Elaine Carvalho de Lima *
Calisto Rocha de Oliveira Neto **
Universidade Federal de Uberlândia, Brasil
elainecarvalhoonline@hotmail.comArchivo completo en PDF
RESUMO
A década de 1960 foi caracterizada por dificuldades econômicas em grande parte dos países da América Latina, que passaram pela industrialização via substituição de importação. Com a obra “Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina” de 1966, Celso Furtado explica o fenômeno da estagnação na América Latina após a fase otimista de industrialização nesses países, os ensaios dessa obra foram frutos das atividades acadêmicas que o autor desenvolveu no exterior, enquanto, exilado pela ditadura militar de 1964. Nesse sentido, o presente trabalho faz uma análise das principais considerações e contribuições dessa obra para o estudo do desenvolvimento econômico nessa região.
Palavras-chave: Desenvolvimento econômico. Industrialização. Subdesenvolvimento.
ABSTRACT
A decade of 1960 characterized by economic difficulties in most of the countries of Latin America, which went through industrialization through import substitution. With the work "Underdevelopment and Stagnation in Latin America" of 1966, Celso Furtado explains the phenomenon of stagnation in Latin America after the optimistic phase of industrialization in those countries, the essays of this work were fruits of the academic activities that the author developed abroad, while , exiled by the military dictatorship of 1964. In this sense, the present paper makes an analysis of the main considerations and contributions of this work for the study of the economic development in this region.
Keywords: Economic development. Industrialization. Underdevelopment.
Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:
Elaine Carvalho de Lima y Calisto Rocha de Oliveira Neto (2018): "Uma investigação das constribuições de Celso Furtado na década de 1960", Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, (febrero 2018). En línea:
//www.eumed.net/2/rev/oel/2018/02/constribuicoes-celso-furtado.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/oel1802constribuicoes-celso-furtado
1- INTRODUÇÃO
O economista Celso Furtado foi um grande intelectual e participante ativo no pensamento da ciência econômica do Brasil. Durante o período de 1949 a 1957 foi diretor de Desenvolvimento da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) e, ao retornar ao Brasil, liderou o Grupo Misto CEPAL-BNDES em 1950. Tal experiência contribuiu para a elaboração de um esquema de programa de desenvolvimento econômico para o Brasil de 1955 a 1960, culminando para o delineamento do Plano de Metas e para a criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), em 1959. No governo de João Gourlart, em 1962, foi Ministro do Planejamento do Brasil, desenvolvendo o Plano Trienal. Em 1964, diante do regime militar, Celso Furtado é cassado e tem a perda dos seus direitos políticos por um período de dez anos. No exílio, ele realizara trabalhos universitários em vários países, primeiro no Instituto Latino-Americano para Estudos de Desenvolvimento (ILDES) ligado à CEPAL com sede no Chile. Posteriormente, exerce cargo de pesquisador na Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Por fim, mudou-se para Paris e foi professor por vinte anos.
A experiência que Celso Furtado teve em terras estrangeiras foi crucial para alimentar no autor um interesse crescente em explicar o processo de subdesenvolvimento e os seus mecanismos de superação. Seguindo o método do estruturalismo histórico cepalino, Furtado pauta seu ideário na herança da economia colonial na formação da conjuntura socioeconômica do país.
Pelas particularidades do desenvolvimento latino-americano, o autor estrutura uma ideologia do desenvolvimento. Assim, a problemática do subdesenvolvimento é enxergada a partir de uma realidade histórica da disseminação técnica na organização de uma economia de escala mundial. Isto é, o subdesenvolvimento deve ser visto não como uma fase do processo de desenvolvimento, mas como um fenômeno da história do desenvolvimento do capitalismo (FURTADO, 1966).
A partir da década de 1960, Furtado estrutura sua análise em torno da crise e da estagnação da economia dos países latino americanos. Nesse sentido, apreendesse a problemática central que abarca essas economias, isto é, a má distribuição de renda na América Latina e o esgotamento da industrialização por substituição de importados que intensificou os obstáculos já existentes nessas economias. Tal problemática ganha destaque na obra “Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina” de 1966. Nesse sentido, o presente trabalho busca analisar esta obra e suas principais contribuições para a discussão do subdesenvolvimento latino-americano.
Neste contexto, o presente trabalho se situa no período posterior ao golpe militar de 1964 no Brasil, onde Furtado encontrava-se no exterior desenvolvendo trabalhos no ambiente acadêmico. Assim, além dessa seção introdutória, o trabalho possui mais quatro seções, a próxima seção analisa as contribuições da CEPAL e as críticas advindas de João Manuel Cardoso de Mello; a seção 3 destaca a problemática da obra “Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina” e brevemente as críticas dirigidas a tese de Furtado sobre a estagnação; a quarta seção analisa o caso do Brasil e, por fim, temos as considerações finais.
A Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) foi criada em 1948 e era ligada as Organizações das Nações Unidas (ONU). Sua criação foi inspirada pelo espírito desenvolvimentista do pós-guerra. Dessa forma, a Cepal delineou um intenso debate, de forma ampla e democrática, sobre as questões de política econômica e social dos países latino-americanos na tentativa de contribuir para o desenvolvimento da região. Surgiria assim, uma escola de pensamento econômico próprio e de relativa autonomia para estudar os problemas de subdesenvolvimento dos países da América Latina, formando caráter crítico e, de certa maneira, inovadora em termos de teoria e prática de economia.
A partir de uma análise da história econômica, os estudiosos ligados a CEPAL traçaram o debate a partir da crítica da análise das teorias marxistas e da Economia Clássica. Diante disso, sob o arcabouço do estruturalismo e da análise keynesiana foram estabelecidas as estratégias para o desenvolvimento latino-americano, mediante o arranque da industrialização. De tal maneira que, as ideias e estudos da CEPAL eram a sustentação intelectual às tentativas de uma verdadeira industrialização aos países da América Latina, que ia de encontro ao pensamento econômico hegemônico.
Neste contexto, a CEPAL desenvolveu um corpo teórico para induzir iniciativas de introdução de parques industriais na América Latina. Ademais, oportunizou a discussão do papel do Estado na economia como indutor das condições necessárias para a industrialização. Dessa maneira, para teoria Cepalina, os países que estavam se industrializando necessitava de intervenção na economia, uma vez que, não era possível chegar à industrialização somente por meio das forças espontâneas do mercado. Sendo assim, o planejamento de modificar a estrutura da economia naquele momento passava pelo Estado, cabendo a este, o papel de organizar as bases para a expansão da industrialização. Além disso, a CEPAL relacionava-se com os movimentos nacional desenvolvimentistas que surgiram na América Latina em meados do século XX.
Assim, pode-se dizer que o idealismo da CEPAL teve uma função importante para a industrialização do Brasil e de outros países da América Latina. No caso brasileiro, cabe aqui ressaltar a influência e correlação do pensamento cepalino nas ações de infraestrutura e industrialização levadas a cabo pelos governos Vargas e Juscelino Kubitschek.
Um dos conceitos fundamentais na análise da CEPAL foi o de subdesenvolvimento, na tentativa de entender a estrutura socioeconômica dos países latino-americanos. A análise do subdesenvolvimento e sua compreensão foi o cenário das questões buscadas pelo CEPAL e por Celso Furtado (OLIVEIRA, 1983). O que seria decisivo para os rumos futuros da industrialização brasileira.
Celso Furtado dirige os estudos do grupo CEPAL/ BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) que tinha como propósito a elaboração de estatísticas para servir de embasamento para o planejamento governamental. A partir disso, ao longo dos governos foram sendo formadas alianças, como a CEPAL e o governo Vargas, continuando com o governo de Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart.
João Manuel Cardoso de Mello, na sua obra “Capitalismo Tardio”, avança nas discussões sobre o desenvolvimento capitalista dos países latino-americanos, em especial, do Brasil. Mello (1982) critica o pensamento da CEPAL, especialmente no que tange a problemática da industrialização nacional. De acordo com Mello (1982, p. 20): “Todo espaço do discurso cepalino está organizado em torno da ideia de independência econômica da Nação. Melhor ainda: a problemática cepalina é a problemática da industrialização nacional, a partir de uma situação periférica”.
Nesse sentido, Mello (1982) tenta caracterizar o desenvolvimento da América Latina como um desenvolvimento capitalista, que por suas características é periférico. Assim, a industrialização latino-americana por ser periférica irá defrontar com uma série de problemas que permeia essa particularidade. Para o autor, esse problema se resume a um, em especial, a inexistência de uma indústria de bens de produção em um período onde o Centro possui uma estrutura industrial com padrão tecnológico bastante avançado.
Assim, Mello (1982) defende que as críticas as interpretações cepalinas estão na periodização do processo histórico e na elaboração de novos conceitos que captem a estrutura de cada período, como será feito ao longo da obra de Mello (1982). Dessa maneira, “(...) Dependência e Desenvolvimento representa uma tentativa de constituir uma nova problemática, a problemática da instauração de um modo de produção capitalista em formações sociais que encontram na dependência seu traço histórico peculiar” (MELLO, 1982, p 25). Além disso, o autor destaca o papel do Estado Nacional, que a partir da constituição deste na América Latina, a dinâmica destes países seriam determinados em primeiro lugar por “fatores internos” e, em última instância, por “fatores externos”.
A década de 1960 tem como pano de fundo a crise econômica, a inflação e estagnação na América Latina. No caso do Brasil, especialmente, Furtado vai constatar que a industrialização não solucionou os problemas estruturais existentes no país, o que foi verificado é que a industrialização por substituição de importações aumentou as disparidades econômicas e sociais que assolavam o país.
Tais questionamentos são abordados na obra “Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina” de 1966, quando Celso Furtado desenvolvia atividades universitárias no exterior. Considerada uma das principais obras do autor sobre a análise do desenvolvimento latino-americano e a situação política da época.
No primeiro capítulo da obra, “Em busca de uma ideologia do desenvolvimento”, o autor esforça-se no sentido de entender o subdesenvolvimento como uma realidade histórica, onde no contraste com o desenvolvimento pode-se apreender aquilo que é inerente ao problema do subdesenvolvimento. A partir disso, alguns desdobramentos serão qualificados, entre eles, a divergência entre a industrialização que foi resultado da revolução industrial e a decorrente do processo de substituição de importações.
Diante disso, duas diferenças se tornam marcantes, nos países da Revolução Industrial clássico observou-se que o progresso técnico e o aumento dos salários permitiram uma luta de classes que, em última instância, resultou em uma conciliação entre os interesses empresariais e os da coletividade. Tal conciliação não se efetivou na América Latina, onde a industrialização encontrou um mercado de trabalho desordenado, marcado por um imenso contingente populacional.
Nesse sentido, o autor conclui que a industrialização latino-americana é um caso típico do que se denominou de processo de substituição de importações. Ademais esse processo ocorreu em um determinado período em que a tecnologia disponível era guiada no sentido de poupar mão de obra. Assim, Celso Furtado afirma que o elemento condutor da evolução histórica contemporânea é o desenvolvimento tecnológico, em segundo lugar é que a maneira abrupta que tal tecnologia avança nos países subdesenvolvidos resulta numa série de mudanças sociais que se tornam conflitantes com a continuidade das estruturas pré-existentes.
Nesse contexto, o autor pontua que vários são os obstáculos a formação de movimentos de massa que pudessem desfazer o subdesenvolvimento, entre estes, têm-se os de ordem externa. Nessa perspectiva, a hegemonia dos Estados Unidos nos países latino-americanos representou um grande impedimento ao pleno desenvolvimento dessas nações. Em certa medida, o desenvolvimento impulsionado por ordem externa foi importante para modificar parte das estruturas deixadas do período colonial, mas foi insuficiente para gerar sistemas autônomos que garantissem o crescimento na América Latina. Consequentemente, tais nações continuaram como simples “periferia” das economias capitalistas desenvolvidas.
Além do mais, havia um total antagonismo entre da política americana de promoção do desenvolvimento através da transferência de empresas para os países latino-americanos, ou seja, como compatibilizar os interesses da grande empresa moderna, a representação popular e a soberania dos estados.
Ao se instalar, as empresas multinacionais na América Latina trazem à tona alguns problemas, em especial com o controle do sistema econômico por sociedades norte-americanas que inviabilizam um projeto de desenvolvimento para essas nações. Em última instância, a introdução de tais empresas com tecnologia moderna em uma estrutura econômica frágil só iriam expandir as desigualdades já existentes nesses territórios.
No terceiro capítulo, Celso Furtado equaciona matematicamente o mecanismo que resulta a estagnação econômica 1. Para isso, o autor expressa que a compreensão da industrialização por substituição de importações necessita do entendimento sobre o surto primário exportador que ocorrera antes da industrialização e as motivações decorrentes desse processo. Nisso, o autor elabora dois modelos, o primeiro modelo que corresponde ao período primário-exportador e, o segundo, que explana o modelo de substituição de importações. A partir do contraste desses dois modelos algumas conclusões serão apreendidas para explicar a estagnação econômica, como bem salienta Schwartzman (1967):
(...) o tipo de desenvolvimento econômico típico da América Latina, que começa com a agricultura de exportação em grande escala e termina, em nossas dias, com a substituição de importações e correspondentes retração do setor externo, não tem condições de satisfazer as aspirações crescentes das populações destes países. É um processo de desenvolvimento que destrói as formas pré-capitalistas de exploração agrícola e não as substitui por outras de tipo moderna, que concentra a população nas grandes cidades e não consegue absorvê-la, que cria aspirações e não pode satisfazê-las. E seriam essas populações que, ao tomar consciência de sua situação, serviriam de base política para o desenvolvimento planejado (SCHWARTZMAN, 1967, pag 1-2).
A elaboração do modelo do processo de estagnação feita por Furtado (1966) tornou-se um dos ensaios mais debatidos da obra “Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina”. Uma das principais críticas foi as de Tavares e Serra (1971) no contexto do “milagre” econômico do Brasil.
No exame do processo de industrialização e do baixo crescimento da renda real das economias latino-americanas no início da década de 1960, Celso Furtado aponta tendências a estagnação nesses países. Tal industrialização acarretou alterações substanciais na estrutura econômica produtiva dos países latino-americanos, entretanto o estímulo decrescia conforme se esgotavam as possibilidades de substituição ditas “fáceis”. Ademais, na época as condições tecnológicas existentes para a industrialização desses países eram altamente poupadoras de mão de obra. Assim, a utilização dessa tecnologia em meio a uma organização industrial monopolista ou oligopolista acarretava em maiores concentrações de renda. Assim:
(...) tudo se passa como se a existência de um setor pré-capitalista de caráter semifeudal em conjugação com um setor industrial que absorve uma tecnologia caracterizada por um coeficiente de capital rapidamente crescente, dessem origem a um padrão de distribuição de renda que tende a orientar a aplicação dos recursos produtivos de forma a reduzir a eficiência econômica destes e a concentrar ainda mais a renda, num processo de causação circular. No caso mais geral, o declínio na eficiência econômica provoca diretamente a estagnação econômica. Em casos particulares, a crescente concentração da renda e sua contrapartida de população subempregada que aflui para as zonas urbanas, criam tensões sociais que, por si, são capazes de tornar inviável o processo de crescimento (Furtado, 1966, p. 86).
Dessa forma, para Furtado (1966) a distribuição desigual da renda entre esses países se origina da escassez do mercado interno que não geravas as economias de escala essenciais para as indústrias de bens de capital e de bens intermediários. Por outro lado, Tavares e Serra (1971) compreendiam as crises das economias da América Latina como problema na transformação de lucros em investimentos e não da insuficiência de lucro dirigido a um nível não satisfatório de poupança para financiar a industrialização.
Por esse ângulo, Tavares e Serra (1971) defendiam que a exclusão das camadas desfavorecidas economicamente das melhorias do crescimento econômico não seria um fator considerável para atestar a insuficiência da dinâmica capitalista na América Latina. Assim, no período do “milagre” econômico, Tavares e Serra (1971) não verificaram tendência à estagnação como destacada por Furtado, mas sim um novo modo de desenvolvimento que, em última análise, necessita de concentração de renda e outras formas de inserção internacional. Ainda, de acordo com os autores os rearranjos da política econômica do Brasil durante o período militar, entre eles, política restritivas de crédito, câmbio, salários, entre outros, foram úteis para superar a crise.
Houve eliminação das empresas consideradas menos sólidas e, conjuntamente, o arrocho salarial promoveu uma redistribuição da renda em favor dos lucros. Esta considerada uma condição fundamental para a retomada do crescimento, ao constatar a indisponibilidade de fundos para o financiamento de novos investimentos. (TAVARES; SERRA, 1971).
Numa primeira apreciação sobre a situação do Brasil no pós-golpe militar de 1964, Furtado (1966) ressalta a natureza conservadora das forças que lideravam o país. O autor reconhece que o populismo não impulsionou a grande massa da população para uma luta em prol do desenvolvimento.
De acordo com Furtado (1966), o caso brasileiro da economia com base na industrialização substitutiva foi decorrente da dimensão do mercado brasileiro, especialmente pela economia do café. Em 1931, com a crise da superprodução do café, o país entra numa crise externa que o submete a cortar suas importações e, consequentemente, ocasiona uma crise interna, devido a necessidade de financiamento dos estoques de café que o mercado já não demandava. Nesse contexto, fora realizada queima de estoques de café para atender as pretensões dos cafeicultores.
Numa segunda fase da industrialização do Brasil, havia-se um pensamento que para se alcançar o desenvolvimento uma das vias seria pela industrialização. Em 1948, a dívida externa do país aumentava e trouxe a preocupação quando ao preço do café, assim o governo estabeleceu o controle das importações para resguardar os interesses industriais. Em linhas gerais, o governo brasileiro conseguiu sustentar o preço do café durante um bom período, todavia considerável parte da renda do mercado internacional cafeeiro foi transferida para o setor industrial.
Nessa perspectiva, ao analisar o caso do Brasil, uma das primeiras críticas de Celso Furtado centra-se na falta de uma política direcionada ao processo de industrialização, que para o caso brasileiro teve enormes consequências, duas em especial podem ser pontuadas:
Nesse contexto, as consequências mais amplas da industrialização via substituição de importados podem ser melhor apreendidas a partir da observação do marco social dentro do qual ela ocorreu. O autor chama atenção para o fato de que a estrutura econômica e social do Brasil não era muito diversa em 1930 do que fora um século antes. Ou melhor, a economia do país era dependente da exportação de uns poucos produtos tropicais, produzidos em grandes propriedades e grande parte da população ainda vivia nas fazendas ou eram diretamente subordinadas aos proprietários de terras. Outrossim, pequena porção da população tinha participação política e pouco se percebia a imagem do Estado nacional.
Devido seu caráter substitutivo, a industrialização não ocorreu como se verifica na Revolução clássica uma desorganização das atividades artesanais semiurbanas. Dessa forma, o operário não tinha uma visão de ter atravessado um processo de degradação social. De maneira oposta, o grande contingente que emigra, especialmente para São Paulo, vindo como trabalhador rural das suas áreas de origem, sentem-se com elevação de status ao chegar nos centros urbanos. Observa-se que muitas vezes as condições de trabalho precário da cidade e a busca por melhores oportunidades de emprego é preferível do que a falta de perspectiva no campo.
Em síntese, o Brasil conseguiu estimular o crescimento por meio da industrialização via substituição de importações, entretanto, não foi o suficiente para atenuar as graves desigualdades sociais e o problema da distribuição de renda. Em especial, com capitais e produtores externos. Assim, a industrialização não provocou o desenvolvimento socioeconômico tão esperado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, alguns apontamentos podem ser depreendidos da investigação feita no presente trabalho. Entre elas, podemos observar que a condição de subdesenvolvimento da América Latina trata-se de um processo histórico que nada mais foi que o resultado da disseminação do progresso técnico em nível mundial. Todavia, há diferenças marcantes entre o que ocorreu nos países da Revolução Industrial clássica e nos países da América do Sul. Nestes observamos uma acentuação das disparidades sociais e econômicas.
Entre as obras do autor, Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina trouxe uma contribuição relevante para a compreensão dos vários processos passados na economia, tais como, as particularidades da economia agrário-exportadora, o processo de substituição de importações, a transição de uma economia primário-exportadora para o processo de industrialização, entre outros elementos importantes para o entendimento da história econômica desses países.
A problemática que o autor levantou torna-se atual, quando se procura analisar as causas e consequências do subdesenvolvimento. Com efeito, Celso Furtado vai posteriormente constatar que a industrialização não conduziu a independência econômica da nação. Em certa medida, houve um aprofundamento da dependência entre países latino-americanos e as economias ditas centrais, especialmente com o processo de internacionalização e entrada do capital estrangeiro nesses países.
REFERÊNCIAS
COUTINHO, M. C. Subdesenvolvimento e Estagnação na América Latina, de Celso Furtado. Congresso de Desenvolvimento, “A crise e os desafios para um novo ciclo de desenvolvimento”. 2012, Rio de Janeiro.
FURTADO, C. Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.
FURTADO, C. Formação Econômica do Brasil. 34ª Edição, São Paulo: Cia Editora Nacional, 2007.
MELLO, J.M. C. (1982). O Capitalismo Tardio. Sao Paulo: Brasiliense.
OLIVEIRA, F. de (org). Celso Furtado: economia. São Paulo: Atica, 1983. (Coleção Grandes Cientistas Sociais; v.33).
SCHWARTZMAN, S. Subdesarollo, revolutión y ideologia. Revista Latinoamericana de Sociologia. n.1. Buenos Aires, 1967.
TAVARES, M. da C; SERRA, J. Más allá del estancamiento: uma discusión sobre el estilo de desarrollo reciente. El Trimestre Económico. México, v. 38, n. 152(4), p. 905-950, 1971.
*Doutoranda em economia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Mestre e graduada em economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)