Marcos Eduardo Carvalho Gonçalves Knup (CV), Ataualpa Luiz de Oliveira y Frederico de Carvalho Figueiredo
1. Introdução
Em tese, uma Secretaria Municipal de Turismo (SETUR) direciona a atividade turÃstica de uma cidade, a fim de organizar, planejar e dinamizar o setor. Dentre as diversas ações normativas, legais e institucionais, existem também as ações mais subjetivas que norteiam a visão da secretaria e que é passada para o setor no sentido de uma coesão, através de uma narrativa integradora, entre seus atores para propiciar a “criação” de uma identidade coletiva. Dessa forma, uma secretaria municipal é responsável pela gestão da cadeia em nÃvel municipal e transmitir valores, normas, crenças etc para todos os outros atores da atividade.
Neste sentido, alguns autores asseguram que as teorias do Estado baseiam-se em uma associação entre unidades simbólicas e unidades sistêmicas o que seria a conexão entre Estado e nação, mas historicamente isso nunca funcionou. Portanto, o que se pretende estudar é a unidade simbólica de uma Secretaria Municipal de Turismo (SETUR) tomada como a estrutura geradora de identidade cultural, de sentimentos de pertencer e de entusiasmos coletivos. Já o setor turÃstico se constitui em um emaranhado de relações entre indivÃduos e organizações que interagem com o meio ambiente que os cerca, inter-relacionando diversos atores, do setor público ao privado, nos nÃveis federal, estadual e municipal, das empresas privadas, associações, instituições, comunidades etc.
No entendimento de cultura, aceita-se que esta possa ser, tanto direcionada, bem como ser influenciadora e influenciada em um determinado contexto interno e, ou externo. Diante dessa afirmativa, têm-se como problemas deste estudo as seguintes questões: Quais os principais pontos de influência da SETUR no turismo da cidade? Qual a percepção dos atores do turismo, inseridos no Conselho Municipal de Turismo, sobre tais influências? Qual a cultura adotada pela SETUR que transcorre para o turismo da cidade? Desta forma, considerando os aspectos metodológicos adotados, pretende-se atingir seu objetivo que é compreender a influência da SETUR na dinâmica do turismo a nÃvel municipal, sob a ótica da cultura.
No primeiro item de desenvolvimento deste artigo trata-se da cultura e seus aspectos antropológicos recortados através de dois autores, tratados aqui como principais para esta reflexão, eles são Franz Boas e Roy Wagner. Segue-se outro item que aborda a cultura organizacional, vista por meio da combinação de duas disciplinas, a administração e a antropologia. No terceiro item, chega-se ao poder simbólico do Estado e sua relação com a atividade turÃstica. Posteriormente, são considerados os aspectos metodológicos utilizados para a pesquisa empÃrica e expostos seus resultados e discussões. Finalmente, chega-se à s considerações finais.
2. Uma visão antropológica
A realização de um contorno bem definido do conceito de cultura constitui uma tarefa extremamente árdua. Mesmo para a antropologia que é a ciência que trata deste tema mais a fundo, isto ainda não foi extenuado. Portanto, não seria adequado partir de um pressuposto que a definição desta terminologia seria dada por antecipação.
Esta discussão inicia-se, portanto, de um clássico autor antropólogo, Franz Boas, que levanta a idéia de que a estrutura da mente humana explica as regularidades manifestadas nos fenômenos culturais. Para Boas (2008), a relação do indivÃduo com a sua cultura é a chave de uma verdadeira interpretação da conduta humana. Assim, antes de qualquer coisa, é preciso levar em conta que nenhuma dessas civilizações antigas foi produto da genialidade de uma única pessoa. Diversas provas mostram que idéias foram divulgadas, enquanto as pessoas entravam em contato umas com as outras.
É criticada por Boas (2008), por inúmeras vezes, a noção de culturas superiores e culturas inferiores, melhores ou piores. Ele advoga que existem culturas diferentes e que, por sua vez, determinam formas diferentes de comportamento. Cultura é entendida por ele como uma totalidade espiritual integrada que, de alguma maneira, condicionava a forma de seus elementos. A dinâmica da cultura está na interação entre os indivÃduos e sociedade.
Então, cultura pode ser definida, segundo Boas (2008), como o conjunto das reações fÃsicas e mentais e as atividades que caracterizam o comportamento dos indivÃduos compondo um grupo social coletivo e individual, em relação ao seu ambiente natural; para com outros grupos, aos membros do próprio grupo e para cada indivÃduo. Assim, ele desenvolve a idéia de que cada cultura tem uma história particular e considera que a difusão de traços culturais acontece em toda parte.
Dada a riqueza de invenções mencionada por Franz Boas conectada com a psiquê humana, um outro autor, Roy Wagner (1981), afirma que a necessidade de invenção é determinada através de convenção cultural, e a necessidade de convenção cultural é determinada através de invenção. Deste modo, semelhantemente à afirmação que Boas (2008) faz à tentativa de imputar um padrão de pensamento (controle) que a interação pode carregar, seria uma espécie de ilusão necessária, uma vez que as interações são o suporte para as invenções.
Partimos agora para as idéias de Wagner (1981), importante pesquisador antropólogo que influencia fortemente as discussões antropológicas contemporâneas, que discorre a partir da invenção, e ele afirma que o estudo da cultura é também cultura. Portanto, isto se trata de uma reflexão que os usos e definições de cultura ultrapassam os limiares acadêmicos do pensamento antropológico. Neste sentido, pode-se tratar a noção da cultura de que o antropólogo manipula um conhecimento e outros entram em interlocução com o conhecimento do antropólogo formulando outros conhecimentos, podendo estes ser os observados pelos antropólogos ou polÃticos e outros estudiosos que introduzem em seus discursos a cultura (BENITES, 2007).
Segundo Benites (2007) a invenção cultural é uma atividade vital de todos os seres humanos. Assim, o estudo da cultura também é cultura e, simultaneamente, a cultura é o instrumento para sua invenção, conclui-se isto a partir da visão de Roy Wagner.
Sabemos que os antropólogos estudam modos de vida ou culturas de civilizações, seja a sua ou outras quaisquer, assim a afirmação acima se refere aos estudos do antropólogo (observador) diante da outra civilização (observada) seja uma sociedade, tribo etc. Então, nossa cultura por si só é criativa e nossa criatividade inventa a cultura através da antropologia, no caso referido. Por vezes, sonegam (os antropólogos) que as observadas também podem ser ou são criativas. Isso acontece da mesma forma nas organizações quando um grupo especÃfico, normalmente de dirigentes ou gerentes (observador), criam ou pontuam uma determinada cultura organizacional para todos ali seguirem, dissimulando que outros integrantes (observados) possam também ter essa criatividade.
Essa idéia de Wagner (1981) da equivalência de observador e observado pode ser compreendida similarmente à afirmação de Boas (2008) sobre a correspondência da estrutura psÃquica do homem correlacionando-se assim à invenção cultural. Porém, o que se percebe é a sobreposição de culturas através do controle, no caso o primeiro sobre o outro, e isto pode também ser apreendido nas percepções sobre cultura organizacional, frente à sua “corrente dominante”.
3. A Cultura na Organização
Na tentativa de demonstrar a realidade da organização da maneira como realmente ela é, surgiu a necessidade de abordar uma perspectiva, não sendo a funcionalista, do meio organizacional. Neste sentido, considera-se que existem aspectos não formais e assim pode-se aproximar ainda mais da realidade complexa do meio organizacional. A cultura caracteriza um lado informal do comportamento dos indivÃduos, grupo social coletivo ou individual, e a organização é uma de suas partes integrantes.
Identifica-se em estudos sobre cultura organizacional a aceitação que esta é influenciada pelos estudos da antropologia. Dentre diversos relatos, inclusive cronológicos, desta associação entre as duas disciplinas, Barbosa (1996) coloca a importância de aplicar a noção básica da análise antropológica, ou seja, a relativização de conceitos, que consiste na verificação dos significados e o conteúdo social das categorias utilizadas serem os mesmos em um e outro universo social.
Elliot Jaques foi o predecessor da “corrente dominante” que ousou colocar as disciplinas - acima mencionadas – para conversar e criou a chamada “cultura de empresa”, segundo Aktouf (1993). Contudo, foi após a década de 70 que o termo cultura organizacional ou corporativa começou a ser reconhecida como um fator importante dentro das organizações, sendo relacionada com o seu desempenho econômico (BARBOSA, 1996).
Dois autores contribuÃram fundamentalmente para as diferenças dos estudos de cultura organizacional, eles são Edgar Schein e Geert Hofstede. Segundo Pires e Macedo (2006) a partir da visão de Chanlat, no entanto, delimita-se uma diferenciação, pois a abordagem de Schein é considerada uma visão antropológica sistêmica fechada por não considerar o contexto social em que a organização se insere, e a abordagem de Hofstede é considerada uma visão antropológica sistêmica aberta, por considerar tais fatores. Já segundo Barbosa (1996), diferenciando estes dois autores, coloca que existem duas direções bem distintas que seriam: o Schein (1984) enfatiza a idéia de culturas organizacionais marcadamente diferenciadas bem como o papel que o herói/fundador desempenha na modelagem dessa cultura; e o Hofstede (1985) que, ao contrário, atribui pouca ou nenhuma importância à s culturas organizacionais particulares, sublinhando a importância da cultura nacional na forma de administrar.
A identidade seria o entendimento compartilhado, por parte dos seus membros, do que a organização é, assim como o antropólogo Boas (2008) afirma a cultura ser a totalidade espiritual integrada, independente das influências internas e externas ao grupo. Existe congruência também no sentido dado pela Barbosa (1996, p. 16) quando ela afirma que:
A melhor forma de ver a natureza da cultura organizacional é considerar a cultura como um elemento bem menos substantivo. Cultura não é algo que se produz no interior de uma empresa ou se carrega pra dentro dela. É um sistema de sÃmbolos e significados de domÃnio público, no contexto do qual as tarefas e práticas administrativas podem ser descritas de forma inteligÃvel pelas pessoas que dela participam ou não.
Já sobre a noção de liderança, Andrade et al (2007) asseguram que os lÃderes são criadores e transmissores da cultura imposta aos funcionários. Schein (1991) escrevendo sobre o papel do fundador e lÃder na criação da cultura organizacional também expõe esta apreciação que cultura é aprendida e desenvolvida por uma variedade de mecanismos, explÃcitos e implÃcitos, freqüentemente baseado em ensinar explÃcito pelo fundador ou lÃderes posteriores. Assim como Aktouf (1993) afirma que a “corrente dominante” da cultura organizacional reveste os dirigentes como criadores de valores e identidades.
Deve-se ter cuidado para, adequadamente, ser considerada a criatividade dos funcionários da organização, que compartilharão o mesmo entendimento do que é aquela organização que fazem parte. Assim, entramos aqui na abordagem de equivalência das culturas abordada por Wagner (1981) frente a integração – dirigentes e funcionários acerca da cultura organizacional. Sonegar a criatividade dos funcionários, neste caso tão significante que é a cultura organizacional, a organização pode se comprometer ao fracasso.
Schein (1993) afirma que as organizações apresentam tendências em se dividir e diferenciar em subunidades de vários tipos, que desenvolvem suas próprias subculturas, com diferentes linguagens e visões da realidade. E que a inventividade cultural inerente ao homem, vista através de Wagner (1981) como vital aos seres humanos, pode ser identificada também no ambiente organizacional, através das invenções das culturas organizacionais. Assim, até mesmo as organizações públicas podem possuir linguagem e visões da realidade de uma maneira bastante especÃfica, como no caso de uma Secretaria Municipal de Turismo.
4. A relação: Turismo e Estado
O setor turÃstico se constitui em um emaranhado de relações entre indivÃduos e organizações que interagem com o meio ambiente que o cerca, inter-relacionando diversos atores, do setor público ao privado, aos nÃveis federal, estadual e municipal, das empresas privadas, associações, instituições, comunidades e outras variedades de coisas que o compõem. Ele é altamente interdependente e o sucesso de uma organização, de certa forma, está intimamente ligado ao sucesso de outra e a administração pública tem uma importância fundamental para dinamizar este setor.
Dentre os órgãos e instituições oficiais do turismo, a nÃvel municipal, encontram-se as Secretarias Municipais de Turismo. Implicitamente, percebe-se diante dos papéis de tais administrações públicas a tentativa para que possa existir uma identidade coletiva entre os diversos atores que constituem determinado setor, desde os que estão inseridos dentro dessas instituições públicas especÃficas (os dirigentes, secretários, diretores etc; e os demais funcionários, analistas, técnicos etc) e os atores que intercalam com ela (as empresas privadas do setor, a comunidade, associações etc). Isto pode ser comparado à narrativa integradora exposta por Eder (2003) como mecanismos importantes para o Estado, a fim de fornecerem espaços de coexistência entre as diversas identidades. Portanto, a necessidade do Estado em construir essas identidades coletivas vai de encontro com o fornecimento de uma narrativa integradora e, dessa forma, mobilizar para o reconhecimento e o pertencimento de diversas identidades coletivas em sentido próprio.
Ainda conforme Eder (2003), o Estado é capaz de influenciar a opinião pública por meio da polÃtica simbólica, o povo pode se juntar, formando um corpo democrático, ou se dissipar, buscas de identidades por comunidades. Desta forma, uma Secretaria Municipal de Turismo direciona a atividade turÃstica de uma cidade, a fim de organizar, planejar e dinamizar o setor. Dentre as diversas ações normativas, legais e institucionais, existem também as ações mais subjetivas que norteiam a visão da secretaria e que é passada para o setor no sentido de uma coesão, através de uma narrativa integradora, entre seus atores, para propiciar a “criação” de uma identidade coletiva. Deste modo, uma secretaria municipal é responsável pela gestão da cadeia a nÃvel municipal e por passar valores, normas, crenças etc para todos os outros atores da atividade.
Almeida (2000) refere-se sobre o poder de influência do aparato administrativo público, sendo que um aparelho ideológico de estado exerce influência sobre a forma pela qual uma sociedade seleciona as suas tradições, vindo, assim, a construir um discurso daquilo que seriam as suas tradições culturais. E de uma maneira mais incisiva, Eder (2003) afirma que o Estado nacional é um mecanismo de domesticação dos sentimentos coletivos, que atua unindo o povo em uma nação. Portanto, é a influência do poder público através dos aspectos culturais sob a luz da liderança (dirigentes) de tais organizações.
Assim, explicita-se a interface que se busca neste estudo: a relação entre a Secretaria Municipal de Turismo, organização pública administrativa, e a sua influência (controle), por meio de caracterÃsticas culturais, a todo um setor através das determinações de sua liderança, consentidas ou não pelos outros atores. Foca-se o papel do lÃder e sua relação de influência, interna e externa, para com uma organização pública e o setor de turismo.
5. Aspectos Metodológicos
A fim de buscar uma maior familiaridade com o problema da pesquisa, o presente estudo utiliza a pesquisa exploratória na tentativa de aprimorar idéias. Segundo Hair Jr. et al (2005, p. 83-84) este tipo de pesquisa pode ser útil quando “há pouca teoria disponÃvel para orientar as previsões” ou seja, “dispõe de poucas informações”. Implica em planejamento bem flexÃvel, possibilitando a consideração dos mais variados aspectos relativos ao fato estudado.
Complementando o estudo, também é utilizada a pesquisa descritiva que, como indica sua própria nomenclatura, descreve as caracterÃsticas de determinada população ou fenômeno. Além da pesquisa bibliográfica, utiliza-se técnicas padronizadas de coleta de dados, através de entrevista com um roteiro semi-estruturado (questões abertas). Assim, este tipo de coleta permite uma análise qualitativa dos dados obtidos com a pesquisa.
Diante do referencial teórico recortado para este estudo, buscaram-se elementos que disporiam de bases para uma pesquisa empÃrica e que trouxesse as caracterÃsticas simbólicas da influência da SETUR na cultura do turismo de uma determinada cidade, segundo a percepção dos membros do COMTUR e do secretário de turismo. Para tanto, utiliza-se de uma amostragem não-probabilÃstica por julgamento, uma vez que a amostra é escolhida pelo pesquisador sendo julgada a melhor para o estudo em questão (ALENCAR, 2000).
Acredita-se, que os integrantes de tal conselho, por se caracterizar por atores representativos do setor do turismo municipal, podem contribuir sobremaneira para elucidar as questões norteadores da presente proposta. Faz-se necessário mencionar que o COMTUR desta cidade tem por objetivo orientar, planejar e promover essa atividade no municÃpio. Atualmente é constituÃdo por 14 entidades representativas do setor.
Será utilizada a técnica de análise de conteúdo que, segundo Bardin (2006, p. 42) é “um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens”.
Diante desse tipo de análise, será adotada a técnica de análise temática que visa descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação e a freqüência de aparição podem inferir significados para o objetivo selecionado, assegura Bardin (2006). Esta é a técnica de análise de conteúdo mais antiga e a mais utilizada, segundo este mesmo autor.
6. Resultados e Discussão
Como proposta do presente trabalho, buscou, através da compreensão da fala dos membros do COMTUR e do secretário de turismo, identificar pontos e argumentos que sinalizassem para a cultura do turismo desta cidade, de modo particular, para a influência exercida nesse setor por parte do poder público, na figura da SETUR. Pode-se observar, a partir do relato dos integrantes do COMTUR três aspectos de relevância para a presente análise. Primeiro, a percepção atual e generalizada a respeito do turismo, num segundo momento, o enfoque na atuação da secretaria municipal e, terceiro, uma última parte que relata especificamente uma visão referente ao secretário de turismo.
Nessa direção, diversos atores comentam que, o turismo da cidade, vem passando por um processo de transformação, onde, sentem-se as mudanças, tanto no setor, como na cidade de um modo geral, incluindo-se aÃ, a população e sua identidade.
“De um tempo pra cá, a gente nota que existe um transformação cultural acontecendo na cidade, nas pessoas, na população. Mesmo que a mobilização das pessoas seja uma coisa difÃcil de acontecer, dá pra notar que as coisas estão diferentes. A idéia do turismo está modificando as pessoas” (Membro D do COMTUR).
“... dá pra ver que tem uma coisa diferente no turismo em (nome da cidade). Antes a Secretaria de Turismo não tinha nem estrutura pra trabalhar, hoje já atua articulando as pessoas do turismo. Isso tem ajudado muito o turismo, os turistas e as pessoas do turismo” (Membro F do COMTUR).
O fato de o turismo causar modificações na população, como citado pelos membros do conselho, está fortemente vinculado aos preceitos de Franz Boas, quando este menciona a dinamicidade e interação como pontos centrais na construção da cultura.
Para as pessoas que participam do COMTUR, as mudanças pelas quais a cidade vem passando, não se deve, única e exclusivamente a uma pessoa em especial, ou que tenha trabalhado de modo isolado. Essa transformação na cultura do turismo deve ser entendida a partir de um processo contÃnuo e histórico, com diversos fatos, ações e pessoas que contribuÃram de algum modo para o processo como um todo, semelhantemente ao que diz Franz Boas a respeito da cultura. Mas, apesar da ênfase na construção processual observa-se que, grande parte dos entrevistados demonstra a importância e a esperança no direcionamento que vem sendo e que deverá ser dado pela atual gerência da SETUR.
“O atual secretário de turismo vem demonstrando que entende e sabe o que faz. Acho que ele está trabalhando com uma cultura de unir as pessoas entorno do turismo. Ele parece querer resgatar a cultura trabalhando a população como um todo, tipo querendo agregar a todos” (Membro F do COMTUR).
“... acho que agora a cidade tá com gente que sabe o que faz. O pessoal da secretaria ta conduzindo bem o turismo. Só pra você ter uma idéia, outro dia a cidade esteve no noticiário da televisão, na globo! Isso não acontece todo dia. Acho que foi dedo do secretário! Ele é influente” (Membro C do COMTUR).
Outro ponto consensual entre os entrevistados, diz respeito à articulação que vem ocorrendo por intermédio do secretário municipal.
“A relação entre os atores parece querer começar a melhorar com o apoio da prefeitura” (Membro C do COMTUR).
“... é verdade que o pessoal (poder público e privado) ainda não ta falando a mesma lÃngua, mais parece que agora vai! Pelo menos, o secretário tá mais aberto a receber as pessoas. E isso já é um bom começo” (Membro F do COMTUR).
“É difÃcil mobilizar as pessoas, mais a transformação só vai acontecer pela mobilização dos diversos atores. E, a princÃpio, a nova gestão parece demonstrar esse entendimento. Uma coisa que a secretaria parece estar fazendo bem... é a idéia de criar um produto...” (Membro A do COMTUR).
Este último comentário, do membro A, revela uma perspectiva, que está presente na fala de diversos membros e ainda, sinaliza para um posicionamento da secretaria em busca de uma expansão para o setor turÃstico na cidade. Assim, algumas pessoas comentam que a secretaria municipal parece ter como objetivos para o turismo uma projeção internacional para a cidade. Nesse sentido, pode-se observar que a SETUR parece dar sinais de um direcionamento no setor do turismo na cidade, seja articulando atores, seja propondo um caminho, seja na divulgação, seja no apoio a projetos.
“Posso dizer que a secretaria, hoje, na atual gestão, é peça chave da cidade!” (Membro A do COMTUR).
“... e pelo pouco tempo que eles estão aà (gestão iniciada em janeiro de 2009) parece que eles sabem o que fazem, dando uma direção pro turismo” (Membro D do COMTUR).
“A secretaria é quem direciona... as parcerias, ...é um papel de empreendedor do turismo. Divulgando e montando eventos, apoiando as pessoas envolvidas no turismo. É isso, ela tem poder de influenciar no apoio, no incentivo e divulgação” (Membro F do COMTUR).
Para alguns membros do COMTUR, a atual gestão da secretaria municipal passa ter planos e caminhos para efetivar seus objetivos. E, nas palavras de A, representante da entidade de Hotéis e pousadas do municÃpio o atual secretário de turismo dá sinais de possuir caracterÃsticas importantes para o desenvolvimento do setor na cidade.
“Ele é empreendedor! Demonstra que tem idéias e as coloca em prática. Pelo menos algumas (risos). É ainda, sensÃvel. O próprio já me procurou para conversar sobre o turismo na cidade. E parece que fez isso com outras pessoas também. Deve estar querendo conhecer as pessoas e o turismo na cidade, para que assim, possa articular as demandas com os potenciais locais. E, além disso, tudo, ele é provocador. E isso, no sentido bom da palavra, ou seja, tem a capacidade de mexer com diversos setores da cidade, mesmo os que não estão diretamente envolvidos com sua carta” (Membro A do COMTUR).
Realmente foi constatado, através da entrevista do secretário, que ele é um empreendedor. O mesmo possui uma empresa na área de eventos e que atua em diversas cidades turÃsticas do paÃs, apesar também de possuir uma larga experiência, 12 anos, em secretarias de turismo de outras duas cidades vizinhas.
“Eu quero é resultado, eu te passo uma função, se você fizer ela em três dias pra mim e não vier trabalhar nos restantes dos dias, eu não quero saber o que você está fazendo nos restantes dos dias, eu quero que você me dê resultados” (secretário de turismo).
“meu trabalho na área de turismo é com a promoção, eu tento promover a cidade fora, porque hoje você tem cidades bonitas e maravilhosas no mundo inteiro, né, mesmo aqui no Brasil, você assim, tem que entrar no inconsciente coletivo do turista, você tem que tá na mÃdia, é igual um artista. O artista que tá na mÃdia é que tem publico, a cidade turÃstica é a mesma coisa, ela tem que tá na mÃdia, de uma forma ou de outra, ela tem que tá aparecendo, tem que tá acontecendo, você faz coisas interessantes na cidade que quem vê diz: lá é interessante, acontece isso. Então, meu trabalho é promover, eu promovo, crio coisas novas, mas também trabalho muito em cima do que já existe” (secretário de turismo).
É perceptÃvel, através da fala do secretário, a expectativa que os atores do turismo da cidade tem em relação a ele. Pode-se inferir que o mesmo é visto como um herói, fazendo uma analogia com a teoria de cultura organizacional, como se percebe na passagem abaixo.
“Como eu fiz um trabalho legal (em outras cidades) as pessoas tinham uma expectativa muito grande, eu vim trabalhar aqui, porque a associação de pousadas e hotéis fizeram um acordo com o prefeito, eu nem sabia disso, um abaixo-assinado, se ele (atual prefeito) entrasse, ele ia me convidar para trabalhar aqui” (secretário de turismo).
Seu primeiro trabalho foi a tentativa de resgatar o carnaval da cidade que, segundo ele, estava deteriorado. Ele começou a trabalhar dois meses antes de entrar oficialmente no cargo, portanto, sem remuneração. Tentou uma integração com outras cidades turÃsticas para fortalecerem uma modalidade peculiar do carnaval, o que ele chama de “um produto nosso”, diferente de todos os outros carnavais do Brasil, levando as cidades, logo no inÃcio do ano, para a mÃdia nacional.
“A gente tem que valorizar a nossa cultura, porque tudo que você valoriza a sua história, você tem força pra ser reconhecido, é, no mundo inteiro. Quanto mais globalizado, mais regional estão ficando as coisas” (secretário de turismo).
Além das peculiaridades que a cidade possui, ele tem várias idéias, planos e projetos para a consolidação de outros atrativos turÃsticos para a cidade, como incentivar o cicloturismo na cidade, através da construção de uma ciclovia e criar um Roteiro dos Butiquins, entre outras coisas. Ele também criou o Conventions & Visitors Bureau que visa trazer eventos de fora para a cidade, a fim de atrair o turismo de negócios, e disse que já conseguiu verba do governo do estado para construir um novo centro de convenções.
“Naturalmente a cidade tem um posicionamento (em relação ao turismo), inicialmente você tem que ver esse posicionamento e reforçar esse posicionamento, tem cidade que não tem posicionamento e você tem que criar esse posicionamento” (secretário de turismo).
Também é verificada a preocupação do secretário nos aspectos integrativos entre os atores da cidade e a SETUR para o direcionamento do setor de turismo, confluindo assim, para o que diz a teoria sobre cultura. Portanto, existe um cuidado do secretário de não transpor os saberes ou as individualidades dos que já estão envoltos no processo ou na atividade.
“Eu trabalho direto com todos os atores (do turismo), eu trabalho, eu incentivo a formação de associações, hoje mesmo eu tenho uma reunião com a associação de guias, to discutindo com eles como vamos trabalhar juntos. Reativei a reunião com a associação de artesãos, já estamos preparando um treinamento para os artesãos(...). Eu trabalho com a associação comercial direto, é... Estou sempre buscando forças, porque todo mundo tem que trabalhar, eu gosto de falar, gente vocês tem que fazer, vocês não vão achar que eu vou puxar esse trem sozinho não, eu cobro muito do empresariado” (secretário de turismo).
“Cada um busca fazer uma participação, mas é meio assim, cada um dando um tiro prum lado, o que eu to tentando ver agora é o que eu falei, vamos concentrar, vamos ver o que a gente tem em comum com os eventos, as ações, e vamos nós todos da cidade usar a força nossa pra aquilo viabilizar, ao invés de cada um ficar criando projetos à parte, então isso é outra coisa pra gente planejar junto, eu to começando a fazer isso” (secretário de turismo).
“Eu trabalhei no meu plano de governo em cima da expectativa da cidade” (secretário de turismo).
“A secretaria faz isso, ela cria polÃticas, ela dá direção, torcendo para que o empresário venha atrás, ele desenvolve pousadas, ele constrói restaurantes, cria empresas de transportes, toda a economia é movimentada, né!” (secretário de turismo).
Posto tais argumentos, e tendo por base o referencial tratado anteriormente, a partir da compreensão e visão de alguns membros do COMTUR, bem como do secretário de turismo, observa-se uma possÃvel influência e direcionamento do setor nessa cidade, isto, a princÃpio, pautado pela atual gestão pública do turismo.
7. Considerações Finais
Neste estudo, traçam-se caracterÃsticas da antropologia e da administração no que diz respeito à noção de cultura, vista através de óticas distintas, mas que transpõem caracterÃsticas análogas. Dessa forma, é possÃvel delimitar a abordagem dita “cultural” destas duas disciplinas a um setor especÃfico, que é o turismo, e sua relação com a influência de um órgão público norteador, a nÃvel municipal, que é a Secretaria de Turismo.
Através da pesquisa realizada com o COMTUR, podem-se notar três aspectos de relevância que nortearam a análise em questão. Eles são: a percepção generalizada a respeito do turismo; a atuação da secretaria municipal e; uma visão referente ao secretário de turismo. É importante ressaltar, mesmo que os entrevistados tracem comparações com o que ocorria anteriormente no turismo da cidade, nesta pesquisa abordam-se percepções a respeito da atual gestão da secretaria de turismo, ou seja, a gestão iniciada em 2009.
Dessa forma, é possÃvel apontar que esse atual secretário está sendo visto como um herói para o setor nessa cidade, pois os entrevistados vislumbram-no como a pessoa correta e que tem potencial para desenvolver a atividade, ocorrendo uma analogia ao que expõem a teoria sobre cultura. Assim, quando se fala dos pontos de influência da SETUR no turismo da cidade, podem-se mencionar aspectos de mobilização, transformação cultural e o sentimento de pertença. Finalmente, confluindo para o entendimento e a integração do que a SETUR e o COMTUR querem para o turismo da cidade, a fim de desencadear uma gerência compartilhada e que agregue estratégias conjuntas para desenvolver a atividade turÃstica.
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