O presente artigo tem como objetivo relatar os resultados da pesquisa elaborada sobre a hospitalidade e a comensalidade entre imigrantes bolivianos na Feira Kantuta, que ocorre todos os domingos na praça de mesmo nome na cidade de São Paulo e é organizada pela Associação Gastronômica Cultural, Folclórica Boliviana Padre Bento.
A cidade de São Paulo é uma cidade multiétnica resultado da variedade proporcionada pelas imigrações ocorridas na formação da cidade, das migrações de nordestinos, nortistas, caipiras etc., e também da intensificação do processo migratório latino americano (bolivianos, peruanos, chilenos, paraguaios etc.) nas últimas décadas, resultando na formação de novos bairros étnicos. Ressalta-se que a feira é constituída por imigrantes bolivianos, contando com a presença de peruanos e paraguaios deslocados de seu país de origem e de visitantes da cidade e de outras localidades do Brasil e do mundo, sendo aberta à visitação do público em geral. A hospitalidade e a comensalidade abordadas são características desse espaço social urbano - a feira Kantuta.
Trata-se de uma pesquisa exploratória de caráter qualitativo, “envolvendo levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado; análise de exemplos que estimulem a compreensão” do pesquisador, como descrito por Silva (2001: 21).
Por se tratar de uma pesquisa aplicada foi realizado um levantamento de dados com a “interrogação direta das pessoas e registro dos comportamentos que se desejava conhecer” realizada na observação e questionamentos elaborados nos momentos registrados, proporcionando ao pesquisador uma maior familiaridade com o problema (SILVA, 2001: 21).
O maior referencial desse trabalho é encontrado em Silva (2003, 2005, 2006), Sidney Antônio da Silva é antropólogo e autor de diversos livros sobre a trajetória de bolivianos na cidade de São Paulo. No referencial teórico sobre a hospitalidade serão utilizados os autores que discorrem sobre o tema; a teoria da dádiva de Mauss (2004), a utilização do conceito da dádiva nas sociedades modernas de Godbout (1999) e de Camargo (2004), a compreensão social e as práticas festivas nas sociedades modernas de Bueno (2008), as formas de acolhimento nas cidades de Salles (2008), e sobre os lugares de hospitalidade de Baptista (2008). O referencial teórico sobre a comensalidade trata da partilha das refeições e a relação com o conceito da dádiva de Schemeil (2011), sobre os eixos vertical e horizontal da comensalidade, o “comer simbólico” de Boutaud (2011), o estudo da comensalidade relacionado à hospitalidade de Camargo (2004), a mesa como espaço de comunicação de Maffesoli (2002).
O artigo apresenta a pesquisa de campo e a relação aos estudos sobre a hospitalidade e a comensalidade com os autores observados. Foi aplicado o instrumento de entrevista com o Sr. Carlos Danilo Soto Gomez Garcia que faz parte da história da feira, escolhido por ser um dos fundadores e que desde então comercializa as salteñas, salgados representativos na Bolívia. Na fase construtiva da pesquisa, a coleta de dados para o estudo da cultura boliviana foi feita pelos métodos bibliográfico e etnográfico. Pelo método bibliográfico foram pesquisados autores que registraram a cultura e a alimentação originais e às adaptadas à cidade de São Paulo.
Na feira Kantuta, a coleta de dados foi feita pelo método etnográfico, elaborada por pesquisa de campo e de observação apoiada na produção de fontes orais e de imagens. Nessa etapa utilizaram-se duas formas de recolhimento de informações e de depoimentos dos comerciantes e participantes da feira: o primeiro através da aplicação de instrumento de entrevista. O segundo através de pesquisa participante, na obtenção de depoimentos orais nos momentos registrados, dos comerciantes e dos participantes da feira em geral, que não serão identificados.
O trabalho trata do espaço de acolhimento criado pelos bolivianos em São Paulo, e pretende relatar os resultados dos estudos da hospitalidade e da comensalidade praticadas no local e a relação de convivialidade que elas proporcionam, importantes para a adaptação esses imigrantes à cidade.
Inicialmente os bolivianos encontravam-se na Praça Padre Bento, em uma feira atrás da Igreja de Santo Antônio do Pari que na época era clandestina.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o IPHAN (2009) divulgou a ficha de identificação de lugares, através do Inventário Nacional de Referências Culturais sobre o Bairro do Bom Retiro, o bem de nº 146, denominando a Feira Kantuta um bem cultural:
A feira teve início por volta de 1993, na Praça Padre Bento, em frente à igreja Santo Antônio do Pari, com uma barraca de propriedade de dona Berta Valdez que, aos domingos, vendia anticucho, um espetinho de carne de coração de boi, com batata e molho de amendoim ardido (IPHAN, 2009: 2).
Silva (2003) relata que depois de várias negociações a prefeitura concedeu aos bolivianos um espaço novo no mesmo bairro. No dia 1º de junho de 2002, após problemas na região aonde era montada, a prefeitura transferiu a atividade para outro local, “a prefeitura solicitou que criássemos uma associação para a legalização da feira” conta o Sr. Carlos Garcia, um dos fundadores da feira.
Esse novo espaço destinava-se à reunião dos imigrantes bolivianos moradores da cidade de São Paulo, que frequentemente buscavam acolhimento e integração; informações do país, notícias de trabalho, reencontrar compatriotas, cortar o cabelo, comprar produtos típicos, e tantos outros. A Praça, batizada de Kantuta por ser o nome de uma flor muito comum no altiplano boliviano, e cujas cores remetem à bandeira boliviana, vermelha, amarela e verde, recebeu em 2003 a autorização de funcionamento oficial.
A ficha 50 de Identificação de Lugares do Inventário Nacional de Referências Culturais do IPHAN (2009) destaca a importância do “aprofundamento de estudos para complementação da identificação ou para fins de registro ou tombamento” através do reconhecimento das “relações de sociabilidade entre brasileiros e latino-americanos que ocorrem na Feira, seja por meio do comércio, dos serviços, das trocas culturais” (IPHAN, 2009: 7). A feira apresenta características únicas dentro da comunidade local a qual pertence, por ser espaço destinado à reunião dos imigrantes bolivianos em sua maioria, mas também de peruanos e de paraguaios, moradores da cidade de São Paulo. Essa característica foi descrita conforme a ficha de nº 50 do Inventário Nacional de Referências Culturais do IPHAN (2009):
[...] é composta por cerca de 54 barracas, que se dividem em: comidas típicas bolivianas, artesanato, cereais, doces e bolos, dvd’s e cd’s, livros e revistas, sucos, brinquedos, pães, barbeiros. [...] No fundo da praça, há um pequeno palco, onde ocorrem discursos e falas relacionadas a temas de interesse da Associação e algumas apresentações culturais, como danças típicas. O público é composto de maioria latino-americana (bolivianos, peruanos, paraguaios) e observa-se o crescimento da visitação de brasileiros à feira, principalmente nas barracas de comidas (IPHAN, 2009: 2).
Além do reconhecimento das relações de sociabilidade, o IPHAN (2009) faz a “identificação de outros bens mencionados nesta ficha” através da “importância das manifestações culturais latino-americanas como danças, festas, língua e culinária, em especial a boliviana, na Feira Kantuta como preservação da identidade cultural para as novas gerações” (IPHAN, 2009: 7).
Observa-se atualmente um grande número de moradores da cidade, pessoas que vem de outros bairros em busca dos atrativos, sejam pelos produtos mais baratos, pelas comidas regionais ou algum tipo de apresentação de dança ou músicas típicas da Bolívia. A seguir outro relato na ficha de nº 50 de identificação da feira Kantuta, do inventário do IPHAN (2009):
Segundo o senhor Carlos Danilo Soto Gómez Garcia, atual presidente da Associação (2008/2009), houve mudanças importantes desde o início da feira. A começar pelo local, a atual Praça Kantuta – antes sem nome - que recebeu melhorias após a transferência da feira para lá. Também houve melhorias nas condições de higiene das barracas que vendem comida, após cursos do SEBRAE, abordando a manipulação e preparo de alimentos, e também oferecendo cursos de empreendedorismo aos associados (IPHAN, 2009:7).
O Senhor Carlos Danilo Soto Gómez Garcia, um dos fundadores da feira e ex-presidente ainda trabalha no local, vendendo salgados típicos.
Destaca-se o espaço de acolhimento que promove aos imigrantes deslocados de seu país de origem, múltiplos meios de expressarem a sua cultura, recobrarem a autoestima, encontrando os compatriotas para momentos de convivialidade e partilha de sua cultura original levando-se em conta a hospitalidade e a comensalidade no local.
Muitos imigrantes bolivianos que vivem em São Paulo aproveitam o domingo para sair das suas moradias e contemplar na feira a oportunidade de se sociabilizarem. Eles vão para comemorar as suas datas festivas, para demonstrar as suas tradições alimentares, ou somente para passear; as relações de hospitalidade são observadas em algumas situações vivenciadas.
Utilizando-se o conceito da dádiva proposto por Mauss, acerca do estudo da hospitalidade, as relações humanas se estabelecem através da reciprocidade pela da tríplice obrigação do “dar-receber-retribuir”. Assim como Godbout (1999: 113) definiu que todas as relações podem “iniciar ou empreender, crescer e funcionar” e sendo alimentada pela dádiva é importante para que os integrantes do grupo se sociabilizem.
Na feira essas relações, nos diversos momentos e também nas datas festivas, “intensificam a existência e coesão de um povo” através da circularidade e da “tríplice obrigação” como relatado por Silva (2003: 159). O autor discorre sobre “A (re)criação de práticas festivas no contexto da migração: o que se transforma?" refletindo sobre “os significados do festejar em São Paulo” e explicando a festa no sentido Maussiano, enxerga “elementos de organização social, tensões entre os sistemas de crenças envolvidos, interesses econômicos e políticos, expressões estéticas, ritmos, emoções e sabores, entre outras coisas”. O autor explicita os aspectos sociais das festas relacionando-o a “um potlach ou fato social total”, na expressão de Mauss, ressaltando que “as festas marianas põem, portanto, em circulação a totalidade do grupo envolvido num complexo sistema de prestações totais” (MAUSS apud SILVA, 2003: 159).
Para a observação da (re)criação de práticas festivas no contexto da migração, parte da pesquisa de campo foi realizada no Domingo de Carnaval em fevereiro de 2012, e a comemoração do Dia da Independência em agosto de 2012, ocasiões propícias para os frequentadores interagirem e relembrarem as festas que acontecem em seu país.
Toma-se como referência Silva (2005: 46) diz que as festas “são veiculadoras de identidades, sejam elas nacionais, étnicas, culturais ou sociais” e que “o ciclo de festas acionado pelos bolivianos em São Paulo é amplo e variado, marcando momentos significativos para o grupo.” Analisando-se às festas bolivianas recriadas fora do país o autor afirma que “tais identidades são reafirmadas e reconstruídas no contato com o outro, com o diferente, e portanto, são sempre situacionais [...] são acionadas em momentos específicos da vida social do grupo, quando é necessário remarcar diferenças” (SILVA, 2005: 46).
Interessante relatar que o autor já havia observado essas características antes, dizendo que até os cantos em idiomas diferentes (aimará ou quéchua), a roupa das cholitas, os gestos expressados nos vários ritmos musicais “reafirmam as várias identidades que são veiculadas no espaço da festa” e afirma que as festas têm duas funções, “remarcar diferenças sociais” e “contribuir para mudar a percepção que esses imigrantes têm de si mesmos, sobretudo em relação aos preconceitos do país de origem e que por sua vez são reproduzidos em São Paulo” (Silva, 2003: 162). Esse preconceito no país de origem tem a ver com as comemorações populares herdadas dos índios, e que a elite local despreza (Silva, 2003: 163). Mas principalmente para os visitantes de fora, nas festividades vê-se a riqueza das tradições culturais, o esforço da organização e a busca do grupo por um lugar na sociedade paulistana.
Ali também se observa um trato amistoso dos bolivianos com os visitantes de outras nacionalidades, em todas as vezes que foi necessário pedir alguma informação dos participantes da feira houve pronto atendimento, lembrando Godbout (1999: 24) e sua preocupação de como os indivíduos devem manter nas suas de relações sociais as “trocas continuas” que os permitem a “sobrevivência num mundo de loucura”. Aos imigrantes bolivianos que enfrentam algumas situações de hostilidade, e muitas vezes já automatizados pelo cotidiano, essas demonstrações são compreendidas como uma das formas de apaziguamento, pertinente ao ritual de hospitalidade.
O Sr. Carlos Danilo Soto Goméz Garcia, o Don Carlos das Salteñas é um dos personagens da feira que demonstra a intenção em resgatar e manter a memória coletiva através das manifestações culturais no local através das tradições ancestrais que identificam o grupo. Em entrevista afirmou que “São Paulo é uma cidade magnífica que acolhe a todos da mesma forma”. Esta frase registrou o sentimento dele ao chegar à cidade em 1970, fugindo da perseguição político-militar, para encontrar o seu tio Armando Soto. Ao ser questionado se sofreu alguma discriminação por parte de outros grupos ele diz que “nunca percebeu”, pois sempre achou o paulista hospitaleiro; provavelmente porque chegou a São Paulo em um contexto diferente de seus compatriotas que chegaram décadas depois.
Em fevereiro de 2012, aconteceu o domingo de Carnaval, quando o dia inicia cedo com a arrumação da estrutura e das barracas de produtos. Os comerciantes organizados as colocam de uma diferente maneira da convencional, sendo reorganizadas fora da rua para dar lugar a uma “avenida” improvisada aonde acontecerão os desfiles da festa. O movimento no começo do dia é maior do que nos domingos, estão a postos mais donos de barracas, ocorre distribuição de panfletos de propaganda e até um número maior de guardadores de carros, todos preparados para atender o grande número de visitantes esperado.
À medida que o tempo foi passando foram chegando muitas famílias, que acabaram sentando à sombra para esperar os grupos folclóricos passarem; mulheres e homens com seus filhos nos braços, algumas amamentando, segurando sombrinhas por causa do calor, cholas (mulheres mestiças)bem vestidas, com tecidos coloridos e brilhantes, jovens guerreando com suas pistolas de água, grupos tocando e dançando, jovens de cabelos coloridos, a diversidade expressa através de um momento de interação e lembranças natais. Essa convivialidade reforça o papel do acolhimento “nas relações sociais concretas” e fortalece a “constituição das alteridades”, descrito por Salles (2008: 87). É na reciprocidade dos imigrantes, que andam todos os dias pela cidade, identificando muitas vezes a hostilidade dos moradores, que se evidencia a importância do exercício da alteridade.
Sobre a hostilidade registrou-se um único momento de manifestação preconceituosa de um colaborador entrevistado (não boliviano) que dirigia o veículo que transportava as bebidas vendidas no domingo de Carnaval. Anteriormente Silva (2003: 169) já havia registrado a oferta de bebidas nas festas bolivianas, reconhecendo à semelhança de um potlach: “esse dom assume, às vezes, um caráter agonístico, pois cada doador procura enfatizar seu poder e prestígio dentro do grupo, pela quantidade de bebida oferecida”. Ao que parece esse caráter gera uma competitividade entre os organizadores das festas.
O rapaz era o funcionário de um dos donos do caminhão das bebidas. Relatou que os donos dos caminhões obedeciam ao sistema comum na compra das bebidas consumidas na festa e como eram os organizadores e padrinhos tinham a obrigação de providenciá-las ao público. A manifestação inconveniente do rapaz pode ser relacionada à questão da compreensão do social à dependência do exercício da alteridade. A ideia fundamentada na sociabilidade, descrita por Bueno (2008: 115) é o propósito da criação do espaço e do vínculo mútuo, que o lugar tem a capacidade de gerar, podendo ser estabelecido através da aliança e da confiança dos grupos que se organizam. São as relações “nem sempre hospitaleiras” descritas por Salles (2008: 77) que estão presentes nas metrópoles, como os sinais de intolerância e de estranhamento das diferenças, e do mecanismo de defesa contra o preconceito através da criação de grupos de acolhimento no espaço social urbano de São Paulo.
A hospitalidade também está ligada à ideia de alteridade e identidade dos grupos que são deslocados para as grandes metrópoles. Registram-se alguns dos fatores de identidade coletiva dos participantes da feira, com um relato obtido no domingo de Carnaval de um dos colaboradores, remetendo às suas lembranças de infância nos dias da festa em sua cidade natal Tupiza. Na ocasião o rapaz já estava há 6 anos no Brasil e há 3 anos em São Paulo, aonde veio se profissionalizar como modelista de roupas, declarando que trabalhava em lojas do Bom Retiro estando na feira para ganhar um dinheiro extra nos finais de semana. Lembrando-se do Carnaval na Bolívia, ressaltou que cada cidade tem tradições diferentes, mas que gostava da brincadeira com bexiga d´água quando era criança. A propósito, no domingo fazia muito calor e as crianças, jovens e adultos ocupavam-se em encher pistolas de água para brincarem, além das disputas com sprays de espumas. Ao ser questionado sobre o Carnaval que presenciou em sua cidade natal, relatou uma memória de infância, quando os confites (doces de açúcar utilizados na ocasião da festa), eram lançados nos telhados das casas, contando que os pegava do chão, lavava e comia; das serpentinas enroladas no pescoço e nas casas; da elaboração das bandeirinhas com sacolas coloridas e cortadas em tiras; além das bombinhas para chamar a atenção dos vizinhos. Relatou que sua comunidade realizava a ch´alla (um ritual de oferenda a Pachamama e purificação da casa, explicado a seguir) somente às terças-feiras de Carnaval, lembrando também do “Enterro do Pepino” no domingo subsequente à festa, chamado de “Domingo das Tentações” conforme seu relato.
No Carnaval da feira, as barracas vendem produtos que não são encontrados durante outros dias do ano, alguns deles são utilizados na ch´alla. O colorido das barracas ganha novos elementos comercializados somente nesta época: as bandeirinhas de plástico, a mixtura de papéis picados, serpentinas e confetes de papel, os confites (doces de açúcar coloridos), os coetillos (bombinhas), e incensos para a purificação dos ambientes. A ch´alla é um momento de libação com bebidas alcóolicas, e um ritual de festa e agradecimento a Pachamama; uma deidade andina (a mãe da totalidade ou a mãe-terra como é comumente descrita). Silva (2005: 47) descreve a mesa ritual detalhada no trabalho de Juárez (1995), El banquete Aymara; montada entre vários elementos com kuka (folhas de coca), a wiraq´uwa (uma erva do altiplano que ao ser queimada faz fumaça), álcool, vinho e objetos açucarados. Nesse ritual que é “realizado em várias situações da vida social, familiar e devocional, como a ch´alla na terça-feira de carnaval [...] quando se pede ao deus da abundância, o Ekeko, a realização dos desejos representados nos objetos comprados anualmente na Praça Kantuta”, vê-se o culto aos seus deuses ancestrais. Ainda o autor reuniu relatos de imigrantes que praticam o ritual:
[...] consiste em aspergir os cantos da casa com algum tipo de bebida, que pode ser cerveja, álcool ou vinho. Todos os espaços da casa são aspergidos, incluindo lugares de trabalho, bem como o pátio exterior. Além da aspersão é comum também espalhar mixtura (papel picado) nos vários cantos já orvalhados, bem como guloseimas, pequenos doces que são oferecidos a Pachamama. (SILVA, 2003: 76)
O autor registra que o ritual da casa na terça-feira de Carnaval é prática comum entre os bolivianos em São Paulo, “seja entre os de classe média, profissionais liberais, ou entre os trabalhadores e donos de oficina de costura [...] Trata-se de ritual privado e familiar, porém acontece também em lugares públicos, como bares e restaurantes, e em praça pública” (SILVA, 2003: 76). Silva (2003:77) presenciou o ritual da ch´alla descrito e finaliza o relato dizendo que “uma vez terminada a comensalidade, inicia-se a tradicional brincadeira de molhar o outro com água, a qual só é concluída quando todos estiverem devidamente encharcados de água, incluindo o pesquisador”. A alimentação no ritual será descrita em “Comensalidade na feira”.
Outra parte da pesquisa aconteceu na comemoração do Dia da Independência ocorrida em agosto de 2012. Durante o dia aconteciam desfiles de bandas e de danças folclóricas, onde os integrantes usavam vestes com penas e animadas com as cores da bandeira da Bolívia. A festa recebeu um grande número de imigrantes, e também a presença de visitantes da cidade que fotografavam as cenas da festa; as bandinhas de música organizadas, os grupos de danças folclóricas e as barracas de comida da feira. No meio da tarde foi realizado um grande desfile da bandeira Bolívia onde os participantes seguravam as suas extremidades e caminhavam organizados, participando dele muitas crianças pequenas com os rostos pintados. A solenidade aconteceu em toda a “avenida” montada na rua e ao final do desfile, já na própria praça, executaram-se os dois hinos nacionais e bradavam-se gritos de “Viva o Brasil o país que nos acolheu!” e “Viva a Bolívia!”. O momento era de comemoração que parecia ser duplamente enaltecida: em primeiro lugar a do Dia da Independência do país de origem, e em segundo lugar a presença no país que os acolheu, o Brasil.
A festa nessa ocasião ganha o sentido que Bueno (2008) reforça, porque “são ocasiões para as pessoas se reunirem e delas saírem fortalecidos”, sobre o exercício da “memória coletiva” nos “lugares de hospitalidade” e esse fortalecimento pode ser maior ainda, quando além da reunião, ela promove a oportunidade de se praticar à alteridade no espaço multicultural da cidade. A que se observar a comoção no momento da execução dos hinos nacionais, o sentimento de orgulho do público participante, diferentemente até da festa do Carnaval, a da Independência parece ter outro sentido. As saudades de casa indicam que ficam mais fortes as lembranças do que ficou pra trás, e a festa tem um valor simbólico único, em poucas palavras, saudades, orgulho e transmissão às gerações seguintes.
A feira da Kantuta e suas festas enquadram-se ao conceito dos “lugares de hospitalidade” definidos por Baptista (2008: 14). São locais que corroboram pela identificação das relações pessoais e ao pertencimento do grupo; “os lugares de autoctonia e de afirmação identitária”, por definição são lugares abertos ao outro, onde “a verdadeira riqueza ou identidade” não deve ser compreendida no campo material, mas a forma de apropriação e de partilha realizadas pelo grupo, que acontece entre a comunidade e os visitantes de fora. A hospitalidade pode ser um caminho para a prática da alteridade e as manifestações culturais dos bolivianos expressam a diversidade mantida, apesar de seu deslocamento a grande cidade, adentrando no contexto das migrações humanas e da “homogeneização de hábitos e costumes, com o consequente esvaziamento dos rituais que regem o vínculo social e marcam a identidade dos povos” relatados por Camargo (2004: 37).
A seguir os registros da comensalidade na feira, lembrando o conceito de Maffesoli (2004: 63) da “refeição como comunicação e socialidade humanas” e seu ponto de vista sobre a “progressiva destruição dos rituais do bem comer associados ao bem viver.”
O Sr. Carlos Danilo descreveu a comensalidade na feira: “é um espaço de comunicação, e encontro aonde famílias passeiam, as crianças brincam e alguns até trazem as suas marmitas de casa”, referindo-se ao momento de coesão do grupo. Nem todos que frequentam a feira consomem alimentos comprados no local, mas não deixam de ter um vínculo, mesmo que simbólico na refeição “em grupo”. Observa-se o aspecto da comensalidade no “nível da incorporação” descrito por Boutaud (2011: 1214), onde dentro da sociedade há a ingestão dos valores ligados aos alimentos que aparece na comida do dia-a-dia, e também o “nível do valor simbólico” do vínculo da refeição em conjunto, mesmo que trazida de casa.
A prática da comensalidade no local acontece quando as famílias dividem o momento coletivo da refeição, lembrando Schemeil (2012: 1199) em seu relato sobre “aquilo que é recebido hoje será devolvido amanhã” na reciprocidade que o momento contempla, onde “a refeição torna visível uma rede de solidariedade”, com a prioridade da partilha do alimento e do momento vivenciado.
A alimentação representada na feira remete às bases da cultura andina, dos produtos da terra e suas variedades; mantêm o sentido de identidade do grupo e representa um Patrimônio Histórico Cultural Boliviano, adaptado à cidade de São Paulo.
Recorre-se à ficha do Inventário Nacional de Referências Culturais - INRC (2009), no anexo de bens culturais, identificado pelo nᴼ 191, que havia inventariado como vigente o Ofício da culinária boliviana na cidade de São Paulo, na feira Kantuta e em restaurantes bolivianos da capital. Dentro do ofício da culinária boliviana, o bem identificado pelo nᴼ 205 do INRC (2009), do anexo de bens culturais inventariados, a salteña é um “alimento tradicional da Bolívia, feito de massa de farinha de trigo assada com recheios diversos”. Ainda o INRC (2009) descreve:
Comida preparada e apreciada por todo o território boliviano. No formato de um “pastel” assado, de massa de farinha de trigo, com recheios que podem ser de frango, carne, queijo. Como o recheio é muito líquido e quente, as pessoas costumam derramá-lo ao morder a salteña; por isso, às vezes os grupos apostam que quem derramar primeiro, paga a rodada de salteñas. Também costuma-se comê-la com colher (IPHAN, 2009: 2).
A salteña éum tipo de empanada assada, com dobras bem feitas nas bordas, recheio variado e caldo dentro. É elaborada por diversos vendedores, como a barraca “Salteñeria Los Caporales”, e a barraca do Sr. Carlos Danilo Soto Gomez Garcia. Don Carlos divulga seu “salgado ao forno com caldo especial” feito a base de carne ou frango. Antigamente vendia 1.000 unidades por domingo, mas segundo ele o movimento da feira caiu e atualmente ele vende de 500 a 600. A sua esposa Sra. Maria Margareth Von Lauer Amaral Soto trabalha com ele na barraca e atualmente o seu filho, Carlos Henrique Amaral Souto de 30 anos, dá a continuidade ao negócio, auxiliando o pai na tentativa de expansão.
As receitas utilizadas hoje são as mais diversas e seus recheios são de carne, frango, pernil, fricasé (carne suína e pimenta), queijo (uma receita própria que leva um molho inventado por ele). “Não existe no mundo uma comida igual à salteña” afirma. E respondendo o que distingue esta comida das outras, responde de imediato: o gosto. As características mais marcantes do produto são o aji amarillo, o caldo e a massa seca e crocante. Ele conta que também já fez recheios “abrasileirados”, como o de carne seca desfiada.
Falando sobre as motivações e satisfações do negócio, mostra-se um grande patriota: “nós cultivamos as nossas tradições e incentivamos o folclore, a culinária e o Carnaval de nossa terra natal”, estando sempre presente nos dias de festividades, nos recebeu no domingo de Carnaval para contar um pouco da tradição da festa, que o fez rapidamente em detrimento ao atendimento do público interessado em suas saltenãs.
Na comemoração do Carnaval, além das festas e danças, constata-se a ao final dos dias de festa o ritual da ch´alla e o momento da comensalidade festiva. Ao término do ritual de purificação, os participantes servem um almoço com pratos típicos da festa, entre eles o fricasé (cozido de carne de porco) e a sopa de mani (sopa de amendoim), e que foram encontrados na feira com exceção do puchero de Carnaval, uma sopa de herança espanhola, que leva carnes, legumes e verduras cozidas. Ao serem questionados sobre a sopa, nem todos os imigrantes da feira a conheciam. Apesar de ser típico em alguns lugares o prato não foi encontrado na festa e dentre algumas informações recolhidas, além de ser um prato substancioso (acredita-se que não apropriado para a comemoração que acontecia no local), é um prato caro pela variedade de ingredientes que o compõe, com diversos tipos de carnes, leguminosas e batatas.
Outra pioneira da feira, citada pelo IPHAN (2009: 2) é a Dona Berta Valdez natural de La Paz. Ela ainda trabalha esporadicamente ali, vendendo os anticuchos, também a linguiça boliviana assada elaborada com carne de porco e temperada com cominho, o frango assado na churrasqueira e as tripas com batatas. É muito raro encontrá-la no local, em uma única vez pode-se avistá-la na Festa do Dia da Independência. O espeto assado em brasa é elaborado com o coração do boi fatiado e temperado, e para acompanhar coloca-se um molho de amendoim picante e batatas cozidas e assadas.
As mulheres em grande parte estão à frente dos negócios na feira, um exemplo é a dona de uma barraca que vende as tucumanas rellenas; empanadas de massa fritas e recheadas com batata ou mandioca ou arroz, além da postre, recheada com banana. As tucumanas são servidas com molho de amendoim e molho de pimenta. A respeito da originalidade dos produtos ela conta que utiliza uma salsinha boliviana chamada quilquiña trazida de lá para a elaboração de suas receitas.
São comuns barracas vendendo a chicha uma bebida ancestral a base de cereais fermentados (nos Andes é comumente elaborada com o milho), mas também podem ser feitas de quinoa, de amendoim ou de frutas. Apesar da bebida no país de origem passar pelo processo de fermentação, no local as chichas vendidas não tem teor alcoólico.
Observa-se que a alimentação dos peruanos também está presente em barracas que vendem pratos tradicionais como o ceviche (a base de peixe cru, suco de limão, cebola, pimenta e aji amarillo), arroz com frango, causa rellena (purê de batata recheado), arroz chaufa (arroz ao estilo chinês), papa a La huancaína (batata com molho picante), picarones (bolinhos fritos servido com melaço de figo), entre outros pratos tradicionais.
Além das comidas prontas para comer, outro atrativo da feira são os ingredientes encontrados nas barracas que evidenciam a diversidade desta cultura. Em reportagem, do dia 03/02/2011 do jornal o Folha de São Paulo, "Hace calor", Rafael Mosna diz que “entre os achados, estão os tecidos nas tradicionais cores vibrantes, diversos tipos de pimentas, pães, chá de coca, muitos grãos, além de produtos industrializados como a cerveja Paceña e o refrigerante Inca Kola.” A cada semana chegam produtos diferentes, muitos são frescos que dependem da sazonalidade lá no país de origem, sendo possível encontrar milhos, batatas, pimentas que estão na época.
Como descrito por Maffesoli (2002: 131), a mesa é um espaço de comunicação, seja pelo comer pelo espetáculo ou como uma forma de se afirmar o indivíduo ao seu meio social. A evidência é a importância da comida natal para fortalecer os laços de identidade do grupo, reproduzir as receitas de infância, buscar de longe os ingredientes para a preparação. Assim mesmo no pluralismo da cidade, conseguem “substituir” produtos e pratos, por tantas outras variedades.
O presente artigo relatou parte dos resultados da pesquisa sobre a feira Kantuta de Cultura Boliviana na cidade de São Paulo. A origem da feira remonta à tentativa de fortalecimento do grupo deslocado e à intensificação de sua convivência; é um local de encontro onde à busca de integração do grupo permitiu o desenvolvimento de um lugar de hospitalidade, de receber e ser recebido, para prática dos costumes que estão se perdendo.
Dentro do contexto da feira Kantuta, nota-se o sentido múltiplo da prática das festas tradicionais bolivianas através do resgate da memória, da visibilidade e da convivialidade do grupo. Observa-se ali um sentido de valorização do outro, que muito embora possa ser uma interpretação subjetiva, pode-se vivenciar na maior parte das vezes em que a pesquisa foi elaborada.
Constatou-se que atualmente, muitas pessoas visitam o espaço criado a partir do encontro de bolivianos que resultou em um dos espaços tradicionais da cultura na cidade. Nasceu da adversidade enfrentada pelos imigrantes bolivianos na capital, sendo assim a alimentação encontrada no local também foi condicionada ao que se pode trazer ou encontrar similar na cidade. Notou-se o velho e o novo em harmonia, juntando-se às visitas de moradores da cidade de etnias diferentes.
É impressionante assistir a comemoração da festa da Independência e o desfile das bandeiras do Brasil, e da Bolívia, e as crianças pequenas participando: marcantes os gritos de “Viva o Brasil o país que nos acolheu!” e “Viva a Bolívia!”, enquanto as barracas de comidas estavam disputadas por um número cada vez maior de não bolivianos, além das famílias tradicionais com seus bebês nos carrinhos. Nesse dia ainda encontrar com uma jovem mãe orgulhosa com seu filho no colo comprando “Cocoa”, (chocolate em pó) para por no leite do café da manhã e a ouvir dizendo: “É mais gostoso que Nescau”!
Presenciaram-se muitas manifestações dos ritos religiosos ou folclóricos e das festas; os dias de orações ao “senhor” nos cultos evangélicos, as danças dos grupos, as festas que resgatam lembranças. Para os imigrantes um lugar de cultura e de refeição compartilhada, mesmo que cada um leve a sua marmita ou da família, como foi observado em alguns momentos.
Para os pesquisadores, um local onde se consegue conversar e ser bem recebido pelos vendedores das barracas, saber a sua origem, o que fazem no Brasil e como aprenderam a cozinhar. Pode-se passear tirando fotos, anotando tudo em um caderninho e a cada visita saborear um prato diferente, de comida de rua, acondicionada em isopores, mas que para eles são “os sabores da infância e de casa”, ambos que ficaram para trás; no momento em que partiram em busca de uma vida melhor na cidade de São Paulo.
Para os visitantes é um lugar de experimentar uma comida de rua adaptada da alimentação típica dos diferentes estados bolivianos: Cochabamba, La Paz, Potosí, Oruro, etc., ou até do Peru. Um lugar de levar os amigos e se sentar para comer uma saltenã fricasé, tão apimentada que arde até o nariz e depois “apagar o fogo” com uma cerveja Paceña gelada; pode-se fazer uma refeição completa nas barracas que as servem prontas ou experimentar um espetinho de anticucho com molho de amendoim picante.
Lembrando o Don Carlos quando perguntado sobre o imaginário do Patrimônio Cultural e sobre a identidade relativos ao grupo e a sua resposta: “A Kantuta é uma feira típica boliviana, onde se divulga o folclore, as comidas de várias regiões, cereais e música. É um espaço de comunicação, e encontro aonde famílias passeiam, as crianças brincam e alguns até trazem as suas marmitas de casa” – referindo-se ao momento de coesão do grupo. Sobre o ponto de referência da cultura boliviana presente em São Paulo finaliza: “a Kantuta é o Ibirapuera dos bolivianos”.
Mediante uma herança tão vasta, registraram-se alguns dos momentos de hospitalidade, de convivialidade e dos costumes alimentares adaptados à cidade de São Paulo nas refeições compartilhadas nos domingos de feira. Um motivo para fugir da rotina semanal e para os imigrantes manter viva a memória que tende a se apagar na vida corrida de uma grande metrópole como São Paulo. Vale ressaltar como a feira Kantuta é pitoresca e única na cidade, em seu contexto nota-se mais do que uma feira de rua, mas a união de pessoas convivendo, partilhando suas memórias e o conhecimento ancestral às futuras gerações.
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SITE CONSULTADO
MOSNA, Rafael, "Hace calor", diz, em SP, freguês de feira andina disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/turismo/870126-hace-calor-diz-em-sp-fregues-de-feira-andina.shtml acesso em 21/06/11
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