Eduardo Pimentel Sant Anna *
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – Brasil
santana@yahoo.com
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Resumo: Este artigo tem como objetivo principal analisar o comportamento do investimento direto externo (IDE) na economia dos países que compõem os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), no período posterior ao ano 2000. Em uma abordagem histórica, este tipo de investimento, realizado principalmente por empresas de capital estrangeiro (multinacionais e transnacionais), ganhou grande atenção na literatura econômica a partir da década de 1990, quando um grande volume de fluxos de capitais passou a ter como destino, países em desenvolvimento. Neste sentido, os BRICS assumiram um papel relevante no âmbito nas relações internacionais, particularmente no que se refere à realização de IDE, em especial após a crise de 2008. Esse grupo de economias, ainda que sob diferentes intensidades, deixou de ser mero receptor de IDE para se tornar importante originador dessa modalidade de investimento. Os fluxos crescentes de IDE, a partir do ano 2000, deixa clara a necessidade de se estudar mais detalhadamente este comportamento e seus impactos nestas economias.
Com a finalidade de fornecer evidências, este trabalho apresenta uma visão detalhada dos fluxos e estoques de IDE nos BRICS, utilizando uma revisão bibliográfica dos principais aspectos que demonstram a evolução e os motivos do aumento deste tipo de investimento.
Palavras-chave: Investimento Externo Direto; BRICS; Internacionalização de Empresas; Crescimento Econômico.
THE BRICS AND THE FOREIGN DIRECT INVESTMENT, IN THE 21ST CENTURY
Abstract: This paper has as main objective to analyze the behavior of foreign direct investment (FDI) in the economies of the BRICS countries (Brazil, Russia, India, China and South Africa) in the period after the year 2000. In a historical approach, this type of investment, mainly carried out by foreign-owned companies (multinationals and transnational corporations), gained a great deal of attention in the economic literature from the 1990s, when a large volume of capital flows went to developing countries. In this sense, the BRICS have played an important role in international relations, particularly in relation to the realization of FDI, especially after the crisis of 2008. This group of economies, although under different intensities, has ceased to be a mere recipient of IDE to become an important originator of this type of investment. The increasing flows of FDI since 2000 make clear the need to study this behavior and its impacts in these economies in more detail. In order to provide evidence, this work presents a detailed view of FDI inflows and inventories in the BRICS, using a bibliographic review of the main aspects that demonstrate the evolution and reasons for the increase of this type of investment.
Key words: Foreign Direct Investment; BRICS; Internationalization of Companies; Economic growth.
JEL Classification: E60, E61, E65
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Eduardo Pimentel Sant Anna (2018): "Os BRICS e o investimento direto externo, no século XXI", Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, (julio 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/oel/2018/07/brics-investimento-direto.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/oel1807brics-investimento-direto
1 INTRODUÇÃO
No final dos anos setenta e o início da década de 1980, o modelo neoliberal passou a ser adotado como padrão de desenvolvimento econômico por vários países do capitalismo avançado. Durante os anos 90, este mesmo modelo viria a ser seguido pelos governos do capitalismo periférico, mesmo aqueles historicamente identificados com as esquerdas. Segundo Chomsky (1999), neste mesmo período, ocorreram processos de privatizações, fusões e aquisições em todo o mundo. Nas últimas décadas, uma das transformações mais evidentes na economia mundial, foi o aumento do grau de internacionalização das economias nacionais.
Neste sentido, é importante ressaltar que o IDE1 ocorre, quando existe a possibilidade de rendimentos mais elevados e de diversificação dos riscos. Desse modo, o investidor busca a expectativa de lucros futuros maiores, movendo-se das regiões de lucro esperado reduzido para aquelas de lucro esperado mais alto, após levar em consideração o risco. Alguns autores, tratam o IDE como um dos principais modelos de internacionalização da produção, ocorrendo sempre que residentes de um país têm acesso a produtos ou serviços de outros países. É possível perceber também que, economias mais abertas, tornaram-se mais atraentes ao investimento privado realizado através do IDE. Segundo LACERDA (2004), os países em desenvolvimento foram alvo de grandes fluxos de IDE, principalmente a partir da segunda metade da década de 1990.
Os fluxos mundiais de IDE ganharam bastante importância dentro do balanço de pagamentos dos países, sendo uma forma estável de financiamento externo, principalmente para as economias emergentes. Segundo a OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico), o IDE atinge seu pico de 3,74% do PIB mundial em 2007, caindo para 1,81% em 2009, em função do processo de desalavancagem pós crise financeira de 2008, e volta a crescer nos anos seguintes chegando a 2,09% em 2011, mas fecha 2016 em 1.95%.
A internacionalização das principais EMN (Empresas Multinacionais) aconteceu em ondas, segundo o World Investment Report (2017). O crescimento das operações no exterior destas empresas, foi impulsionado principalmente pelo processo de Globalização e, em particular, pela integração dos mercados de capitais, acelerados após o início da década de 1990. Essa expansão estrangeira foi desigual e interrompida por crises. Ainda segundo o relatório, o crescimento da internacionalização das 100 principais empresas (que são classificadas por seus ativos estrangeiros), tem como paralelo, o crescimento dos fluxos mundiais de IDE.
Embora ao longo dos últimos anos, os países da economia desenvolvida tenham permanecido como os principais detentores de IDE no mundo, sua preponderância tem diminuído, principalmente pela ascensão dos países em desenvolvimento, como os BRICS2 . Os EUA, por exemplo, vêm diminuindo a sua participação nos fluxos mundiais de IDE, embora continue sendo um dos principais expoentes neste segmento. Segundo dados do IPEA, em Alves (2014), a sua participação no fluxo mundial de IDE, caiu de 33,6% em 2000 para 22% em 2014.
De acordo com o World Investment Report (2011), o investimento estrangeiro direto em economias emergentes tem sido fenomenal e vem contribuindo para o crescimento econômico destes países. Estas economias juntas, atraíram mais da metade das entradas globais de IDE no ano de 2010.
O consumo e a produção internacional foram transferidos em grande parte para economias emergentes, levando as multinacionais a investir cada vez mais em projetos de busca de eficiência e de busca de mercado, nestes países. Já o World Investment Report (2017), cita que, embora o grupo dos BRICS tenham representado 22% do PIB global, estes países receberam apenas 11% do estoque de IDE global, em 2016. Ainda conforme o mesmo relatório, as entradas de IDE para os BRICS excederam as saídas do grupo. No entanto, os fluxos de saída (os investimentos dos BRICS no exterior), estão em ascensão. As saídas aumentaram 21 por cento em 2016, empurrando o estoque externo do grupo para US $ 2,1 trilhões - ou mais de 8% do total mundial em 2016, ante 5% em 2010.Os investimentos intra-BRICS continua sendo pequeno, mas segue aumentando. Estes contabilizaram cerca de 10% do estoque externo de todo o grupo em 2015, acima de apenas 3% em 2010. Vale ressaltar que, quando os investimentos realizados pelos BRICS, são comparados ao IDE total recebido por cada um de seus vizinhos, percebe-se que os membros do grupo figuram como os principais investidores em diversos países, notadamente naqueles com ambientes de negócios mais precários. Neste sentido, o Brasil se destaca negativamente, pois não é o maior investidor estrangeiro em nenhum de seus vizinhos – nem entre os de menor desenvolvimento relativo, tampouco entre aqueles com ambientes de negócios menos receptivos.
Segundo Alves (2014), Digno de nota ainda é o papel desempenhado pelo Estado no processo de expansão das firmas dos BRICS para os países próximos. Deve-se ter claro o grande peso que o Estado ainda exerce nas economias chinesa, indiana e russa, enquanto na brasileira e na sul-africana esta participação mostra-se menos importante: não apenas o Estado é o provedor de inúmeros bens e serviços naquelas economias, que não há muito tempo funcionavam por meio de planificação centralizada, como várias de suas maiores empresas continuam sob o controle estatal. Além disso, os fluxos de IDE entre os BRICS e seus respectivos vizinhos também são impactados por considerações de ordem política, as quais podem atuar tanto de forma a facilitar os investimentos, como a restringi-los, ou mesmo proibi-los. Neste caso, a Índia diferencia-se dos demais BRICS, por manter relações bastante tensas com seus vizinhos mais populosos. Por outro lado, os acordos de livre comércio, por exemplo, apresentam-se como alguns dos instrumentos mais importantes para encorajar os investimentos. Neste quesito, a China se destaca, possuindo acordos de livre comércio e evitando a bitributação com a maior parte dos vizinhos.
Para Dailami (2011), a questão fundamental é que as economias emergentes, sob a liderança da China, têm aumentado não apenas a participação na produção global, mas também nos fluxos internacionais de comércio e de investimento, atuando não mais apenas como importadores, mas também como exportadores de mercadorias, e não mais apenas como destino, mas também como origem de capitais, ainda que em diferentes graus. Neste processo de reorganização da economia global, é de particular importância, o fato de que muitas empresas dessas economias têm se tornado maiores e mais competitivas, o que lhes permitiu assumir um papel mais contundente nessas transações diante de circunstâncias externas realmente excepcionais, prevalecentes em boa parte do século XXI.
Os mercados financeiros dos BRICS, também expandiram-se de forma rápida, acompanhando o crescimento econômico. De acordo com Ranking de bancos da S&P (Standard and Poors), as instituições desses cinco países figuram entre os 100 melhores bancos do mundo, sendo 4 deles com sede na China.
Esse artigo está organizado em 4 seções: além dessa introdução, a seção 2 apresenta evidências do aumento da importância dos BRICS na economia mundial, assim como algumas transformações ocorridas no período do estudo. Na seção 3 é apresentada a dinâmica do IDE recebido e realizado pelos BRICS e seus reflexos na economia dos países membros. Na seção 4 são apresentadas as considerações finais do trabalho.
2 OS BRICS EM UM CONTEXTO GLOBAL
Para muitos autores, o crescimento econômico dos BRICS, especialmente durante a crise de 2008, desempenhou papel fundamental, passando a ser objeto de análise e monitoramento de acadêmicos, analistas de bancos e empresas do mundo todo. O aumento da globalização, fez com que este grupo de países, se tornassem uma importante fonte de crescimento e influência política.
Segundo O’Neill (2012), criador do acrônimo BRICS, este grupo de países conformam “mercados de crescimento”, no sentido de que são economias que tendem a apresentar crescimento acelerado do produto interno bruto (PIB), superior ao registrado pelas economias desenvolvidas, mais maduras e menos populosas. Para o autor, a elevada população e o grande potencial de crescimento da produtividade constituem-se, nos dois fatores potencializadores do crescimento econômico.
Estes países possuem economias bastante diferentes em relação à sua história, recursos e estratégias econômicas globais. Contudo, eles têm uma coisa em comum: taxas de crescimento econômico com alto potencial de expansão, em comparação as taxas globais. No total, mais de três bilhões de pessoas vivem nos países BRICS. Com 1,4 bilhões de habitantes, A China é o maior país, seguido pela Índia com 1,1 bilhão. O Brasil tem em torno de 200 milhões de habitantes, Rússia cerca de 120 milhões. O menor país, com 53 milhões de habitantes é a África do Sul. Em comparação: A União Europeia abriga 502 milhões de pessoas. Dentro da UE, a África do Sul seria o quinto maior país antes da Espanha. No total, 40 por cento da população mundial vivem nos BRICS. Sendo assim, esses países não são importantes apenas como fornecedores de recursos para estados industrializados, mas também significativos mercados de vendas e importantes atores econômicos.
O rápido e pronunciado aumento da importância dos BRICS na economia mundial pode ser observado na sua participação no total da riqueza produzida em todo o mundo. Segundo a UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development), a participação dos BRICS em proporção do produto interno bruto mundial, sai de 10,8% em 2000, ou seja, US$ 3,1 trilhões. Já em 2008, para 20,1%, porcentagem equivalente a US$ 6,2 trilhões, às vésperas da deflagração da crise internacional. Em 2013, essa importância era de 27,5%, ou US$ 8,5 trilhões, caindo em 2015 para 23,1% do PIB mundial.
O aumento da globalização propiciou aos BRICS, principalmente a China, tornarem-se uma importante fonte de crescimento global e influência política. Estas economias cresceram rapidamente sua participação do PIB mundial, conforme vimos anteriormente, sendo detentores hoje, de mais de US $ 4 trilhões em reservas, além de contarem com mais de 17 por cento do comércio global.
È importante ressaltar que embora fique evidente o aumento do peso dos BRICS na economia mundial, principalmente a partir da década de 2000, os dados do FMI (Fundo Monetário Internacional), mostram que essa elevação tem sido condicionada, preponderantemente, pelo acelerado crescimento econômico chinês.
Países como Brasil e Rússia, obtiveram uma trajetória de crescimento principalmente na primeira metade da década de 2000, impulsionados, sobretudo, pelo aumento dos preços das commodities no mercado internacional e pelo ingresso de capitais estrangeiros. O crescimento desses países, entretanto, permaneceu menor e mais volátil que o verificado no caso da Índia e, principalmente, da China. Importante observar, ainda, que, embora todos estes países tenham sido afetados pela crise internacional, isso ocorreu em diferentes graus. De fato, a queda do crescimento foi menor e a recuperação mais rápida na Índia e na China relativamente ao Brasil e à Rússia. No caso da África do Sul, embora tenha havido uma queda no período da crise internacional, o crescimento se manteve mais estável ao longo do período, como podemos observar no gráfico 01.
Ainda que não estivessem em seu epicentro, os BRICS foram afetados pela crise internacional com origem nos países centrais, sobretudo em função do comportamento pró-cíclico dos fluxos de comércio e investimento internacionais. No comércio, a redução da demanda levou à queda do saldo comercial gerado por esses países. Nos investimentos, os proprietários de riqueza mostraram-se mais cautelosos em abrir mão da liquidez, em favor dos ativos mais arriscados. Se olharmos estes países como um grupo, vemos que globalmente funcionaram um pouco como estabilizadores durante o processo financeiro e econômico da crise de 2008 / 2009. Especialmente nos casos de economias extremamente dinâmicas, como a da Índia e da China, a crise realmente não retardou o processo recuperação econômica. O crescimento econômico geral da Índia foi ligeiramente afetado em 2008, já se recuperando em 2009. A China experimentou apenas uma pequena diminuição da taxa de crescimento do PIB nos anos de crise. O Brasil sofreu brevemente um corte de crescimento, mas rapidamente reverteu para o seu caminho de crescimento, com a utilização de políticas anticíclicas, embora tenha voltado a sofrer com a crise econômica interna, no período 2015/2016. A África do Sul, viu seu PIB cair bastante em 2009 após a crise econômica e financeira, mas já em 2010, estava acima do nível pré-crise. A Rússia, em contraste, experimentou uma forte queda em 2009. Sua economia parece ainda estar se adaptando aos novos níveis de preço do petróleo.
Segundo Paula e Barcelos (2011), as diferenças entre as taxas de crescimento dos BRICS têm decorrido, entre outras razões, da gestão da política econômica dessas economias, com destaque aos seguintes parâmetros: i) política cambial; ii) conversibilidade da conta de capital; e iii) grau de vulnerabilidade externa. Os autores sustentam que os dois gigantes asiáticos têm realizado uma administração cuidadosa dos seus regimes cambiais, tendo operado uma liberalização apenas parcial da conta de capital e reduzido a vulnerabilidade externa, condições que contribuíram para o crescimento econômico mais acelerado comparativamente aos outros dois países, uma vez que isso lhes assegurou maior flexibilidade no que se refere à manipulação dos instrumentos de política monetária e fiscal, dados os limites impostos pelas assimetrias que caracterizam o sistema monetário e financeiro internacional contemporâneo.
A despeito do sucesso inicial das políticas anticíclicas implementadas pelos BRICS, essas economias apresentaram pioras relevantes em suas performances nos últimos anos, embora em diferentes intensidades. Isso é particularmente evidente no caso da Rússia e do Brasil, o que não surpreende, uma vez que eles são mais vulneráveis às variações nos fluxos internacionais de comércio e investimento. Além disso, o aumento dos desequilíbrios nas contas públicas e nas contas externas, somado ao aumento da taxa de inflação, tem levado à adoção de ajustes macroeconômicos relevantes nos casos de Rússia e Brasil, em vista das políticas monetárias e fiscais contracionistas implementadas.
Conforme o relatório do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (2011), diversos fatores associados às especificidades nacionais, concorreram para as diferenças entre as taxas de crescimento dos BRICS. Na China, destacam-se as reformas estruturais levadas a cabo a partir do final da década de 1970, que asseguraram o rápido processo de industrialização do país. De fato, a política de abertura administrada da economia e de incentivos às exportações, além de atração de investimentos estrangeiros, assegurou o aumento da competitividade do país em setores intensivos em conhecimento e tecnologia. A Índia, a adoção gradual de reformas estruturais a partir da década de 1990 também não pressupôs a redução do papel do Estado no estímulo aos setores mais sofisticados, contribuíram decisivamente para o maior dinamismo da economia, mas não foram suficientes para assegurar a redução dos elevados níveis de desigualdades sociais que caracterizam o país. Na Rússia, a difícil transição para o capitalismo implicou na liberalização e desregulamentação dos mercados e o avanço do processo de privatização, sobretudo ao longo da década de 1990. Esse último, certamente foi decisivo para a conformação de uma economia capitalista na Rússia, assim como de grandes grupos econômicos. O país foi particularmente beneficiado pelo processo de aumento dos preços do petróleo e gás verificado em boa parte dos anos 2000, mas vem sofrendo com a queda destes preços nos últimos anos. No Brasil, o aumento excepcional dos preços das commodities verificado entre 2003 e 2008 também cumpriu papel decisivo para dinamizar o crescimento econômico, ainda que ele tenha sido o menor entre os BRICS. Também foi beneficiado pelo expressivo ingresso de recursos estrangeiros, via conta financeira do balanço de pagamentos, a partir de 2005-2006. Estes fenômenos foram revertidos nos últimos anos, com a queda no preço das commodities e a fuga de capital estrangeiro em função do aumento do risco.
Dos cinco países dos BRICS, apenas a África do Sul não está entre as 10 maiores economias do mundo, além disso, contribui apenas com cerca de 3% do desempenho económico do grupo, segundo o Programa Africano de Inovação do Instituto de Estudos de Segurança (ISS)3 . Apesar de ser a menor economia do grupo, a África do Sul é a porta de entrada para um continente que vive um processo de forte crescimento. Para Pereira (2011), embora a população e o crescimento econômico do país sejam inferiores aos demais membros do grupo, em termos geopolíticos e geoeconômicos possui enormes vantagens. Único país africano no G-204 , a África do Sul busca reforçar os laços políticos e econômicos que possam impulsionar o seu desenvolvimento e o desenvolvimento regional, principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento de infraestruturas na África e sua industrialização.
Segundo Castro (2011), deve-se observar que, embora constitua um importante indutor do crescimento mundial, em geral, e dos próprios BRICS, em particular, o crescimento chinês também oferece riscos não desprezíveis para o dinamismo dessas economias. De fato, na medida em que o crescimento chinês contribui para o aumento dos preços das commodities e para a redução dos preços das manufaturas no mercado internacional, ele pode induzir os países a restringirem à produção e à exportação de produtos menos sofisticados. Para países com uma estrutura produtiva minimamente diversificada e integrada, mas que também dispõem de grandes reservas de recursos naturais, como é o caso da Rússia e do Brasil, a ascensão chinesa pode acabar por “empurrá-los” em direção aos setores em que eles possuem vantagens comparativas naturais, pressionando-os, assim, no sentido da especialização regressiva e, no limite, da desindustrialização, com a perda de elos importantes das cadeias produtivas.
Conforme o Fundo Monetário Internacional (FMI), em 2017, a participação dos BRICS na economia global foi de 23,6% e em 2022 estima-se que essa quota aumente para 26,8%. Para Jakkie Cilliers, chefe do Programa Africano de Inovação do Instituto de Estudos de Segurança, na África do Sul, o grupo dos BRICS, manterá um papel ativo no cenário global do G20, na definição da política económica global e na promoção da estabilidade financeira, porque é um contrapeso para o grupo do G7 5. Dos projetos iniciais, apenas o Novo Banco de Desenvolvimento, saiu do papel. Uma instituição financeira com sede em Shangai que pretende ser a alternativa ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional. Além disso, os países do BRICS foram impulsionados para um objetivo comum de reformar o sistema financeiro e monetário internacional, com um forte desejo de construir uma ordem internacional mais justa e equilibrada que reflita a dinâmica da economia global de hoje e atendam os interesses de todos de maneira justa.
3 O COMPORTAMENTO DO IDE NOS PAISES BRICS
A globalização e os avanços tecnológicos fizeram com que o IDE passasse a ser um investimento muito cortejado principalmente pelos países em desenvolvimento. Este tipo de investimento sempre foi considerado um indutor do desenvolvimento econômico e também um condutor de transferências tecnológicas. De uma forma geral, a evidencia empírica, mostra-se favorável à contribuição positiva do IDE no desenvolvimento econômico dos países receptores.
Segundo a OCDE (Organização para cooperação econômica e desenvolvimento), o IED pode ser classificado de quatro formas: Criação de ativos produtivos por estrangeiros, aquisição de ativos existentes (fusões e aquisições), extensão de capital (ampliação do investimento) e reestruturação financeira.
Os países que compõem o grupo dos BRICS têm se mantido nos últimos anos, não só como importantes receptores de IDE, mas também vêm aumentando a participação como investidores do mesmo tipo de capital. Para termos uma ideia deste crescimento, segundo Alves (2014), em 2012, o montante investido pelos BRICS foi equivalente a 44,2% do fluxo de IDE oriundo dos Estados Unidos, contra apenas 5% em 2000.
Embora ainda muito limitado, o investimento direto intra-BRICS também tem crescido rapidamente. Segundo o relatório da UNCTAD (2016), a parcela de IDE compartilhada entre os países membros, aumentou de 0,1% no início do grupo, para 2,5% em 2012, chegando a 4,5% de todo o estoque de IDE do grupo, em 2015. As multinacionais dos BRICS têm mostrado maior interesse no investimento dentro do grupo nos últimos anos. Algumas companhias indianas e chinesas, por exemplo, estão fazendo ou anunciando investimentos em outros países BRICS. Conforme o relatório WTI (2017) da Unctad, a Beijing Automobile International Corporation está construindo uma Instalação de montagem de US$ 823 milhões na África do Sul, para produzir veículos motorizados para o mercado local e mercados regionais. Na Índia, a CRRC Corporation da China, investiu em uma planta de joint venture, US$ 63 milhões para produzir equipamentos de transporte ferroviário e a Huawei Technologies planeja começar a fabricação de smartphones no país. Outras multinacionais chinesas, como Alibaba, Xiaomi e Didi Chuxing também investiram na Índia em 2015 e 2016. Além disso, os fluxos de investimentos Intra-BRICS destinados as atividades de fusões e aquisições, aumentaram de US$ 3 bilhões em 2015 para US$ 22 bilhões em 2016.
Mesmo apresentando uma melhora significativa nos últimos anos, o crescimento dos fluxos de IDE dos BRICS ainda têm números distantes, quando comparados aos países desenvolvidos. Conforme mostra o relatório da UNCTAD (2016), este grupo de países ainda é o detentor dos maiores índices de estoque e fluxo de entrada e saída de IDE, no mundo.
Os países BRICS, também se mantêm ativos em várias iniciativas econômicas Sul-Sul, como por exemplo, na China One Belt One Road6 . Essas iniciativas criam um ambiente favorável para aumentar cooperação econômica entre membros, inclusive no que diz respeito ao IDE.
Vale destacar também a importância da localização geográfica dos países, como um dos determinantes do IDE. Nos BRICS, a China, é a única que possui economias avançadas entre seus vizinhos. Os demais, são os países com a estrutura produtiva mais complexa de suas respectivas regiões. Isto tem implicações importantes para os padrões dos fluxos regionais de IDE: enquanto a África do Sul, a Índia e a Rússia quase não recebem investimentos de seus vizinhos, a China acolhe muito mais do que realiza. Neste contexto, o Brasil ocupa uma posição intermediária.
No gráfico 02 é possível observar uma comparação dos fluxos de entrada e saída de IDE, entre as economias desenvolvidas, em desenvolvimento e nos BRICS.
Segundo o relatório WTI (2017) da Unctad, o IDE continua a ser a maior e mais constante fonte externa de financiamento para as economias em desenvolvimento - em comparação com investimentos de carteira, remessas e fontes oficiais de desenvolvimento, mas a partir de 2015, estas entradas foram reduzidas em todas as regiões em desenvolvimento. Por outro lado, os fluxos para as economias desenvolvidas obtiveram um crescimento ainda maior em 2016, após um aumento significativo em 2015. A queda do IDE na Europa, foi mais do que compensada por um crescimento modesto na América do Norte e um aumento considerável em outras economias desenvolvidas. No caso dos BRICS, o aumento dos fluxos para a Federação Russa, Índia e África do Sul, mais do que compensaram o declínio do IDE para o Brasil e a China. As vendas de fusões e aquisições, transfronteiras, diminuíram de US $ 44 bilhões em 2015 para US $ 37 bilhões em 2016. No entanto, o investimento Greenfield7 , aumentou 1 por cento, com transações concentradas na fabricação de alimentos, produtos químicos, elétricos e eletrônicos, veículos motorizados, serviços de infraestrutura (eletricidade, informações, telecomunicações) e atividades comerciais.
Ainda conforme o mesmo relatório, o grupo dos BRICS, é o lar de 24% das 500 maiores empresas do mundo. Estas empresas também estão emergindo como atores na paisagem global fusões e aquisições. Eles adquiriram ativos no valor de US $ 100 bilhões em 2016, em comparação com apenas US $ 37 bilhões em vendas transfronteiriças de fusões e aquisições.
Vale também ressaltar que o aumento do IDE dos “países em desenvolvimento”, em geral, e em particular dos BRICS, não teria sido possível sem o aumento substancial das reservas internacionais verificado a partir da década de 2000, como consequência do aumento das exportações e do ingresso de capitais (Cintra, 2005; Oliveira, 2012).
3.1 ENTRADA DE IDE NOS BRICS
O impacto do IDE no país anfitrião representa assunto de pesquisa intensa. Alguns pesquisadores, concluíram que o IDE normalmente vem acompanhado de uma reação positiva, no desenvolvimento econômico do país anfitrião, enquanto outros encontraram o inverso. Romer (1994), viu a transferência de tecnologia, como input com um significado especial no que diz respeito ao investimento estrangeiro direto como uma fonte de avanço tecnológico. Nesse caso, o efeito do IDE é inequivocamente positivo.
O trabalho teórico de Findlay (1978) e Wang e Bloomstrom (1992), que modela a importância do IDE como um canal para a transferência de tecnologia, verificou que os fluxos de investimentos estrangeiros, relacionam-se mais com os setores de manufatura ou de serviços e muito menos com o setor primário da economia. Além disso, o potencial do IDE para criar vínculos com empresas domésticas, como Albert Hirschman (1958) descreveu em seu livro sobre desenvolvimento econômico, também pode variar entre setores. O autor enfatizou que nem todos os setores, têm o mesmo potencial para absorver tecnologia estrangeira ou para criar vínculos com o resto da economia. Foi verificado, por exemplo, que "as ligações são fracas na agricultura e na mineração”.
Para Nistor (2011), o IDE é considerado um fator ativo para o desenvolvimento econômico e um recurso importante para se adaptar aos requisitos de mercado e a competitividade, representando para economias emergentes um elemento importante para o desenvolvimento econômico. Nestas circunstâncias, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, podem evoluir com a ajuda do investimento estrangeiro direto, a fim de alcançar patamares mais próximos das economias desenvolvidas.
Segundo dados do WTI (2017) da UNCTAD, os fluxos de IDE para o grupo dos BRICS no ano de 2016, aumentaram em 7 por cento, chegando a US $ 277 bilhões. Além disso, o estoque interno de IDE excedeu o estoque externo. No gráfico 03, podemos verificar este comportamento, para o período 2000/2016.
Os países BRICS, são predominantemente economias em desenvolvimento e como tal, são receptoras líquidas de IDE. A reconfiguração corporativa, o crescimento econômico e os sentimentos comerciais aprimorados contribuíram para o aumento desses fluxos, nos últimos anos, ficando clara a evolução quase que constante, do estoque de IDE nas economias BRICS para o período 2000-2016. É possível observar também, o alto nível de estoque de IDE a partir de 2009, período pós-crise, quando a China e o Brasil superam os 400 000 milhões de dólares por ano. Neste mesmo período, vimos que, o estoque de IDE se comportou de forma semelhante ao fluxo
A África do Sul, a Rússia, a Índia e o Brasil registraram níveis mais baixos de entradas de IDE antes de 2000, explicando em parte, o menor nível de estoque de IED em comparação com a China. As vantagens oferecidas por esses países, para atrair capital externo, principalmente no período pós ano 2000, refletiram em um aumento nos fluxos de IDE e, consequentemente, no estoque de IDE nessas economias. Em 2007, a Rússia manteve o maior nível de estoque de IDE chegando a 491.052 milhões de dólares, superando a China. Em 2010, a economia brasileira atinge o maior estoque de IDE dos países BRICS, alcançando 682,346 milhões de dólares. Para o período 2000 / 2016, a Índia e a África do Sul, registraram os níveis mais baixos de estoque de IDE do grupo. De acordo com dados da UNCTAD em 2016, os países BRICS detêm 10,53% do estoque global de IDE e continuam a crescer.
Analisando os fluxos de entrada de IDE nas economias emergentes, é possível observar que as economias do grupo BRICS, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, atraíram grandes entradas de investimento estrangeiro direto. Nistor (2015), verificou que as entradas de IDE nestas economias atingiram 20% da participação no IDE mundial em 2012. Segundo a autora, a força de trabalho barata da China, a população jovem da Índia, a indústria de óleo e gás na Rússia e os recursos naturais do Brasil, foram algumas das principais vantagens que tiveram o efeito de atrair uma quantidade crescente de IDE para as economias dos BRICS. É possível perceber também, que no período anterior a 2000, os fluxos de entrada de IDE nas economias BRICS eram bem mais baixos. Após 2000, estes fluxos começaram a crescer registrando taxas de crescimento anual cada vez maiores. No gráfico 04, é possível observar o comportamento dos fluxos de entrada de IDE para cada um dos cinco países do grupo, de forma independente.
Em 2001, embora menor do que em 2000, o ingresso de IDE para o Brasil teve um nível relativamente alto de cerca de 22 bilhões de dólares, segundo dados da UNCTAD. Esse nível de IDE se deu principalmente em função do amplo programa de privatização e abertura econômica, promovido pelo governo FHC. O fluxo de entrada de IDE foi dez vezes maior do que na Rússia e quatro vezes maior do que na Índia, durante o mesmo período. Mesmo assim, as entradas de IDE ainda eram muito pequenas em comparação com a China. Também Rússia, Índia e África do Sul registraram níveis baixos nos fluxos de entrada de IDE no início dos anos 2000, com menos de 5 bilhões de dólares por ano.
Em 2002 e 2003, os influxos de IDE apresentaram valores mais baixos, comparado à um período de repouso, devido à desaceleração global dos fluxos. Neste período, é possível observar uma queda acentuada no fluxo de IDE para o Brasil, refletindo principalmente o final das privatizações das empresas públicas e estatais. Por outro lado, a China continuava em um ritmo de crescimento acentuado, com um grande número de empresas transferindo suas áreas de produção para o país.
De 2004 a 2008, os fluxos de IDE crescem de 77 bilhões para 281 bilhões de dólares, com a China e a Rússia compartilhando os melhores resultados do grupo, principalmente em função da subida dos preços internacionais do petróleo, (UNCTAD 2013). Entre os anos de 2007 e 2008 ocorreu um aumento significativo nos fluxos anuais nas cinco economias do grupo, sendo que a China registrou um valor de 108,312 milhões de dólares. A África do Sul foi a única economia do grupo BRICS que em 2006, sofreu com um processo de alienação, mas a partir de 2007, conseguiu registrar valores mais elevados. Em 2009, o país atinge o pico na entrada de IDE, chegando a 9,2 milhões de dólares. A Índia também começou a registrar um ingresso anual de IDE acima de 20 bilhões de dólares, a partir de 2006. A Rússia que havia registrado níveis mais baixos de entradas de IDE até 2003, também começou a atrair um número maior de investidores. Em 2006, as entradas anuais de IED excederam 35 milhões de dólares.
Em 2009, os fluxos entrantes de IDE cai em todos os países do grupo, refletido uma retração dos investimentos de forma global, como consequência da crise de 2008, sendo as maiores quedas a do Brasil e da Rússia. No período 2010/2013 os fluxos permanecem praticamente estáveis, com exceção do Brasil que cresce fortemente em 2010/2011, mas volta a cair a partir de 2012 com problemas na economia interna. No Período 2013/2016 fica mais evidente a queda dos investimentos na Rússia, provavelmente reflexo do mau desempenho da indústria de óleo e gás, em função da queda nos preços do petróleo.
Como foi possível observar, após o ano 2000, o IDE interno começou a registrar um aumento de crescimento em todos os países do grupo BRICS, com ligeiras recaídas entre 2001 a 2005 devido ao abrandamento mundial desses fluxos.
A China liderou o grupo, tendo recebido os maiores investimentos durante o período de estudo. Em 2015, registrou o maior nível de entrada de IDE de todo o grupo, atingindo 135 610 Milhões de dólares. Este número, reflete a presença de grandes multinacionais no país, dando-lhe uma posição de liderança entre as economias mais atraentes para o investimento estrangeiro. Grande mercado potencial, políticas goveridntais favoráveis, e também os custos de mão-de-obra baratos, atraíram muitas empresas multinacionais, em setores como telecomunicações, automobilístico e também petroquímica. No pólo oposto, a África do Sul registrou o menor número de entradas de IDE dos BRICS ao longo do período analisado.
Borensztein, De Gregorio e Lee (1998), verificaram em sua pesquisa, utilizando uma amostra de 69 países em desenvolvimento nas décadas de 70 e 80, que os benefícios do IDE, estão condicionados ao adequado desenvolvimento de fatores locais do país receptor, tais como: desenvolvimento do sistema financeiro, infraestrutura adequada, políticas cambiais, entre outros aspectos positivos da economia.
3.2 INVESTIMENTO DIRETO DOS BRICS NO EXTERIOR
O crescimento do IDE realizados no exterior, em montante representativo, constitui-se de um fenômeno recente para os países do grupo BRICS. O fato marcante do fenômeno “BRICS como investidores internacionais” tem sido a forte expansão do IDE dessas economias, principalmente a partir do ano 2000. Empresas chinesas, indianas, russas, sul africanas e também brasileiras, até então desconhecidas na arena internacional, passaram a ocupar posição importante, embora em graus muito diferenciados, em diversos mercados. Diante da intensificação da concorrência, consequência do regime de globalização dos mercados, muitas empresas do grupo partiram em direção a outros países em busca de novos mercados e novas possibilidades de produção, enquanto meio para aumentar a competitividade em um regime oligopolista global.
Segundo Hiratuka (2010), É importante ressaltar que as empresas transnacionais dos “países em desenvolvimento”, têm de competir com as empresas transnacionais dos países desenvolvidos em um contexto em que o sistema de cadeia de valor é integrada verticalmente, e reproduzida dentro dos limites de um dado mercado/país, tipicamente prevalecente na “era de ouro do capitalismo”, passou a ser crescentemente substituído por um sistema cada vez mais distribuído e segmentado geograficamente, por extensão, com atividades mais especializadas. Esse processo permitiu a obtenção de economias de escala e escopo por parte das corporações transnacionais, ante o melhor aproveitamento das vantagens relativas de cada região.
Diferentes motivações condicionam a internacionalização empresarial. Dunning (2002), relata as diferenças substanciais entre os fluxos de IDE que envolvem apenas países desenvolvidos, tanto entre os países de origem, como os receptores, além daqueles em que os receptores são países em desenvolvimento. No primeiro caso os investidores procuram por ativos estratégicos, onde o IDE é representado por uma operação de fusão e aquisição, e também por eficiência horizontal. Já no segundo caso, os investimentos são caracterizados por procura de mercados, de recursos ou de eficiência horizontal.
Para Gammeltoft (2008), muitas multinacionais de economias emergentes e em desenvolvimento, gradualmente acumularam capacidades tecnológicas e vantagens específicas, suficientes para expandir suas operações para outros países. Consequentemente os fluxos de investimento externo provenientes destas economias, aumentaram significativamente em termos quantitativos. É possível perceber também que, ao se investigar abaixo da superfície quantitativa, encontra-se um número importante de mudanças qualitativas na composição e nas características estruturais do investimento externo realizado pelo mundo em desenvolvimento.
Em relação ao grupo dos BRICS, conforme podemos observar no gráfico 05, o investimento direto realizado por estes países no exterior, cresceram rapidamente nos últimos anos. Embora o fluxo de IDE tenha apresentado uma certa volatilidade, em função das oscilações dos ciclos econômicos mundiais, a trajetória do estoque de IDE, manteve uma tendência de alta durante todo o período de estudo, mesmo após a eclosão da crise internacional em 2008, mostrando a resiliência das empresas investidoras do grupo.
Conforme podemos verificar, a participação do estoque de IDE do grupo BRICS, explica também, parte importante do aumento desse mesmo estoque para o conjunto de “economias em desenvolvimento e em transição”. De fato, estes dados revelam o papel decisivo cumprido pelos BRICS, principalmente na expansão do IDE dos países não desenvolvidos. Outras “economias em desenvolvimento” também ampliaram tais investimentos, embora, segundo a UNCTAD, os centros financeiros offshore localizados nesse conjunto de países desempenharam papel relevante nesse sentido.
Depois de ter apenas dobrado, em valores nominais, e ter perdido posição relativa no estoque de IED global (outward) durante a década de 1980, o estoque de IDE dos países em desenvolvimento, subiu de US$ 328,6 bilhões, em 1995, para US$ 908,4 bilhões, em 2000. Isto significou um aumento da participação desses investimentos no estoque mundial de IED, de 8,7% para 11%.
Para os BRICS, a despeito do crescimento ao longo da década de 1990, foi a partir da década de 2000 e, em especial, a partir de 2008, que os estoques de saída de IDE registraram os aumentos mais importantes. Eles totalizaram US$ 127,9 Bilhões em 2000, atingiram US$ 624,6 bilhões em 2008 e fecharam 2016 em US$ 2,1 trilhões. Os maiores aumentos foram da China, que chegou a US$ 1,2 trilhões em 2016; seguida pela Rússia, com US$ 335,7 bilhões; pela África do Sul que ultrapassou o Brasil com US$ 172,8 bilhões, pelo Brasil com US$ 172,4 bilhões; e, finalmente, pela Índia, com US$ 144,1 bilhões, segundo os dados da UNCTAD STATS.
É importante ressaltar que no ranking de 2015 das cem maiores transnacionais não financeiras do mundo, elaborado e apresentado pela UNCTAD, aparece, entre os BRICS, uma empresa brasileira, a Vale S/A, com um total em vendas de US$ 25,6 bilhões, e duas chinesas, o China Ocean Shipping Group, com US$ 27,4 bilhões e a China National Offshore Oil Corporation, com US$ 99,5 bilhões.
É evidente que, por trás de todos os fatores, o aumento dos investimentos dos BRICS nas últimas décadas está associado ao acirramento da concorrência intercapitalista em um contexto de liberalização e desregulamentação dos mercados em escala global. A competição com as empresas estrangeiras está em todo lugar, seja no mercado nacional, seja no mercado internacional, no que se refere às regiões de atuação, ou seja por meio das exportações, e/ou por meio dos investimentos diretos desses países, no que tange às modalidades de investimento.
Quando analisamos os fluxos de saídas de IDE dos países BRICS de forma independente, verificamos que os mesmos, também apresentaram crescimento, principalmente a partir de 2005, puxados de forma especial pela Rússia e pela China. É possível perceber através do gráfico 06, que a diferença entre os países do grupo, no que se refere ao aumento destes fluxos é grande, em função dos diferentes níveis de estabilidade econômica em se encontram.
Diferentemente dos demais BRICS, o fluxo de IED brasileiro, a partir de 2000, apresentou um comportamento bastante volátil. Enquanto nos outros países do grupo, o fluxo de IDE cresceu de maneira praticamente continuada, entre 2000 e 2008, no Brasil, o mesmo sofreu oscilações substanciais. Após uma queda em 2001, em 2004, a saída de IDE cresce e atinge US$ 9,8 bilhões, mas em 2005 volta a cair. Em 2006, atinge seu pico, com US$ 28,2 bilhões. Em 2009 o investimento cai fortemente em razão da crise de 2008, mas fecha 2010 em US$ 22 bilhões, recuperando-se da queda. A partir de 2011inicia uma trajetória de queda fechando 2016 negativo em US$ 12,4 bilhões.
Esse comportamento oscilante assumido pelo fluxo de IDE brasileiro a partir de 2004 pode ser explicado pela sua maior sensibilidade às variações da economia no contexto interno e externo, mas também pela expressiva concentração do IDE em poucas operações, como por exemplo, o investimento de US$ 4,5 bilhões, em 2004, proveniente da fusão entre a Ambev e o grupo belga Interbrew, exerceu forte influência sobre estes números. A compra pela Vale das canadenses Inco e Canico totalizando aproximadamente US$ 17,4 bilhões, em 2006, é outro exemplo. Além disso, redução do crescimento da economia nos últimos anos, decorrente de políticas monetária e fiscal mais restritivas, para conter crescentes desequilíbrios macroeconômicos, produziu um duplo movimento. De um lado, estimulou as empresas a buscarem alternativas de rentabilidade no exterior. De outro, tornaram-nas mais cautelosas em utilizar os seus recursos. Outro fator que contribui para a queda do IDE externo brasileiro nos últimos anos, está associada aos fluxos de recursos das filiais estrangeiras para as matrizes no país.
Segundo Rocha, Silva e Carneiro (2007), a concentração da internacionalização produtiva brasileira nos setores ligados a recursos naturais, reflete a ausência de vantagens firma-específicas, em particular pelo baixo nível de investimento em P&D, comparativamente com as firmas asiáticas.
Em relação a Rússia, é importante destacar, que a partir dos anos 2000, foi iniciado um intenso processo de internacionalização produtiva, na sua economia, o qual pode ser aferido pela elevada relação entre saída e entrada de IDE, a maior entre os BRICS, tanto em termos de fluxo, como de estoque. No ponto de vista dos fluxos, a economia russa, conseguiu alcançar a condição de investidora líquida internacional. Atualmente, o país se coloca como o segundo maior investidor global entre os BRICS, sob a ótica do IDE.
O gráfico 06 mostra o excepcional crescimento do IDE externo russo, a partir de 2000. O fluxo desses investimentos, que naquele ano foi de US$ 3,1 bilhões, atingiu US$ 56,7 bilhões em 2008. Após serem fortemente impactados pela crise, os fluxos e o estoque de saída de IDE, voltaram a crescer nos anos seguintes, atingindo USS$ 70,6 bilhões em 2013, mas voltam a cair, fechando 2016 em USS$ 27,2 bilhões.
O ingresso da Rússia na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2012, e às políticas adotadas pelo governo para evitar a crise de algumas das principais empresas do país, durante a crise internacional, permitiram estas empresas aproveitarem as oportunidades criadas pelo novo contexto em mercados estratégicos.
Para Alves (2011) e Filippov (2010), a internacionalização, para as empresas russas, significa o acesso a fontes externas de financiamento, além de ser uma forma de fugir do sistema tributário e regulatório, que é excessivamente rigoroso no país, e da instabilidade econômica e política, que prejudica o desenvolvimento dos negócios.
Foi em um contexto de abertura da economia e de forte ingresso de recursos externos, prevalecente a partir da década de 2000, que a internacionalização produtiva das empresas indianas passou a se constituir como um fenômeno relevante. Conforme pode ser observado no gráfico 06, os fluxos de IDE indiano, que era de US$ 514,44 Milhões em 2000, aumentou para US$ 21,1 bilhões em 2008, refletindo a expressiva ampliação dos investimentos externos. Após a crise internacional, esses fluxos passam a cair em um ritmo gradativo e constante, chegando a US$ 1,6 bilhões em 2013. Isso reflete o fato de que os fluxos de saída de IDE indiano, embora positivos, foram cada vez menores a partir de 2008.A partir de 2014, estes investimentos voltam a crescer com mais vigor, encerrando 2016 em US$ 5,1 bilhões. A crise internacional, contribuiu para a deterioração das condições de financiamento das empresas não apenas no exterior, mas também no país. O sistema bancário indiano foi particularmente atingido pela exposição aos papéis e instituições relacionadas à crise, o que o levou a restringir a concessão de novos empréstimos. Além disso, a rápida e pronunciada saída de capitais do país exerceu impactos sobre o mercado de capitais doméstico, o que limitou a capacidade dessas empresas de captar novos recursos por meio da emissão de ações e títulos de dívida.
Segundo Silva (2012), o marco do processo de internacionalização das empresas indianas, se deu em 2000, com a introdução da Foreign Exchange Management Act (Fema), legislação que flexibilizou os critérios para a realização de IDE. O reconhecimento, por parte das autoridades indianas, da internacionalização como meio de aumentar a competitividade empresarial, levou-as, inclusive, a estimular este processo a partir de políticas públicas, como provimento de financiamento, seguros/instrumentos de minimização de riscos, incentivos fiscais, etc.
Embora insignificantes antes de 1985, os níveis dos fluxos de IDE externo dos chineses vêm crescendo de forma constante desde o ano 2000, independentes de crises mundiais. Este comportamento permitiu que o país assumisse elevada representatividade nos fluxos globais dessa modalidade de investimento. No gráfico 06, vemos que os fluxos de IDE chinês aumentaram de forma ininterrupta, refletindo a expansão acelerada desses investimentos, a qual não possui equivalente em nenhum dos outros países BRICS. De fato, os fluxos saltaram de US$ 915,7 milhões, em 2000, para US$ 55,9 bilhões em 2008 e daí para US$ 107,8 bilhões em 2013, encerrando 2016 em US$ 183,1 bilhões. Em 2013, o fluxo de saída IDE da China foi o terceiro maior entre todas as economias contempladas pela Unctad, atrás apenas dos USA e do Japão.
Essa intensificação da internacionalização produtiva das empresas chinesas foi, em grande medida, um resultado da política Going Global, uma iniciativa do governo destinada ao fomento da transnacionalização das empresas do país, iniciada em 2000. Como um dos pontos desta iniciativa, criou-se uma estrutura de financiamento subsidiado, com linhas de crédito específicas para essa finalidade, criadas e disponibilizadas pelo China Development Bank e pelo Export-Import Bank of China. Não por acaso, muitas das atuais transnacionais chinesas, são trial groups, ou seja, são empresas ou grupos empresariais escolhidos pelo Estado chinês para figurar no rol dos campeões nacionais. Segundo Silva (2012), em 2005, pouco mais de 80% dos fluxos totais de IED da China foram estatais. Vale ressaltar que cada vez mais, o empresariado privado, vêm participando desta política, em razão das dificuldades das empresas estatais chinesas de realizarem operações de fusões e aquisições no exterior, ante as barreiras impostas pelos países ocidentais.
A África do Sul, embora com valores mais modestos nos fluxos de IDE externo, se comparado a outros países do grupo, é a maior fonte de investimento externo da África. Estes fluxos, têm sido impulsionados principalmente pelo investimento em recursos, bem como por oportunidades de investimento em países vizinhos, como resultado de privatizações. Em 2000 esses fluxos eram de apenas US$ 270,6 milhões, após queda forte em 2001 e 2002, chega em 2006 com US$ 6,3 bilhões, volta a cair em 2007 e 2008, em função da crise mundial, mas a partir de 2012 volta a crescer atingindo seu pico em 2014 com US$ 7,6 bilhões e fechando 2016 em US$ 3,3 bilhões. Como podemos observar os fluxos tiveram uma alta volatilidade no período.
De fato, os anos 2000 foram de significativas mudanças nas opções geográficas dos investimentos diretos realizados pelas empresas sul-africanas no exterior. Historicamente, a Europa vinha dominando cerca de 90% do estoque de investimentos da África do Sul. Entretanto, esta proporção caiu para apenas 42% em 2009, e, em 2012, se encontrava em 45%. Para Alves (2014), esta mudança nos fluxos de investimentos sul-africanos se deve, principalmente, ao crescimento dos investimentos feitos na África e na Ásia, em meados dos anos 2000, quando, partindo de participações de 7% e 1% nesses estoques, respectivamente, atingiram participações de 21% cada um, em 2012.
Segundo Naidu e Lutchman (2004), uma das vantagens encontrada pelas empresas sul africanas, para realizar o IDE, era a taxa de retorno dos investimentos. Nos países da SADC8 , era de cerca de 30%, e alcançava, em alguns casos, 60%, frente ao rendimento típico, que ficava entre 14% e 20%, no mercado interno. Além disso, o grau de desenvolvimento sul-africano frente aos países da SADC, permitiu às empresas da África do Sul, oferecer produtos e serviços mais sofisticados que aqueles prevalecentes na região, seja por meio de exportações, seja por meio de investimentos diretos.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de globalização econômica evidenciado nos mercados do mundo desenvolvido com a abertura internacional, a partir da década de 1980, e que posteriormente atingiu as economias em desenvolvimento a partir da década de 1990, foi em grande medida responsável pelo aumento do investimento externo direto. Além disso, este processo foi intensificado pelos avanços tecnológicos que permitiram uma maior integração, alterando o cenário macroeconômico das nações e minimizando os problemas causados pelas distancias geográficas.
Focalizando o grupo dos países BRICS, foi possível observar que estes países embora possuam economias bastante distintas, eles compartilham de algumas características em comum: taxas de crescimento econômico com alto potencial de expansão, em comparação as taxas globais e altas taxas populacionais. Além disso, 40 por cento da população mundial vive hoje nos BRICS, fazendo com que estes países ganhem importância não apenas como fornecedores de recursos para estados industrializados, mas também como importantes atores econômicos. Este rápido e pronunciado aumento da importância dos BRICS na economia mundial, pode ser observado na participação do grupo no total da riqueza produzida em todo o mundo. Segundo a UNCTAD, em 2013, essa importância era de 27,5% do PIB mundial, ou US$ 8,5 trilhões, caindo em 2015 para 23,1%. Vale ressaltar que os cinco países que compõem o grupo, apenas a África do Sul não está entre as 10 maiores economias do mundo e que este desempenho econômico, tem sido sustentado, preponderantemente, pelas altas taxas de crescimento da economia chinesa.
Analisando a evolução do investimento direto externo dos BRICS, é possível observar um crescimento considerável do volume dos fluxos anuais e dos estoques. Os fluxos de IDE para os cinco países do grupo, aumentaram em 7%, chegando a US $ 277 bilhões, em 2015, fazendo com que o estoque interno de IDE ultrapassasse o estoque externo. Para a UNCTAD, o IDE continua a ser a maior e mais constante fonte externa de financiamento para as economias em desenvolvimento - em comparação com investimentos de carteira, remessas e fontes oficiais de desenvolvimento.
O investimento direto intra-BRICS também cresceu de forma consistente. A parcela de IDE compartilhada entre os países membros, aumentou de 2,5% em 2012, chegando a 4,5% do estoque total de IDE do grupo, em 2015, segundo o relatório da UNCTAD (2016). Percebe-se ainda, que as multinacionais dos BRICS vêm mostrando maior interesse no investimento direto dentro do próprio grupo.
Foi possível verificar também, que o aumento da saída de IDE dos BRICS se firmou como um importante fenômeno da economia internacional, principalmente a partir da década de 2000. Esse processo foi viabilizado, em grande medida, pelo aumento das reservas internacionais e por uma maior disposição dos governos desses países em estimular esse processo por meio de políticas públicas, ainda que sob formas diferentes e em distintas magnitudes.
Este desempenho fica mais evidente quando observamos o crescimento do estoque de saída de IDE dos BRICS, que em 2000 totalizaram US$ 127,9 Bilhões, em 2008 atingiram US$ 624,6 bilhões, fechando 2016 em US$ 2,1 trilhões. É importante destacar que a China foi o país que mais contribuiu com este resultado, conseguindo a marca de US$ 1,2 trilhões em investimento direto no exterior, no ano de 2016, tendo como objetivos principais: obter acesso a novos mercados e adquirir ativos que gerassem fluxos de receita em moedas estrangeiras.
Mesmo contando com uma certa volatilidade nos fluxos de IDE, se comparado com o mundo desenvolvido, os BRICS encontram-se em uma posição privilegiada em vários aspectos. Eles são grandes economias, onde o IDE é atraído principalmente em função dos mercados locais, os quais mantêm expectativas de crescimento acima da média mundial. Neste contexto, as grandes multinacionais têm suas estratégias facilitadas, podendo concentrar seus investimentos em um grupo de poucos países, possibilitando a expansão das vendas a um baixo custo.
Também é possível observar, que uma grande parte da saída de IDE dos BRICS é por busca de recursos, particularmente da China e da Índia, que visa a Ásia e a África. O Brasil, assim como a África do Sul, ainda são players considerados mais regionais que globais. Já no caso da Rússia, a UE é uma importante região de destino do IDE externo e, pela quantidade de capital destinado, é o mais importante investidor BRICS na região.
Embora as atividades de investimento direto dos BRICS ainda permaneçam em um nível baixo, se comparadas ao mundo desenvolvido, todos os países membros estão em um curso de expansão internacional recente, com expectativa de crescimento. A preocupação atual é estimar se estes países terão a mesma tendência ascendente, dadas algumas fraquezas identificadas dentro deles: o alto nível de corrupção, ideologias políticas diferentes, exposição excessiva a commodities, etc.
Para a UNCTAD, a formulação de políticas de investimento está ficando mais complexa, mais divergente e mais incerta. As considerações de desenvolvimento sustentável, vêm tornando estas políticas mais desafiadoras e multifacetadas. A elaboração de políticas também, reflete a variedade de abordagens com as quais as sociedades e os governos respondem aos efeitos da globalização. Isto, juntamente com mais intervenções goveridntais, também reduziu a previsibilidade para investidores. Neste sentido, um regime de investimento direto baseado em regras, com amplo apoio internacional, que visa a sustentabilidade e a inclusão, pode ajudar a reduzir a incerteza e melhorar a estabilidade nas relações de investimento direto externo.
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