DELOS: Desarrollo Local Sostenible
Vol 5, Nº 13 (febrero 2012)


PAULO FREIRE, UM EDUCADOR AMBIENTAL: APONTAMENTOS CRÍTICOS SOBRE A EDUCAÇÃO AMBIENTAL A PARTIR DO PENSAMENTO FREIREANO

 

Andreisa Damo (CV)
andreisadamo@yahoo.com.br
Christian da Silva Simões (CV)
christiansimoes@yahoo.com.br
Danieli Veleda Moura (CV)
danielimoura@furg.br
Luís Fernando Minasi (CV)
lfminasi@terra.com.br
Ricardo Gauterio Cruz (CV)
ricardo_gcruz@hotmail.com
Universidade Federal do Rio Grande

 

RESUMO
O ponto de partida para o debate que aqui levantamos está situado nas questões trazidas por Paulo Freire em diversas de suas obras. Procuramos levantar alguns pontos cruciais suscitados pelo autor, orientados pela perspectiva dialética materialista, de modo a dialogar com os princípios da Educação Ambiental.No plano social, entendemos que a Educação Ambiental que pretende ser transformadora precisa assumir-se com práticas pedagógicas desveladoras das contradições existentes na sociedade – no meio ambiente, nos processos sócio-históricos ambientais, evidenciando-os com vistas a sua superação. Nesse sentido, entendemos como necessidade urgente trazer as categorias de ideologia e de luta de classes para o centro de nossas discussões e de nossas preocupações, de modo que a educação ambiental possa assumir sua função de emancipar os sentidos humanos para o desvelamento da realidade.

Palavras-Chave: Paulo Freire, Educação Ambiental Transformadora, Pedagogia do Oprimido, Pedagogia da Autonomia, Ideologia, Luta de Classes.


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EDUCAÇÃO AMBIENTALE TRANSFORMAÇÃO DO MUNDO

O ponto de partida para o debate que aqui levantamos está situado nas questões trazidas por Paulo Freire em suas célebres obras “Pedagogia do Oprimido” e “Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa”.Procuramos levantar alguns pontos cruciais suscitados por Freire nestes títulos, orientados pela perspectiva dialética materialista, de modo a dialogar com os princípios da Educação Ambiental.

Paulo Freire nos convida a refletir sobre o processo ensino-aprendizagem ao dizer que como experiência especificamente humana, a Educação é uma forma de intervenção no mundo. Isso nos remete a pensar que a Educação se dá num lugar, num ambiente, numa sociedade. Essa sociedade, palco de onde a Educação se desenvolve é uma sociedade regida pelo modo de produção capitalista, pautada na divisão dos seres humanos em classes sociais: a classe proprietária e a classe trabalhadora.

Partindo de Marx e Engels, nosso referencial teórico, afirmamos que as idéias dominantes numa determinada época de uma sociedade, são as idéias da classe dominante. Essa, utiliza-se da ideologia para manter-se no poder, no domínio, no controle social. Dessa forma, numa sociedade dividida em classes, a Educação se desenvolve de acordo com os interesses da classe dominante e, assim, aprendemos apenas aquilo que nos é permitido conhecer, isto é, o superficial, para que não façamos a revolução e, assim, permaneça tudo como está.

Embora esta seja a regra que move a sociedade de classes no que se refere à Educação, há sempre movimentos revolucionários, propostas de Educação progressista, a favor da classe trabalhadora. Desta forma, é que afirmamos que a Educação é um ato político, pois ou está a favor de uma Educação para o desenvolvimento humano ou para o desenvolvimento do capital.

A Educação é um ato políticoe até mesmo partidário como tal precisa ser encarada. Isso significa dizer que a Educação nunca foi, não é, e nem poderá ser neutra numa sociedade de classes, pois ao representar o interesse de uma classe estará indo contra os interesses da outra.

Na medida em que os seres humanos, atuando e refletindo, são capazes de perceber o condicionamento de sua percepção pela estrutura em que se encontram, sua compreensão começa a mudar, embora isto não signifique ainda a mudança da estrutura.

A Educação como prática de liberdade proposta por Freire está pautada numa Educação problematizadora, fundada na convicção da humanização de educadores e educandos, a partir da interação dialética entre eles, mediatizadas pela problematização do mundo, no desvelamento de suas contradições e na busca por outra hegemonia, a qual está associada ao que soa muito na sociedade atual, que é a busca por outro mundo possível. Diríamos mais: possível e necessário.

Esse outro mundoé possível quando, por meio dos seres humanos e de sua participação ativa numa prática política, na defesa de seus interesses e na compreensão de que estes não podem ser antagônicos aos de seus companheiros, conseguem superar o que Goldman chama de consciência real pelo máximo de consciência possível (FREIRE, 2001, p. 39)

Desse modo, a problematização como eixo da relação da Educação como um dos meios necessários ao processo de transformação do mundo, através da nossa intervenção consciente neste, pressupõe que seja praticamente impossível o sujeito que problematiza a realidade não se sentir comprometido com o processo histórico que se vive, enquanto processo que não é somente dele, enquanto ser individual, mas seu enquanto ser social.

Embora saibamos que a Educaçãonão seja sozinha a alavanca da transformação, sem ela a mudança radical da estrutura da sociedade vigente não acontece, pois é o meio pelo qual somos desafiados a procurar a emersão das consciências, para que aconteça a “inserção” crítica do sujeito na realidade, facilitando a compreensão reflexiva e politizada do mundo para que, assim, nossas práticas sejam práticas autenticas, ou seja, práticas condizentes com o que a realidade objetiva está a nos mostrar ser a necessária a realizarmos.

Nesse sentido, uma Educação como prática de liberdade humana, emancipadora de nossos sentidos para que possamos conhecer a realidade para além de sua aparência, penetrando o mais profundamente em sua essência, ou seja, no movimento que impulsiona os fenômenos sociais a se constituírem da forma como eles vêm sendo constituídos implica, necessariamente no rompimento com a lógica do capital, o que pressupõe a busca pela hegemonia da classe trabalhadora.

Isso se dará, entre outras coisas, pelo desvelamento da ideologia dominante – burguesa - que ofusca a luta de classe existente na sociedade capitalista, tornando as contradições existentes nesse modo de produção como “coisas” normais, fatalidades, acasos. Logo, se retira do ser humano a sua ontologia de ser mais humano, de lutar; a sua capacidade e a sua busca de ser mais, se retira do homem a sua humanidade.

Paulo Freire numa passagem da Pedagogia da Autonomia traz a essência do que aqui procuramos desenvolver. Assim diz ele:

O que quero repetir, com força, é que nada justifica a minimização dos seres humanos, no caso das maiorias compostas de minorias que não perceberam ainda que juntas seriam a maioria. Nada, o avanço e/ou da tecnologia, pode legitimar uma “ordem” desordeira em que só as minorias do poder esbanjam e gozam enquanto às maiorias em dificuldades até para sobreviver se diz que a realidade é assim mesmo, que sua fome é uma fatalidade do fim do século. Não junto a minha voz à dos que, falando em paz, pedem aos oprimidos, aos esfarrapados do mundo, a sua resignação. Minha voz tem outra semântica, tem outra música. Falo da resistência, da indignação, da ‘justa ira’ dos traídos e dos enganados. Do seu direito e do seu dever de rebelar-se contra as transgressões éticas de que são vítimas cada vez mais sofridas (2000, p. 113-114).

É importante compreender que a realidade é transformável, que feita pelos seres humanos por esses pode ser transformada. Assim, a Educação como um instrumento no desenvolvimento da consciência crítica, permite compreendermos que a realidade opressora não é uma sina, na qual caberia somente nos acomodarmos. A Educação contribui para que a percepção ingênua da realidade vá cedendo lugar a uma compreensão crítica da mesma, movendo os seres humanos numa esperança que pode mover a uma cada vez mais concreta ação – prática social - em favor da mudança radical da sociedade.

QUESTÕES DO MÉTODO

Marx e Engels (2002) em sua 11° tese sobre Feuerbach nos fazem um convite direto à luta quando atentam para o fato de que os filósofos apenas interpretaram o mundo de diferentes maneiras; agora é preciso transformá-lo. A relação que fazemos aqui entre essa tese o aparente estado de preocupação demonstrado pelas grandes corporações, empresas, órgãos financiadores, etc., em nossa sociedade em relação à crise socioambiental escondem interesses de autopreservação do Modo de Produção Capitalista e acabam refletindo uma tentativa de manter a situação inalterada a fim de continuar usufruindo os benefícios que o capitalismo oferece a quem detém os meios de produção.

O interesse do Capital não está em transformar o mundo, mas justamente em mantê-lo como está. É assim que a “preocupação” que demonstram os defensores da ordem burguesa, por meio de suas práticas ditas sustentáveis, ecologicamente corretas e socialmente justas não são mais que estratégias de sobrevivência frente à evidência cada vez maior das contradições da ordem capitalista. Compreender, portanto, a sociedade na qual vivemos é um passo sem o qual não podemos compreender como vem se desenvolvendo a Educação Ambiental condicionada a este contexto e muito menos poderemos conduzí-la diretivamente para a transformação.

Mas, para que possamos seguir adiante em nossa explanação metodológica para uma Educação Ambiental Transformadora, é necessário que deixemos claro que estamos falando do Método Materialista Dialético, pois a partir dele temos clareza do mundo (a matéria) como processo histórico em constante movimento de desenvolvimento (dialeticidade), constituído na unidade de contradições que lhe são temporalmente específicas e que, na lei da luta dos contrários, garantem a possibilidade concreta de transformação (historicidade).

Cabe-nos esclarecer, pois, em nossa perspectiva teórica, que a transformação é um processo inerente ao desenvolvimento de todo e qualquer fenômeno, processo ou objeto da realidade, caracterizando o estágio da resolução de todas as contradições específicas desse desenvolvimento.

Guiados pelas leis e categorias do Materialismo Dialético, do Materialismo Histórico, expressão do primeiro aplicada à analise da sociedade burguesa, e da Economia Política, temos convicção na possibilidade concreta da transformação das condições materiais que estão hoje a nos roubar a humanidade a cada dia em que se repetem as práticas opressoras, alienadoras e exploratórias que competem à lógica de existência e persistência do Capital.

Confiamos nesses fundamentos como a teoria necessária à consciência dos seres humanos para que sejam inevitáveis as práticas transformadoras. Se nos lançarmos à prática sem que se tenha desenvolvido em nós uma consciência crítica sobre a realidade, corremos o sério risco de resultar ativismos infrutíferos. Da mesma forma, seremos acusados com justiça de verbalismo se, munidos de um arsenal teórico libertador, nos acomodamos e não concretizamos a prática transformadora que é necessariamente o processo imediato do conhecimento teórico libertador.

Uma Educação Ambiental como um conjunto teórico-prático para a transformação pressupõe a adoção de um método infalível que nos possibilite compreender as causas para a crise socioambiental que estamos vivendo no atual estágio de desenvolvimento da humanidade. Isso implica romper com representações sobre os processos, fenômenos, objetos da realidade que muitas vezes nos conduzem à ineficácia e ao erro.

O método para uma Educação Ambiental Transformadora difere da simples adoção de algumas metodologias, muitas vezes oriundas de uma concepção fragmentada e reducionista de mundo que não reflete a ordem como as coisas existem e interagem na natureza e na sociedade por meio de ligações e relações.

É por isso que concordamos na convicção de que o método Materialista Dialético, proposto por Karl Marx como fundamento para a análise da realidade, é o único capaz de conduzir à transformação; justificamos nossa certeza sobre a eficácia deste a partir do conhecimento de que as categorias e leis da dialética materialista expressam o movimento de desenvolvimento de todas as coisas, processos e fenômenos da realidade, e, portanto, são plenamente aplicáveis à realidade. Sendo assim, conscientes de que a teoria forma-se a partir da compreensão da prática, ou da “ciência do mundo”, sabemos que somente uma teoria que compreenda a prática com o maior aprofundamento possível poderá resultar na ação transformadora.

Vemos com frequência que muitas ações em Educação Ambiental na sociedade da qual participamos elegem o efeito que os problemas socioambientais ocasionam à vida dos seres humanos e de outros seres vivos como ponto de partida em sua análise da realidade, quando, no entanto, se respeitado o movimento dialético de desenvolvimento de todos os fenômenos, processos e objetos da realidade, deveríamos partir das causas destes problemas.

Uma análise da realidade em seu maior aprofundamento possível irá revelar-nos que as causas são todas elas ramificações da forma como estamos produzindo nossa existência material dentro do Modo de Produção Capitalista. A crise socioambiental em nossa sociedade é a expressão das contradições inerentes ao próprio metabolismo do Capital, enquanto um conjunto de relações que dita a forma como existimos em sociedade e como nos relacionamos com a natureza.

A razão da necessidade de um método por traz de uma Educação Ambiental Transformadora é que a transformação engendrada pelos sujeitos não se pode dar sem a formação de uma consciência crítica sobre o real. No âmbito da Educação Ambiental, a consciência crítica é a expressão do máximo aprofundamento possível que pode alcançar a consciência humana na compreensão das questões que delimitam o meio ambiente enquanto a totalidade das ligações e relações dos seres humanos em sociedade e com a natureza.

Nenhum processo eficaz de transformação poderá ocorrer no âmbito das relações sociais e entre seres humanos e o meio natural sem que haja uma clareza, fruto da formação da consciência crítica, de como surgiu e está se desenvolvendo o contexto por nós hoje vivenciado como “o modo capitalista de existir” e transformar a natureza a partir de uma lógica voltada, não para atender as necessidades humanas, mas o lucro que mantém o Capital.

O método para uma Educação Ambiental Transformadora expressa a necessidade de superação das contradições que constituem o Modo de Produção Capitalista. A transformação de algo ocorre quando o conjunto de forças/ interesses contrários (e, portanto, impossível de serem conciliados, apesar de constituírem o mesmo fenômeno) se resolvem e deixam de existir transformando o fenômeno, processo ou objeto em outra coisa.

No caso específico da sociedade capitalista, a transformação dar-se-á na resolução das contradições existentes entre a classe operária e a classe burguesa, ou seja, no desaparecimento destas contradições, quando os interesses contrários deixam de existir e podem caracterizar a formação de uma nova sociedade ausente de classes.

É necessidade radical atentarmos para o fato de que as ações conservadoras-reprodutivistas - e, portanto, anti-revolucionárias no sentido da resolução das contradições existentes na sociedade capitalista - adotadas no âmbito da Educação Ambiental nada contribuem para a transformação daquilo que a realidade está a nos dizer que precisamos transformar. Pelo contrário, uma Educação Ambiental quando subjugada à lógica do Capital nada mais é que uma parte auxiliar dele.

A compreensão do método Materialista Dialético possibilita-nos reconhecer que o Capital permeia ideologicamente todas as instâncias da vida social e também aquelas entre seres humanos e a natureza. Sendo assim é freqüente a distorção do que sejam realmente as “práticas transformadoras” em Educação Ambiental. Um conjunto de práticas transformadoras dentro deste campo teórico-prático pressupõe romper com a forma como estamos nos produzindo materialmente em sociedade e nas relações com a natureza, ou seja, exige a superação das contradições próprias de nossa ordem social, e não sua continuidade.

É por isso que ratificamos que a transformação exige um método de análise que nos conduz a compreender o mais aprofundadamente possível as contradições existentes em nossa realidade socioambiental para então guiar-nos diretivamente à prática transformadora.

As diversas situações de exploração que submetem natureza e seres humanos no Modo de Produção Capitalista somente serão transformadas para uma forma de viver livre, fraterna e justa quando todos aqueles sujeitos que constituem a classe trabalhadora, ou seja, a grande maioria, tiverem compreensão crítica dessas situações com foco no que as está causando.

Pensar desta forma pressupõe que a transformação é um processo coletivo e não obra de poucos que compreendem como nossa sociedade vem se desenvolvendo. A transformação é a prova da existência de uma consciência crítica coletiva sobre os fenômenos e processos da realidade, pois é impossível para a perspectiva dialética uma ação eficaz sobre o que não se conhece e compreende.

Uma abordagem de herança positivista, pelo uso de um método focado em “evidências” tende a focar sua análise das questões ambientais no estágio de efeito ou conseqüência, fragmentando a totalidade de seu desenvolvimento e isolando essas questões de suas causas. A abordagem pós-moderna, por sua vez, peca grosseiramente por diluir a própria realidade, como se esta fosse composta por elementos que são independentes uns dos outros, impedindo assim a compreensão das ligações e relações que tornam os processos, fenômenos e objetos da realidade um todo dinâmico e interativo.

Em base essencialmente distinta a essas duas formas de compreender e explicar o mundo, o método Materialista Dialético nos ensina que a transformação expressa o movimento de mudança radical do que “deixa de ser” para “ser outra coisa” no nível da estrutura e organização dos fenômenos, processos e objetos da realidade. Dessa forma, assim como fez Marx na análise da sociedade burguesa de sua época, buscando compreender os movimentos históricos que levaram ao seu surgimento, o educador ambiental em cuja visão de mundo está o método Materialista Dialético, não sobrepõe os efeitos às causas que geram as crises socioambientais em nossa sociedade.

Uma das razões de estarmos adotando em nossos estudos sobre a Educação Ambiental Transformadora o referencial teórico-metodológico do Materialismo Dialético e do Materialismo Histórico, enquanto visão de mundo que nos permite analisar a realidade sócio-histórica da humanidade por meio de suas categorias e leis é por que – apesar de não ter sido a natureza, mas sim a sociedade, o objeto de estudo de Marx - não somente a sociedade, como também a natureza, na forma dialética como a estamos concebendo, é passível de análise a partir deste método, já que as categorias que se aplicam aos fenômenos sociais, por serem universais, também podem ser o fundamento teórico-metodológico para a análise dos fenômenos naturais.

O Materialismo Dialético constitui-se em uma filosofia científica para a análise da realidade, e implica necessariamente no desenvolvimento de uma visão científica do mundo, que se apóia em princípios conceituais baseados na materialidade, e, portanto, plenamente aplicáveis à realidade. De acordo com Krapívine (1986, p.12) “a visão científica do mundo ajuda o indivíduo a formar um sistema conceitual íntegro e coerente, proporciona-lhe uma metodologia científica para conhecer a realidade e agir de acordo com as necessidades do desenvolvimento social”.

A perspectiva dialética, ao colocar a origem da consciência nas condições materiais, ou na realidade objetiva, nos atenta para o fato de que nada acontece por acaso, mas nas condições que vão se organizando para tal. Quando produzimos as condições necessárias para que determinadas coisas aconteçam, é necessário que estas realmente venham a se tornar realidade.

Nada é fatalidade, fruto do acaso. O fatalismo é uma estratégia utilizada pelos que regem o modelo de sociedade vigente, para que aceitemos a realidade existente como algo natural, ou “que sempre existiu”, portanto, impossível de ser transformada. É importante que tenhamos consciência de que nada é eterno sob as leis da dialética. Portanto, se organizarmos outra forma de ser e estar no mundo, reunindo as condições necessárias para esta nova estruturação e organização social, bem como na maneira como transformamos a natureza, então teremos a possibilidade de um mundo diferente do que aí está.

É nesse sentido que a filosofia dialética e materialista é revolucionária e crítica pela sua essência, pois respeita o movimento de desenvolvimento dos objetos, processos e fenômenos sociais e naturais, compreendendo-os como elementos localizados historicamente e condicionados por determinadas forças contextuais. É crítica por que se dedica não apenas a conhecer superficialmente, ao nível da aparência, os fenômenos e os processos da realidade, mas busca compreender sempre o movimento destes, dentro da aproximação dialética possível em relação a um fenômeno que “não é”, mas “está sendo”.

É revolucionária por que direciona seu método de análise da realidade para a transformação das condições existenciais da experiência humana no mundo. Ao descobrir as leis mais gerais do desenvolvimento da natureza, da sociedade e do pensamento humano, a dialética materialista fornece, desta maneira, aos seres humanos um método de conhecimento e de transformação prática do mundo real, baseada nesse conhecimento.

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL E OS PRINCÍPIOS FREIRIANOS

Muito se fala no atual paradigma socioambiental sobre a necessidade de implementarmos uma Educação Ambiental crítica. Porém, esta qualidade atribuída à Educação Ambiental não pode resumir-se a uma palavra vazia de significado, isenta de conteúdo, sem que se reconheça nela a sua possibilidade prática. Caso contrário nada mais é que discurso. Freire (2001) vem nos dizer em Pedagogia dos sonhos possíveis que não podemos separar a leitura das palavras da leitura do mundo, assim como não é possível separarmos a leitura do mundo da escrita do mundo. Aqui podemos perceber uma crítica às palavras vazias, aos meros discursos, que não carregam em si a possibilidade da prática.

As palavras, assim como quaisquer outros elementos concretos, obedecem ao movimento dialético. Sendo assim, não podemos desligá-las do contexto em que elas existem e se desenvolvem. Seu sentido literal não basta para explicar o conteúdo que as mesmas portam, pois a palavra assume o sentido das relações e ligações que a condicionam em um determinado tempo histórico.

O que estamos querendo dizer com isso é que, quando falamos insistentemente nesta tal Educação Ambiental crítica, precisamos nos perguntar: o que é ser crítico em uma sociedade em cuja lógica está justamente a alienação desta capacidade de crítica, a depredação da capacidade de pensar, a atrofia da consciência? Esta investida contra o elemento intelectual dos sujeitos tem por objetivo manter as relações sociais inalteradas, preservando o modelo de sociedade vigente.

Não podemos, no entanto, conscientes da sociedade em que vivemos, permanecermos estagnados pelas amarras da sua lógica de funcionamento. Negar inocentemente a realidade esperando que se estabeleça magicamente sobre esta outra forma de realidade não é ser crítico. Assim como não é ser crítico aceitar as coisas como estão, contribuindo para a continuidade de um modo de uma forma de sociedade injusta e desumana.

Ser crítico é, partindo do conhecimento mais próximo da realidade que podemos elaborar ao nível da consciência, assumir o compromisso de instrumentar a transformação desta sociedade em que vivemos, sem limitarmo-nos ao plano ideológico da transformação, mas partindo da unidade teoria e prática. Se rompermos esta unidade, focando apenas o plano teórico, sem reunir condições para a materialidade, corremos o risco de sermos iludidos pelo discurso vazio. Da mesma forma, se nos lançarmos à prática sem o necessário fundamento teórico, podemos tornar a situação material produzida, insustentável.

Retornando ao que estávamos discutindo, não basta adjetivar a palavra se este adjetivo está vazio. Isso serve apenas para embelezar o substantivo que o acompanha. O adjetivo, ou a qualidade atribuída ao substantivo, no caso, a criticidade da Educação Ambiental, só tem valor quando vem instrumentar o substantivo diretivamente, para uma determinada prática social.

O adjetivo só tem valor quando implica no compromisso com o conteúdo especificado na palavra. Sendo assim, quando aderimos à Educação Ambiental a adjetivação “crítica”, precisamos conhecer o sentido contido na palavra, sabendo que a palavra é ação, precisa materializar-se para existir. Nossa prática é o critério de verdade para dizer que o que estamos pensando é válido.

Para que possamos dar continuidade ao nosso estudo precisamos esclarecer o tipo de Educação Ambiental a qual queremos e com a qual nos comprometemos. Não uma educação que se estrutura e organiza a fim de constituir um mero aparelho ideológico do modo de produção capitalista, servindo a este enquanto reprodutora de sua ideologia.

Pretendemos em nosso projeto de outra sociedade que não à qual participamos, que a Educação Ambiental venha cumprir sua função social no sentido de contribuir para uma organização social justa, igualitária e fraterna, no processo mesmo em que a sociedade se reestrutura e constitui uma nova forma de entender o meio ambiente, que foge ao conceito equivocado de ambiente puramente “ecológico”, separado do seu constituinte social, que é a presença humana, natureza humanizada.

Nesse sentido trazemos Paulo Freire, educador comprometido com a legitimação de uma Educação transformadora, humanizadora, libertadora na medida em que considera o sujeito da aprendizagem enquanto sujeito, participante na produção desses saberes, e não como objeto, desprovido de autonomia, de escolha, capacidades, criatividade, vontades.  A produção dessa Educação dar-se-ia pela adoção coletiva de uma forma de agir e pensar movidas de tal criticidade e fundamentada em uma visão humanizadora de mundo que nos permita enxergar e compreender a realidade para então transformá-la. Comprometida com a verdade e não com ilusões. É preciso clareza para entender que na concepção de educação partimos sempre da reflexão sobre um contexto concreto para responder a esse contexto.

Em sua obra “Pedagogia da Autonomia” (1996) Freire elucida o processo educativo, de acordo com seu entendimento, sua visão de mundo, quando coloca que ensinar vai além de transmitir conhecimento, mas significa oferecer condições para que o sujeito da aprendizagem se desenvolva. Temos aqui em se tratando de mera transmissão de conhecimentos o que o autor chama de Educação Bancária.

Pretendemos adaptar de Freire em nosso estudo o conceito por ele elaborado de “Educação Bancária” (utilizada pelo autor em sua obra “Pedagogia do Oprimido, de 1981), o qual vem a ser uma concepção de educação na qual se estabelece uma relação de poder entre educador e educando, sendo que, ao primeiro enquanto detentor do conhecimento cabe a função de transmitir, e em referência ao próprio termo ”Educação Bancária”, cabe depositar os saberes aos segundos, estando estes na condição de receptores do conhecimento, folhas em branco, nas quais se pode imprimir qualquer saber. 

Nos é oportuno enquanto meio de elucidarmos a proposta de Educação Ambiental que estamos defendendo valer-nos do pensamento freireano para fundamentar a Educação Ambiental a qual desejamos rompendo com aquela por nós rejeitada devido às suas contradições inaceitáveis. Trata-se, pois, de uma adaptação que estamos fazendo do conceito de Educação Bancária presente na obra freireana. Ousamos aqui aproximar nossa proposta de Educação Ambiental ao pensamento de Freire, já que entendemos ser a Educação Ambiental, antes de tudo, Educação.

Nesse sentido, parafraseando Freire e adaptando dele alguns termos que estamos trazendo para o nosso estudo temos que a “Educação Ambiental Bancária” não está comprometida com a transformação, pois foge ao real, quando não se permite enxergar a totalidade das coisas (sociedade, meio ambiente, ser humano), bem como as inter-relações inerentes às mesmas. Esta forma de Educação Ambiental ignora a historicidade dos fenômenos. Desliga-os de suas origens, de suas causas: descaracteriza-os, tornando-os ideais. Quando não parte de uma concepção ampla, de totalidade do meio ambiente e de sua historicidade passa a guiar-se com base em fundamentos ingênuos, distanciados da prática social.

Ao considerar uma sociedade fragmentada, constituída por elementos isolados, fixos, não relacionados, esta Educação Ambiental não se presta à resolução dos problemas socioambientais concretos, nem ao incentivo de práticas benéficas ao meio ambiente, pois sua base é ideológica (a ideologia hegemônica 1). Nesse caso, limita-se ao mero apelo conservacionista, elegendo como alvo de seus esforços a natureza na sua concepção ecológica, desligando-a do todo: o meio ambiente humanizado.

Negar o elemento humano do ambiente é decretar a extinção, sem exagero da palavra, deste mundo como o conhecemos. Fruto este da ação humanizadora de homens e mulheres. Se o negamos, então negamos nossa própria existência. Não podemos ceder ao equívoco de que a solução seria retornar aos primórdios da evolução humana, quando o ambiente não evidenciava impacto proveniente da ação do homem, sendo esta ainda muito irrisória. Quem de nós abrirá mão das melhorias na qualidade de vida, do conforto e da possibilidade de controlar nossos condicionantes biológicos a nosso favor, tão admiravelmente desenvolvidos pela ação criativa humana? Negar o social, desprezar o seu constituinte humano, culpabilizando as ações humanas pelos problemas e agravantes ambientais vivenciados neste contexto de crise, ao mesmo tempo em que se proliferam formas de ativismos infrutíferos, os quais “pretendem” chocar-se de frente contra o capital é assumir uma posição de conformidade, não em relação aos problemas ambientais, mas em relação a esse modo de produção, causa legítima da crise socioambiental presente.

Em contraposição, uma Educação Ambiental Problematizadora não se ancora em pressupostos ingênuos, simplificadores, idealistas. Mas aceita o existente, o concreto, o real como critério de verdade. Torna-se então realizável, pois passa a existir não apenas no pensamento, na ideia, mas habita o campo do real, ou seja, concretiza-se na prática social, categoria que legitima a existência humana. Ao contrário, a Educação Ambiental Bancária, assume analogamente a consistência líquida, quando, tomando a forma do recipiente, passa a existir de várias formas, instável, maleável, flexível. Esta forma líquida permite aceitação, não se constitui revolucionária, a não ser para a classe dominante. Nisso está a sua fragilidade. Temos então a intensa ploriferação das manifestações e dos ativismos infrutíferos.

Uma Educação Ambiental que se pretende problematizadora não se contenta com a condição existencial de nossa sociedade, alicerçada sobre a base de um modo produtivo não condizente com os princípios de sustentabilidade socioambiental tão enfaticamente palavreados neste mesmo antro produtivo. Não aceita este contexto insustentável em que vivemos, mas lança-lhe um olhar crítico, olhando-o de perto, não abstrata ou isoladamente, mas partindo da sua totalidade. Questiona-o, investiga as origens e as causas de seus fenômenos. Não se reduz ao plano das idéias, mas constitui-se prática social.

Parafraseando Freire: uma Educação (Ambiental) como prática da liberdade, que permita ao ser humano conscientizar-se de sua existência no mundo e de sua historicidade no processo de constituição social (e de sua própria constituição como sujeito). Para que possa desenvolver-se, num movimento dialético de superação, de transcendência de suas possibilidades. Uma Educação Ambiental Problematizadora como prática humanística, comprometida com práticas sociais transformadoras (e aqui permitimo-nos um pouco de esperança) e com os sujeitos sociais, suas necessidades concretas. Não como reprodutora da ideologia e dos interesses dominantes, não como mais uma peça dessa engrenagem fortemente estruturada pelas suas estratégias de persuasão (e/ou controle) que mantém o capital.

A proposta só é legítima quando o sujeito se reconhece nos objetivos esperados. Ou então é pura ideologia, prática alienadora. Dar condições para que o sujeito se desenvolva. Esta é (ou deveria ser) a intenção essencial da Educação. Constituí-lo autônomo, emancipar-lhe os sentidos para que perceba e viva o mundo por si (e para si) próprio.

Finalmente, ao educador cabe comprometer-se com o projeto de uma Educação Ambiental Transformadora e com a formação de sujeitos críticos, nos quais reconhecemos a capacidade de compreender a realidade agindo conforme o contexto do problema. Em tais sujeitos deve então se desenvolver uma consciência crítica, a qual, de acordo com Freire (1979), difere inconfundivelmente em sua essência da consciência que o autor denomina de ingênua. Freire, ao comparar essas duas formas de consciência, a ingênua e a crítica, enumera as características da segunda, como a trazemos adiante:

1. Anseio de profundidade na análise de problemas. Não se satisfaz com as aparências. Pode-se reconhecer desprovida de meios para a análise do problema; 2. Reconhece que a realidade é mutável; 3. Substitui situações ou explicações mágicas por princípios autênticos de causalidade; 4. Procura verificar ou testar as descobertas. Está sempre disposta às revisões; 5. Ao se deparar com um fato, faz o possível para livrar-se de preconceitos. Não somente na captação, mas também na análise e na resposta; 6. Repele posições quietistas. É intensamente inquieta. Torna-se mais crítica quanto mais reconhece em sua quietude a inquietude, e vice-versa. Sabe que é na medida que é e não pelo que parece. O essencial para parecer algo é ser algo; é a base da autenticidade; 7. Repele toda transferência de responsabilidade e de autoridade e aceita a delegação das mesmas; 8. è indagadora, investiga, força, choca; 9. Ama o diálogo, nutre-se dele; 10. Face ao novo, não repele o velho por ser velho, nem aceita o novo por ser novo, mas aceita-os na medida em que são válidos (FREIRE, 1979, p. 40-41).

É nesse sentido do desenvolvimento de uma consciência crítica por parte dos sujeitos sociais que os mesmos se constituem emancipados, já que, capazes de reconhecer na realidade as relações que os oprimem e os exploram são sustentados pela possibilidade de transformar esta realidade. Em tal grau de constituição de uma consciência crítica é que também o discurso da Educação Ambiental, que deixou de ser abstrato, ingênuo e fragmentado, passa a existir enquanto práxis social, unidade teoria/prática, que se materializa, transformando a realidade.

Temos compreendido, com a ajuda de Paulo Freire, que o ser humano somente se desenvolve ao aprender. É nesse processo de aprendizagem, fruto da sua interação com o mundo e com os outros que homens e mulheres se humanizam e se historicizam através da cultura.

Conforme as palavras de Freire (1979) “não é possível fazer uma reflexão sobre o que é a educação sem refletir sobre o próprio homem”. O autor ainda coloca que a existência humana possui uma característica que lhe é singular, o núcleo que nos permite, caso haja esperança, que nosso processo educativo seja constante: o inacabamento ou a inconclusão do homem.

O processo educativo - o qual tem como princípio o inacabamento dos sujeitos enquanto seres de consciência, e, portanto, capazes de aprender de uma forma diferenciada do que o simples treinamento ou determinação – nos leva a atentar para importante papel atribuído ao educador nesse processo como um “desafiador” para a emancipação, a libertação, a autonomia do ser dos seus educandos. O aprendizado somente se concretiza quando desenvolvido no interior do próprio sujeito da aprendizagem, influenciado pela sua interação com o mundo e com os outros.

Somos seres condicionados, não determinados. Isso significa dizer que somos seres de possibilidades, e embora certas condições às quais nos cercam acabam por direcionar-nos de uma forma ou de outra, sempre teremos a possibilidade de tornarmo-nos outros. Quanto mais autônomos, quanto mais emancipados, libertos nos tornamos tanto mais seremos capazes de utilizar nossas possibilidades em nosso favor.

Não podemos, ao falar de Educação, contentar-nos com atitudes supostamente críticas, por vezes exaltadas, incoerentes, mais próximas do ativismo ingênuo, impensado do que com uma forma de consciência crítica capaz de compreender a realidade e reconhecer nela as contradições que exigem urgente superação por meio da transformação social.

Não podemos, dessa forma, pensar um educador que se pretende orgânico, comprometido com a transformação social em benefício de sua classe, se negligenciarmos a urgência com que a nossa sociedade demanda esse tipo de profissional da Educação. É preciso, conforme dito anteriormente, que o educador seja capaz de romper nesse processo de torna-se orgânico, com o próprio modelo de Educação do qual participamos, baseado na reprodução das ideologias da classe dominante. Nesse caminho, é preciso então que o educador se torne suficientemente crítico em relação à realidade que vem nos oprimindo e coisificando. É necessário que se desenvolva nesse sujeito o que Paulo Freire vem chamar de “consciência crítica”.

Além de desenvolver em si a consciência crítica o educador, quando se pretende orgânico, compromete-se consigo mesmo e com os demais, seus educandos e outros sujeitos sociais. Nesse sentido, é preciso que no processo de ensino o educador se torne também pesquisador. Que ele desenvolva sua curiosidade epistemológica, conforme nos refere Freire no livro “Pedagogia da autonomia” (1996), uma “curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta” (p. 32).

Nesse sentido o autor ainda coloca que a curiosidade é uma característica inerente à existência humana, sem a qual o mesmo permanece estagnado, incapaz de criar o próprio mundo, de historicizar-se. A curiosidade, de acordo co Freire (1996, p. 32) “nos move e nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos”. Aqui reside o ponto central quando falamos na necessidade do educador ser também um pesquisador: a curiosidade o faz querer conhecer o mundo, refletir sobre ele e compreendê-lo, para então poder transformá-lo. Não se pode agir com eficácia sobre o que não se conhece. Se não nos comprometermos com a transformação das condições sociais que nos oprimem e nos impedem de “ser mais” seremos cada vez menos humanos e sujeitos de nossa própria história, para tornarmo-nos cada vez mais objetos.

CONSCIENTIZAÇÃO: DESENVOLVIMENTO DA CONSCIÊNCIA DA REALIDADE

Partindo da visão dialética da relação ser humano/mundo, ambos inacabados, Paulo freire desenvolveu sua compreensão acerca de uma Educação como Prática de Liberdade, sobre a qual, nós, seres humanos, na constante busca de sermos mais, transformamos a realidade objetiva e os efeitos desta transformação refletem-se na transformação de nós mesmos. Por isso é que Paulo Freire diz que será pelo aprofundamento de uma consciência crítica que nos conscientizaremos da realidade, sendo capazes de transformá-la, pois a consequência da conscientização é o compromisso dos seres humanos com o mundo, já que criticamente conscientes de nossa realidade de opressão, seremos capazes de realizar uma ação que vise sua superação.

É assim que compreendemos a conscientização de Freire no mesmo sentido da 11ª tese sobre Feuerbach: não se trata apenas de conhecer o mundo, de poder descrevê-lo, de conhecer as leis gerais de seu funcionamento e o modo particular como cada fenômeno opera na totalidade da realidade objetiva, mas sim, trata-se de conhecer o mundo para, de acordo com um interesse de classe particular – o interesse da classe trabalhadora – poder modificá-lo.

O processo de produção das condições materiais necessárias à vida – o trabalho – é a prática social que permite ao ser humano conhecer o mundo, produzir os saberes que lhe serão necessários na produção do próprio mundo da vida. A ação humana é trabalho, e reside na consciência das relações causais de sua própria prática a possibilidade de produção de certos resultados, razoavelmente previsíveis, a partir de determinadas práticas. A consciência possibilita ao ser humano a possibilidade que tem de programar sua ação, de criar instrumentos com que melhor atue sobre o objeto, de ter finalidades, de antecipar resultados, conforme Paulo Freire (2001) nos ensina em Ação Cultural para a Liberdade e outros Escritos.

Neste sentido, reside na consciência humana a real possibilidade de, conhecendo os fenômenos materiais (objetos, fenômenos, processos), transformá-los em proveito próprio. A transformação a que nos referimos é tanto dos objetos materiais que servirão à satisfação das necessidades imediatas do ser humano, como o modo particular de organização das diferentes instâncias da vida. A sociedade, enquanto um fenômeno material constituído pelo complexo de relações que o ser humano desenvolve no processo de produção da vida, da mesma forma que os próprios objetos necessários a vida, são produtos da ação humana, devendo sofrer o desenvolvimento necessário a satisfação das necessidades do humano, à humanização. 

Paulo Freire chama a conscientização de compromisso histórico, pois implica no nosso compromisso com o mundo e, portanto, também com nós mesmos, como sujeitos que fazem e refazem o mundo e assim sua própria história. Neste instante, a conscientização não se encontra mais somente na relação consciência/mundo, mas transcende, convidando-nos a assumirmos uma posição utópica frente ao mundo.

Saber que não apenas estamos no mundo, mas com o mundo e também pelo mundo; da mesma forma, que somos seres condicionados e não determinados, e que, portanto, nossa possibilidade de transformar a realidade que nos oprime e nos explora é a mesma possibilidade dialética que rege a história da humanidade e nos permite produzir novas formas de viver em sociedade. Saber que sonhar o sonho coletivo, que é um sonho acordado, real, passa pelo desejo de uma forma justa, fraterna e humana de viver em sociedade; este é o primeiro passo para a transformação social. Saber que a utopia2 é possível.

Uma consciência crítica pressupõe um método de conhecimento da realidade em que nos encontramos, levando-nos a mudanças radicais. Mas, o que é, então, conscientização? A conscientização é o aprofundamento da consciência crítica que é ao mesmo tempo ação/reflexão/ação para a superação da realidade opressora, sendo em virtude disso, um apelo à ação.

A conscientização, no modo como a compreendemos, é o processo de desenvolvimento de saberes verdadeiros a respeito das condições materiais nas quais os indivíduos se encontram, seu papel no modo de produção, sua situação de classe. O movimento de transformação – mudança radical da forma – da prática social dos indivíduos requer primeiro, uma mudança tal em sua compreensão de mundo, que suas ideações se dêem no sentido do desenvolvimento de práticas condizentes com a vocação ontológica do ser humano, que é superar sua condição desumanizadora que lhe impõem o atual modo de produção.

O desenvolvimento de tal nível de consciência acerca das relações sociais de produção que compõem a realidade objetiva é, neste sentido, a arma de luta dos oprimidos para vencerem a opressão. O desenvolvimento da consciência de classe do proletariado (LUKÁCS, 2003) é a condição para que se possa organizar o conjunto das relações sociais em torno da produção, para que o resultado necessário seja a realização do vir-a-ser humano, sua humanização.

Os saberes hegemônicos que nossa sociedade desenvolve são saberes que dissimulam a existência das relações opressivas nas quais está ancorado o modo de produção das condições materiais de reprodução da própria sociedade. A Educação como Prática de Liberdade é, assim, o movimento contra hegemônico de produção de saberes que denuncia a luta de classes, que no sentido freireano, pronuncia o mundo para poder modificá-lo, que quer possibilitar ao indivíduo desenvolver a consciência real sobre as relações que o oprimem.

A luta de classes é, não exclusivamente, mas, sobretudo, uma luta pela consciência do proletariado, o movimento histórico da burguesia sobre a classe trabalhadora no sentido de impedir o desenvolvimento de sua consciência de classe, neutralizar a sua mais valiosa arma de luta. Quanto mais o oprimido conhecer sobre a sua situação de opressão, tanto mais lhe será possível desenvolver práticas sociais cuja consequência se materializará na forma de outro mundo possível e necessário.

Pelo exposto podemos compreender que somente nós, seres humanos, somos capazes de agir conscientemente sobre a realidade objetivada, pelo poder da ideação, que consiste em conseguirmos projetar em nosso cérebro o resultado daquilo que faremos, o que nos difere dos animais, cuja prática é fruto de instintos, por se tratarem de seres de contato e não de relações como nós. Por esta condição de seres de relações, de seres sociais que fazem a própria história, está nas mãos da humanidade a possibilidade de romper com as relações opressivas de produção que se apresentam como um empecilho à humanização do humano.

Desenvolvemos nosso conhecimento no exercício de nossa práxis (ação/reflexão/ação sobre o mundo) e somos os únicos seres capazes de nos distanciarmos do mundo para admirá-lo. Assim, é que num primeiro momento a realidade não se apresenta para nós como objeto cognoscível, já que numa aproximação espontânea homem/mundo estamos frente a ele apenas em nível de percepção, o que Freire chama de posição ingênua. Manter a grande massa oprimida nesta situação é o objetivo da classe hegemônica, pois vencido o estado de ingenuidade, a classe oprimida lhe fugirá ao controle, e as próprias relações sociais que passarão a se desenvolver culminarão em uma mudança estrutural da sociedade. 

A conscientização, assim, consiste no desenvolvimento crítico da tomada de consciência, ou seja, “que ultrapassemos a esfera espontânea da apreensão da realidade, para chegarmos a uma esfera crítica na qual a realidade se dá como objeto cognoscível e na qual o homem assume uma posição epistemológica” (FREIRE, 1980, p. 26).

Para penetrar na realidade aparentemente impenetrável é preciso, pois, utilizarmo-nos da abstração, da descodificação do real aparente, isto é, que se passe do abstrato ao concreto (da parte ao todo) para voltar às partes, e neste momento a abstração passa a ser percepção crítica do concreto, que deixou de ser uma realidade impenetrável.

Logo, o processo de conscientização é tão mais desenvolvido quanto mais conseguirmos penetrar na essência dos fenômenos materiais, mas esta posição de desvelamento da realidade precisa ser permanente. Precisamos estar sempre explorando as situações limite, de modo a alcançarmos o inédito viável. Paulo Freire chama atenção para as situações limites dizendo que quando a percebemos como a fronteira entre ser e não ser, “começamos a atuar de maneira mais e mais crítica para alcançar o, possível não experimentado contido nesta percepção” (FREIRE, 1980, p. 30).

Assim é que cada relação dos seres humanos com a realidade apresenta-se como um desafio ao qual precisa ser respondido de maneira original, pois não há modelo típico de resposta, senão tantas respostas quantos são os desafios, logo a resposta que cada um de nós dá a um desafio não transforma apenas a realidade com a qual nos confrontamos, mas a nós mesmos, cada vez mais e sempre de modo diferente.

NOSSA COMPREENSÃO DE EA A PARTIR DE PAULO FREIRE

A educação ambiental como parte das contradições internas do processo da educação, não pode ser ingênua pensando que vai conhecer “todos” os aspectos da realidade, e oferecer um quadro “total” do ambiente, na infinidade dos seus aspectos e propriedades. Nesse sentido a Educação Ambiental precisa ser transformadora, não só estar em movimento, mas como educação, se constituir em uma teoria da realidade e do conhecimento que dela se tem como necessária.

A educação, em seu sentido ambiental, busca captar e exaurir todos os aspectos, caracteres, propriedades, relações e processos do meio sócio-histórico como uma compreensão da realidade como totalidade concreta. Se a educação é entendida como concreticidade, como um todo organizado que possui sua estrutura, onde a educação ambiental é parte – por não ser caótica, e porque se desenvolve – e portanto não é imutável e nem dada uma vez por todas, que vai se desenvolvendo e que portanto não é perfeita e acabada no seu conjunto e não é mutável apenas em sua partes isoladas, na maneira de ordená-las, a educação pode se converter em orientação heurística  e com princípios epistemológicos para estudo, descrição, compreensão, ilustração e avaliação de certas seções tematizadas da realidade objetiva, quer se trate da física ou da ciência literária, da biologia , ou da política econômica, de problemas teóricos da matemática ou de questões práticas relativas a organização da vida humana e da situação social e ambiental.

Assim, dentro do situado acima,encaminhamos  uma reflexão, enquanto possibilidade de diálogo, que se refere essencialmente a possibilidade de uma prática social, como “ação cultural para libertação”, visando socialmente a emancipação dos sentidos humanos, como ato de conhecimento e de método de ação transformadora da realidade, por meio do qual as massas populares sejam desafiadas a exercer uma reflexão crítica sobre sua própria forma de estarem sendo, para que, com essa outra prática, desenvolvam as forças que possam levar uma sociedade a se transformar radicalmente, para não ser tão exagerado,  substancialmente.

Dentro desse desejo, com possibilidades concretas, precisaremossituar a Educação Ambiental dentro do contexto social. As situações são múltiplas e variadas, dependendo de tempo e lugar, perspectiva teórica de mundo e vida. Não existe, portanto,regras válidas para sempre e em todos os locais e interesses sociais. Mas, torna-se fundamental nos orientarmos nos espaços/sociedades ditas em transição ou em transformação – uma vez que não há sociedades estáveis ou estáticas.

Sem querer inventaruma teoria da mudança, válida para todas as situações, poderíamos dizer, de maneira geral, que duas correntes monopolizam as tendências de transformação (na sociedade) – na educação , na educação ambiental. Uma seria reformista e outra revolucionária. Na primeira, uma verdadeira transformação seria prejudicada e somente no segundo caso é que se pode falar em transformação.

Utilizando a expressão de Paulo Freire, podemos dizer com ele, que a primeira – a reforma na educação Ambiental seria uma educação da reprodução da sociedade e do pensamento, apenas com outra roupagem, com outra metodologia, que seria ou continuaria uma educação ambiental como prática da domesticação. E, no outro extremo, a educação ambiental, como parte do processo educativo geral, seria ela uma educação transformadora – revolucionária enquanto educação como prática da libertação.

Porém como não há sociedade “pura”, esta duas perspectivas reformista/reacionária e transformadora/revolucionária são apenas abstrações pedagógicas. Digo abstrações pedagógicas porque não existe uma sociedade abstrata, uma ecologia abstrata, uma educação abstrata – isto é, que fosse totalmente conservadora ou totalmente libertadora

Esses dois modelos, se assim podemos dizer, o conservador e o transformador seriam apenas horizontes opostos, em direção dos quais a educação – e a educação ambiental- tentariam caminhar, mantendo a pressão, o conflito, a didática, entre o velho e o novo, entre a reprodução e a transformação. Novamente chamando Freire ao diálogo, queremos dizer que a Educação e a Educação Ambiental não são a “alavanca da transformação social” , nem a transformação do meio ambiente e da ecologia se dará sem uma  educação que não seja também ambiental, pois não conseguem reproduzir integralmente a sociedade e o meio ambiente da qual dependem.

A questão essencial da educação e da educação ambiental, que é a relação entre educação e a sociedade, entre a educação ambiental e o meio ambiente não se constitui em uma relação simétrica ou matemática o processo que realizam. A Educação e a Educação Ambiental não são apenas sub-processos do processo social. Eles o são, mas não apenas isso. A educação ambiental enquanto educação reproduz a sociedade, a contradição e o conflito não se manifestam porque a reprodução é dominante. A educação e em específico a educação ambiental faz o que a classe dominante “pede”.

A partir de A Ideologia Alemã de Karl Marx e F. Engels podemos inferir que os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentosdominantes; em outras palavras, a classe que é poder material dominante numa determinada sociedade é também o poder espiritual dominante. A classe que dispõe dos meios da produção material dispõe também dos meios da produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles aos quais são negados os meio de produção intelectual está submetido à classe que domina.

Os pensamentos predominantes nada mais são do que a expressão ideal das relações materiais dominantes; eles, os pensamentos são essas relações materiais influenciadoras consideradas sob forma de idéias, portanto a expressão das relações que fazem de uma classe a classe dominante; em outras palavras, são as idéias de usa dominação.

Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras coisas, também uma consciência, e consequentemente pensam; na medida em que dominam como classe e determinam uma época histórica em toda a sua extensão, é evidente que esses indivíduos dominam em todos os sentidos e que tem uma posição dominante, entre outras coisas também como seres pensantes, como produtores de idéias, que regulamentam a produção e a distribuição dos pensamentos da sua época; suas idéias são portanto as idéias dominantes de sua época.

Nesse contexto então, o que poderíamos chamar de Educação Ambiental transformadora? Penso que seja aquela que não tente esconder, camuflar, escamotear a contradição da Educação Ambiental numa sociedade de classe, mas tenta mostrá-la. Que a educação e a Educação Ambiental, nessa sociedade, nesse ambiente, pudessem trabalhar no desenvolvimento de outra cultura que distinguisse uma Educação Transformadora de uma Conservadora. Que levasse a educação ambiental conservadora a se desvelar por suas atividades reacionárias, frente ao desenvolvimento de práticas conscientizadoras.

Ao considerar que uma Educação seja ela adjetivada como desejamos, ela será revolucionária, pelo seu conteúdo ser ele conservador ou transformador, pelo que ela ensina e como ensina, para que ensina, a favor de que e contra que ensina. Assim uma educação ambiental será transformadora por aquilo que ela diz, por tudo aquilo que ela explica.

Apoiando-nos nessa compreensão, vamos tomar a Luta de Classe como uma das categorias básicas para a ação pedagógica para uma educação ambiental transformadora. Em seus estudos, Marx, observou que a luta de classe não se operava mecanicamente, e que nela intervinham forças “externas” intenções, interesses, enfim ideologia. Assim como também, para uma Educação Ambiental transformadora precisamos de intenções, interesses revolucionários.

Logo, trago para nossa compreensão de educação ambiental transformadora, a ideologia e a luta de classe, como pontos chaves da perspectiva da mudança do mundo, da realidade, do meio ambiente, da sociedade, da educação, dos homens e das mulheres. Nesse contexto é necessário concentrarmo-nos nestas duas categorias do Materialismo Histórico – ideologia e Luta de Classe – tentando descobri-la em algumas de suas facetas no que tange ao nosso propósito de Educação Ambiental Transformadora.

Uma Educação Ambiental Transformadora só pode ser eficaz, quando fundada na relação entre a Teoria e a Prática da transformação. Não há prática transformadora sem uma teoria transformadora. Considerar a ideologia dimensão básica de toda ação transformadora significa reconhecer que não é o homem singular que virá realizar a transformação – embora seja o único que exista. É o homem tornado coletivamente. Isto significa, em nosso entendimento, que não é o homem que transforma, que faz história, mas o coletivo dos homens, isto é, os homens em comunhão, juntos.

A dúvida e a suspeita dialética são atitudes e método para que não fiquemos na superficialidade, no imediatismo, nas aparências. Significa reconhecer que o aparente é sempre uma e apenas uma das faces do real. Como diria Moacir Gadotti: Suspeitar é deixar sempre uma porta aberta para uma nova visita; é reconhecer os limites da ação transformadora.

No plano social, a Educação Ambiental que pretende ser transformadora, precisa assumir-se com práticas pedagógicas desveladora das contradições existentes na sociedade – no meio ambiente, nos processos sócio-históricos ambientais, evidenciá-los com vistas a sua superação. Nesse sentido não é o educador ambiental revolucionário ou transformador – ou mesmo a Educação Ambiental que cria as contradições e os conflitos. Ela, por meio dos educadores ambientais apenas os revela, isto é, tira os estudantes da inconsciência. Assim, educar ambientalmente no sentido da transformação passa a ser essencialmente conscientizar sobre a realidade socioambiental do educando enquanto indivíduo e enquanto coletivo, é formar a consciência crítica de si mesmo e da realidade. 

A educação ambiental transformadora vai se caracterizar também pela divergência. Isso vem significar não outro adjetivo para a educação ambiental, mas uma propriedade que a torne transformadora. É sim, colocar diante do educando e dialogar com ele sobre os vários caminhos, as várias possibilidades que a solução de uma questão ambiental pode suscitar.

Uma pedagogia ambiental que se pauta na divergência é o contrário da domesticação, do conservadorismo, da manipulação, da doutrinação. A história também, por isso, pode ser escrita de muitas maneiras diferentes, assim como o comportamento e o cuidado do meio ambiente – do planeta terra. Pode-se dizer em tese, que cada presente tem o seu passado.

A prática da divergência – da dúvida e da suspeita dialética deveria deixar os educadores ambientais e seus educandos diante de alternativas divergentes não apenas em questões fundamentais como a forma de compreender a realidade objetiva – o meio ambiente e a sociedade, mas em questão menos complicada, com as metodologias que possam orientar práticas teórica, visando as críticas da teoria, isto é, a crítica das visões parciais das coisas, dos fenômenos e dos processos, necessariamente parciais e fragmentárias. 

Na linha desse pensamento incluiria como uma “estratégia” para a educação ambiental transformadora a “desobediência” e o desrespeito, dando a essas categorias um significado particular. A desobediência como estamos entendendo, representa um alto grau de criticidade histórica. Ela precisa ser necessariamente coletiva e organizada ao nível de sociedade civil. Temos pensado que é pela desobediência coletiva, organizada, consciente comoum ato de lucidez e de criticidade para o educador ambiental e para seus educandos, que os fazem assumir sua postura, tornar-se alguém, libertar-se. É pela desobediência consciente que os educadores e educandos ambientais, ao dizerem “NÃO”, diz também “EU”, se assume criticamente.

O desrespeito, visto como complemento “negativo” da desobediência, é um ato cheio de amor e de ternura na compreensão Freireana desta prática, pois implica uma atitude de insubmissão, principalmente frente aqueles que se intitulam “Monumentos da Educação Ambiental”, da teoria da educação ambiental, não porque não sejam monumentos, mas porque praticando o desrespeito e eles que descobriremos o que neles podemos amar e o que devemos odiar.

É preciso, segundo Paulo Freire, ter coragem para praticar uma educação ambiental dessa maneira, mas pensamos que somente dessa maneira que podemos formar educadores ambientais, gente capaz de assumir sua autonomia. A prática da Educação Ambiental transformadora começa por precisarmos “nós” sermos desrespeitosos, inicialmente, conosco mesmos, com a pretensa imagem do homem, da mulher, do aluno, do educador, do orientando, do orientador, do dirigente educado, sábio ou mestre – doutor.

Querer traduzir a Luta de Classe na Educação e ou na educação Ambiental parece ser uma tarefa suicida, pois aparentemente a Escola, a universidade, os cursos de pós-graduação, estão fora da Luta de Classe. É isso, que a educação, com uma visão conservadora de ambiente, sociedade e realidade nos quer fazer acreditar que, por exemplo, a educação ambiental tradicionalmente concebida seja uma ilha de pureza e que o meio ambiente e as classes sociais que a formam – enquanto sociedades – não fazem parte do mundo, das atividades educativas e da ação transformadora.

Tomar a luta de classe como dimensão fundamental das atividades educativas e da ação transformadora não significa introduzir a luta de classe na escola, na universidade, nos cursos de pós-graduação, pois ela sempre esteveaí. Em uma concepção de Educação que seja ambiental e transformadora é necessário reconhecer que a escola, a universidade e os cursos de pós-graduação no geral, são espaços políticos importantes na medida em que podem garantir ou não a “herança”, reproduzindo ou não os privilégios de classe, pois é aí – notadamente na universidade, que se preparam os intelectuais do sistema, seus dirigentes e educadores ambientais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação – uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez, 1980.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido.  Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

FREIRE, Paulo. Ação Cultural para a Liberdade e Outros Escritos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.

FREIRE, Paulo; ARAÚJO, Ana Maria (org.). Pedagogia dos sonhos possíveis. São Paulo: Editora UNESP, 2001.

J. SIMÕES Jorge. A Ideologia de Paulo Freire. Edições Loyola: São Paulo, 1981.

LUKÁCS, Georg. História e Consciência de Classe. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

SIMÕES JORGE, J. A Ideologia de Paulo Freire. São Paulo: Edições Loyola, 1981.

1 O conceito de hegemonia, um dos pontos centrais no pensamento de Antonio Gramsci representa o pensamento dominante, ou a liderança cultural-ideológica de uma classe sobre as outras. Antes dos escritos de Gramsci este conceito não era utilizado na literatura marxista, embora o próprio Gramsci tenha recusado a paternidade do termo, atribuindo a Lenin a formulação do princípio teórico-prático da hegemonia. A função exercida pela hegemonia, ou seja, a direção política, ideológica e cultural é essencial à constituição de uma determinada forma de estruturação e organização social.

2 O utópico para Freire é a dialetização dos atos de denunciar a estrutura desumanizante e de anunciar a estrutura humanizante, exigindo para isso um conhecimento critico e sendo, portanto, um compromisso histórico.

 

Comit Director:
Carlos Barrios
Editor:
Juan Carlos M. Coll (CV)
ISSN: 1988-5245
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