Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352


A IMPORTÂNCIA DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO PARA A GESTÃO PÚBLICA, COMO FATOR DE PRIORIDADE NO COMBATE AS DESIGUALDADES SOCIAIS

Autores e infomación del artículo

José Armando Correia *

Sócrates J. Moquete Guzmán **

UESC, Brasil

j.armando_correia@hotmail.com

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RESUMO
O bem-estar social é algo almejado por todos os indivíduos, no entanto, esse bem-estar só pode ser concretizado através da criação de Políticas Públicas que convergem para o bem de todos e que mude o contexto social dos sujeitos, diminuindo assim as múltiplas expressões da questão social, como a pobreza e as desigualdades sociais. Contudo, essa questão se torna complexa para a gestão pública, visto a grande demanda por serviços públicos de qualidade e que realmente podem cessar ou amenizar as desigualdades existentes. Dentro desse patamar, encontra-se o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, mecanismo crucial para conhecer a realidade social como um todo, e quem vem sendo utilizado pela gestão pública, como forma de destinar recursos para criação de políticas públicas mais eficazes e urgentes. Desse modo, esse estudo destaca a importância do Índice de Desenvolvimento Humano, para a qualidade da Gestão Pública, bem como para a criação de políticas públicas mais eficientes, priorizando assim os setores onde são encontradas vulnerabilidades e maiores desigualdades sociais.
Palavras – chave: Políticas Públicas, Índice de Desenvolvimento Humano, Gestão Pública e desigualdades Sociais.

RESUMEN
El bienestar social es algo anhelado por todos los individuos, sin embargo, ese bienestar sólo puede ser concretado a través de la creación de Políticas Públicas que convergen para el bien de todos y que cambie el contexto social de los sujetos, disminuyendo así las múltiples expresiones de la cuestión social, como la pobreza y las desigualdades sociales. Sin embargo, esta cuestión se vuelve compleja para la gestión pública, ya que la gran demanda de servicios públicos de calidad y que realmente pueden cesar o amenizar las desigualdades existentes. Dentro de ese nivel, se encuentra el Índice de Desarrollo Humano - IDH, mecanismo crucial para conocer la realidad social como un todo, y quien viene siendo utilizado por la gestión pública, como forma de destinar recursos para la creación de políticas públicas más eficaces y urgentes. De este modo, este estudio destaca la importancia del Índice de Desarrollo Humano, para la calidad de la Gestión Pública, así como para la creación de políticas públicas más eficientes, priorizando así los sectores donde se encuentran vulnerabilidades y mayores desigualdades sociales.
Palabras clave: Políticas Públicas, Índice de Desarrollo Humano, Gestión Pública y desigualdades Sociales.

ABSTRACT
Social well-being is something desired by all individuals, however, this well-being can only be achieved through the creation of Public Policies that converge for the good of all and that changes the social context of the subjects, thus reducing the multiple expressions of the social question, such as poverty and social inequalities. However, this issue becomes complex for public management, given the great demand for quality public services and which can actually stop or lessen existing inequalities. Within this level, there is the Human Development Index - HDI, a crucial mechanism to know the social reality as a whole, and who has been used by public management, as a way of allocating resources for the creation of more effective and urgent public policies. Thus, this study highlights the importance of the Human Development Index for the quality of Public Management, as well as for the creation of more efficient public policies, thus giving priority to sectors where vulnerabilities and greater social inequalities are found.
Keywords: Public Policies, Human Development Index, Public Management and Social Inequalities.

Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

José Armando Correia y Sócrates J. Moquete Guzmán (2018): "A importância do índice de desenvolvimento humano para a gestão pública, como fator de prioridade no combate as desigualdades sociais", Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, (noviembre 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/oel/2018/11/desenvolvimento-humano.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/oel1811desenvolvimento-humano


  1. INTRODUÇÃO

Nos dias hodiernos, os quesitos qualidade de vida e bem-estar social estão em evidência nas discussões so­bre desenvolvimento econômico. Conforme o paradoxo de Easterlin, uma vez que a riqueza atinge o nível de subsistência, a sua eficácia como um gerador de bem-estar diminui.
Desse modo, diferente dos indicadores econômicos e sociais — como o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, nível de desemprego, níveis de criminalidade — o conceito de desenvolvimento engloba a qualidade de vida da população, considerando­-se indicadores como o IDH, Igualdade de Renda, Felicidade, Bem-Estar Subjetivo, Satisfação com a Vida, entre outros fatores que tornam a vida mais ou menos gratificante.
De acordo com Prearo, Maraccini e Romeiro (2015)

Para a realização de seus cálculos, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) considera fatores como uma vida longa, acesso ao conhecimento e o padrão de vida de uma população, medindo assim, o progresso de uma nação a partir de três dimensões: renda, saúde e educação. De forma resumida, a renda é medida pela Renda Nacional Bruta per capita, a saúde pela expectativa de vida, e a educação, pela média de anos de educação de adultos e a expectativa de anos de escolaridade para crianças na idade de iniciar a vida escolar (PREARO, MARACCINI e ROMERO, 2015, p.143).
Esses dados, portanto, possui grande importância para a gestão pública, pois os governos aplicam medidas sistemáticas em diversos aspectos da economia, alcançando desde a empregabilidade até taxas de poupança para o crescimento, re­colhendo uma variedade de medidas que refletem avaliações subjetivas das vidas dos indivíduos para atingir percepções de desenvolvimento social.
Além disso, esse conhecimento ajuda na educação de cidadãos sobre as escolhas que afetam suas vidas. Tal entendimento justifica-se no sentido de propiciar, por exemplo, aos administradores públicos, tomadas de decisão mais eficazes, uma vez que o bem-estar subjetivo pode com­pletar as informações disponíveis e orientar políticas alternativas que visem, sobretudo o combate as desigualdades sociais.

2. O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO – IDH
2.1 Conceito/Discussão
IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) é um índice que serve de comparação entre os países, com objetivo de medir o grau de desenvolvimento econômico e a qualidade de vida oferecida à população. O relatório anual de IDH é elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), órgão da ONU.
Este índice é calculado com base em dados econômicos e sociais. O IDH vai de 0 (nenhum desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento humano total). Quanto mais próximo de 1, mais desenvolvido é o país. Este índice também é usado para apurar o desenvolvimento de cidades, estados e regiões.
No cálculo do IDH são computados os seguintes fatores: educação (anos médios de estudos), longevidade (expectativa de vida da população) e Produto Interno Bruto per capita.
Criado para oferecer um contraponto ao Produto Interno Bruto (PIB) per capita, que considera apenas a dimensão econômica do desenvolvimento, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) foi desenvolvido pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq, com a colaboração e inspiração do pensamento do econo­mista Amartya Sen. Sua primeira apresentação aconteceu em 1990, no primeiro Relatório de Desenvolvi­mento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, agência líder da rede global de desenvolvimento da ONU, que trabalha principalmente pelo combate à pobreza e pelo Desenvolvimento Humano.
Segundo Jannuzzi (2014):

Através de fotografias de diferentes locais e posições da comunidade, os indicadores permitem reconstituirmos um retrato aproximado de determinadas dimensões da realidade social vivenciada. Assim como filmagens, indicadores coletados de forma periódica podem permitir o monitoramento da mudança social na comunidade. Enfim, se é fato que um conjunto de fotografias bem tiradas – a cores, nítidas, com ângulos e luminosidade adequados – das moradias, das ruas, das crianças e idosos pode nos fornecer uma visão geral da situação social da comunidade ou região de interesse, indicadores construídos ou selecionados com base em critérios técnicos também podem retratar de forma aproximada tal situação (JANNUZZI, 2014, p.13).

Desse modo, Jannuzzi (2014) diz ainda, que não podemos sobre-estimar a capacidade de síntese e objetivação da realidade que as fotos e os indicadores podem proporcionar. Centenas de fotos – ou horas e horas de filmagens – não conseguem captar toda a dinâmica e complexidade da realidade vivenciada pelas famílias; tampouco o fazem um indicador ou um conjunto exaustivo de indicadores sociais. Fotos, filmes e indicadores são recursos metodológicos que permitem “modelizar” a realidade social, focando os aspectos priorizados pelo fotógrafo ou analista social.
Matos (2007) corrobora dizendo, que para o Brasil, o Índice de Desenvolvimento Humano é calculado através de uma metodologia simples que necessita exclusivamente de algumas variáveis obtidas a partir dos Censos Demográficos realizados a cada dez anos pelo IBGE.

Embora a grande maioria da literatura sobre desenvolvimento enfatize os aspectos econômicos, nos dias atuais este conceito experimenta um repensar de suas dimensões com vistas a melhor abarcar todas as suas especificidades. Resumidamente, esta releitura conceitual tem origem na discussão sobre a relevância da medida do desenvolvimento e do bem-estar de um país a partir de variáveis estritamente econômicas, como o PIB per capita (MATOS, 2007).

Desse modo, quando se pensa no conceito de desenvolvimento, entende-se como a expansão das possibilidades de escolhas dos indivíduos de acordo com suas capacidades, revelando, portanto, que não se deve analisar unicamente como decorrência dos resultados de desempenho econômico. Assim consequentemente o PIB per capita não deverá ser sua única variável de medida.
O quadro abaixo retirado do PNUD demonstra as dimensões e indicadores considerados no cálculo do IDH.

2.2. A gestão pública e o desenvolvimento humano

                   A gestão pública muito aproveitou dos modelos gerenciais advindos do setor privado (ROSEBLOOM, KRAVCHUK e CLERKIN, 2009), com destaque a busca de melhor eficiência para gerar melhores serviços públicos, que teve por objetivo adquirir eficiência (FREDERICKSON, 1996; MOTTA, 2013). Trata-se da capacidade do governo em fazer e implementar políticas públicas eficazes (WORLD BANK, 1994).
Acredita-se, nesse caso, a grande importância da gestão pública na formulação de políticas públicas, vistas por Souza (2002) como a demonstração dos propósitos da gestão através de programas e ações que resultam em melhorias nas condições de vida das pessoas. Conforme Pierre (2009) o papel do gestor público deve ser centrado na produção de serviços públicos de longo prazo.
Esse período longo refere-se ao fato da apresentação de resultados consistentes para a vida da sociedade. Da mesma forma, Sen (2010) aponta que o desenvolvimento deve ser entendido como um processo de evolução das condições sociais, sendo que este processo remete das ações tomadas por gestores em períodos anteriores.

Diversas áreas sociais de influência ao desenvolvimento humano já são previstas pela Constituição Federal de 1988, como saúde, educação e habitação, apontando as devidas obrigações ao gestor público e à sociedade, esta por sua vez, na obrigação de fiscalizar e fazer que a gestão pública cumpra com o que se prevê na constituição (BRASIL, 1988, p.10).

                   Também, pela Constituição de 1988, o modelo federativo brasileiro e as divisões de competências dos entes federativos foram traçadas de modo a estabelecer os poderes e autonomias política e administrativa à União, Estado e Municípios, de forma a garantir atendimento às necessidades locais, tanto na realização de políticas sociais como nas políticas de arrecadação fiscal (KERBAUY, 2001).
Sobre essa divisão, a gestão de políticas públicas buscou ser direcionada às necessidades locais, tendo em vista a maior proximidade do gestor público municipal com a demanda social. Assim, parte da gestão dos demais entes a elaboração de estratégias sociais e a elaboração de programas mais abrangentes (MENDES, 2017, p. 15).

                   Essa divisão do Estado e a busca pela aproximação da administração pública com o povo possibilitou um fortalecimento das instituições públicas, dando voz para as classes excluídas da sociedade, sentimento cívico da população, aumento da eficiência do Estado, neutralização dos efeitos corporativos, adequação das ações às reais demandas sociais, além da maior prestação de contas (ROCHA, 2011).
Contudo, apesar dos avanços normativos adotados para aproximar o povo das decisões públicas, há ainda grandes desafios para uma implantação do controle social de forma eficiente dentro do cenário brasileiro, considerando o apoio das forças políticas, econômicas e contexto cultural (SABIONI, et al., 2016).
Tal situação reforça a ideia da associação política e administrativa como funções da gestão pública, com finalidades do atendimento às demandas sociais para garantir melhores condições sociais e promoção do desenvolvimento humano.
A promoção do desenvolvimento humano necessita de um longo processo sistêmico que relacionam os aspectos das finanças públicas, da gestão pública, do controle social, da economia e das condições sociais. Dessa forma, o esforço do Estado deve ser constate, e o retorno da boa gestão nem sempre é imediata. Sen (2010) apresenta, como exemplo, o caso do Leste Asiático, que antes da redução da pobreza, promoveu o avanço das condições sociais que, após algum período, surgiram os primeiros resultados, através de uma economia mais fortalecida.
O início deste sistema parte da arrecadação tributária. A arrecadação tributária, nesse caso, parte-se da base tributária disponível, da estrutura de impostos existentes e do esforço fiscal (MORAES, 2006). É através da captação de recursos que torna possível o financiamento de políticas públicas.
A gestão pública surge a partir do gerenciamento desses recursos e seu direcionamento para financiar políticas públicas. De acordo com o World Bank (1994), a gestão pública se responsabiliza pelo gerenciamento do orçamento do governo, do investimento público, de análise contábil, de auditorias e de outros sistemas de gerenciamento financeiro, além do planejamento e avaliação de programas, gerenciamento de agências econômicas, entre outras atividades gerenciais. Para Teixeira e Paim (2000), a gestão desses recursos disponíveis deve atender ao planejamento proposto.

3. A pobreza no Brasil e os fundamentos da desigualdade social

Ao longo da evolução histórica, a pobreza se configura como algo do ponto de vista econômico, social e cultural. No entanto, são vários os contextos em que esta se manifesta. A palavra “pobreza” na nossa língua materna é utilizada no singular. Embora isso ocorra, segundo os autores Silva, Bandeira e Lopes (2011), cabe dizer que na verdade, do ponto de vista conceitual essa palavra se constitui uma categoria teórica que encerra uma gama de significados os quais demonstram que a pobreza é um fenômeno bem mais complexo, de difícil mensuração e que ao longo do tempo assumiu variadas proporções, não só no Brasil, mas também no mundo.
Desse modo, não se deve tomar como base a pobreza apenas as questões econômicas, ou seja, a insuficiência de renda dos indivíduos.

Em síntese, entende-se que a pobreza é um fenômeno multidimensional. Sendo assim, pode ser vista como carência material face à insuficiência de rendimentos, vinculada apenas as necessidades mais imediatas de sobrevivência como: alimentação, vestuário, moradia, etc. Tal definição de cunho multidimensional, também nos leva a entender a pobreza como a falta ou carência de acesso a bens e serviços sociais públicos essenciais à reprodução do trabalhador e sua família, expresso nas políticas públicas de corte social como: educação, saúde, moradia, saneamento básico, transporte urbano, informação, dentre outras, ainda que também considere à falta de recursos econômicos, mais precisamente a carência de rendimentos (SILVA, BANDEIRA, LOPES, 2011, p.4).

 
Certamente olhando de outra maneira, e tendo uma visão mais ampla e diferenciada desse fenômeno, nota-se que o mesmo vai além de uma carência apenas em termos monetários, pois traz em si a carência social, alavancada, sobretudo pela desigualdade em um ritmo intenso de exclusão, em razão da falta de participação mais justa na partilha da riqueza, bens e serviços socialmente produzidos.
O país ao longo de sua trajetória tem convivido com acentuados contingentes de sua população na condição de pobreza, como já apontado anteriormente. Observa-se que ao longo desse processo, tal questão apresenta características peculiares não no que se refere à sua redução em termos expressivos. Pois, o que se demonstra é quase sempre uma tendência de ampliação, isto é, pelas suas formas de expressão, ou pelo notório incremento de seu contingente em todos os momentos da nossa história (mais remota ou recente) há predominância de situações de empobrecimento, precariedade e de exclusão social, demonstrando também que existem crescentes níveis de desigualdade na distribuição do produto resultante da riqueza socialmente gerada (SILVA, BANDEIRA, LOPES, 2011, p.4).

Nesse contexto, acredita-se que a noção de pobreza associada à desigualdade social se configura no contexto brasileiro como um produto das relações sociais construídas as quais são permeadas por valores e princípios que produzem e reproduzem no plano econômico, político e nos aspectos culturais.
Quando se fala em aspectos históricos da pobreza no Brasil e, sobretudo no mundo, não se deve esquecer a questão modernidade, pois foi a partir dai na reflexão da práxis social que vai celebrar, na sociedade pré-industrial, o elogio ao trabalho, agora visto como uma ação transformadora, que passou a refletir profundas mudanças na mentalidade coletiva (Geremek, 1987).
O ideário da pobreza, enquanto valor espiritual enfraquece-se na medida em que novos padrões passam a derrubar essa noção. “[...] O trabalho torna-se ‘o principal direito do homem, que almeja comandar o destino e conquistar riqueza’” (Geremek, 1987, p. 219). Aqui reside a mutação radical no ethos da pobreza, “[...] quando se dá o decisivo aggiornamento das doutrinas religiosas, das atitudes coletivas e da política social face à pobreza” (Geremek, 1987).
Na evolução do ethos da pobreza, assiste-se, na modernidade, a novos sinais para um outro modelo de pauperização: a pobreza socioindustrial, gerando as noções determinantes da desigualdade social do mundo moderno capitalista. No século XVI, a Europa estava superpovoada: os pobres já constituíam um sinal de problema nas cidades e as massas de miseráveis, para as quais não havia lugar nem no campo nem na cidade, tornam-se um elemento constante da paisagem social da Europa, vivendo de trabalhos ocasionais e esmolas (GEREMEK,1987, p. 13).
Dentro dessa perspectiva, revela-se que a situação das massas pobres em Portugal não era diferente dos países da Europa. Siqueira comenta que no século XVI, Portugal vivia um clima de contradições internas, entre as práticas das virtudes de uma nova ordem burguesa e a prática tradicional da Igreja Católica, renovando os princípios católico-feudais. Nesse clima de contradições, no Brasil, a escravidão negra, o latifúndio e a monocultura firmaram-se, aliados a um conjunto de fatores do sistema mercantilista, assentando a economia e as bases sociais da sociedade colonial brasileira.

A matriz colonial, nos seus pilares de sustentação – apoiados no caráter autoritário, patrimonialista e escravocrata –, criou uma herança de dominação excludente e produziu uma sociedade permeada por relações autoritárias de poder, estruturada em uma cultura política que envolveu colonizador e colonizado na reprodução da desigualdade social, dando origem a uma rígida estratificação de classes sociais (SALES, 1994).

Os pobres constituíam uma camada social de impossibilitados e desclassificados, criados na indigência, sem condição suficiente de sobrevivência. Viviam de biscates e esmolas, amparados pela caridade da Misericórdia e da Igreja (Piva, 2005). Essa camada de desclassificados sociais foi se alargando até o século XVIII, predominantemente com negros livres, mestiços, brancos sem trabalho e/ou biscateiros, mendigos, bastardos e oriundos de núcleo familiar dirigido por mulheres sozinhas, que se amesquinhavam na sombra da caridade nas cidades (Souza, 1986).
Assim, até a abolição da escravatura, o país já era povoado de um número considerável de indivíduos pobres, em que se caracterizava uma pobreza rural extensiva aos centros urbanos. Nessa sociedade radicalmente marcada por extremos bem definidos – senhorial e escrava – a população livre e pobre, num processo contínuo de desclassificação social, protagonizou a situação de carência, miséria e exclusão do Brasil colonial.
Siqueira (2009) comenta que:
A pobreza e a caridade caminharam juntas na organização social da colônia brasileira num ideário que contemplava a lógica conservadora do projeto colonizador, em que a pobreza cumpria um papel político (fidelidade dos pobres aos doadores afortunados), social (diferenciação das classes abastadas) e religiosa (a noção do perdão e salvação dos pecados através da doação aos pobres). Não se registra na história colonial nenhuma indicação que denuncia a vontade e/ou iniciativas por parte do governo e da irmandade em criar alternativas sociais mais modernas para diminuir a pobreza e o combate à situação de miserabilidade que se espalhava nas provinciais. As ações efetuavam-se no sentido da mensagem cristã, que na realidade legitimava a situação dos pobres. Não havia, portanto, perspectivas de mudanças, já que o trabalho não era colocado como uma ação transformadora. Historicamente para a população pobre a caridade tutelada contribuiu para a ausência de um ideário relacionado à noção de cidadania (com direitos e deveres sociais), na constituição da sociedade brasileira (SIQUEIRA, 2009, p. 105).
Contudo é a partir década de 90, segundo Sousa (2006) que a pobreza no Brasil passa a fazer parte da agenda pública ganhando visibilidade como objeto de interesse público, uma vez que, representa um problema a ser resolvido na esfera democrática sob a suspeita de vir a se constituir uma ameaça para a própria estabilidade da redemocratização.
Sendo assim, no tocante ao enfrentamento da pobreza no país, alguns autores acreditam que esta lacuna tem sido historicamente influenciada pelas flutuações conjunturais, porém, nunca se estabeleceu verdadeiramente, medidas e soluções políticas autenticas para pelo menos equacioná-la de maneira mais permanente em termos de longo prazo, ou seja, as ações de enfrentamento a essa questão tem sido pontuais, assistemáticas, descontínuas e contam com recursos insuficientes para dar conta da sua amplitude.

4. Desenvolvimento humano e recursos públicos

Mais recentemente, como decorrência da Constituição de 1988, as informações sociais e demográficas para fins de formulação de políticas públicas municipais vêm apresentando uma demanda crescente no Brasil, no contexto da descentralização administrativa e tributária em favor dos municípios e da institucionalização do processo de planejamento público em âmbito local. Diversos municípios de médio e grande porte passaram a demandar com maior frequência uma série de indicadores sociodemográficos às agências estatísticas, empresas de consultoria e outras instituições ligadas ao planejamento público.
Afinal, indicadores de nível municipal são necessários para subsidiar a elaboração de planos diretores de desenvolvimento urbano, de planos plurianuais de investimentos, para permitir a avaliação dos impactos ambientais decorrentes da implantação de grandes projetos, para justificar o repasse de verbas federais para implementação de programas sociais ou, ainda, pela necessidade de disponibilizar equipamentos ou serviços sociais para públicos específicos, por exigência legal (para portadores de deficiência, por exemplo) ou por pressão política da sociedade local (melhoria dos serviços de transporte urbano, por exemplo).
O interesse crescente pela temática dos indicadores sociais e sua aplicação nas atividades ligadas ao Planejamento Governamental e ao Ciclo de Formulação e Avaliação de Políticas Públicas também se deve, em boa medida, às mudanças institucionais pelas quais a Administração Pública tem passado no país, como: os formatos de implementação descentralizada de programas sociais; a preocupação da auditoria dos Tribunais de Contas na avaliação do desempenho dos programas, além da análise na conformidade legal; e a reforma gerencial da Gestão Pública em meados dos anos de 1990. (GARCIA, 2001)

Dados cadastrais antes esquecidos em armários e fichários passam a transitar pela rede, transformando-se em informação estruturada para análise e tomada de decisão. Dados estatísticos antes inacessíveis em enormes arquivos digitais passam a ser “customizados” na forma de tabelas, mapas e modelos quantitativos construídos por usuários não especializados. Sem dúvida, a internet, os CD-ROMs inteligentes e os arquivos de microdados potencializaram muito a disseminação da informação administrativa compilada por órgãos públicos e a informação estatística produzida pelas agências especializadas (JANNUZZI, 2014).

Em conformidade com sua constituição federativa, no Brasil, as estatísticas sociais, econômicas e demográficas utilizadas para construção dos indicadores são produzidas, compiladas e disseminadas por diferentes agências, situadas em âmbito federal, estadual ou mesmo municipal. Através de uma rede capilarizada pelo território nacional, com unidades estaduais e agências municipais, o IBGE cumpre seu papel de agente coordenador do Sistema Estatístico Nacional, como produtor de dados primários, compilador de informação proveniente de Ministérios e como agente disseminador de estatísticas.

A fim de equalizar as receitas e possibilitar a ação efetiva dos governos subnacionais no provimento de políticas públicas para a qualidade de vida, o Governo Federal busca repassar parte das receitas tributárias arrecadadas de competência da União, por meio de transferências intergovernamentais, para os municípios a fim de equalizar as receitas, reduzir as desigualdades inter-regionais e promover o desenvolvimento nas regiões (SCHOROEDER e SMOKE, 2003).

Conforme ressaltado por Cunha (2007), quanto mais baixo o IDH, maior seria, supostamente, a necessidade de investimento.
Segundo Guimarães e Jannuzzi (2004), com o surgimento e disponibilidade de indicadores como o IDH, surge um deslumbramento e uma crença de que este índice garantiria uma melhor gestão dos recursos e programas sociais.
Considera-se ainda que, além do controle das contas públicas, o Índice de Desenvolvimento Humano social possui influência na identificação de necessidades sociais e cobrança da gestão pública para solucionar tais situações.
Rosebloom, Kravchuk e Clerkin (2009) ressaltam que a gestão pública possui pouco conhecimento sobre a realidade local, o que destaca o IDH como mecanismo de apresentação de demandas, de elaboração de ações e de avaliação de políticas públicas.
Contudo, o governo ao admitir o compromisso em adotar políticas de promoção social para o desenvolvimento humano, deve rever as formas de aplicação e empregar um modelo de organização capaz de atender a amplitude dos problemas sociais e suas diversas causas (WESTPHAL e MENDES, 2000).
As políticas de promoção do desenvolvimento humano, em muitas das vezes devem ser aplicadas de forma integradas, visto as diversas interações entre essas dimensões sociais. Isso se deve pelas diversas dimensões que contemplam desenvolvimento humano.
Mendes (1993) afirma que apesar dos estudos apresentados e das diversas relações que envolvem o Desenvolvimento Humano, ainda existe uma lacuna na literatura associada a necessidade de observância dos efeitos interativos dos diversos elementos que afetam o desenvolvimento humano, visando especialmente isolar aqueles cujo protagonismo é reservado ao setor público. Isso feito, é possível avançar no estoque de conhecimento da área, via exposição dos mecanismos de relação entre as diversas dimensões condicionantes da qualidade de vida e do estabelecimento da importância, da capacidade e da limitação da gestão pública na promoção do bem-estar social e econômico.

5. Considerações Finais

O desenvolvimento, em seus primórdios, era considerado como algo novo, descoberto, sem interferência humana, associado ao caráter evolutivo. Mais tarde, o desenvolvimento se viu como algo que foi interferido pela ação humana para melhorar a vida da sociedade.
Nos dias hodiernos, o desenvolvimento pode ser compreendido sobre o olhar de diferentes concepções, entre elas a abordagem do desenvolvimento sustentável, local, social e outras. Essas abordagens podem ser agrupadas em dois modelos, um de visão econômica, trabalhado como crescimento e desenvolvimento econômico, e uma visão social, trabalhada como desenvolvimento humano. Sobre o desenvolvimento econômico, Freitas, Freitas e Dias (2012) tratam como uma evolução contínua que supera limites impostos por tradição.
No intuito de promover, o desenvolvimento humano, bem como a melhora das condições de vida da população, é necessário um levantamento minucioso de como esta população está vivendo e quais os parâmetros utilizados para se obter uma vida melhor, não levando apenas em consideração os aspectos econômicos ou de riqueza do país.
Desse modo, o Índice de Desenvolvimento Humano, torna-se um mecanismo crucial e importantíssimo para a Gestão pública, pois através dos seus mecanismos de pesquisas e que retratam a realidade da população Brasileira, o mesmo dá uma base e, sobretudo um norte na maneira de gerir o bem público e na forma de destinar recursos a serem utilizados nas políticas públicas e no combate as desigualdades sociais.
A promoção das condições sociais e do desenvolvimento humano consiste em um dos principais papeis da formação Estado. São diversas as dimensões que contemplam o desenvolvimento humano, como saúde, educação, emprego, renda, saneamento básico, moradia entre outras, que tornam necessário o papel do Estado na elaboração de políticas públicas capazes de garantir a melhoria nas condições sociais, o que demonstram a atmosfera que envolve o tema.
De acordo com Sen (2010), o crescimento econômico promove o aumento da renda da população e da arrecadação tributária ao governo, possibilitando que este aplique tais recursos na promoção social. “O crescimento econômico pode ajudar não só elevando rendas privadas, mas também possibilitando ao Estado financiar a seguridade social e a intervenção governamental ativa.” (SEN, 2010, p. 61).
Nesse sentido, segundo o autor, o crescimento econômico contribui para a promoção do desenvolvimento humano que consiste na expansão das capacidades humanas, por meio de programas sociais a fim de criar oportunidades sociais.
Desse modo, o desenvolvimento humano está além do crescimento da renda, garantindo a evolução de diversas componentes sociais, como educação e saúde.
No Brasil, é sabido que alguns desses serviços mencionados acima são garantidos pela Constituição Federal de 1988, tais como saúde e educação. Contudo ressalta-se, diante da magnitude territorial brasileira, as grandes diferenças entre as diversas regiões, como as ambientais, culturais e, principalmente, as diferenças econômicas e sociais, que resultam em diferentes necessidades por parte da população, empregando maior desafio do governo em propiciar políticas públicas que promovam o desenvolvimento humano.
Através dessa realidade e magnitude territorial, percebe-se a grande importância do Índice do Desenvolvimento Humano - IDH, para a gestão pública, bem como no combate as desigualdades sociais. 

                  
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* Assistente Social do Núcleo de Apoio à Saúde da Família- NASF e Professor de Redação e Língua Portuguesa da Escola Diante do Trono, Itabuna-Bahia, Brasil.
** Doutor em Ciência Política. Professor Pleno do Departamento de Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Santa Cruz.

Recibido: 20/11/2018 Aceptado: 23/11/2018 Publicado: Noviembre de 2018

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