Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352


ANÁLISE DA REPRODUÇÃO ECONÔMICA DE AGRICULTORES EM AMBIENTES DIFERENCIADOS NA MICROBACIA DO ARICURÁ, CAMETÁ-PA, AMAZÔNIA, BRASIL

Autores e infomación del artículo

Ana Julia Mourão Salheb do Amaral*

Paulo Fernando da Silva Martins**

Sônia Maria Simões Barbosa Magalhães Santos***

UFPA, Brasil

pfsm@ufpa.br

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Resumo
Este artigo1 tem como objetivo avaliar reprodução econômica das famílias campesinas que exploram o ambiente de várzea estuarina em estabelecimentos rurais de uma microbacia da região do baixo rio Tocantins. Os dados foram coletados em duas etapas de pesquisa de campo, usando as ferramentas da observação participante e de entrevistas. A pesquisa constatou a diferenciação dos componentes da renda familiar como também dos valores encontrados em cada componente devido as implicações do ambiente em que cada comunidade se encontra, mostrando a relevância da disponibilidade do ambiente de várzea e da exploração do açaizeiro na reprodução econômica das famílias.
Palavras-chave: Agricultura familiar, várzea estuarina, terra firme, açaizeiro, renda familiar, valor agregado.

ANÁLISIS DE LA REPRODUCCIÓN ECONÓMICA DE AGRICULTORES EN AMBIENTES DIFERENCIADOS EN LA CUENCA DEL ARICURÁ, CAMETÁ-PA, AMAZONIA, BRASIL.

Resumen

Este trabajo tiene como objetivo evaluar la reproducción económica de familias campesinas que explotan el ambiente de tierras bajas del estuario en comunidades rurales de una cuenca en la región del bajo río Tocantins. Los datos fueron recolectados en dos etapas de investigación de campo, utilizando herramientas de observación participante y entrevistas. La investigación verificó la diferenciación de los componentes de la renta familiar, así como los valores encontrados en cada componente, debido a las implicaciones del ambiente en que cada comunidad está insertada. Confirma la relevancia tanto de la disponibilidad del ambiente de tierras bajas en los establecimientos agrícolas y de la explotación del "açaizeiro" en la reproducción económica de las familias.

Palabras –clave: Agricultura familiar, tierras bajas, tierra firme, açaizeiro, renta familiar, valor agregado.

ANALYSIS OF ECONOMIC REPRODUCTION OF FARMERS IN DIFFERENTIATED ENVIRONMENTS IN THE ARICURÁ MICROBACY, CAMETÁ-PA, AMAZÔNIA, BRAZIL.

Abstract

This paper aims to evaluate the economic reproduction of peasant families that exploit the estuarine floodplain environment in rural communities of a micro basin in the region of the lower Tocantins River. Data were collected in two stages of field research, using participant observation tools and interviews. The research verified the differentiation of the family income components, as well as the values found in each component, due to the implications of the environment in which each community is inserted. It confirms the relevance of both the availability of the floodplain environment in the farms and the exploitation of the açaí tree in the economic reproduction of the families.

Key-words: Peasant family, estuarine floodplain, firm land, açaí tree, family income, added value.

1 Este artigo faz parte da dissertação de mestrado da referida autora, intitulada “Várzea ou terra firme? A (re) produção do sistema família- estabelecimento na microbacia do Aricurá- Cametá- Pará”. Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares, Universidade Federal do Pará, Belém, 2018. Contando com o financiamento de bolsa de mestrado CNPq e do Grupo de pesquisa GEDAF (Grupo de Estudos da Diversidade da Agricultura Familiar) cadastrado no diretório da Plataforma do CNPq.

Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Ana Julia Mourão Salheb do Amaral, Paulo Fernando da Silva Martins y Sônia Maria Simões Barbosa Magalhães Santos (2018): "Análise da reprodução econômica de agricultores em ambientes diferenciados na microbacia do Aricurá, Cametá-PA, Amazônia, Brasil", Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, (mayo 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/oel/2018/05/reproducao-economica-agricultores.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/oel1805reproducao-economica-agricultores


1. INTRODUÇÃO
Na Amazônia, os ambientes de várzeas e de terras firmes são utilizados por populações que habitam as planícies, sendo que muitas vezes os moradores podem ou não dispor simultaneamente desses dois ambientes que requerem estratégias diferenciadas de sobrevivência.
Especialmente nas várzeas estuarinas amazônicas, que sofrem a influência das marés do oceano Atlântico, como é o caso das situadas nas planícies da parte baixa do rio Tocantins, dentre as explorações efetuadas, a do açaizeiro, espécie Euterpe oleracea Mart., tem aumentado em virtude da expansão do mercado nacional e internacional (ENRIQUEZ; SILVA; CABRAL, 2003; NOGUEIRA; FIGUEIRÊDO; MULLER, 2005; OLIVEIRA; FARIAS NETO; QUEIROZ, 2015).
O rio Aricurá, tributário do Tocantins no seu baixo curso, forma uma microbacia localizada ao sul da cidade de Cametá, Estado do Pará, com aproximadamente 6 km2   que é formada por ambientes de várzea e de terra firme, que se apresentam por vezes associados em um mesmo estabelecimento rural. Nesta microbacia as duas principais comunidades rurais são a  comunidade do Ajó e a comunidade do Aricurá, sendo que  a primeira é formada por ambientes de várzea e de terra firme enquanto a segunda é formada apenas por ambiente de várzea, A principal atividade dessas comunidades é a exploração do açaizeiro. Assim, as condições dessa microbacia permitem abordarmos, em uma unidade da paisagem, como esses ambientes são utilizados pelas famílias de moradores e quais os fatores de relevância que atuam nas possibilidades de exploração e de reprodução econômica dessas famílias em seus estabelecimentos rurais.
Considerado que a disponibilidade de terrenos com várzea explorada nos estabelecimentos rurais pode ter um papel importante na reprodução socioeconômica das famílias, este trabalho tem o objetivo de avaliar as peculiaridades da exploração do ambiente de várzea estuarina em uma microbacia hidrográfica da região do baixo rio Tocantins através do estudo da reprodução econômica das famílias campesinas a partir de estabelecimentos rurais que possuem ambiente de várzea e  de terra firme e  estabelecimentos que possuem só ambiente de várzea.

2. CAMPESINATO DA REGIÃO DO BAIXO TOCANTINS
O Território Baixo Tocantins localizado no Estado do Pará, abrange uma área de 36.024,20 Km² e é composto por 11 municípios: Abaetetuba, Acará, Baião, Barcarena, Cametá, Igarapé-Miri, Limoeiro do Ajuru, Mocajuba, Moju, Oeiras do Pará e Tailândia (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO, 2013). O território do Baixo Tocantins é um espaço de ocupação antiga, e desde o período colonial predomina a produção/extração, em detrimento da conservação/preservação ambiental (BASTOS et. al., 2010; REIS, 2015). A região é bastante antropizada, e possui extensas áreas alteradas e as áreas de várzea têm recentemente sido alvo de uma revitalização econômica devido ao boom de manejo de açaí (BASTOS et. al., 2010).
A região é atravessada pelo rio Tocantins, pertencente ao estuário amazônico e que deságua no rio Pará, se junta ao rio Guamá, formando a baía do Guajará e o complexo fluvial da foz do gigante rio Amazonas o qual despeja diariamente milhões de metros cúbicos de água doce no Oceano Atlântico (COSTA, 2006). No estuário é a oscilação das marés de seis em seis horas dos rios que condiciona a vida da população local, a microrregião integra a Bacia do Tocantins, considerada a segunda mais importante do país, superada apenas pela Bacia do Rio Amazonas (ALMEIDA, 2010).
Conforme as literaturas abordadas (ALMEIDA, 2010; BASTOS et. al., 2010 e REIS, 2015) sobre a ocupação do território do baixo Tocantins, a região passou por várias mudanças desde sua formação até os dias atuais que influenciaram a dinâmica da região. Segundo Santos (2014), na década de 1980, a estagnação econômica do território do Baixo Tocantins se agravou, devido, em grande parte, aos efeitos da implantação da UHE Tucuruí sobre a economia ribeirinha, especialmente sobre a atividade pesqueira. A mudança no ciclo hidrológico do rio Tocantins, a formação da barragem e do imenso lago, assim como as alterações na fauna e na flora aquáticas afetaram o processo de reprodução e de mobilidade de diversas espécies de pescado. Isso influenciou diretamente a oferta de pescado à jusante da UHE Tucuruí, ou seja, em toda a região do Baixo Tocantins (SATONS, 2014). Nos dias atuais, as atividades de agricultura e do extrativismo ainda regem a economia local destacando agora a produção do fruto do açaí (ALMEIDA, 2010).
Compreende-se que há na Amazônia um campesinato diversificado, que se metamorfoseia de acordo com a realidade de cada mesorregião ou microrregião amazônica. Na região do Baixo Tocantins essa diversidade campesina é bem evidente pelas várias formas de estratégias adaptativas em diversidade produtiva e manejo integrado dos recursos naturais caracterizados pela relação entre homem e natureza. Devido aos processos produtivos adaptativos, combinando extrativismo, agricultura e pesca, por meio da extração e manejo dos recursos florestais e aquáticos, bem como da agricultura em pequena escala (REIS, 2015).
Assim, o modo de viver do campesinato na Amazônia advém do seu conhecimento do uso e manejo dos recursos naturais, resultado não só de um processo de adaptação socioeconômica da biodiversidade presentes, mas também, de sua história cultural, ou seja, das suas experiências passadas (PINTO, 2005). Com isso os graus de adaptação ao meio ambiente amazônico variam em função das circunstâncias históricas, sociais e político-econômicas que as têm influenciado (MORÁN, 1990).
Continuando no mesmo pensamento de Morán (1990), a relação homem/ambiente se caracteriza por uma mistura de uso e conservação. Cada sociedade adquire critérios únicos que consagram a maneira pela qual os recursos devem ser utilizados e para qual fim. O homem, da mesma forma que tantas outras espécies, geralmente se reproduzem e crescem até os limites ambientais corrigindo seu comportamento reprodutivo e o uso dos recursos ambientais.
Um argumento interessante que o autor utiliza para se basear é que a heterogeneidade das populações que têm habitado a Amazônia que reflete a diversidade do ambiente; em que essas sociedades são produto do contato Inter étnico, de processos históricos particulares, da ação de missões religiosas e da natureza da intervenção do Estado. Outro elemento interessante apontado por Morán (1990) é em relação às práticas culturais, tais práticas sofrem continuamente inserção de novos valores pelo convívio e relações com outras populações, mantendo assim o processo de mudança cultural como elemento central do processo adaptativo dessas populações.
Além disso, a complexidade das atividades num estabelecimento agrícola aumenta ainda mais quando se encontram os dois ecossistemas presentes (várzea e terra firme), tendo como ponto relevante a influência da várzea como um fator determinante na vida dos camponeses, na sua reprodução social e nas atividades produtivas.
Marin e Castro (1998 apud Reis, 2015), enfatizam que, o que regula as atividades produtivas em comunidades amazônicas tradicionais é o tempo da natureza, desse modo, as estações de chuva e estiagem estruturam a vida econômica das famílias, assim como o clima, o ciclo das marés e o movimento das águas dos rios que influenciam o ambiente local e o uso dos recursos naturais pelas famílias ribeirinhas em suas comunidades. Isso aliado aos aspectos socioculturais como discorrem Aguiar et. al. (2010) sobre a relação entre as populações ribeirinhas e a natureza.
Na localidade estudada, atualmente o açaí é o carro chefe de produção, muito embora os estabelecimentos com maior diversificação tenham a vantagem de dispor de terrenos de várzea e de terra firme. É de se indagar, por um lado, sobre as implicações e as limitações dos estabelecimentos que possuindo terrenos de terra firme possuem reduzida área de várzea e, por outro lado, os que só possuem várzea, embora possam produzir açaí, não podem produzir diretamente a farinha, (por não possuírem terra firme) um dos componentes principais da sua alimentação (SOUZA; MENDES; OLIVEIRA, 2012), muito embora se saiba também que os ribeirinhos costumam trocar sua produção com agricultores da terra firme.
O saber camponês dos agricultores- ribeirinhos revela um conhecimento e a suas múltiplas práticas produtivas por meio do cultivo e manejo do açaí, da pesca, da caça, do extrativismo vegetal, da criação de animais domésticos e da agricultura, dentre outras atividades, seguindo ritmos sazonais impostos pela dinâmica do ecossistema de várzea (REIS, 2015). Essas práticas são uma expressão sofisticada da relação entre o homem e a natureza, expressando não apenas dimensões técnicas, mas também princípios morais e simbólicos (WOORTMANN, 2009). Sendo integrados ao meio ambiente e fazendo parte dele, os agricultores-ribeirinhos, nas condições de pescadores, agricultores e extrativistas.
O camponês que estamos estudando é um tipo de camponês que desenvolve uma multiplicidade de atividades, assim como aponta o estudo de Witkoski (2007) sobre a região do Baixo Amazonas, em que essas múltiplas atividades formam o modo de vida daquele campesinato, sendo essa multiplicidade presente também no campesinato do Baixo Tocantins. Esta multiplicidade de atividades faz dele um agente econômico, social e político que pode ser classificado como multifuncional condição necessária, embora não suficiente, para seu desenvolvimento pleno (WITKOSKI, 2007).

3. ÁREA DE ESTUDO
As cidades ribeirinhas assim como, Cametá surgiram ligadas ao processo de ocupação inicial do espaço amazônico, pelo qual se configuraram os primeiros aldeamentos e povoados nas margens dos rios, com o objetivo de ocupar e proteger território; o que remonta ao contexto da colonização ibérica e seus desdobramentos ocorridos na região (DA TRINDADE JÚNIOR, Saint-Clair Cordeiro et. al., 2011). Cametá foi à cidade que teve o papel destacado durante a Revolução da Cabanagem movimento cívico de maior repercussão da história do Estado do Pará e na Amazônia.
Cametá possui uma área de aproximadamente 3.081,367 km² (IBGE- CIDADES, 2016) com sua formação territorial composta por 20,3% de rios e baías, 36,4% de campos naturais, 26,2% de áreas de várzeas e ilhas sendo formada por 17,1% de terra firme (OLIVEIRA et. al., 2014). O município de Cametá limita-se ao norte com Limoeiro do Ajuru, ao sul, com Mocajuba, a leste, com Igarapé-Miri e a oeste, com Oeiras do Pará, situando-se entre as coordenadas 1°55’ e 2°38’25” de latitude sul e 49°50’34” e 49°11’13” de longitude oeste (IBGE- CIDADES, 2016). Conta com uma população de 120 896 habitantes segundo o último censo realizado pelo IBGE, com estimativa de habitantes para o ano de 2016 de 132.515 pessoas. Mais de 50% dos habitantes da zona rural encontram-se na região das ilhas, portanto, uma população superior a 30 mil pessoas (IBGE- CIDADES, 2016).
Em relação à economia, nas últimas décadas o município passou por alguns ciclos econômicos, caracterizados na Região do Baixo Tocantins. Assim, se favoreceu bastante dos ciclos da borracha e do cacau, mas o último com bastante importância econômica foi a pimenta-do-reino. Nesse sentido, percebe se na cidade de Cametá, assim como na região do Baixo Tocantins como um todo, a mudança dos sistemas agrários, impulsionados pela economia do mercado, o que traz consequências para as populações locais tendo que introduzir essas novas culturas, na maioria das vezes sem recursos financeiros para custear a produção e auxilio técnico. 
Mais precisamente na microbacia do Aricurá, lócus da pesquisa, embora esteja situada em um domínio de área de várzea, formada pela influência do Rio Tocantins, nela são encontradas significativas áreas de terra firme, seja na transição entre a várzea e a terra firme margeando a linha de costa, ou mesmo em enclaves dentro dessas ilhas, conhecidas como “icas”. Essas diferenciações criam uma distinção no uso produtivo da terra, apresentando alta ou baixa dependência com relação ao solo, na medida em que podem incluir áreas mais alagáveis (Igapós e várzea baixa) e áreas menos alagáveis situados nos tesos (várzea alta) e, por conseguinte, com as melhores características edáficas para o estabelecimento desses ambientes (SILVA; SILVA; RODRIGUES, 2002). As diferenciações do ambiente entre estabelecimentos rurais, se compostos de várzea associada à terra firme, como ocorre na comunidade de Ajó, ou composto apenas de várzea, como é o caso da comunidade de Aricurá, implicam diretamente no sistema produtivo desses agricultores e nas suas relações socioeconômicas, fato este que pode ser bem explorado no local escolhido.

3.1 Características Gerais da Microbacia do Aricurá
O rio Aricurá é um rio de 3ª ordem, afluente da margem esquerda da parte baixa do curso do rio Tocantins. Sua bacia, aliás, microbacia, tem uma extensão de aproximadamente 6 km² e está localizada ao sul da cidade de Cametá, conforme a (figura 1), onde é possível se distinguir as duas comunidades rurais existentes a esquerda da microbacia está localizada a comunidade do Ajó (composta pelo ambiente de várzea e terra firme) sendo acessada pela estrada do Ajó, de acesso à cidade pelas populações do interior. Ela foi traçada praticamente no limite oeste da bacia, onde se dá a transição entre a terra firme e a várzea. E a direita da microbacia está localizada a comunidade do Aricurá (composta somente pelo ambiente de várzea), em que o Rio Aricurá se estende em toda a extensão da comunidade.

A microbacia do rio Aricurá possui, na sua margem esquerda, diversos tributários de ordens superiores, não apresentando tributários na margem direita onde não se verifica a presença de terra firme. Esta microbacia apresenta uma complexa malha hidrográfica particular e se destaca pala diversidade quanto ao ecossistema, além de várzea, também há presença de terra firme condicionando a cobertura vegetal e, consequentemente, a forma como o meio é explorado (SILVA- JUNIOR, 2016). Estas diferenças, além de se expressarem através de seus marcos históricos (conforme os interlocutores das duas comunidades), e também por eles, implicam na existência de dinâmicas também diferenciadas de ritmos de vida entre seus moradores e do desenvolvimento de sistemas de produção cujas especificidades precisam ser consideradas na avaliação da reprodução do sistema família-estabelecimento.
Essa malha hidrográfica particular se constitui em diferenças quanto às características do meio ambiente. Essas diferenças ocorrem pelo fato da comunidade do Aricurá se localizar no lado direito da bacia, no entorno da calha do rio Aricurá e da foz de seus tributários, onde os lotes são constituídos só de ambientes de várzea enquanto a comunidade do Ajó ficar localizada no lado esquerdo da bacia, entre a terra firme e a calha do rio, onde nascem os afluentes e os lotes são constituídos de terra firme e várzea.

4. MÉTODOS EMPREGADOS
Foi efetuado um levantamento preliminar incluindo dados secundários sobre as comunidades a serem estudadas abrangendo pesquisa bibliográfica e leitura de trabalhos de anteriores sobre a microbacia do Aricurá vinculados ao projeto de pesquisa do GEDAF (Grupo de Estudos sobre a Diversidade da Agricultura Familiar).
A pesquisa buscou seguir as recomendações de Brumer et. al. (2008) que orienta a uma estratégia de hierarquização (planejamento operacional) dos objetivos da pesquisa abarcando todos os passos ou etapas necessárias para sua execução em resposta ao problema de pesquisa.  A pesquisa de campo iniciou no final do ano de 2016 com um pré-campo visando reduzir as possibilidades de erros e distorções que poderiam vir a ocorrer (BRUMMER et. al., 2008, p. 138) e se estendeu ao longo do ano de 2017 envolvendo duas etapas.
As ferramentas de coleta de dados utilizadas foram a observação participante que segundo Mann (1970, p. 96), é uma “tentativa de colocar o observador e o observado do mesmo lado, tornando se o observador um membro do grupo de molde a vivenciar o que eles vivenciam e trabalhar dentro do sistema de referência deles”, ou seja, o princípio da observação participante nesta pesquisa foi de se colocar ao mesmo lado que o observado, estar presente nas principais atividades, através da vivencia direta nos estabelecimentos e com as famílias. E as entrevistas foram de acordo com cada nível de profundidade (BRUMER et. al., 2008) para obtermos as informações necessárias, sendo composta por entrevistas estruturadas, semi- estruturadas e não diretivas.
A população total estimada de famílias da microbacia do Aricurá é de 195 famílias, 125 famílias são da comunidade do Aricurá e 70 famílias são da comunidade do Ajó.  As famílias entrevistadas fazem parte da primeira e segunda geração de moradores da microbacia, conforme foi relatado no histórico da mesma, fundada há 46 anos.
A primeira etapa envolveu onze famílias (sete na comunidade do Aricurá e quatro na comunidade do Ajó), nessa etapa foram coletados os dados mais gerias sobre as rendas das famílias. Na segunda etapa foram escolhidas seis famílias (quatro na comunidade do Aricurá e duas na comunidade do Ajó) da amostragem anterior para se fazer os cálculos da renda famílias, assim como o cálculo do valor agregado da produção. As famílias foram enumeradas de 1 a 11 e denominadas conforme a comunidade onde estão localizadas.

4.1 Cálculos da renda familiar e do Valor agregado

Para se comparar a renda familiar bruta anual das famílias (foram levados em consideração para o cálculo as rendas não agrícolas- aposentadoria, benefícios sociais e renda de trabalhos extra e a renda agrícola -que no caso dos estabelecimentos pesquisados a renda agrícola é igual ao valor agregado, pois não existem nos estabelecimentos valores de salário, impostos, juros e renda da terra) de acordo com o INCRA/ FAO (1999).  Como também se chegar ao valor agregado foram utilizados os critérios com base no Guia INCRA/FAO (1999).
O valor agregado (VA) corresponde ao valor adicional criado por um agente econômico que adquirem os bens e serviços ao serem transformados durante o processo produtivo. Portanto o valor agregado se caracteriza como uma medida de valor econômico, que avalia a atividade produtiva da unidade de produção durante um ano de trabalho. O Valor agregado mede especificamente o valor novo gerado pela unidade de produção e sua determinação permite comparar as atividades produtivas de unidades que não se encontram na mesma situação sob ponto de vista do domínio dos meios de produção (NEUMANN; SILVEIRA, 2000), por isso a escolha de se trabalhar com o VA como forma de unidade de comparação entre as famílias.
Para se chegar ao VA primeiramente precisa- se ter três valores o produto bruto (PB), consumos intermediários (Ci) e a depreciação (D). O valor obtido do produto bruto (PB) corresponde ao valor total do que é produzido, seja para a venda ou para o consumo da família. O leque de itens levados em conta para medir o produto bruto foi: a produção do açaí, da pesca, da piscicultura, das criações e das hortas, ou seja, todos os componentes das atividades produtivas que foram vendidas e consumidas pela família.
O valor dos Consumos intermediários (Ci) foi obtido através de bens que são inteiramente transformados no processo: adubos, óleo diesel, sementes, ração e medicamentos para os animais, etc., por isso são chamados de intermediários porque são transformados durante o processo produtivo (INCRA/FAO, 1999). 
O valor da depreciação corresponde à fração dos meios de produção adquiridos pela unidade de outros agentes (máquinas, instalações, equipamentos, etc.) que não são integralmente consumidos no decorrer de um ciclo produtivo. A forma desse cálculo foi extraída de definições trazidas por Hoffmann et. al. (1987) e também Santos e Marion (1993). Esse método recebe o nome de método de depreciação linear. O valor da depreciação foi obtido pela seguinte formula segundo esse método:

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 Aspectos econômicos das famílias

O estudo e o entendimento da renda familiar são de extrema importância, para se avaliar as condições da reprodução econômica e social do campesinato, sobretudo o amazônico.  A análise da renda familiar representa um elemento importante para permitir uma aproximação das condições favoráveis para agricultura familiar (MENEZES, 2002). Como ainda argumenta Menezes (2002) é evidente que, para uma possível reprodução socioeconômica da agricultura familiar ou ao menos sua durabilidade, as condições socioeconômica e ecológica dos agricultores devem ser satisfatórias. Esta satisfação não deve ser apenas no sentido de alimentar e suprir as necessidades básicas da família, mas, principalmente, numa perspectiva de continuidade de condições favoráveis de reprodução local das famílias.

5.1.1 Componentes da renda familiar

A renda familiar é, sem dúvida alguma, um elemento fundamental para efetivação do consumo familiar e dos investimentos nos sistemas de produção dos estabelecimentos, ou seja, a renda familiar representa a renda total obtida pelo conjunto família-estabelecimento durante um ciclo agrícola. Portanto, além da renda das atividades produtivas, a renda familiar também é constituída pelas rendas oriundas de outras atividades realizadas fora do estabelecimento, como é o caso da pesca e da renda das atividades não agrícola como a de benefícios sociais.
A hipótese principal desta abordagem é fundamentada no funcionamento do estabelecimento com objetivos essencialmente voltados para o atendimento do “padrão reprodutivo” vinculado a uma “rotina de trabalho” e a um “habito de consumo” (FREITAS; GOMES, 2006). Então, novamente, cada família terá suas especificidades que se refletirão no valor dos diversos componentes da renda familiar.
Atualmente a economia da região de Cametá é a base do extrativismo vegetal, agricultura familiar e da pesca artesanal, complementada por outras rendas como aposentadorias, auxílios governamentais, serviços públicos na área educacional, na área da saúde e no setor informal, e criações de pequenos animais fazem parte da economia que é sazonal (OLIVEIRA et. al, 2014). Sendo assim neste capitulo iremos explanar quais os principais componentes da renda familiar agrícola e não agrícola e ainda mostrar a implicação que o ambiente tem com as atividades produtivas. Levando em consideração que o sistema de produção familiar apresenta disposição e capacidade de inovar se forem atendidos os critérios que assegurem, antes de tudo, a reprodução da família.
No gráfico 1 encontramos a distribuição da renda familiar dos estabelecimentos estudados da comunidade do Aricurá, que na média corresponde a R$ 20.419,20. A renda da produção do fruto do açaí constitui a maior parte da renda com 55% da renda bruta anual (RBA), seguida da renda de benefícios sociais, que incluem as aposentadorias (5%) e a bolsa família (15%), que vem em segundo lugar perfazendo 20%, pois todas as famílias recebem bolsa família e duas recebem a aposentadoria.
Outro componente importante para a renda das famílias ribeirinhas da comunidade do Aricurá é o seguro defeso. Optamos por separar este item do item de benefícios socais, pois ele decorre do fato das famílias sendo também de pescadores, o benefício decorre de atividades produtivas. Esta renda fica em terceiro lugar com 10% da renda bruta anual. Segundo a colônia de pescadores Z-16 (2006), no período do defeso da pesca, no território do Baixo Tocantins, a queda na rentabilidade das famílias é compensada pelo seguro defeso, que complementa, com um salário mínimo mensal, a renda para cada pescador ou pescadora. Como a pesca não é totalmente fechada, há um limite legal de captura de cinco quilos por pescador/dia, não podendo ser vendidas espécies proibidas pela portaria, de acordo também com as regras do 2º acordo de pesca da comunidade do Aricurá.
A economia extrativista dos ribeirinhos sofre fortes oscilações durante o ano, sendo favorável nos períodos de liberação da pesca (março a outubro) e na safra do açaí (agosto a dezembro), períodos quando a população tem seu maior rendimento, e no período de defeso do pescado (janeiro e fevereiro) e de entressafra do açaí março a julho), quando ocorre uma queda vertiginosa da economia (COLÔNIA DE PESCADORES Z-16, 2006). Assim, de modo global, há um período bem favorável que coincide com a soma da renda do açaí e da pesca (agosto a outubro) outro relativamente favorável pela renda do açaí e do recebimento do seguro defeso (novembro e dezembro), ou outro sofrível corresponde à entressafra do açaí, mas que é em parte compensado pela pesca (março a julho), e um desfavorável quando eles contam apenas com o seguro defeso (janeiro e fevereiro).
Outro elemento que pode ser importante na renda das famílias da comunidade do Aricurá é a renda extra, sobretudo no período da entressafra do açaí quando a renda familiar decai bastante, fazendo com que as famílias realizem trabalhos extras em outros estabelecimentos, na limpeza do açaizal ou exerçam outras atividades como a de carpintaria e serviços de transporte de barco que, no conjunto corresponde a 7% da renda bruta.
Esses valores dos componentes da renda familiar ribeirinha foram similares aos valores obtidos por Reis (2015) na Região do baixo Tocantins, estudando as ilhas dos municípios de Igarapé- Miri e Abaetetuba, em que os benefícios sociais são de grande relevância para as famílias ribeirinhas, pois garantem o sustento nos meses de entressafra do açaí e no período de defeso da pesca. Essa renda ajuda, principalmente, com a compra dos alimentos básicos das famílias ribeirinhas.

 

Na comunidade do Ajó, os componentes da renda familiar, são praticamente os mesmos da comunidade do Aricurá, exceto pela presença da atividade da horta e a ausência do seguro defeso (gráfico 2). Com uma média de renda bruta anual familiar de R$ 23.327,40, na comunidade do Ajó, a renda da produção do açaí corresponde a 45% da renda bruta anual, sendo de uma participação um pouco menor do que na comunidade do Aricurá. Já a renda de benefícios sociais é bem maior que da comunidade do Aricurá, com 38%, o que se deve à aposentadorias. A renda de aposentadorias em ambas as comunidades é utilizada para as despesas da alimentação que são compradas fora do estabelecimento, na compra de medicamentos, como também para aquisição de utensílios de trabalho, utensílios domésticos ou ainda para a compra de alevinos ou ração, no caso das famílias que tem piscicultura.
A atividade da piscicultura também tem uma participação bem maior na comunidade do Ajó do que na comunidade do Aricurá, representando 7% da renda bruta familiar. A atividade da horta tem uma participação até um pouco maior que a piscicultura, com 8%.
Um estabelecimento, que conta com as aposentadorias (do chefe da família e da esposa), equivalente à metade da renda bruta da família, como Ajo1, porque já têm uma certa idade, com os filhos executando o trabalho mais pesado, constitui uma situação diferente quando comparada com um estabelecimento que não dispõe de aposentadoria, como o Aricurá 1, em que a maior parte da renda vem da produção de açaí e da pesca e depende da força de trabalho do chefe de família.
Assim, além da influência da existência ou não de terrenos de terra firme no estabelecimento, a diversidade do sistema de produção, também depende das características das famílias, da composição e do ciclo de vida do grupo doméstico quanto à disponibilidade da força de trabalho.

 

           
Pela composição das rendas brutas anuais das famílias se verificou que, apesar do reduzido tamanho de área dos estabelecimentos, as famílias das duas comunidades desenvolvem diversas atividades integradas, formando sistemas de produção constituídos de vários sub- sistemas interdependentes (Dufumier, 1989) como apontam os estudos de Reis (2015) e Costa (2009) na região do baixo Tocantins. No entanto, essa característica é encontrada em todo o campesinato Amazônico como apontamos estudos de Menezes (2002), de Souza (2010) e de Rocha (2013) tratando da reprodução socioeconômica e produtiva no sudeste paraense. Essa diversificação otimiza a utilização da mão-de-obra familiar e o aproveitamento dos recursos disponíveis no estabelecimento.
Considerando as atividades produtivas desenvolvidas pelas famílias, Miguez; Fraxe e Witkoski (2006) abordam que o sistema produtivo tradicionalmente desenvolvido por pequenos produtores na Amazônia brasileira envolve atividades agrícolas, extrativistas, domésticas e outras, constituindo uma importante combinação para a economia de subsistência das famílias na Amazônia. Dependendo da situação, parte da produção resultante das atividades agrícolas ou extrativistas destina-se, essencialmente, ao consumo familiar e à venda nos mercados próximos como pudemos constatar em nosso estudo.

5.1.2 Valor agregado da produção

O gráfico 3 contém os valores de renda que agora denominaremos de produto bruto (PB), consumo intermediário (Ci), depreciação (D) e valor agregado (Va) das famílias estudadas. Podemos perceber que os valores de depreciação e de consumo intermediário são muito baixos em relação ao valor bruto, fazendo com que este e o valor agregado sejam próximos. Os valores agregados variam de um pouco mais de R$ 18.000,00 a cerca de R$ 35.000,00. Para Reijntjes et. al. (1993) a variação dos componentes da renda varia, pois, cada família tem diferentes recursos físicos, biológicos e humanos. Esses recursos e processos físicos e biológicos dispõem de uma base material diferenciada, entendida como a quantidade e qualidade da terra e dos demais meios de produção e estão integrados de forma distinta em um determinado meio agroecológico e socioeconômico, com o qual as famílias estabelecem relações de produção.
Chayanov (1974) apud Schneider (2003) ressalta que a economia familiar não é um modo de produção, mas sim um “modo de produção específico” nas palavras de Chayanov, que consiste na satisfação das suas necessidades básicas, concebida simultaneamente como uma unidade de produção e consumo, porém, inserido e subordinado ao sistema dominante, capaz de se adaptar às regras gerais da formação econômica vigente, sendo os principais elementos da economia familiar, a força de trabalho familiar e as estratégias adotadas para assegurar sua reprodução. A quantidade do produto e do trabalho depende do tamanho da família trabalhadora e do grau de auto- exploração, que se determina pelas necessidades internas de consumo em que o equilíbrio será afetado pelo tamanho da família, membros aptos ou não ao trabalho, e pela dimensão da terra, sujeita a alterações por herança, casamentos, entre outros elementos, promovendo assim a diferenciação no espaço rural.

5.1.3 Valor agregado em função do ambiente e do açaí

                Lima et. al. (2005, p. 113) atribuem especial importância ao valor agregado (VA) como indicador econômico dos estabelecimentos agrícolas ao afirmar:

A medida de avaliação do valor agregado é de extrema importância do ponto de vista da gestão do estabelecimento agrícola, pelo fato de permitir a comparação de encargos operacionais com os ingressos e principalmente porque demostra até que ponto essa sobra é suficiente para fazer frente aos encargos estruturais (depreciações). Portanto da posse desta informação pode se verificar em que medida cada atividade está contribuindo para a reposição do aparelho de produção. 

Sendo a produção de açaí de grande importância na renda das famílias, apresentamos na (tabela 1) os valores agregados separando as atividades produtivas oriundas da várzea, da terra firme, cujas disponibilidades nos estabelecimentos constituem fator de extrema importância quando se comparam os estabelecimentos das duas comunidades, que como sabemos se separam pela disponibilidade ou não de terrenos de terra firme bem como da extensão dos terrenos de várzea com influência na produção do açaí, principal atividade das famílias.
Podemos confirmar a grande representatividade do açaí pelo seu VA, que para a maioria das famílias contribui com mais de 50% do VA no estabelecimento, podendo chegar porcentagens superiores a 90% do VA na várzea. Outro fato interessante que pode ser constatado através da (tabela 1), é que mesmo as duas famílias que possuem terrenos de terra firme (comunidade do Ajó) o maior valor agregado delas advêm também da várzea, sendo que o VA na terra firme dessas famílias não chega a 25% do VA total.
O mais elevado VA na várzea nas duas situações dos estabelecimentos, com e sem terra firme mostra a importância da várzea no que diz questão à renda das famílias. Assim, mesmo aquelas famílias que possuem só terrenos de várzea (comunidade do Aricurá) como aquelas que têm terrenos de várzea e de terra firme (comunidade do Ajó), encontram na várzea, e na produção do açaí, sua maior capacidade de reprodução socioeconômica. Comprovando a relevância da produção do açaí, que naturalmente, pelas características do meio ambiente, permite sua exploração com resultados de elevada agregação de valor, se justifica o seu papel na reprodução socioeconômica das famílias estudadas. 

5.1.4 O açaí como principal componente da renda familiar

                O fruto do açaí serve primeiramente como alimento cotidiano das famílias e também através da venda do mesmo propicia o retorno financeiramente como indicado pela (tabela 2), constituindo a principal fonte de renda das famílias entrevistadas. Em consequência disso, podemos avaliar os valores da venda do açaí no período da safra e da entressafra, com importante diferenciação entre os dois períodos tanto no que se refere à venda como ao consumo das famílias.
A maioria das famílias consome e vende e o valor auferido com a venda é bastante variável, o que decorrer do tamanho e da necessidade de consumo das famílias podendo o valor da produção vendida chegar a três vezes mais que a consumida. Contudo, parte das famílias obtém uma renda de venda maior que a do consumo na safra enquanto outra parte obtém uma renda de venda maior na entressafra. Isso indica que há ritmos de produção diferenciados entre os estabelecimentos rurais.
Em diversos casos o valor de venda decai extremamente na entressafra chegando a R$ 266,67 por ha ao mês no Aricurá 4 e R$ 164,06 no Ajó 2, enquanto na safra é respectivamente de R$ 1.785,71, e R$ 937,50, uma diferença que pode chegar a R$ 1.500,00 por ha ao mês. Para as famílias isso deve pesar bastante no cotidiano, em se tratando desse período da entressafra como o mais duro da reprodução socioeconômica das famílias que concentram sua renda na safra. Contudo, existem estabelecimentos que conseguem um elevado valor de venda na entressafra, como são os casos do Aricurá1 e Aricurá 3, com valores mais elevados na entressafra que na safra.
Em relação aos valores de consumo do açaí no período da safra e no período da entressafra, os valores foram bem diferenciados entre as famílias. Mas na maioria os valores de consumo no período da entressafra diminuem bastante comparados com os valores de consumo no período da safra. Por exemplo, no Aricurá 2, o consumo na safra foi de R$ 1.500,00 e na entressafra de R$ 729,17 enquanto no Ajó 1 foi de R$ 957,85 na safra e R$ 275,86 na entressafra, com diferenças em torno de R$ 700,00 por ha por mês. A exceção do Aricurá 1, em que esse valor é um pouco mais elevado na entressafra.
Essa diferenciação encontrada no Aricurá 1 pode ser explicada pela prática de rodizio de área do açaizal (prática especifica da família), em que durante o período de 3 anos a família só tira o açaí de uma área especifica, deixa a outra área “descansando”, o que faz com que a família tenha o açaí na entressafra.
Marinho (2009) aponta que o extrativismo do fruto do açaí sempre foi uma atividade secularmente praticada na Amazônia, no entanto essa atividade era relativamente voltada para o autoconsumo. Sendo alimento tradicional para as famílias, é indispensável o açaí na mesa cotidianamente como na fala de um entrevistado “se não tiver o açaí eu mesmo não como, nem que seja pra dar volta em todo o mato atrás de um pouco, mas sem o açaí eu não posso ficar já é costume nosso” (Sr. J. R. V.L. S., ribeirinho- Aricurá. Entrevista de campo, 2017).
A restrição no período da entressafra do açaí também foi encontrada por Costa (2009) ao apontar que no inverno, entre março e junho, que coincide com a entressafra do açaí, é aquele em que os problemas socioeconômicos da população ribeirinha se agravam, sendo a época mais dura da reprodução social desse campesinato ribeirinho, época em que as famílias precisam vender mais produtos para fazer face as suas necessidades alimentares. No caso da comunidade do Aricurá, o que impede que a situação se agrave é o recebimento do seguro defeso, enquanto na comunidade do Ajó são as outras atividades produtivas, tais como a horta e a piscicultura que completam a renda das famílias no período da entressafra do açaí.

6. CONCLUSÕES

Percebemos a diferenciação dos componentes da renda familiar como também dos valores encontrados em cada componente devido as implicações do ambiente em que cada comunidade se encontra, mostrando a relevância do ambiente nas atividades produtivas e na economia. Mesmo devido a essas circunstâncias do ambiente, as duas comunidades da microbacia do Aricurá a maior porcentagem da renda familiar advém da produção do fruto do açaí, espécie característica da região amazônica.
Outra constatação relevante foi a importância do ambiente de várzea nas duas comunidades pois o mais elevado valor agregado dos estabelecimentos, nas duas situações, com e sem terra firme, é proveniente das atividades na várzea devido à exploração do açaizeiro, o que mostra a importância da várzea no que diz questão à renda das famílias por permitir melhores condições de reprodução econômica das famílias que utilizam esse ambiente.
Mesmo sendo a produção do fruto do açaí determinante para as famílias que exploram a várzea, tanto no que diz respeito ao consumo como à obtenção de receita para fazer face as aquisições efetuadas, é necessário considerar que devido às características da sua produção, que se concentra no período seco, há uma distinção na situação socioeconômica das famílias com maiores restrições na entressafra do açaí, quando a renda diminui, requerendo o desenvolvimento de estratégias com atividades não agrícolas, como se prestação de serviço, ou mesmo agrícolas, como a criação de peixes, para compensar a diminuição de renda no período da entressafra do açaí.

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*Possui graduação em Engenheira Agronômica pela Universidade Federal Rural da Amazônia (2015), especialização em agricultura familiar e desenvolvimento agroambiental na Amazônia pela Universidade Federal do Pará (2015), mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável pela Universidade Federal do Pará (2018).
** Possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal Rural da Amazônia (1974), mestrado em Agronomia (Solos e Nutrição de Plantas) pela Universidade Federal do Ceará (1978) e doutorado em Solos e Nutrição de Plantas pela Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz USP (1986). Pós-doutorado no Centre de Coopération International en Recherche Agronomique pour le Développement (CIRAD), Maison de Teledection, Montpellier, França (2013). Atualmente é professor Associado da Universidade Federal do Pará.
*** Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (1978), mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (1983), doutorado em Antropologia pela Universidade Federal do Para e em Sociologia pela Université Paris 13 (2007). Atualmente é Professora na Universidade Federal do Pará.
**** Este artigo faz parte da dissertação de mestrado da referida autora, intitulada “Várzea ou terra firme? A (re) produção do sistema família- estabelecimento na microbacia do Aricurá- Cametá- Pará”. Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares, Universidade Federal do Pará, Belém, 2018. Contando com o financiamento de bolsa de mestrado CNPq e do Grupo de pesquisa GEDAF (Grupo de Estudos da Diversidade da Agricultura Familiar) cadastrado no diretório da Plataforma do CNPq.

Recibido: 26/04/2018 Aceptado: 04/05/2018 Publicado: Mayo de 2018

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