AJUSTE FISCAL E GASTOS SOCIAIS NO BRASIL: a estabilidade em detrimento da eqüidade a partir das influências do FMI e Banco Mundial (*)
Por Carlos Nelson dos Reis, Lessi Pinheiro, Letícia Ribeiro y Mara Oliveira§
A grande transformação (1) ocorrida a partir da década de 70 foi resultante da saturação do padrão de reprodução capitalista, que vinha, desde o final da década de 60, apresentando, junto aos países centrais, sinais de declínio: baixo crescimento econômico, queda nas taxas de lucros, variações de produtividade, dentre outros. A recessão generalizada da economia capitalista atingiu todas as grandes potências econômicas, com um novo período de crise do capital, pelo esgotamento de uma longa onda expansiva (OLIVEIRA, 2005). Essa nova fase de crise do capital derivou-se de um conjunto de múltiplas determinações, que foram desenvolvidas, de modo cumulativo, nos períodos de expansão capitalista. “Decorre de fatores estruturais e não apenas conjunturais, políticos e sociais, tais como, por exemplo, o desmoronamento do sistema de Bretton Woods, ou, ainda, a alta do preço do petróleo no mercado internacional, ou mesmo das lutas operárias e sindicais.” (ALVES, 1996, p. 113).
Esse contexto de crise de um modelo social de acumulação e de reestruturação produtiva impôs novas formas de produção, organização e gestão do trabalho e novas estratégias, que permitissem a rearticulação da política econômica internacional, visando à recuperação de seu ciclo de reprodução, tão necessária à manutenção da hegemonia global sob a égide do capital (OLIVEIRA, 2005).
A crise econômica mundial propagou uma “crise” de balanço de pagamentos nos países periféricos, principalmente a partir da década de 80, o que acarretou uma “[...] enorme sangria de recursos [...] junto com sua expulsão do mercado internacional de crédito [tendo] como conseqüências a explosão inflacionária e a estagnação econômica da ‘década perdida [década de 80]” (FIORI, 2002, p. 82). Tal “crise” obrigou os países latino-americanos a se subordinarem às políticas de ajuste estrutural determinadas pelos credores – organismos internacionais e governos dos países centrais –, em troca da renegociação de suas dívidas e do retorno ao sistema financeiro internacional. Isso permitiu que “[...] a estratégia de ‘cooptação seletiva’ se associasse de forma mais clara e definitiva ao projeto de restauração na periferia latino-americana” (FIORI, 2000, p. 79) e ao enunciado liberal vigente, definido por mercados desregulados, economias abertas e exportadoras e Estado não interventor. O enunciado liberal para a América Latina está condensado no intitulado Consenso de Washington (2) que teve a chancela do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (BM).
A América Latina aplicou essa proposta de reforma, “com firmeza”. O motivo atribuído foi o de que “[...] as economias estatizadas da América Latina se haviam deteriorado [...] nos anos 80 [...]” (BIRDSALL; LA TORRE, 2001, p.11), havendo necessidade de mudanças, e a única mudança veiculada como possível pela elite dominante e aceita por quase todos os países da região era através do chamado ajuste estrutural. Para efetivar a proposta, a América Latina recebeu “vigoroso” respaldo de instituições internacionais, reforçado com créditos vinculados às reformas e condicionantes de aplicação.
No Brasil, a implementação do ajuste estrutural teve como preocupação inicial a negociação da dívida externa (ainda na década de 80), concluída no início da década seguinte. A seguir, a busca pela estabilização dos preços foi a prioridade da política econômica. Nesse cenário, o tema ajuste fiscal passou a monopolizar a atenção dos economistas e dos políticos brasileiros, sendo considerado imprescindível para a obtenção da estabilidade de preços e para a sua manutenção.
O debate econômico centrado na relação déficit público e processo inflacionário levantou argumentos de economistas ortodoxos e heterodoxos, cujas posições conflitavam. Pela visão ortodoxa, a inflação era um fenômeno ligado ao desequilíbrio fiscal, causado pela emissão monetária necessária ao seu financiamento. Já os heterodoxos enfatizavam a importância da inércia na explicação das causas da inflação, sem dar importância à necessidade de ajuste fiscal. Medidas ortodoxas e heterodoxas alternavam-se na elaboração dos planos de estabilização, alguns deles contendo, simultaneamente, elementos das duas correntes.
Entretanto os sucessivos insucessos da política econômica, na década de 80, deixaram claro que o ajuste fiscal não deveria ser uma medida isolada, mas um processo que visasse compatibilizar receita e despesa, criando um equilíbrio intertemporal das contas públicas nas diversas esferas do governo, sem depender “[...] da inflação para conservar a despesa real contida e que permitisse ao setor público ter um déficit fiscal reduzido, com base em medidas de caráter estrutural, que implicassem uma solução definitiva do déficit público” (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001, p.147).
Na década de 90, as restrições dos gastos públicos passaram a ser ditadas pela necessidade de geração de superávits primários no âmbito do acordo com o FMI e pela Lei de Responsabilidade Fiscal, a partir do ano 2000. A estratégia, apesar de bem-sucedida no combate à inflação, teve consideráveis custos sociais. Este artigo tem como objetivo particularizar a análise do ajuste fiscal brasileiro e a sua dimensão sobre os gastos públicos sociais. Para tanto, o texto está estruturado em três itens, além de introdução e considerações finais. Inicialmente, são apresentadas as alternativas disponíveis para a efetivação do ajuste fiscal; num segundo momento, reflete-se sobre a economia política do ajuste e suas repercussões; e no último item, mostram-se as implicações do ajuste fiscal nos gastos públicos sociais.
1 As alternativas para a realização de ajustes fiscais
A visão sobre o déficit público vem-se alterando ao longo das duas últimas décadas. De maneira geral, os déficits ocorrem por razões de ordem puramente fiscal e, em alguns casos, por razões de ordem político-institucionais. Se, por um lado, parcela significativa dos gastos públicos está vinculada a um conjunto de encargos ligados a antigas decisões orçamentárias e ao funcionamento corrente da administração, não refletindo medidas novas (3), por outro, as receitas do Estado estão sujeitas a certas restrições de financiamento. Caso as receitas definitivas, provenientes de tributos ou venda de ativos públicos, não forem suficientes para financiar os seus gastos, o Estado passa a ter uma necessidade de financiamento (GENÉREUX, 1995). Teoricamente, são três as principais possibilidades para cobrir as necessidades de financiamento: o aumento dos impostos, a emissão monetária e empréstimos junto aos poupadores.
Quanto ao aumento de impostos, a margem de manobra é muito estreita. Muitas vezes, os governos hesitam em utilizá-la, pois se trata de uma medida de difícil reversibilidade. Assim sendo, existem dificuldades para contar com aumentos de impostos para financiar gastos públicos. Outro ponto importante é o espontâneo encolhimento das receitas fiscais e a elevação de gastos nos períodos de redução do ritmo de crescimento, fato que pode provocar ou acentuar o déficit orçamentário (GENÉREUX, 1995).
O financiamento dos gastos do governo através da emissão de moeda, que consiste em solicitar ao Banco Central a emissão direta de moeda, além de ter efeito inflacionário, é um recurso que pode ser limitado pelo grau de independência do Banco Central.
Uma possibilidade de financiamento não inflacionário são os empréstimos públicos. Esses empréstimos suprem a necessidade de financiamento sem gerar inflação, porque recorrem à poupança disponível, absorvendo moeda já em circulação, não induzindo novas emissões (GENÉREUX, 1995). Trata-se de um endividamento, pois obriga o pagamento de juros e o pagamento do capital ao final. O aumento da dívida pública tende a elevar as futuras despesas financeiras do governo. Como se observa, o setor público disputa recursos da poupança interna com o setor privado. Essa disputa provoca pressão sobre a taxa de juros, já que o governo, quanto mais precisar de recursos para o seu financiamento, mais aumentará o prêmio sobre eles, o que desvia recursos dos investimentos privados.
Evidentemente, existem restrições ao endividamento, senão os governos gerariam déficits infinitamente. Essas restrições dizem respeito ao mercado, às instituições e à inflação. Quanto ao mercado, à restrição dá-se em virtude de que uma dívida fecha as possibilidades de endividamento futuro. Quanto às instituições envolvidas na execução da política fiscal, estas são chamadas a ter um comportamento responsável, principalmente nas economias desenvolvidas, e servir de contrapeso para entrar em ação quando o déficit se torna muito elevado. A restrição é o risco de inflação,
[...] se o déficit for muito elevado e não houver como financiá-lo através da colocação de novos títulos, só resta ao governo à alternativa de fazer isso através de emissão monetária. Esta, porém, ao gerar expansão dos meios de pagamento muito superior ao aumento da quantidade de bens e serviços da economia, tenderá, mais cedo ou mais tarde, a se refletir no nível de preços (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001, p. 210).
A questão relevante é: em que ponto a dívida pública de um país se torna preocupante? A fixação de valores nominais da moeda nacional para dimensioná-la não é usual, uma vez que vários fatores a influenciariam, haja vista os períodos de inflação. Desse modo, via de regra, a preocupação refere-se à relação dívida/PIB. A fixação do patamar dessa relação está ligada ao desempenho fiscal, à composição e ao custo da dívida. Por isso, quanto mais sólido e desenvolvido for o mercado de títulos públicos e, muito importante, com juros pré-fixados, maior poderá ser a proporção da dívida na forma de papéis de longo prazo (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
Existe vasta literatura (4) mostrando a relação direta entre inflação e déficit público, devido aos seus efeitos sobre a receita. Isso se dá porque a inflação reduz a receita tributária em termos reais, em razão da defasagem entre o fato gerador dos impostos e o seu efetivo recolhimento, o chamado efeito Tanzi (5).
Diferentemente, no debate brasileiro sobre os efeitos da inflação no déficit público, teve importância o efeito sobre as despesas (6), o chamado efeito Patinkin (7), que “[...] sugere que a elevação dos preços pode proporcionar a redução do déficit público por meio da queda real dos gastos públicos. Para isso ocorrer, basta o governo adiar pagamentos e postergar aumentos de salário num ambiente de aceleração inflacionária” (REZENDE, 2001, p. 284). Com inflação alta, retardar os pagamentos é eficaz para controlar a evolução das despesas.
As questões relacionadas aos ajustes fiscais são sempre cercadas de controvérsias, existindo um grande número de propostas de execução. De maneira geral, pode-se afirmar que o ajuste fiscal é obtido através de aumentos de receitas ou de cortes efetivos nas despesas, ou, ainda, por um conjunto seletivo de medidas fiscais que atinja receitas e despesas conjuntamente.
Considera-se uma receita qualquer a “[...] entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondências no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo” (BALEEIROS, 1973, p. 126). O orçamento das receitas é um quadro analítico com estimativas de arrecadação de cada um dos tipos de receita da instituição, sendo os seus procedimentos disciplinados em outros âmbitos, especialmente o da legislação tributária (GIACOMONI, 2002).
A tributação pode ser classificada como direta ou indireta. Os impostos diretos são os que incidem sobre a renda ou o patrimônio do indivíduo, e os impostos indiretos são aqueles que recaem sobre as transações com mercadorias e serviços. Ancorados em argumentações sociais e econômicas, os especialistas em finanças públicas recomendam a preponderância dos impostos diretos sobre a renda em relação aos indiretos. Os impostos sobre a renda são uma forma superior de tributação frente aos impostos sobre a produção e a comercialização, por não interferirem na formação dos preços.
As medidas para promover o ajuste através do aumento das receitas podem orientar-se para o aumento da alíquota cobrada sobre um imposto já existente, ou para a criação de um novo tributo. Qualquer que seja a escolha, ela envolve uma decisão sobre em que agente ou conjunto de agentes econômicos o ônus irá recair. Entretanto é necessário chamar atenção para que
[...] os impostos que mais ferem a sensibilidade dos contribuintes e despertam, no espírito deles, a consciência fiscal são exatamente os mais justos e de mais benéficos efeitos econômicos: os diretos e pessoais, como sobre a renda, sobre a herança, sobre a propriedade, elementos seguros de capacidade contributiva.
Em contraste, a anestesia fiscal é apontada como característica dos impostos de consumo e outros indiretos e reais. Raras pessoas reparam no valor do selo colado aos sapatos, cigarros ou fósforos e raríssimas meditam que esses impostos são regressivos ou inversamente progressivos, isto é, retiram aos pobres maior percentagem de recursos do que aos ricos, já que os artigos de alimentação e vestuário absorvem a quase totalidade dos salários e apenas pequena parte dos altos rendimentos das classes abastadas (BALEEIROS, 1973, p. 196 e 197).
A percepção do impacto do aumento da carga tributária, muitas vezes, não corresponde à realidade, uma vez que há dificuldade de se preverem os efeitos econômicos da tributação. A chamada “consciência fiscal”, a percepção do montante dos sacrifícios em dinheiro para a manutenção dos serviços públicos, é difícil de ser implantada. Grosso modo, pode-se afirmar que a parcela da população atingida pelos impostos diretos sabe o que lhe cabe na divisão dos custos da máquina governamental, porém a grande maioria, que não paga imposto de renda, mas não tem como fugir dos impostos indiretos, não acredita, ou sequer sabe, que seus interesses são comprometidos quando ocorre a elevação de uma alíquota.
A despesa pública é a parte do orçamento onde estão classificadas as autorizações de gastos destinados a atender às atribuições e às funções governamentais. Desde a instituição do Estado moderno, observa-se o fenômeno do crescimento das despesas públicas quaisquer que sejam as condições geográficas, econômicas, sociais ou políticas vividas pelos países. Distintas correntes econômicas têm procurado explicar as causas do aumento dos gastos públicos.
Um dispêndio público pressupõe o uso de recursos para atender a um objetivo público. Assim sendo, em “[...] todos os tempos e lugares, a escolha do objetivo da despesa envolve um ato político, que também se funda em critérios políticos, isto é, nas idéias, convicções, aspirações e interesses revelados no entrechoque dos grupos detentores do poder” (BALEEIROS, 1973, p. 86).
A despesa pública deve ser analisada sob os aspectos político e técnico. É o aspecto político que determina qual o objeto dos gastos públicos, ou seja, decide qual necessidade pública será atendida pelo processo do serviço público. Uma vez tomada a decisão, cabe aos técnicos a execução com o máximo de eficiência e o maior rendimento para a sociedade.
Assim, quando da existência de um déficit fiscal persistente e levando em conta as alternativas de que dispõe, se o governo decidir realizar o ajuste fiscal, ou não, a segunda decisão refere-se a como fazê-lo. Existe um grande número de opções e combinações de ajuste para um mesmo objetivo de redução do déficit, opções que não são excludentes e que, naturalmente, afetam grupos diferentes de pessoas. Caso a opção seja a redução das despesas, é necessário decidir quais áreas e/ou ministérios serão afetados. Se a redução for executada através de corte nas despesas de investimentos públicos, acabará por provocar contração no produto e no emprego, no futuro. Uma redução nas despesas com as transferências tem um efeito negativo imediato para aqueles que deixam de receber um benefício.
Se a opção for o aumento das receitas, é necessário decidir se este se dará nos impostos diretos ou indiretos, em que imposto específico e como será feita a intervenção. Uma vez tomadas essas decisões, existem ainda outras escolhas: as alíquotas podem ser uniformemente reajustadas, ou somente em alguma das faixas; ou, ainda, a intervenção pode ser uma redução nos limites de isenção, o que poderá fazer com que mais pessoas ou empresas que não pagam o imposto passem a pagá-lo.
O ajuste fiscal levado a cabo no Brasil, a partir da década de 90, caracterizou-se pela elevação da carga tributária. Quanto à distribuição do ônus, a expansão da carga tributária em termos do PIB basicamente se deu “[...] através da ampliação da arrecadação de impostos indiretos e contribuições sociais, considerados regressivos por recaírem indiscriminadamente sobre os contribuintes e interferirem na alocação de recursos” (PINHEIRO, 2005, p. 187). A arrecadação total passou de 21,4% do PIB em 1991 para valores acima dos 33% do PIB a partir 2002, sendo mais de 50% dessa arrecadação representada por impostos indiretos. No ano de 1994, a arrecadação de impostos indiretos representou 59% da arrecadação total (PINHEIRO, 2005).
2 Repercussões: a economia política do ajuste
A decisão de realizar um ajuste fiscal, como a maioria das decisões públicas, traz modificações na repartição das vantagens e dos inconvenientes para grupos de indivíduos que participam das atividades do país. As decisões de política econômica suscitam questões do que é bom para a sociedade, quem deve ser o beneficiado pelas intervenções do Estado e como conciliá- -las com a liberdade de ação dos indivíduos (GENÉREUX, 1995).
A análise puramente econômica não pode definir por antecipação o nível considerado bom de um objetivo, nem a repartição precisa dos custos e dos benefícios (8), ou seja, no
[...] plano metodológico, impõe-se aqui uma conclusão. Do ponto de vista estritamente científico, não existe boa nem má política; há somente instrumentos eficazes ou ineficazes para atingir um dado objetivo. Mas a definição dos bons objetivos é uma questão política, e até moral ou filosófica. Por conseguinte, não se pode colocar um economista à frente do Estado e exigir que ele pratique boas políticas econômicas. A definição destas políticas resulta de um debate político e desemboca nas decisões de políticos cujo problema fundamental não é aplicar da melhor maneira os resultados da ciência econômica (GENÉREUX, 1995, p. 93).
A possibilidade de os políticos se orientarem por motivações puramente técnicas é também contrariada por duas objeções, uma técnica e outra metodológica. A objeção técnica está ligada ao fato de ser impossível definir de maneira incontestável o interesse geral, o que deixa certa margem de manobra aos agentes tomadores das decisões. A democracia direta é relativamente limitada, já que consultas sobre cada questão, além de não garantirem a definição clara do interesse geral, apenas aumentam os custos da democracia, ao multiplicarem as negociações e as votações. A forma mais utilizada é a representativa. Entretanto, na democracia representativa, os indivíduos pronunciam-se sobre um programa geral e sobre quem irá representá-lo por um período. Quanto à objeção metodológica, esta se refere à idéia de que os políticos buscam o interesse geral, mesmo contrariando a metodologia utilizada na análise econômica, uma vez que esta se apóia na racionalidade dos indivíduos. Tal racionalidade é uma premissa que não tem garantia de realização (GENÉREUX, 1995).
Assim, utilizando o conceito de mercado político, as decisões são tomadas mediante a interação entre a demanda de indivíduos, os grupos de pressão e oferta de partidos e líderes políticos. Os indivíduos exprimem as suas demandas políticas de acordo com os seus interesses e concepções do interesse coletivo, sem que haja garantia de que eles saibam sempre e com precisão as melhores políticas para atendê-los. Os grupos de pressão reúnem indivíduos que tentam centralizar e homogeneizar as suas demandas (GENÉREUX, 1995).
No que se refere à oferta política, ela é feita pelos políticos visando, principalmente, à conquista e à manutenção do poder e à sua parcela de mercado, que é representada pela cota da opinião pública que lhe é favorável e pelas porcentagens de mandatos obtidos nas eleições.
Em que pesem todas as ponderações sobre o mercado político, o problema maior que os governos enfrentam, quando um país se encontra em situação de desequilíbrio fiscal grave e a opção é realizar o ajuste, é definir sobre quem irá incidir o ônus do ajuste. Mesmo que a sociedade como um todo considere um benefício e esteja a favor do ajuste, pode persistir a tendência de que os agentes econômicos, considerados individualmente, não estejam dispostos a arcar com esse ônus (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
A grande questão para a resolução das crises fiscais é a distribuição do ônus do ajuste entre os diversos setores sociais. Mesmo que haja consenso sobre os benefícios do equilíbrio fiscal, os agentes econômicos tendem a evitar o custo desse ajuste e pressionam o Executivo para não fazerem parte do esforço coletivo, utilizando, para isso, os instrumentos políticos de que dispõem. Nas questões que dizem respeito à tributação, “[...] os grupos beneficiados costumam ter força política suficiente para bloquear as iniciativas destinadas a cortar os seus benefícios, mas não têm o poder de impor uma taxação direta ao resto da sociedade [...]” (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001, p. 359). Os impasses gerados por esse processo podem provocar uma espécie de paralisia fiscal, resultante da assimetria existente entre os custos e os benefícios das políticas de ajuste.
Como cada grupo atua em seu favor e não contra os outros, as pressões sofridas pelo Poder Executivo acontecem no sentido de impedir cortes de gastos ou de isenções, sem que haja pressões equivalentes na direção contrária. Essa situação tende a paralisá-lo, impedindo uma reação eficiente nas situações de desequilíbrio que podem ser criadas (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
As ações que envolvem o orçamento público não dependem exclusivamente de decisões administrativas do governo, devendo ser submetidas ao Poder Legislativo, sujeito a processo cujo manejo é, muitas vezes, difícil e lento. Da mesma forma, a pressão da opinião pública é particularmente intensa quanto às questões orçamentárias. Assim,
[...] no caso de um país que tem um déficit que deve ser cortado, por trás de cada rubrica do orçamento haverá milhares – ou até milhões – de famílias dispostas a se manifestar, intensamente, através de passeatas, greves, pressão sobre parlamentares, etc., ou silenciosamente, através do seu voto na eleição seguinte – para evitar que o corte se dê exatamente na “sua” rubrica e/ou que o aumento dos impostos incida sobre elas (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001, p. 344 ).
Questão relevante é a de como institucionalizar os mecanismos de tomada de decisão coletiva. Essa possibilidade representa um desafio e um problema, no sentido de que tais mecanismos sejam eficazes e, ao mesmo tempo, impeçam a sujeição da coletividade à vontade de alguns (REIS, 2000).
Como se observa, as questões que envolvem finanças públicas e, sobretudo, as razões dos desequilíbrios fiscais, ultrapassam os limites da ciência econômica, passando para a esfera da ciência política, remetendo, ainda, para o conceito de governance (9). Nesse caso, o termo governance contempla duas dimensões: as capacidades de comando e de coordenação do Estado. A capacidade de comando é a força necessária para definir e implementar as políticas públicas, e a capacidade de coordenação significa estabelecer prioridades e conciliar objetivos levando em conta a diversidade de interesses dos cidadãos (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
Os modelos apresentados acima não são inflexíveis. Existem situações difíceis de ser enquadradas neles, enquanto outras podem ser enquadradas em mais de um deles, o que deixa clara a existência de entrelaçamento entre decisões econômicas e impasse político. As opções adotadas para a realização do ajuste fiscal no Brasil e as suas repercussões na execução orçamentária de políticas sociais serão tratadas a seguir.
3 Ajuste fiscal e gastos públicos sociais no Brasil
A partir do ano de 1990, com o início do Governo de Fernando Collor de Mello, o combate ao déficit público ganhou destaque na agenda do Governo brasileiro. Foi também nesse período que passaram a ser questionados e reformados os pilares do modelo de desenvolvimento até então adotado no Brasil. A substituição de importações (10), a forte intervenção estatal na produção de bens e serviços e o protecionismo comercial foram substituídos pela política de desestatização e pela abertura comercial, através da eliminação de barreiras não tarifárias (11) e da queda das tarifas de importação (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
No início do ano de 1990, a inflação havia chegado ao índice de 80% ao mês, encaminhando-se rapidamente para uma hiperinflação, e o novo governo fez do combate ao processo inflacionário o eixo central do seu programa. As principais medidas do Plano Collor foram: reforma fiscal, através da diminuição de gastos públicos e do fim de subsídios e incentivos fiscais, além do aumento das receitas, pela elevação da carga tributária e recomposição das tarifas públicas; reforma monetária, com o objetivo de substituir o cruzado novo pelo cruzeiro, e um enxugamento dos meios de pagamento; e uma política de rendas, através do congelamento de preços por 30 dias, reajuste dos salários pelo Índice Geral de Preços de fevereiro daquele ano, além da liberação da taxa de câmbio.
O Plano afastou o risco de hiperinflação. Apresentando características ortodoxas e heterodoxas, a sua engenharia era bem mais complexa que a dos planos executados na década de 80, o que não significa que não tivesse problemas.
O Plano merece ser reformulado em vários aspectos, principalmente no que tange à distribuição dos sacrifícios, pois leva de roldão, sem diferenciar, “famílias” e “empresas”, grandes e pequenas, poupadores de salário e especuladores, empregados e desempregados. Exatamente, o sentido de um plano para evitar a hiperinflação é impedir suas consequências perversas; faz parte da sua essência, enquanto proposta, não só restaurar as finanças e a economia do País, mas fazê-lo levando em consideração determinados aspectos do ponto de vista social (FONSECA, 1990, p. 29).
O choque monetário e de expectativas teve um efeito quase instantâneo sobre a taxa de inflação e sobre a redução da dívida interna e uma conseqüente diminuição do déficit público operacional, somente no ano de 1994. Entretanto os bancos reagiram mal ao bloqueio da dívida pública, e em dois meses, o Plano estava destruído nos seus fundamentos internos, tendo a inflação voltado a crescer (TAVARES, 1993).
A política de estabilização do Governo Collor de Mello estava perfeitamente de acordo com as orientações emanadas do Consenso de Washington, cujo diagnóstico para os problemas econômicos da América Latina era de que todos eles advinham da indisciplina fiscal e do estatismo, na esteira da crise do capitalismo. Uma vez obtidas a consistência e a estabilidade financeira do governo, estas enviariam um sinal positivo para a sociedade, benéfico à retomada do crescimento (12).
As políticas inspiradas no Consenso foram levadas a cabo, mas não sem algum confronto político. O conhecimento prévio dos potenciais efeitos sociais e da conseqüente resistência política (13) que podia gerar fez com que as medidas fossem implantadas de cima para baixo.
Assim, o estilo político autocrático que caracteriza as reformas feitas ao estilo de Washington tende a minar as instituições representativas, a criar uma política personalista e a gerar um clima no qual a política se reduz a arreglos, a uma busca da redenção. Mesmo que os pacotes de reforma neoliberais contenham uma ciência econômica de qualidade, o mais provável é que transformem a política numa espécie de sortilégio/magia negra, destinada a dominar as ações dos demais participantes (PEREIRA; MARAVAL; PRZEWORSKI, 1993, p. 23).
As políticas foram postas em prática via medidas provisórias (MP) (14) ou sob pressão, para que o Legislativo as aprovasse sem alterações substanciais (PEREIRA; MARAVAL; PRZEWORSKI, 1993).
O Plano Collor representou uma virada em relação às tentativas anteriores de combate ao processo inflacionário, mesclando o debate sobre a contenção do processo inflacionário, já existente, com as recentes recomendações surgidas a partir de Washington.
Que quantativistas, monetaristas e neoliberais vejam com simpatia as rígidas metas monetárias e fiscais, bem como as privatizações, não é de estranhar. Até a equipe econômica – bastante “plural”, diga-se de passagem – pode ter-se contagiado por esse espectro que ronda o Hemisfério Norte desde meados dos anos 70, mas que aqui chega só no limiar dos anos 90. Todavia convém salientar que o Plano é muito mais engenhoso que o debate travado entre monetaristas e inercialistas no Brasil, na última década, e encontra guarida em teorias diversas destas (FONSECA, 1990, p. 24).
Desde o lançamento do Plano Collor até 1994, houve uma redução considerável das Necessidades de Financiamento do Setor Público (NFSP 15) operacionais, a qual se deveu à retomada do crescimento, que produziu efeitos positivos sobre a receita, além das características do sistema tributário brasileiro (16), que o protegiam do efeito Tanzi, e a alguns ajustes efetivos nas despesas. No entanto, o controle continuava sendo considerado artificial, já que o déficit potencial, aquele que se verificaria, caso o Governo não contasse com a indexação da receita e com a ajuda da inflação para reduzir o valor real das despesas, permanecia muito alto (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
O governo de Fernando Collor de Mello terminou em 1992 com o impeachment do Presidente. Entretanto o seu sucessor, o então Vice-Presidente Itamar Franco, assumiu e manteve a maioria das políticas, nomeadamente o combate ao déficit público. Porém, durante o governo de Itamar Franco, o processo inflacionário continuou a se fortalecer, atingindo os 2.489% ao ano em 1993.
O debate sobre a relação entre inflação e política fiscal prosseguiu, sendo possível distinguirem-se três tendências. A primeira considerava bons os resultados das NFSP entre 1990 e 1993, julgando que o ajuste já havia sido feito e que um esforço adicional para obter a estabilização seria muito custoso. Esse grupo mantinha-se otimista em relação ao futuro das perspectivas fiscais. A segunda tendência considerava o ajuste precário, mas entendia ser possível estabelecer uma ponte para a estabilização com um esforço do tipo once and for all que desse a um plano de estabilização o lastro fiscal (17) até a aprovação de mudanças estruturais, que exigiam reformas constitucionais. A terceira tendência considerava o ajuste irrelevante e não concordava com um ajuste temporário (GIAMBIAGI, 1997).
As três tendências consideravam o ajuste fiscal uma condição básica para o sucesso de um plano de estabilização, a dúvida era saber se esse deveria ser prévio ou simultâneo à estabilização. No entanto, até
[...] aqueles que defendiam um ajuste fiscal temporário faziam-no no pressuposto de que, durante a duração desse ajuste com deadline para expirar, seriam aprovadas as reformas constitucionais – especialmente a administrativa, para diminuir o gasto com o funcionalismo e a previdência, para evitar o aumento do déficit atuarial da Previdência Social – que representariam um ajuste fiscal duradouro. Isso que dizer que mesmo a existência de um equilíbrio temporário, supondo que não fosse acompanhado de reformas destinadas à eliminação do desequilíbrio em caráter definitivo, era julgada insuficiente para a estabilização (GIAMBIAGI, 1997, p. 10).
Em 1994, ainda no Governo de Itamar Franco, foi lançado o Plano Real, implantado através de uma sucessão de etapas. A primeira etapa foi a adoção de medidas que buscavam o ajuste fiscal para gerar condições macroeconômicas favoráveis. A importância dada ao ajuste ficou explícita na expressão “alicerce insubstituível” da estabilização, utilizada na exposição de motivos que encaminhou a Medida Provisória nº 434/94, que lançou o plano. A segunda etapa foi o estabelecimento de uma unidade de conta, a Unidade Real de Valor (URV), e a terceira foi a sua transformação na nova moeda de valor estável, o real. O objetivo das duas últimas etapas era alinhar os preços relativos importantes, medida que libertaria a economia da inércia inflacionária (PINHEIRO; GIAMBIAGI; GOSTKORZEWICZ, 1999).
A busca do equilíbrio das contas públicas foi feita através da criação do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) e do Fundo Social de Emergência (FSE), que reduzia por dois anos as transferências vinculadas aos estados e aos municípios. Essa medida permitiu ao Governo contar com uma fonte excepcional de recursos por um período de tempo.
O Plano Real eliminou a inércia inflacionária, e a combinação de apreciação cambial com abertura comercial provocou a redução drástica da inflação no início do plano. A contenção dos preços dos bens importáveis deu efetividade à âncora cambial no combate à inflação.
Com referência às NFSP, estas ficaram superavitárias somente em 1994, voltando a ter maus resultados nos anos seguintes (Tabela 1). O resultado positivo quanto à inflação, apesar da persistência dos maus resultados fiscais, contrariou as expectativas, contradizendo os que argumentavam que a estabilização sem ajuste fiscal seria fadada ao fracasso.
Se alguém com bola de cristal assegurasse, em meados de 1994, que o resultado primário do setor público consolidado a partir de então ia piorar consecutivamente ao longo dos três anos seguintes e que o déficit nominal médio – que, já com inflação baixa, tornou-se mais próximo do operacional – iria ser da ordem dos 7% do PIB nos quatro anos seguintes, certamente a opinião da maioria dos economistas teria sido de que, nessas circunstâncias, um plano de estabilização estaria condenado ao fracasso. Em tal caso, essa maioria teria, provavelmente, preferido adiar a deflagração do plano, até que se criassem as condições fiscais supostamente favoráveis ao êxito do mesmo (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001, p. 156 ).
Assim sendo, os resultados contrariaram as opiniões que julgavam que o ajuste temporário proporcionado pelo FSE equilibraria as contas públicas por um período de dois anos. Ao mesmo tempo, a combinação de déficit elevado com o fim do imposto inflacionário provocou o aumento da dívida líquida do setor público.
A política social adotada no período 1990-94 remetia à desresponsabilização do Estado quanto à garantia de direitos sociais, já que, em consonância com o ideário neoliberal, o desenvolvimento social era visto como resultado do crescimento econômico.
Durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso, foram adotados dois regimes distintos de política fiscal. O primeiro vigorou de 1995 até o ano de 1998 e, nele, o Governo não conseguiu obter os resultados desejados para as contas públicas, mesmo com a carga tributária em elevação e com os recursos advindos do programa de privatização das empresas estatais. O segundo regime teve início em 1999, no segundo mandato, quando a geração de crescentes superávits tornou--se o principal compromisso da política econômica. Essa política produziu mudanças importantes no processo orçamentário, pois condicionou a realização de despesas não obrigatórias à obtenção de metas de superávit (REZENDE; CUNHA, 2003).
O comportamento das contas públicas espelha os dois regimes distintos de política fiscal, como se pode ver na Tabela 1, que apresenta os dados pelo conceito nominal — já que este se tornou o conceito oficial a partir da estabilização — e a relação dívida/PIB. No ano de 1994, o resultado nominal foi alto, o que se explica devido à inflação também alta no primeiro semestre. A partir 1995, ocorreu uma grande inflexão dos resultados primários alcançados anteriormente. Como se pode constatar, os juros foram um fator importante na evolução das NFSP, no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso. Em 1999, ocorreu outra inflexão, no sentido oposto, quando da implementação do forte ajuste fiscal, mantendo-se elevado até o final do período analisado, no ano de 2004.
Ministério do Planejamento. Disponível em http://planejamento.gov.br/política_economia/conteúdo/indicadoresfiscais. Acesso em: 09.08.04 e 21.04.06
(1) Os resultados negativos representam superávit.
A alteração na política macroeconômica ocorrida no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso representou uma mudança da atitude fiscal (18) por parte do Governo, que passou a demonstrar um maior rigor no controle das contas públicas, que não se apresentava antes de 1998. Entretanto, a [...] crise de 1998/99 modificou essa situação, permitindo que os defensores de uma política fiscal mais rígida recebessem o apoio político necessário para implementar o ajuste requerido. De fato o Presidente da República, convencido de que uma combinação de aumento de impostos e/ou corte de gastos era condição sine qua non para a obtenção do apoio do FMI ao programa que estava sendo negociado, deu o necessário respaldo à adoção de um conjunto de medidas fiscais duras e assumiu a liderança das negociações com o Congresso Nacional para a aprovação daquelas que requeriam apoio legislativo (GIAMBIAGI, 2002, p. 40).
Ao mesmo tempo em que reformas estavam sendo postas em prática, foi promulgada a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) (19), para disciplinar a administração pública nas três esferas. A LRF estabelece um teto para despesas com pessoal, subtetos para despesas com pessoal nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário (20); limites estritos para despesas em anos de eleições; regras de transparência para a apresentação da contabilidade pública; e proíbe novos refinanciamentos das dívidas de estados e municípios por parte das autoridades federais.
Nesse cenário, o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006) manteve a política de restrição fiscal. Na verdade, ocorreu aumento do ajuste fiscal. O superávit primário alcançou 4,25% do PIB no ano de 2003 e se manteve acima desse patamar até 2006, final do primeiro mandato.
É necessário salientar que a Lei de Responsabilidade Fiscal criou também um dispositivo que determina que a Lei de Diretrizes Orçamentárias deve incluir não apenas as metas do resultado primário do Governo Central para o Orçamento Geral da União (OGU), mas para o segundo e terceiro anos seguintes. Assim sendo, o controle do endividamento passou a exigir que uma parcela da receitas seja reservada, desde o início do processo orçamentário, para o pagamento do serviço da dívida.
Tornada peça central do novo modelo econômico, a partir de 1999, a geração de superávits fiscais primários adquiriu status de despesas obrigatórias e passou a ser incluída na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o respectivo exercício e para os dois anos subseqüentes, não cabendo ao Congresso alterá-la e sendo de responsabilidade do Executivo realizar os ajustes necessários nas finanças públicas para garantir seu atingimento (REZENDE; CUNHA, 2003, p. 46).
Como se observa, na prática, a partir desse dispositivo da LRF, as oscilações da conjuntura econômica passaram a se refletir na elaboração e na execução do orçamento. Como a realização de gastos públicos passou a estar condicionada à obtenção de superávits primários, as situações de crise, quando ocorrem, levam à revisão do orçamento, com o objetivo de promover o ajuste necessário. Assim sendo, a necessidade de equilibrar as contas públicas pode comprometer os níveis de investimentos em áreas sociais, o que se configura como um trade-off entre a responsabilidade fiscal e responsabilidade social.
Os dados da Tabela 2 apresentam a percentagem dos gastos públicos sociais em áreas selecionadas sobre o total do orçamento entre 1996 e 2006. De maneira geral, é possível perceber, no Governo Federal, a baixa participação relativa do financiamento público nas áreas de saneamento, cultura, habitação e urbanismo, cuja parcela destinada a cada uma dessas funções não alcançou os 0,05% do orçamento total.
Na função Habitação, observa-se que, nos anos de 1996 a 1999, quando a função ainda era mista — Habitação e Urbanismo —, os valores orçados ficaram em torno de meio por cento. A partir de 2000, quando houve a alteração das classificações e as duas áreas foram desvinculadas, percebe-se que a despesa continuou nos mesmos patamares, nunca superiores a 0,30% quando somados.
Em que pese o reconhecimento público da essencialidade da habitação e da provisão de serviços urbanos adequados para a inclusão social e o combate à pobreza, em termos de financiamento o papel do Governo Federal na área foi inexpressivo. O déficit habitacional e a favelização são problemas estruturais, que, no Brasil, foram intensificados com o aumento da urbanização a partir de 1940. Em 1999, calculava-se que o déficit habitacional era de cerca de 5,3 milhões de novos domicílios (MORAIS, 2002). A falta de acesso à moradia e à urbanização adequada, intrinsecamente, nega o acesso a outros bens e serviços sociais, sendo, por isso, geradora de demandas por políticas sociais públicas de vários setores. Trata-se de uma significativa parcela da população que termina por morar de ocupação, que, sem pagar IPTU, vive sem infra-estrutura, sem água tratada e sem esgotos, quando não é morador de rua.
A área do Saneamento também chama atenção pela ínfima fatia do orçamento que lhe foi destinada em todo o período e pela fraca execução do orçamento. O saneamento básico é uma área cuja deficiência, notadamente, acaba por, no futuro, gerar demandas em outras áreas, como a da saúde.
As áreas de Educação e Cultura também têm uma execução orçamentária baixa. Quando as duas se encontravam agregadas na mesma função, a dotação orçamentária estava abaixo de 3% do orçamento. Quando ocorreu a desagregação, a Educação ficou com maior fatia do que a cultura, que não ultrapassa 0,05%.
Quanto à Assistência Social especificamente, verifica-se que o seu peso relativo no orçamento, após a desvinculação da Previdência, até 2003, não ultrapassou 1% do orçamento da União, enquanto a Previdência chegou a 17,4% em 2002.
Os dados apresentados na Tabela 3 apresentam a execução orçamentária dos gastos públicos sociais em áreas selecionada, no período 1996-04. É possível perceber a baixa execução orçamentária nas funções Saneamento, Cultura, Habitação e Urbanismo.
Quanto à função Habitação, observa-se que, nos três primeiros anos, quando a função ainda era mista — Habitação e Urbanismo —, os valores executados foram 15%, 18% e 19%, respectivamente, caindo drasticamente em 1999. A partir de 2000, quando houve a alteração das classificações e as duas áreas foram desvinculadas, observa-se que a execução orçamentária das despesas com a função Habitação foi muito baixa até 2003 (não chegou aos 4,5% do orçado), alcançando 28,76% em 2004.
Apesar do reconhecimento público da essencialidade da habitação e da provisão de serviços urbanos adequados para a inclusão social e o combate à pobreza, em termos de financiamento, o papel do Governo Federal na área foi inexpressivo. A falta de acesso à moradia e à urbanização adequada, intrinsecamente, nega o acesso a outros bens e serviços sociais, sendo, por isso, geradora de demandas por políticas sociais públicas de vários setores. Trata-se de uma significativa parcela da população que termina por morar de ocupação, que, sem pagar IPTU, vive sem infra-estrutura, sem água tratada e sem esgotos, quando não é morador de rua.
Neste sentido, a área do Saneamento também chama atenção pela fraca execução do orçamento. O saneamento básico é uma área cuja deficiência notadamente acaba por, no futuro, gerar demandas em outras áreas, como a da saúde.
As áreas de Educação e Cultura também têm uma execução orçamentária baixa. Quando as duas se encontravam agregadas na mesma função – e a dotação orçamentária estava abaixo de 3% do orçamento - a execução orçamentária rondava os 90% em média. Entretanto, quando ocorreu a desagregação, a Educação teve pequena queda de 10% inicialmente, voltando aos patamares anteriores, enquanto a execução orçamentária da função Cultura caiu aproximadamente 30%, chegando a 54% do total orçado em 2004.
Quanto à Assistência Social - cuja dotação orçamentária não ultrapassou 1% do orçamento da União —, esta apresenta execução orçamentária em torno dos 90%, no período, tendo chegado a 95% em 2004. No entanto, esse fato não tem a relevância que poderia ter; afinal, 90% de muito pouco continua sendo muito pouco.
A análise da execução orçamentária das políticas sociais selecionadas deixa claro que a intenção dos sucessivos governos do período era a de privilegiar a estabilização econômica a qualquer preço, já que o aumento da carga tributária não correspondeu a um aumento dos gastos sociais, mas à sua redução. Isso significa que os recursos arrecadados em forma de impostos tiveram outra destinação, foram canalizados para a geração de superávits primários, segundo o que foi contratado no âmbito do acordo com o FMI, num primeiro momento, e, posteriormente, passou a ser preconizado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que obriga a previsão de recursos para esse fim na Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Considerações finais
As grandes transformações políticas e econômicas dos anos 80 trouxeram ao cenário do capitalismo mundial significativas alterações nas relações societárias. As economias emergentes — também conhecidas na literatura como economias em desenvolvimento — foram obrigadas a um conjunto vigoroso de reformas estruturais, caso contrário não teriam como acompanhar o rápido processo de mudanças internacionais.
O núcleo dessas reformas estruturais foi de orientação teórica liberal, e elas tiveram como origem as instituições financeiras lideradas pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial. No que se refere à América Latina, os objetivos ficaram concentrados, em primeiro lugar, na estabilização macroeconômica da região e, em segundo, mas não menos importante que o primeiro, nas instituições ligadas às estruturas governamentais.
Esta reflexão é voltada à especificidade brasileira, onde a estabilidade dos agregados macroeconômicos foi priorizada em detrimento da estabilidade social. Nessa perspectiva, o ajuste fiscal implementado pelas autoridades brasileiras foi muito complacente com as questões ligadas à base produtiva e muito pouco generoso com as questões ligadas às desigualdades sociais, o que configurou um trade-off entre responsabilidade fiscal e responsabilidade social. Sendo assim, fica nítida a sua determinação em busca da estabilidade macroeconômica em detrimento da eqüidade.
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§
Carlos Nelson dos Reis,
Economista, Doutor em Economia pela Unicamp e Professor Titular Permanente da PUCRS.
Lessi Pinheiro, Economista, Doutora em Serviço Social e Professora da Universidade Estadual da Bahia.
Letícia Ribeiro, Bolsista de Iniciação Cientifica do Programa PIBIC e aluna de Graduação em Serviço Social na PUCRS.
Mara Oliveira, Assistente Sócia. Doutora em Serviço Social e Professora da UCS.
1. “A história da expansão capitalista é caracterizada por grandes transformações, como: ‘[...] a criação de redes ferroviárias no meio do século XIX, o nascimento da indústria automobilística na virada do século XX e o aparecimento da ‘indústria da internet’ na virada do século XXI’ (AGUITON, 2002, p. 28-29). Essas transformações introduzem novas tecnologias – que se iniciam nos países centrais e se proliferam nos países periféricos –, repercutindo diretamente nos processos de produção e, dessa maneira, em novas formas de organização do trabalho, no crescimento das economias dominantes, nas condições e nos modos de vida da população mundial.
2. Conjunto de medidas destinadas a reverter a crise econômica que atingiu os países da América Latina na década de 80. As reformas propostas deveriam, no curto prazo, controlar o déficit fiscal e o populismo econômico e, no médio prazo, implantar uma política econômica voltada para o mercado. Sinteticamente, as medidas eram: estabilização através de políticas monetária e fiscal ortodoxas, taxa de câmbio flutuante, liberalização do comércio exterior, privatização das empresas públicas, desregulamentação da atividade econômica e mais garantias para o direito de propriedade (PEREIRA; MARAVAL; PREWORSKI, 1993).
3. Nos grandes países industrializados, a margem de manobra para novas medidas não ultrapassa a casa dos 10% do orçamento público (GENÉREUX, 1995).
4. Dentre outras fontes, ver Bacha (1994), Giambiagi e Além (2001).
5. Refere-se à existência de defasagem de tempo entre o fato gerador e o efetivo recolhimento dos tributos. Um exemplo é o recolhimento dos impostos sobre circulação de mercadorias. O produto é adquirido no mês t, mas somente é recolhido ao órgão responsável pela arrecadação no mês t+1 ou t+2. Assim, a perda do valor da receita, efetuada em termos constantes é uma função direta do prazo do recolhimento e da taxa de inflação registrada (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001). No caso do Brasil, tal efeito não teve as mesmas proporções que em outros países, devido à utilização de um sistema de indexação de tributos, o que significa atualizar o imposto a ser recolhido em termos de um índice que acompanhe o nível inflacionário, o que atenua as perdas (REZENDE, 2001).
6. Como as despesas eram estabelecidas em termos nominais e a receita era indexada, o Governo controlava a evolução das despesas retendo as liberações de pagamentos por algum tempo, quando chegavam os pedidos.
7. No Brasil, a esse procedimento deu-se o nome de efeito Bacha, uma vez que o economista Edmar Bacha realizou estudos empíricos que sugeriram que o efeito Patinkin dominou o efeito Tanzi nos períodos de elevada inflação brasileira (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
8. Dificuldade reforçada pelas contradições muitas vezes existentes entre os objetivos. Por exemplo, o combate à inflação pode ter elevados custos em termos de desemprego e redução do nível de atividade econômica (GENÉREUX, 1995).
9. Governance é entendido como poder de um governo de fazer valer as suas políticas (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
10.Trata-se de uma industrialização voltada para dentro, inicia-se com a substituição de importações de bens finais não duráveis. As novas indústrias requerem a importação da maioria dos bens intermediários. Assim, o motor dinâmico do processo é o estrangulamento externo; na medida em que o investimento e a produção avançam em determinado setor, geram-se pontos de estrangulamento em outro (BIELSCHOWSKY, 1995).
11.Barreiras não tarifárias são alternativas às tarifas nas intervenções dos governos, no comércio internacional. São efetivadas por meio de restrições voluntárias às importações, subsídios e cotas de importação (KRUGMAN; OBSTFELD, 1999).
12.A abordagem de Washington assumia que, após a estabilização macroeconômica, a liberalização comercial e a privatização, o crescimento econômico seria automático (PEREIRA; MARAVAL; PREWORSKI, 1993).
13.“O marketing das idéias neoliberais foi tão bem feito que, além de sua identificação com a modernidade, permitiria incluir no Consenso de Washington, com toda a naturalidade, a afirmativa de que as reformas realizadas na América Latina se devem apenas à visão, à iniciativa e à coragem de seus novos líderes” (BATISTA, 1995, pg.104). A mensagem neoliberal foi absorvida por substancial parcela das elites políticas, empresariais e intelectuais, a tal ponto que a FIESP, em agosto de 1990, publicou um documento chamado Livre para Crescer, onde sugeria a adoção de uma agenda de reformas idênticas às de Washington. A proposta sugeria, inclusive, que a inserção internacional brasileira fosse feita pela revalorização da agricultura de exportação, conforme mencionara um documento do Banco Mundial, de 1989, Trade Policy in Brazil: the Case for Reform (BATISTA, 1995). O órgão máximo dos dirigentes da indústria paulista endossava, assim, uma proposta de inversão do processo de industrialização.
14.A MP é uma fonte legislativa reservada ao Executivo Federal. Através dela, o Governo pode realizar ações imediatas, sem a aprovação do Congresso. As MP tornam-se leis por 30 dias, período durante no qual o Congresso deve debatê-las e votá-las, podendo aprová-las, emendá-las ou rejeitá-las.
15.Déficit (+) ou superavit (-) que se deriva da variação líquida da dívida pública em um determinado período de tempo, descontando- -se os empréstimos concedidos ao setor privado. O conceito nominal é o mais amplo, incluindo todas as receitas e despesas. O conceito operacional exclui as correções monetária e cambial sobre a dívida pública, mas inclui as despesas com o pagamento de juros reais das dívidas interna e externa. O conceito primário exclui receitas e despesas financeiras, ou seja, com juros nominais (juros reais + correção monetária e cambial). Portanto, NFSP primária + juros reais + correção monetária e cambial = NFSP operacional + correção monetária e cambial = NFSP nominal.
16.O efeito Tanzi não foi tão importante no Brasil como em outros países, porque as unidades arrecadadoras reagiram à inflação de duas formas: diminuindo os intervalos dos recolhimento para o menor tempo tecnicamente possível e promovendo a indexação das receitas, expressando o valor a ser cobrado não mais em moeda nacional, mas em unidades de referência que se modificavam de acordo com a inflação. Alguns desses indexadores chegaram a ter mudanças diárias nos períodos de inflação mais elevada (GIAMBIAGI; ALÉM, 2001).
17.Referindo-se às medidas de longo prazo do tipo “uma vez e para sempre”.
18.Com relação à situação, identificada na literatura econômica como “restrição orçamentária fraca”, vivida no Brasil por mais de duas décadas, passou a ser a identificada como “restrição orçamentária forte” a partir de 1999 (GIAMBIAGI, 2002).
19.Lei Complementar nº 101/2000.
20.Os tetos e subtetos para os gastos com pessoal nos três poderes foram estabelecidos com base na receita corrente líquida (RCL) para as três esferas. Na esfera federal, está fixado em 50%, sendo 2,5% para o Legislativo, 6,0% para o Judiciário, 40,9% para o Executivo e 0,6% para o Ministério Público da União. Nas esferas estadual e municipal o teto é de 60% da RCL. O subteto estadual é de 3,0% para o Legislativo, 6,0% para o Judiciário, 49,0% para o Executivo e 2,0% para o Ministério Público Estadual. Nos municípios, os subtetos são de 6,0% para o Legislativo e 54,0% para o Executivo (Lei Complementar n° 101/2000).