook e Hirschman (p. 131, 1982). Os referidos autores definem o consumo experiencial como um “estado subjetivo de consciência acompanhado de uma variedade de significações simbólicas, de respostas hedônicas e de critérios estéticos”. Seguindo a perspectiva desses autores e os critérios de inspiração fenomenológica que guiam este trabalho, considera-se que é o consumidor a unidade de produção de experiência, que o faz por meio do tratamento e interpretação dos produtos e serviços que o mercado lhe propõe.
O que se verifica, entretanto, é que o processo de fabricação e de comercialização dos bens e serviços ainda está intrinsecamente ligado às normas racionalizantes do projeto moderno de produção, que se concentra no desempenho funcional e mensurável do bem e do serviço. Esta oferta apresenta-se desprovida de todas as características de surpresa, do ponto de vista do consumidor, que se encontra fechado na “prisão de ferro da racionalidade” prevista por Max Weber. O encanto do consumo parece exterminado, mas enquanto motor da economia, as instituições encarregadas da produção e da comercialização dos bens e serviços devem encontrar caminhos para promover o re-encantamento (RITZER, 1996, 1999).
A perspectiva da compreensão da experiência, neste estudo, é analisada sob o ponto de vista da estrutura da oferta e por meio do conceito de consumo, pois apesar de existir no processo de consumo de todos os produtos/serviços componentes experienciais e não experienciais, a estratégia do produtor deve ter como objetivo o enriquecimento do componente experiencial. Esse objetivo atinge facilmente os serviços em que o componente experiencial é dominante (ex. um resort; ou um restaurante à la carte). Entretanto, para os serviços onde o componente funcional é dominante, a exigência de uma iniciativa mais inovadora é bem maior (ex. um hotel econômico; ou um fast food).
A partir do trabalho de Kotler (1973) - que lançou a proposta da atmosfera da loja, significando tudo o que contribui para criar um ambiente (decoração, mobília, musica, aromas...) e exercer influencia sobre o comportamento do consumidor - o espaço de venda como lugar de experiência tem sido trabalhado no sentido de criar uma atmosfera propicia para a permanência em uma loja e por seu papel como estimulador do ato da compra. Posteriormente, Bitner (1992), também demonstrou que o ambiente tem influencia sobre o pessoal de vendas e, consequentemente, sobre as interações com os consumidores. A criação de uma atmosfera é mais sutil que a simples adição de componentes diferenciados (musica, aroma, iluminação, dentre outros), pois deve ser pensada de forma global e traduzir o posicionamento da empresa. Concretamente, é o conjunto dos componentes do mix que deve ser teatralizado para ser re-encantado (DUPUIS; SAVREUX, 2004), pois a força do marketing experiencial reside em parte na capacidade de transformar a experiência vivida em realidade, o que não significa somente criá-la durante uma visita, mas cultivá-la, posteriormente, na lembrança do consumidor. De acordo com a experiência proposta, o consumidor pode ou não escolher se apropriar dela e, se for o caso, a experiência pode, então, ser observada por meio do uso e da apropriação do espaço comercial onde o serviço é prestado.
A partir da consideração de que uma experiência de serviço é o resultado da co-produção entre o provedor e o consumidor, tanto a oferta quanto o indivíduo são vitais para que a experiência possa ocorrer. Nessa relação, é preciso levar em conta que os produtores de serviços precisam criar condições – a partir do conjunto de sua oferta - para que os consumidores possam avaliar suas experiências – a partir do consumo - e classificá-las como ordinárias ou extraordinárias. A oferta de um serviço utilitário em relação a uma ocasião definida como especial pode ser distinta em pontos fundamentais, como por exemplo, no valor econômico e na resposta do consumidor. Aspectos característicos da oferta de experiências ordinárias e de experiências extraordinárias em serviços de restaurantes foram propostos por Hanefors e Mossberg (2003), estabelecendo-se os pontos que serviram como base de análise para o presente estudo, conforme segue.
Os serviços são caracterizados pela natureza da oferta que é intangível. A função principal é a prestação de serviços, que pode assumir um caráter padronizado (padrão de alta qualidade e customização em massa) ou personalizado (serviços voltados para as necessidades individuais do cliente) (HOLBROOK, 2000). Tanto para os serviços baseados nos sistemas de padronização como para aqueles fundamentados na personalização, os consumidores sabem exatamente quanto irão pagar e, frequentemente, o que vão receber, baseados em experiências prévias (ARNOULD; PRICE, 1993).
Os fatores da demanda surgem de forma diferente para serviços considerados como experiências ordinárias ou extraordinárias. Na experiência considerada ordinária o consumidor recebe benefícios como, rapidez, conveniência e preço. Já uma experiência extraordinária é um tipo de sensação que deve ser realizada em estágios e que devem ser realimentadas constantemente (HANEFORS; MOSSBERG, 2003). Assim, identifica-se uma clara distinção na natureza da ocasião que se mostra entre o quotidiano e o fora do quotidiano, assim como aquilo que é ordinário ou não. Essa divisão é baseada em noções temporais e espaciais.
Em relação ao motivo principal que leva uma pessoa a se utilizar de um determinado serviço é possível identificar dois aspectos importantes. O primeiro se refere à necessidade de uma pausa relativa ao dia a dia, em que se busca algo diferente do que é encontrado em casa. E o segundo, é que existem motivos intelectuais, sociais e componentes estimulantes ou de retração, em que todos podem ser vistos como um continuum entre o alto e o baixo nível de necessidade.
As emoções estão estreitamente relacionadas às experiências de consumo de serviços e afetam as percepções do consumidor em relação aquilo que lhe está sendo ofertado. Algumas circunstâncias podem afetar o humor das pessoas, como a companhia (CSIKSZENTMIHALYI, 1990), ou algum incidente que porventura possa ocorrer (BITNER, 1990).
Quanto ao envolvimento, refere-se à percepção de alguém sobre a importância, ou relevância pessoal, ou ainda interesse e prazer evocados em uma situação (GABBOTT; HOGG, 1998). Tanto os fatores cognitivos quanto o envolvimento afetivo podem ser vistos como elementos chave para chegar a uma experiência extraordinária. Csikszentmihalyi (1997) assegura que em uma experiência a atenção da pessoa é completamente absorvida pela atividade em si e pelo seu objetivo, ou seja, há um completo envolvimento do consumidor durante uma determinada atividade. A experiência como resultado da participação do consumidor em uma série de atividades dentro de um contexto social, precisa ser conceituada e estudada em relação a essas atividades e a situação na qual ela ocorre. O contexto sendo representado pelo espaço físico, um local específico e a organização dos produtos, o conjunto de objetos, os atores e as regras e procedimentos estabelecidos para as interações sociais com outros consumidores e facilitadores dos serviços (GUPTA; VAJIC, 2000).
O grau de satisfação diz respeito ao fato das expectativas do consumidor, relacionadas à experiência vivida, sejam atendidas corretamente ou que o resultado seja melhor do que o esperado. A satisfação é a reposta completa para o consumidor (OLIVER, 1996), é o julgamento de que o serviço fornece um nível de prazer relacionado ao sentido de plenitude com o ato do consumo.
É o conjunto desses componentes da oferta que deve ser considerado para criar estímulos que levem o consumidor a viver uma experiência extraordinária ou utilitária. E, para melhor compreender os significados e as expectativas relativas à experiência vivida pelo consumidor é importante levar em conta as fases que integram a experiência que, de acordo com Arnould et al. (2002), tem quatro estágios: experiência pré-consumo, experiência da compra, componentes essenciais da experiência de consumo, e lembrança da experiência de consumo.
Essa subdivisão do tempo da experiência permite, a partir do trabalho de Hanefors e Mossberg (2003), identificar alguns aspectos que podem distinguir uma experiência extraordinária de uma experiência ordinária de consumo. Esses aspectos estariam ligados a dimensões relativas à: a) motivação e expectativa (experiência pré-consumo); b) interação, envolvimento e satisfação (experiência da compra e componentes essenciais da experiência - consumo); e c) encantamento (lembrança da experiência de consumo – pós-consumo). Essas três fases constitutivas da experiência permitem identificar características importantes. Na fase preliminar devem-se identificar os elementos objetivos e simbólicos do projeto da experiência do consumidor. Posteriormente, na percepção da experiência, distinguindo os consumidores de acordo com os esquemas experienciais adotados e na última fase, se a experiência vivida é tida como algo fora do comum, pode-se reconhecer os aspectos que o consumidor desejará conservar na sua lembrança. O conjunto das informações obtidas a partir do estudo das fases que compõem uma experiência ordinária ou extraordinária oferece uma orientação para a sua compreensão de forma holística.
O tema central deste estudo é a experiência de consumo e por ser este um fenômeno complexo, pressupõe a necessidade de um tratamento multidimensional, transdisciplinar e interrelacional (CARVALHO; VERGARA, 2000; SERVA; JAIME JR, 2001). Essas características levaram a seguir, neste estudo, uma demarcação científica de caráter fenomenológico, tanto para a coleta como para interpretação de dados. A abordagem fenomenológica não se preocupa em estudar objetos e atores sociais isolados, mas compreender como a realidade se constrói por meio da experiência das pessoas envolvidas no fenômeno (CARVALHO; VERGARA, 2002). A abordagem da pesquisa sendo subjetivista admite-se que todo o conhecimento foi filtrado por meio dos pesquisadores e desse modo é fortemente alterado por forças cognitivas e culturais. Portanto, a visão interpretativa aplicada nesta pesquisa, explica com riqueza o fenômeno estudado e traz subsídios para a compreensão do consumo da experiência de serviço em restaurantes, não tendo a presunção de explicar todos os comportamentos de consumo.
Em função da orientação oferecida pelo problema proposto, adotou-se o estudo de casos dentre as estratégias qualitativas de pesquisa, como ferramental ilustrativo para os pressupostos teóricos aqui abordados. O estudo de casos ofereceu a oportunidade de obter uma visão holística da experiência de consumo, permitindo fotografar as experiências de consumo em sua complexidade e pluralidade (ORUM et al., 1991).
Os métodos qualitativos predominam neste estudo, que conceitualmente foi moldado como parte de uma abordagem indutiva, em que os detalhes empíricos são considerados sob a luz de um contexto particular. O estudo iniciou com uma teoria de base, como indicado para as pesquisas em ciências sociais e, a partir da revisão de literatura a teoria precisou ser aprofundada por meio do estudo de um fenômeno (HAMEL, 1993), a experiência de consumo.
A estratégia adotada não exigiu técnicas randômicas para a definição de amostras, ao contrário, foi preciso selecionar estrategicamente as empresas com o objeto deste estudo, o que permitiu investigá-lo na sua totalidade (PATTON; APPELBAUM, 2003). Assim, o estudo incluiu duas empresas que oferecem, pela sua estrutura física e serviços, posicionamentos diferenciados: um fast food – Restaurante A (comida rápida e padronizada), por apresentar características consideradas mais como utilitárias e outra empresa que oferece serviços à la carte - Restaurante B (serviço de refeição mais elaborado e personalizado), com características mais hedônicas, levando-se em conta as características da oferta de experiências propostas por Hanefors e Mossberg (2003).
O que se pretendeu com essa escolha foi melhor compreender os atributos e simbolismos desses eventos de consumo em situações de compra tanto utilitárias como hedônicas, a partir do sujeito que as vivenciou. A seleção dos casos envolveu, inevitavelmente, julgamento, optando-se por empresas que pudessem prover o acesso necessário ao seu ambiente e aos seus clientes, bem como em função de conterem os componentes indispensáveis que permitiriam verificar a percepção do consumidor sobre os serviços prestados.
As unidades do estudo foram compostas pelo próprio ambiente de consumo (observação), assim como pelo grupo social formado por consumidores que freqüentam esses estabelecimentos (entrevistas). A definição dessas unidades seguiu a orientação fenomenológica a qual indica critérios de representatividade não probabilísticos por tipicidade (CRESWELL, 1998; VERGARA, 2000) e por conveniência (MOTTA, 1999). O critério adotado para o número de unidades de análise pesquisadas, no caso da observação direta e das entrevistas com consumidores seguiu a orientação de Parasuraman (1986), ou seja, o critério da saturação de dados.
A coleta de informações se baseou em fontes de dados primários para suporte à análise dos resultados. Esta etapa do estudo foi realizada levando-se em consideração a construção dos corpora da pesquisa, que estão baseados em dois corpus distintos, conforme apresentado por Bauer e Aarts (2002). O primeiro, definido como corpus teórico, foi composto por dados obtidos por meio da literatura relacionada ao tema deste estudo, bem como serviu de base para a interpretação dos dados coletados. E o segundo conjunto, foi o corpus lingüístico, composto de dados de texto, constituídos a partir de grupo focal, entrevistas e observação direta.
O grupo focal é uma reunião de pessoas que se encontraram para discutir sobre um tema, neste caso a experiência de consumo de serviços de restaurantes, na presença de um moderador. Essa técnica de coleta de dados permite focalizar a discussão em um tópico, o que a torna produtiva, pois direciona a atenção dos participantes para um tema central (GASKELL, 2002). O grupo foi composto por seis voluntários, levando-se em conta os critérios indicados por Balch e Mertens (1999), que foram: a) possuir a experiência ou informação que o objetivo de pesquisa requeria; e b) ter capacidade de comunicação. Para alcançar esses critérios, a escolha dos participantes recaiu em pessoas do mesmo nível social e intelectual (clientes habituais ou consumidores potenciais de restaurantes), o que facilitou a troca de idéias, já que Corfman (1995) coloca que a homogeneidade por assunto, implica em similaridades quanto a aspectos como atitude, preferências, motivação, etc. O grupo focal ocorreu em quatro etapas: apresentação dos objetivos, análise do restaurante A, análise do restaurante B, e comparação entre os dois restaurantes, para que se pudesse tirar o máximo de informações possível sobre as experiências de consumo. A seção foi gravada em áudio e vídeo e, posteriormente, foi feita a compilação dos dados, com transcrição dos debates ocorridos.
A observação ajudou a identificar e a obter informações a respeito de objetivos sobre os quais os indivíduos não tinham consciência, mas que orientaram seu comportamento, a partir do convívio direto dos pesquisadores com a realidade. A observação foi feita de forma sistemática e realizou-se em condições controladas, conforme recomendação de Marconi e Lakatos (1999). Foi utilizado um roteiro com tópicos de orientação para a coleta de dados e feitas anotações sistemáticas em um diário de campo. O tempo de observação foi de quatro semanas, quinze dias em cada um dos restaurantes, tendo sido trabalhados todos os dias da semana. Quanto aos horários das observações, foram realizadas no período noturno, que no restaurante utilitário, por suas características específicas, variou de 18h00 às 22h00 e no restaurante hedônico das 19h00 as 23h00.
Além da observação direta, foram realizadas entrevistas com os consumidores dos restaurantes pesquisados. O tipo de entrevista utilizada foi a episódica, por ser uma técnica que procura a contextualização das experiências e, como afirma Flick (2002), volta-se mais para o contexto situacional dos acontecimentos, além de sua base metodológica estar assentada na fenomenologia e na hermenêutica, sendo importante destacar seus objetivos enquanto método de pesquisa, quais sejam: a) penetrar na experiência do indivíduo; b) direcionar a percepção para situações concretas vivenciadas pelo indivíduo; c) verificar como os episódios investigados desdobram-se sobre a experiência social do individuo; d) conhecer o significado das experiências para o entrevistado; e) compreender os episódios da vida como um construto da própria vida social (CRESWELL, 1998).
Para a operacionalização das entrevistas, utilizou-se um roteiro e sendo aplicadas nos próprios restaurantes e os clientes selecionados pelos critérios de conveniência e aceitação em conceder a entrevista. Foram realizadas após o término da refeição pelo cliente, no próprio ambiente de consumo, sendo 12 clientes do restaurante tipo fast food e 10 do restaurante à la carte. As entrevistas foram realizadas durante o período de uma semana em cada uma das empresas, no período noturno (horário do serviço de jantar), que no restaurante utilitário, por suas características específicas, variou de 18h00 às 22h00 e no restaurante hedônico das 19h00 às 11h00. O tempo de duração das entrevistas regulou entre 20min e 50min, sendo o tempo médio daquelas realizadas no restaurante A um pouco menor das que ocorreram no restaurante B. Tanto o número de entrevistas como o tempo de duração foram considerados suficientes para obtenção das informações para aprofundar a essência do objeto pesquisado, considerando-se o critério de saturação dos dados, conforme orientação de Patton (2002).
Inicialmente foi feita uma análise teórica com base na literatura que deu suporte a este estudo. O uso da teoria para a orientação da pesquisa qualitativa trouxe um grau de reducionismo ao processo de coleta de dados, mas não eliminou a habilidade de descrever e explorar o tema em questão. Trata-se de um contexto em que a teoria existente foi utilizada, apresentando-se na forma de categorias analíticas (construtos) e não de descritores empíricos (variáveis) (ALI; BIRLEY, 1999). Além da análise teórica, foi utilizada a análise fenomenológica dos dados, realizada seguindo-se dois procedimentos principais: (a) a leitura crítica; e (b) a classificação de termos e idéias (MOTTA, 1999). Para os relatos e narrativas, se fez inicialmente uma leitura crítica das transcrições do grupo focal, das observações e das entrevistas, identificando os pontos que mereciam atenção e articulando-os com as informações obtidas na revisão da bibliografia pertinente ao problema sob investigação. A análise foi alimentada pela reflexão hermenêutica, que consistiu na interpretação dos textos da pesquisa como um movimento dinâmico em direção a uma melhor compreensão do fenômeno investigado (REMENYI et al., 1998).
Para se chegar à dinâmica geral do fenômeno observado, com base no conjunto de dados coletados, as análises foram agrupadas levando-se em conta duas possibilidades não-excludentes de formação de conglomerados: (a) padrões que seguiram os termos usados pelos próprios depoentes; e (b) padrões que emergiram de coincidências observadas nos textos (MOUSTAKAS, 1994). O objetivo buscado foi manter a essência das experiências individuais (PRUS, 1991). Esse procedimento, denominado de “síntese”, consistiu na fusão de vários depoimentos e anotações que descreveram um padrão típico de comportamento ou de resposta (MORSE, 1994), caracterizando uma construção “essencial” ou “universal” (HELGESON, 1994). Por meio dessas análises temáticas (MORSE, 1994), identificaram-se estruturas comuns às experiências particulares, capazes de otimizar a interpretação dos dados de pesquisa.
Com relação aos critérios de qualidade, buscou-se gerar objetividade, não na abordagem, mas em relação à credibilidade dos resultados da pesquisa, levando-se em consideração os parâmetros próprios da tradição qualitativa que contemplam pontos como: a triangulação, a reflexividade, a clareza nos procedimentos, a construção do corpus de pesquisa, a descrição detalhada e a validação comunicativa.
A partir dos dados coletados obteve-se um rico conjunto de dados que foi estruturado levando-se em conta os resultados do restaurante A (fast food), posteriormente do B (à la carte) e, por último, uma análise comparativa entre os dois.
Com relação ao estudo do caso A encontrou-se que, pelo conjunto da oferta observada, bem como em relação à sua percepção pelos consumidores, ter uma experiência de consumo nesse restaurante tem significações predominantemente utilitárias. Apesar de alguns componentes de caráter hedônico terem surgido, a experiência de consumo foi interpretada como ordinária ou comum pelos consumidores. Conforme colocam Lasalle e Britton (2003) nem todas as experiências devem ou tem que ser consideradas como extraordinárias, mas podem ser vistas como valorosas para o consumidor. O valor atribuído pelos consumidores às experiências ordinárias, como no restaurante A, revela componentes que vão além do valor econômico em si e isso deve ser potencializado. Esse enfoque no valor atribuído ao ato de consumo remete ao pensamento dos autores citados, quando dizem que oferecer experiências pode ser a solução para evitar a armadilha do commodity. Codeluppi (2001) complementa destacando que o principal deve ser construir estratégias que visem oferecer ao consumidor sensações físicas e emocionais durante a experiência de consumo, pois quanto maior a sensação positiva obtida a partir da experiência, mais gratificação os consumidores terão.
Com relação aos principais pontos relativos ao significado de consumo de experiências no restaurante B, constatou-se que a essência daquilo que é interpretado pelos consumidores está centrado em significações predominantemente extraordinárias. Não se pode deixar de considerar que alguns componentes utilitários se apresentaram, mas o que ficou registrado como percepção mais geral é que o caráter extraordinário da experiência se sobrepõe aos aspectos utilitários. Reafirmando o que foi mencionado anteriormente, é o consumidor o intérprete da sua experiência e o provedor do serviço de restaurante se apresenta como um facilitador dessa interpretação, na medida em que estrutura o conjunto de sua oferta para tentar influenciar esse sujeito. Mas, em última instância, é o consumidor que constrói o quadro de sua experiência. Esse é um aspecto importante e que foi detectado claramente a partir das entrevistas realizadas e ficou bastante evidenciado em uma delas. A análise dos depoimentos de um consumidor especificamente demonstrou que este admite que o restaurante B oferece determinadas condições que possibilitam reconhecer aspectos extraordinários em sua oferta de serviços. Entretanto, o conjunto do que foi oferecido e as circunstâncias pessoais desse consumidor, conduziram a que ele encontrasse maior intensidade de significações utilitárias na sua experiência no restaurante B.
Tomando como referência Holbrook (1999), verifica-se que a subjetividade é a fonte de valor principal e influencia o resultado das interações entre os aspectos objetivos e subjetivos da experiência e essas interações envolvem diferenças nas formas como cada produto hedônico é consumido. Essa subjetividade é, portanto, a força que molda a interpretação do consumidor sobre a sua experiência.
O cruzamento das informações coletadas possibilitou uma melhor compilação dos resultados e permitiu verificar as divergências e ou semelhanças existentes entre os restaurantes para chegar a uma conclusão sobre os significados das experiências. De forma geral, o que se teve como resultado na comparação entre os dois estudos de caso é que o restaurante A apresenta como conjunto de sua oferta características predominantemente utilitárias e os elementos que o compõem estão influenciando os consumidores a interpretarem suas experiências, em última instância, como comuns ou ordinárias.
No restaurante B, os produtos e serviços ofertados foram construídos valorizando componentes mais hedônicos, de modo a levar os consumidores a interpretarem suas experiências, preferencialmente, como fora do comum ou extraordinárias.
Nos dois casos há uma convergência entre o que está sendo ofertado e a interpretação do consumidor, entretanto, o fato deste ser o condutor da interpretação de sua experiência e a subjetividade um componente inerente à sua condição, várias nuances foram detectadas nos significados atribuídos às essas experiências. As entrevistas com os consumidores dos dois restaurantes levaram a constatação de que elementos com características utilitárias são identificados nas experiências no restaurante hedônico, assim como características hedônicas foram capturadas no restaurante utilitário, o que demonstra que o resultado da experiência de consumo é formado por pesos diferenciados na interação entre o produto e o consumidor.
De acordo com Petr (2002) os atributos e simbolismos relativos à experiência de consumo de serviços podem ser definidos como integrando as características físicas do quadro da experiência e as características da atmosfera da experiência. Nesses dois pontos os restaurantes A e B mostraram existir diferenças profundas, mas com alguns aspectos comuns detectados pelos consumidores. Os aspectos físicos do restaurante A, tais como, a decoração padronizada, estar em um shopping, a praça de alimentação, o mobiliário, o tipo de cardápio padronizado, são alguns dos aspectos que demonstram o seu posicionamento, caracterizando-o como um fast food, que oferece uma alimentação rápida, de qualidade, a um preço justo. Com relação às características da atmosfera da experiência, verifica-se que a interação entre funcionários e clientes é pouco intensa e os pratos do cardápio e o ambiente criados o caracterizam como utilitário. O restaurante B apresenta uma outra proposta, com decoração diferenciada e autêntica, a localização é em uma rua pequena e aconchegante, com fachada simples, mas bucólica e o cardápio permite alterações. A sua atmosfera revela que a interação entre funcionários, gestor e clientes é intensa, o serviço é personalizado, os pratos do cardápio são muito elaborados, há uma temática de cantina italiana, dando ao restaurante uma sensação de “estar em casa fora de casa”, conforme relato de um entrevistado.
Não se pode deixar de registrar que surgiram algumas diferenciações de características físicas e de atmosfera entre os restaurantes A e B, mas pode-se considerar que, mesmo com propostas diferenciadas, um elemento comum em importância foi ressaltado pelos consumidores, a comida. O cardápio elaborado, a qualidade e o sabor da comida aparecem, indiscriminadamente, nos dois grupos, como fatores relevantes, já que este é um dos principais produtos ofertados por um restaurante.
Considerando-se ainda, que a subjetividade do consumidor (HOLBROOK, 1999) é fator mediador da interpretação de sua experiência de consumo, significados hedônicos ou extraordinários foram encontrados no restaurante utilitário, assim como valores funcionais, comuns ou ordinários foram encontrados no restaurante hedônico. O ambiente do shopping, como uma área de lazer, a apresentação de shows ao vivo e em vídeo, a proximidade com o cinema, a qualidade e o sabor da comida, a companhia, são algumas significações reveladas pelos consumidores que demonstram uma parcela hedônica de sua experiência ordinária no restaurante A. Em contrapartida, estar só, como no caso de um entrevistado, e em viagem de trabalho e, portanto, sem muito envolvimento com a situação de consumo, revela características consideradas como utilitárias na experiência de um dos consumidores do restaurante B.
Um aspecto comum aos dois restaurantes, revelado pelos consumidores foi haver, em algum ponto da experiência, falha na prestação do serviço. De acordo com Petr (2002), é preciso que os restaurantes saibam primeiramente o papel que o quadro físico e a atmosfera desempenham para, em seguida, se voltarem para a experiência do consumidor. Reconhecer as fontes possíveis de incidentes e seus impactos na experiência vivida torna-se fundamental para fazer os reparos necessários de modo a maximizar o valor da experiência.
Verificou-se existirem divergências de significações para os consumidores nos dois tipos de experiências, entretanto, o aspecto experiencial do consumo de serviços de restaurante está bastante presente nos dois casos estudados. A partir de uma análise da prática da experiência proporcionada pelos restaurantes A e B, levando-se em conta os quatro suportes da produção de experiência propostos por Holbrook (2000): experiência, divertimento, exibicionismo e evangelismo, verificou-se que: a) A experiência, como fonte de evasão da vida quotidiana, das emoções e do prazer, foi observada para os dois restaurantes, o que mudou de um para outro foi a intensidade com que esses elementos se apresentaram para cada consumidor; b) O divertimento, como um componente relacionado ao restaurante em si, representado pelo ambiente, associado aos seus freqüentadores, contribuiu para que a experiência de fazer uma refeição fosse um momento agradável para os consumidores do restaurante A e uma espécie de espetáculo encenado pela empresa para o restaurante B; c) O exibicionismo é um componente menos intuitivo que se mostra ao consumidor pela sua realidade física e o que se verificou foi que o envolvimento dos consumidores com os pratos ofertados assumiu uma importância especial nos dois restaurantes, sendo que no hedônico a relação com a comida tem um componente um pouco mais emocional. Nos dois conjuntos de consumidores constatou-se que estes consideraram os espaços dos dois restaurantes como vitrines, onde podiam se mostrar e conviver com os outros; e d) O evangelismo, em que o restaurante exerceu a função de exemplo. A estrutura física do restaurante A permite que os consumidores acompanhem visualmente à preparação, já no restaurante B, é o consumidor que pode entrar na cozinha para falar com o chefe, acompanhar uma preparação ou fazer um pedido. Esses aspectos são enriquecidos com a decoração do prato ou na preparação e arrumação da mesa, no restaurante B. Ou ainda na oferta de cortesias para os clientes preferenciais no restaurante B ou na preparação de uma sobremesa especial para um aniversariante, no restaurante A.
O que se pode concluir é que os dois casos estudados proporcionam experiências para os seus consumidores, mas o restaurante B apresenta um componente experiencial dominante e o restaurante A um componente funcional que sobressai e, portanto, para este último é exigida uma iniciativa mais inovadora.
Constata-se, portanto, que as experiências em serviços são como um subconjunto do comportamento humano, ou seja, uma interação pessoal (e social) entre o provedor e o consumidor do serviço. Essas experiências apresentam algumas semelhanças, por partilharem algumas características comuns, ao mesmo tempo podem ser diferentes, levando-se em conta as expectativas e percepções dos clientes em relação às características do provedor e às realidades da entrega do serviço.
As reflexões feitas a partir do conjunto de dados obtidos e do estudo do material bibliográfico adotado neste estudo levaram a proposição de um esquema referencial que pode colaborar para a compreensão do processo de consumo de experiências em serviços. Procurou-se demonstrar que a estrutura de interdependência desse quadro de análise modifica, de certa forma, a visão da gestão da oferta de serviços, já que o consumidor é o elemento central da experiência de consumo e a partir dele a experiência ganha sentido e deve ser construída. Esse é um processo que se apresenta de forma multifacetada, se fazendo necessário tentar delimitar um quadro de análise para melhor compreender a experiência de consumo em si. No esquema teórico referencial proposto (figura 1), busca-se fornecer uma visão holística da experiência em serviços, tanto ordinária quanto extraordinária, demonstrando que as três elipses que compõem o dispositivo de análise são interdependentes, em que C (a experiência ordinária/extraordinária) aparece como uma função de A (os elementos da oferta de serviços), somado a B (que é o processo de consumo ou a experiência do consumidor em si). Ou seja, para que uma experiência possa ser interpretada como ordinária ou extraordinária precisa existir uma inter-relação entre o que é ofertado e a vivência do consumidor durante o processo de aquisição de um serviço.
O conjunto dos elementos da oferta em serviços (A) fornece experiências sensoriais (relativas aos sentidos: visuais, olfativas, auditivas, táteis e gustativas); experiências afetivas (relacionadas ao aspecto hedônico do consumo); experiências físicas (relacionadas aos aspectos físicos relativos ao local de consumo); e as experiências relacionais (o contato com os funcionários, proprietários, companhias e demais clientes) que compõem o cenário onde ocorre o consumo da experiência do serviço (SCHMITT, 1999). São esses aspectos que os provedores devem trabalhar para criar seus diferenciais e posicionar seus serviços, produtos e marcas, no sentido de oferecer as condições necessárias para que o consumidor possa considerar a sua experiência como ordinária ou como extraordinária.
Essa experiência (B) ocorre no ambiente de uma loja onde o serviço é prestado, mas não se restringe somente ao encontro de serviço em si, se caracterizando como um processo que acontece em quatro etapas e no qual estão inseridas dimensões experienciais, que são: o pré-consumo (motivação e expectativa); a compra (interação e envolvimento); os componentes essenciais da experiência de consumo (satisfação); e a lembrança da experiência de consumo (encantamento) (HANEFORS; MOSSBERG, 2003).
A experiência vivida pelo consumidor durante esse processo e, a partir do que é ofertado pelo provedor do serviço, é que levará a uma interpretação de sua vivência, que poderá ser considerada como uma experiência ordinária ou extraordinária, identificada na elipse resultante (C) da interseção com as duas outras (A + B). O principal motivo subjacente à organização de serviços é reposicionar a participação do cliente para o centro do processo. O sistema de oferta que lhe é proposto não se limita ao produto ou serviço oferecido, mas a toda a atmosfera que inclui o lugar, a arquitetura, o cenário, os prestadores de serviços, em que tudo vai concorrer para criar um lugar que suscitará algo no consumidor (AUGÉ, 1995).
Reconhecendo que o ambiente de consumo é o lugar onde a experiência ocorre, verifica-se que a gestão do ponto de venda, em toda a sua complexidade, assume um papel essencial. O ambiente de serviços não se caracteriza mais e somente como um ponto de passagem necessário à aquisição de bens/serviços, mas se transformou em vetor de atração, retenção e de fidelização de clientes. Cada dia mais se faz necessário dar conta da forma como os provedores de serviços procedem para fazer de seu ponto de venda um lugar de produção de experiências, um setor específico de atividades ou um ambiente comercial particular.
A gestão da experiência de consumo de serviços aparece como uma articulação permanente de dois componentes: um mais funcional e outro mais lúdico e hedonista do processo de visita (teatralização) a um determinado local. Longe de caracterizar-se como um artifício, essa combinação produz um contexto de experiência de compra particular que requalifica o ponto de venda em função da concorrência e, às vezes, gera quadros específicos de participação e outros de emissão sensorial pelos consumidores (BOUCHET, 2004).
Existe um ambiente de consumo específico para cada provedor de serviços com uma atmosfera que constitui a particularidade de seu espaço de consumo (produto, serviços, competências, relacionamentos, emoções ou preço), para o qual se deve tentar criar estrutura e espetáculo particulares em função dos recursos estruturais e posicionamento de cada ofertante. Os provedores de serviços criam, portanto, as circunstâncias e condições especiais para que o consumidor, como elemento central do processo, vivencie e interprete a sua experiência como ordinária ou como extraordinária.
Finalmente, considerando-se a natureza metodológica deste estudo, a proposição defendida é que o consumidor tem participação na produção de sua experiência, admitindo-se que ele interpreta os serviços disponibilizados pelo mercado, mas reconhecendo-se que os sistemas de oferta propostos influenciam nessa interpretação. Espera-se que esta proposição estimule outros pesquisadores a testarem a sua validade empírica em estudos futuros.
Esta pesquisa permitiu constatar que a experiência é um elemento chave para a compreensão do comportamento do consumidor e o fundamento principal de uma nova perspectiva para o marketing. A compreensão sobre o significado da experiência a partir do que é ofertado por uma determinada empresa demandou que se buscasse conhecer as expectativas dos consumidores nos momentos anteriores ao consumo, os significados relativos às experiências vividas durante o consumo do serviço, e as lembranças que o consumidor guarda da sua experiência. Esse conhecimento permitiu verificar que o consumidor pode ter várias interpretações de sua experiência de compra, considerando que esta pode ser tanto um evento ordinário (utilitário) como um evento extraordinário (hedônico).
Os componentes da experiência de serviços de restaurante, que incluem aspectos ligados ao ambiente criado para envolver o consumidor, às interações entre pessoas, e a avaliação dos efeitos de tudo isso pelos consumidores se constituíram em pontos de reflexão neste estudo. E, considerando-se que as experiências dos consumidores são muito complexas, foi necessário procurar explicações que pudessem responder as mais diversas conjunturas que se apresentam nas experiências de consumo, evitando simplesmente buscar por uma única teoria que correspondesse à verdade.
A estrutura de interdependência desse quadro de análise pode modificar, de certa forma, a maneira de planejar e compor a oferta dos serviços, pois está focada na experiência vivida pelo consumidor. A gestão da relação com os clientes deve propiciar mais importância ao poder de ação dos próprios consumidores e, portanto, estimular à reflexão de que os elementos da oferta devem ser re-encantados por meio de um sistema de atração, de recepção e de acolhida baseados na sua experiência.
O resultado deste estudo apresenta uma abordagem diferenciada, distinguindo os consumidores de acordo com os esquemas experienciais adotados. Se a experiência vivida é considerada como um evento fora do comum ou como um episódio quotidiano, a pesquisa em marketing pode contribuir para melhor antecipar os ícones que o consumidor desejará conservar na lembrança. Ao mesmo tempo, mostra-se útil no sentido de possibilitar o aperfeiçoamento da experiência vivida, pois os consumidores não mais estão aceitando se submeter a um esquema comportamental tipo. Essa recusa, voluntária ou inconsciente, às vezes parcial e, às vezes total, não é sistemática, entretanto, se esses comportamentos de transgressão aparecem podem desestabilizar os sistemas de gestão das empresas. A solução parece ser a de realizar mais estudos na área de comportamento do consumidor e de marketing e, a partir do conjunto de informações coletadas, arbitrar sobre elas. Visto que as formas de viver as experiências de consumo podem ser variadas e estas devem levar em conta os objetivos e propostas das empresas que são os fatores estimulantes da interpretação do consumidor.
Outro ponto a considerar está relacionado à definição de quais ações podem ser empreendidas para favorecer determinados tipos de experiências. Para definir os tipos de experiências adequados à proposta da empresa e aos desejos dos consumidores, deve-se levar em consideração aspectos como: a) participar ativamente da construção da experiência desejada; b) conhecer profundamente a experiência vivenciada pelo consumidor e a percepção sobre ela. Esses aspectos podem impulsionar as empresas a se organizarem para ofertar elementos que levem os consumidores a definir suas experiências como ordinárias ou extraordinárias ou algo que esteja nesse continuum. O que se verifica, de modo geral, é a institucionalização, a profissionalização e a diminuição dos atos de sedução, com a adoção de padronizações, o que pode levar a uma desilusão da relação comercial, que se traduz na ausência de interesse ou de empatia pelo consumidor.
Novamente, colocar em evidência o re-encantamento experiencial do ponto de venda impõe direcionar atenção particular aos valores, atitudes e preferências do consumidor. Esse re-encantamento da relação com a clientela predispõe que os consumidores se engajem para viver uma experiência de serviços, seja ela ordinária ou extraordinária. Recomenda-se a partir desta pesquisa uma maior utilização da visão experiencial sobre o comportamento do consumidor, que pode e deve ser empregada em estudos sobre serviços, que até então vem sendo trabalhados somente como tópicos relacionados ao modelo orientado para a decisão.
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Recibido: 12/1/2013
Aeptado: 04/02/2013
Publicado: Junio 2013
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