João Henriques De Sousa Júnior*
Rafaela Escobar Bürger**
Silvio Antônio Ferraz Cário***
(PPGA/UFSC), Brasil
sousajunioreu@hotmail.com
RESUMO
A utilização de ferramentas e inovações tecnológicas nas indústrias vem sendo apontada como uma nova revolução industrial, a quarta de acordo com a história. Não o bastante, o tema tem se mantido presente no setor industrial por todo o mundo. A denominada Indústria 4.0 tem o seu conceito originado e fundamentado na Alemanha, em 2011, e apesar da expansão global do termo, as pesquisas na área ainda estão incipientes. Desta forma, o presente trabalho se propõe a analisar os esforços de política industrial e tecnológica, além dos arranjos internos, realizados pelos países Alemanha e Japão. Não o bastante, este estudo ainda relaciona os chamados dos referidos países com o Brasil, a fim de se apontar lições a serem tomadas.
Palavras-chave: Indústria 4.0; Alemanha; Japão; Brasil.
RESUMEN
La utilización de herramientas e innovaciones tecnológicas en las industrias viene siendo apuntada como una nueva revolución industrial, la cuarta de acuerdo con la historia. No es suficiente, el tema se ha mantenido presente en el sector industrial por todo el mundo. La denominada Industria 4.0 tiene su concepto originado y fundamentado en Alemania en 2011, ya pesar de la expansión global del término, las investigaciones en el área todavía están incipientes. De esta forma, el presente trabajo se propone analizar los esfuerzos de política industrial y tecnológica, además de los arreglos internos, realizados por los países Alemania y Japón. No basta, este estudio aún relaciona los llamados de dichos países con Brasil, a fin de si se apuntan lecciones a tomar.
Palabras clave: Industria 4.0; Alemania; Japón; Brasil.
ABSTRACT
The use of tools and technological innovations in industries has been pointed out as a new industrial revolution, the fourth according to history. Not enough, the theme has remained in the industrial sector all over the world. The so-called Industry 4.0 has its concept originated and based in Germany in 2011, and despite the global expansion of the term, research in the area is still in its infancy. In this way, the present paper proposes to analyze the industrial and technological policy efforts, as well as the internal arrangements, carried out by the countries Germany and Japan. Not enough, this study still relates the so-called countries with Brazil in order to lessons can be learned.
Keywords: Industry 4.0; Germany; Japan; Brazil.
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
João Henriques De Sousa Júnior, Rafaela Escobar Bürger y Silvio Antônio Ferraz Cário (2019): “A indústria 4.0 sob as perspectivas alemã e japonesa e suas lições para o Brasil”, Revista Contribuciones a la Economía (abril-junio 2019). En línea:
//eumed.net/2/rev/ce/2019/2/industria-licoes-brasil.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/ce192industria-licoes-brasil
1 INTRODUÇÃO
O advento gradativo e constante da tecnologia tem revolucionado inúmeros campos de atividades humanas. De forma não surpreendente, a inserção de novas ferramentas tecnológicas no setor industrial tem provocado uma nova revolução, impulsionada pela criação da ‘Indústria 4.0’.
Apesar de apresentar um aumento de visibilidade no campo industrial, e de ser, atualmente, um dos mais discutidos dentro deste setor em todo o planeta, Neto et al. (2018) afirmam que o termo Indústria 4.0 ainda não está bem definido. Dentre as diversas tentativas de definição, Yanai et al. (2017) colocaram que este novo conceito visa englobar o desenvolvimento, a incorporação e a aplicação das ferramentas e inovações tecnológicas nos campos de automação, controle e tecnologia da informação, aplicados aos processos de manufatura.
Balasingham (2016) diz que, em essência, a Indústria 4.0 nada mais é do que o resultado das outras três revoluções, em seus diversos estágios históricos, que o setor industrial vivenciou. A primeira revolução, datada do século XVIII, originou-se na Inglaterra e caracterizou-se pela transição de uma sociedade predominantemente rural e de mão de obra artesanal com máquinas básicas, para a utilização de máquinas a vapor, tear mecânico e maior rapidez na confecção dos produtos (SCHLÖTZER, 2015). A segunda teve início no século XX e apresentou envolvimento maior nas áreas de aço, petróleo, químicas e elétricas, sendo, porém, a utilização da eletricidade o grande marco deste momento (SCHLÖTZER, 2015). Já no momento de pós-segunda guerra mundial iniciou-se a terceira revolução industrial, comumente conhecida como a revolução tecnológica, que teve o seu auge na década de 1970 com a descoberta e utilização da robótica nos meios produtivos e maior informatização nos sistemas de produção, até a chegada da interne e a globalização (SCHLÖTZER, 2015). Atualmente o mundo vivencia uma nova revolução industrial com a proposta de aumento da utilização da tecnologia.
Se as primeiras três revoluções foram resultado da mecanização, eletricidade e tecnologia da informação, respectivamente, agora é a introdução da internet das coisas e dos serviços no ambiente de manufatura que está inaugurando uma quarta revolução industrial a partir do desenvolvimento de sistemas físicos cibernéticos (NETO et al., 2013, p. 1381).
Como uma iniciativa estratégica do governo alemão, em 2011, na feira anual de Hannover, Alemanha, foi apresentado pela primeira vez o conceito da indústria 4.0. Daudt e Willcox (2016) apontam como elementos fundamentais para este novo conceito de indústria: a fusão de mundo virtual e real; a utilização de Sistemas Ciberfísicos; e a flexibilidade da cadeia produtiva com informação disponível em tempo real para fornecedores e para clientes.
Já analisando mais profundamente essa discussão, Hermann, Pentek e Otto (2016), afirmaram que o projeto da indústria 4.0 está atrelado à criação de novos modelos de negócios, serviços e produtos, uma vez que agrega tecnologias e valor às organizações, por meio de “fábricas inteligentes” (HERMANN; PENTEK; OTTO, 2016). Na visão de diversos autores (KAGERMANN et al., 2013; HERMANN; PENTEK; OTTO, 2016; EUROMONITOR INTERNACIONAL, 2016), essas fábricas aumentarão a eficiência e conservarão os recursos, flexibilidade e competitividade, trabalhando com uma nova abordagem de produção, em conexão em tempo real de pessoas, equipamentos e dispositivos em geral, a partir de equipamentos interconectados em uma rede capaz de convergir o mundo físico e o mundo virtual, sob a forma de Sistemas Ciberfísicos.
Para que a indústria 4.0 seja uma realidade, faz-se necessário que se adote uma infraestrutura tecnológica adequada, além de um ambiente propício para as novas tecnologias sejam criadas e incorporadas pela indústria (SISTEMA FIRJAN, 2016; YANAI et al., 2017). Segundo Hermann, Pentek e Otto (2016), são quatro os componentes fundamentais para as indústrias 4.0, sendo eles: os sistemas ciberfísicos, a internet das coisas, a internet de serviços e a fábrica inteligente.
Os Sistemas Ciberfísicos (CPS) são compostos por atuadores e sensores inteligentes que permitem que sistemas informatizados façam o controle físico dos processos de produção. A Internet das Coisas (IoT), permite o compartilhamento de dados entre dispositivos que controlam e atuam nos processos de produção em tempo real através de redes sem fio. A Internet de Serviços (IoS), corresponde a todo tipo de serviço que pode ser realizado a partir dos dados gerados e disponíveis durante o processo produtivo, seja este através da comunicação máquina para máquina ou entre uma fábrica solicitando matéria-prima a seus fornecedores, por exemplo. Fábrica Inteligente (Smart factory), pode ser definida como uma indústria, na qual as comunicações entre componentes ciberfísicos, através da internet das coisas, provém ajuda a máquinas e pessoas na execução de suas tarefas. (YANAI et al., 2017, p. 4-5).
Dada a importância da Indústria 4.0 para a atualidade percebe-se que ainda há necessidade de que sejam feitos maiores estudos para o alcance da sua maturidade teórica. Assim, a fim de compreender melhor este novo fenômeno global, o presente trabalho objetiva apresentar os esforços da política industrial e tecnológica e os arranjos internos adotados pela Alemanha e Japão - duas potências econômicas destruídas na 2ª Guerra Mundial e que agora ocupam um papel de destaque nesta corrida tecnológica da indústria 4.0 - para que, a partir deles, possa se fazer uma análise comparativa com os esforços apresentados e previstos para o Brasil.
2 ALEMANHA: PRINCIPAIS ESFORÇOS, POLÍTICAS E ARRANJOS INTERNOS
Apresentado em 2011, como parte do High-Tech Strategy 2020 Action Plan (Plano de Ação de Estratégias de Alta Tecnologia 2020) pelo governo alemão, o conceito de indústria 4.0 possui a finalidade inicial de explorar o alto potencial econômico possível de ser gerado a partir da utilização de tecnologias da informação e comunicação na indústria (NETO et al., 2018).
O pioneirismo da Alemanha em debater este tema, de acordo com o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI, 2017), Bezerra, Silva e Araújo (2018) foi resultado de um esforço estratégico do governo alemão em parceria com as universidades e a indústria, de modo a assegurar maior avanço e preservação da competitividade industrial alemã, tendo em vista que outros países, como os Estados Unidos e a China já vinham sinalizando esforços de propostas neste sentido, denominadas como “Internet Industrial” pelo primeiro e “Internet +” pelo segundo (WANG et al., 2015).
Apesar de apontada por Dauderstädt (2012), Daudt e Willcox (2016) como uma “obsessão” pela competitividade, a Alemanha tem uma história de grandes investimentos, durante as duas décadas após a segunda guerra mundial, em indústrias estratégicas e no aumento das exportações de bens de capital. Tanto que, segundo O’Sullivan et al. (2013), o setor manufatureiro alemão é uma dos maiores da Europa, sendo este país o segundo maior exportador de produtos manufaturados. Não o bastante, o país ainda é líder em novas tecnologias, incluindo os segmentos de energia solar e eólica (DAUDT; WILLCOX, 2016).
Em se tratando especificamente da Indústria 4.0, é possível perceber diversos esforços a partir de planos, programas e iniciativas que vem sendo tomadas pelo governo alemão, através de uma combinação de todos os seus ministérios, para reunir os principais inovadores e acionistas da tecnologia com o propósito comum de avançar as novas tecnologias (BUNSE; KAGERMANN; WAHLSTER, 2014). São bilhões de euros sendo investidos anualmente para o desenvolvimento de tecnologias de ponta que beneficiarão o país nesta competitiva corrida pelo desenvolvimento.
De acordo com o IEDI (2017), a Alemanha assumiu o papel pioneiro no desenvolvimento de Sistemas Ciberfísicos (CPS), que fornecem a base para a criação da Internet das Coisas que, combinada com a Internet dos Dados e dos Serviços, torna possível a Indústria 4.0, não apenas pela posição de liderança internacional que o país exerce em sistemas integrados, em soluções de segurança e em software empresarial, mas também pela invejável reputação de engenharia em questões relacionadas a soluções de sistemas, tecnologias semânticas e know-how de sistemas integrados que este país apresenta.
Tendo em vista que o desenvolvimento só acontece com a disposição e participação conjunta de atores como o governo, a indústria e a sociedade, Cesaratto (2010) enfatiza que várias são as razões para o bom desempenho da Alemanha frente a esta realidade. Conforme este autor, o contexto macroeconômico europeu, as restrições à utilização da política fiscal e o baixo dinamismo do consumo doméstico são algumas razões para o bom desempenho externo do país.
Cesaratto (2010) ainda aponta que a superioridade tecnológica da indústria alemã resulta em uma excepcional performance exportadora por esse país. Lehndorff (2012), por sua vez, afirma que a política de compressão salarial e o fato de a taxa de câmbio nominal alemã estar desvalorizada em relação aos demais países europeus tornam as exportações alemãs mais competitivas em relação a seus concorrentes europeus. Não o bastante, Daudt e Willcox (2016, p. 25) afirmam que o sucesso desse país pode ser atribuído a uma série de reformas no capitalismo alemão, “em especial aquelas referentes ao mercado de trabalho e à política de compressão salarial, que contribuíram para manter uma taxa real de câmbio competitiva”. Outro fator, apontado por Dauderstädt (2012) é que a Alemanha se beneficiou das mudanças dos padrões de demanda mundial, inclusive estimulando a demanda de bens de consumo “de luxo”.
A posição da Alemanha neste processo e a busca por se manter no topo desta revolução é algo tão almejado que os planos e estratégias estão sendo criados e ajustados de forma homogênea, sob a coordenação do governo federal alemão e participação de empresas como Siemens, Volkswagen, Bosch, Kuka, ABB, Festo e IBM.
A Hight-Tech Strategy foi a primeira iniciativa ampla construída a partir de um consenso nacional que compartilha uma visão comum sobre o processo de inovação e a necessidade de criar novas tecnologias, considerando o objetivo mais geral da economia alemã o de consolidar sua liderança global e abrir possibilidades para sua indústria (DAUDT; WILLCOX, 2016, p. 28).
Segundo Daudt e Willcox (2016) as grandes áreas consideradas prioritárias e que darão o Norte para as ações estratégicas alemãs, atualmente, são: economia digital e sociedade; economia sustentável e energia; saúde e vida saudável; mobilidade inteligente; e segurança civil.
O objetivo central da estratégia é dirigir as políticas de pesquisa e inovação para a resolução de “missões” específicas. Para isso, optou-se por associar projetos específicos (forward-looking projects) aos grandes temas. Tais projetos devem perseguir objetivos específicos, em um período de dez a 15 anos (DAUDT; WILLCOX, 2016, p. 30).
Apesar de todas essas estratégias, vantagens expressivas e o significativo potencial econômico, a Alemanha apresenta alguns desafios que ainda precisam ser superados. O IEDI (2017) aponta que, enquanto as grandes empresas alemãs estão integrando suas instalações de produção em sistemas de TI de nível superior, as pequenas e médias empresas deste país ainda estão reticentes em aderir ao projeto 4.0. Fora este, a incerteza quanto aos impactos no mercado de trabalho do aumento da digitalização já está surgindo, uma vez que há receio de que com as atividades de rotina sendo crescentemente automatizadas e digitalizadas, haja má remuneração e menor proteção social aos “trabalhadores de cliques” e “trabalhadores de nuvens”, o que poderia criar dificuldades ao ritmo de expansão dos mercados consumidores.
3 JAPÃO: PRINCIPAIS ESFORÇOS, POLÍTICAS E ARRANJOS INTERNOS
Sendo caracterizada como uma das mais sofisticadas nações industriais do mundo, o Japão possui empresas líderes em diversos setores de mercado e isso se deve ao sucesso da abordagem político-econômica de incentivo ao desenvolvimento nacional adotada. O Japão é um exemplo de país que fez uso com sucesso da política industrial para tornar-se uma potência econômica na segunda metade do século XX (IEDI, 2017). Enquanto que outros países estão em processo de adaptação para implementar a indústria 4.0, o Japão já expõe em seu relatório Growth Stratregy (2017) a visualização de um novo modelo de desenvolvimento tecnológico, com a compreensão de que tudo está conectado e que a sociedade terá que ser adaptável, a Sociedade 5.0.
Desde sua reestruturação, após o período da Segunda Guerra Mundial (1945), a indústria japonesa adotou uma trajetória particular de desenvolvimento das suas competências tecnológicas, o que permitiu fazer emergir novos princípios de eficácia industrial utilizados como exemplo a seguir ao redor do mundo (HIRATA; ZARIFIAN, 1991). Na medida em que a economia japonesa parou de crescer na década de 90, segundo O’Sullivan et al. (2013), reformas começaram a redefinir as novas diretrizes econômicas e uma nova agenda política surgiu, visando reorganizar a estrutural industrial japonesa e promover uma participação mais ativa das empresas no cenário global.
Recentemente políticos e acadêmicos japoneses têm discutido sobre um papel mais ativo do estado para o fortalecimento da competitividade industrial (O’SULLIVAN et al., 2013). A partir de dados divulgados pelo IEDI (2017), desde 2015 o governo japonês tem adotado uma política proativa, voltada à aceleração da nova revolução 4.0, objetivando ampliar seu papel competitivo no cenário mundial e gerar novos mercados para a indústria manufatureira nas áreas da saúde, agricultura e transporte.
Sakong (2017) cita e discute as duas grandes respostas do Japão frente a Revolução da Indústria 4.0, tais como:
(1) Introdução de IoT (Internet of Things) por empresas japonesas e sua utilização: Cerca de 52,3% das empresas japonesas percebem que a IoT mudará os produtos ou serviços de suas próprias empresas em 3 anos e por isso se lançaram na corrida para o desenvolvimento de aprendizado e tecnologias que utilizem a IoT.
(2) Desenvolvimento de AI (Artificial Intelligence) das empresas japonesas: A pesquisa sobre o avanço da AI no Japão é dividida em um tipo focado em pesquisa liderado pelo governo e em um tipo de desenvolvimento de novo modelo de negócio liderado pelo setor privado. Segundo dados retirados da pesquisa, o governo japonês está planejando investir 100 bilhões de ienes em pesquisa e desenvolvimento nos próximos 10 anos em conjunto com o Ministério da Economia, Comércio e Indústria; o Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia; e o Ministério de Assuntos Internos e Comunicações, considerando 2016 como o primeiro ano a apoiar a política de P&D de AI (SAKONG, 2017).
Conforme pode ser observado, o Japão possui uma longa história de relacionamento colaborativo entre os setores público e privado (SORTE, 2018). Esta estratégia permanece sendo um dos pilares da nova política econômica com o estabelecimento de conselhos formados por funcionários do governo, representantes da indústria, acadêmicos e pesquisadores que discutem a formulação de medidas de incentivo e avanço da indústria 4.0 no país (IEDI, 2017).
Além disso, outros arranjos internos foram adotados objetivando movimentar o desenvolvimento de novas empresas e tecnologias, conforme aponta o trecho de O’Sullivan et al., (2013):
Para melhorar a competitividade geral do Japão como um centro manufatureiro, as medidas incluíram: uma reforma tributária que busca levar os impostos corporativos do Japão para níveis internacionais; novos incentivos para atrair funções corporativas de alto valor agregado para o Japão (com ênfase em sedes asiáticas e bases de P&D); e aumento do investimento em infraestrutura logística. Novos fundos de longo prazo também foram disponibilizados para apoiar a reestruturação de negócios, com ênfase no apoio a start-ups e esforços de diversificação das empresas. Medidas recentes para melhorar a "qualidade e quantidade" da força de trabalho japonesa incluem: a criação de qualificações profissionais nacionais modeladas no sistema do Reino Unido; a promoção de oportunidades de carreira de "segunda vida" para os trabalhadores mais velhos; programas de treinamento destinados a transmitir as habilidades de trabalhadores experientes para as gerações mais jovens; bem como novas medidas para aumentar o emprego feminino e atrair recursos humanos de alto nível do exterior (O’SULLIVAN et al., 2013, pag. 448-449).
A fim de apoiar a implantação de tecnologias e produtos do Japão no mercado mundial, o governo também promoveu a mudança da venda de produtos individuais com funções avançadas para o fornecimento de soluções integradas, combinando componentes de fabricação e serviços – ou seja, da venda de produtos autônomos à implantação de sistemas – em áreas onde o Japão é percebido como tendo uma vantagem competitiva, ou seja, “vencer pela tecnologia e pelos negócios”. A ênfase foi colocada na implantação de tecnologias de geração e distribuição de energia de baixo carbono em economias de alto crescimento, principalmente da Ásia (IEDI, 2017).
Segundo o planejamento japonês, a intenção é apoiar a mudança de uma estrutura 'mono-polo' baseada em eletrônica automotiva e eletrônica (as principais produções do país), para uma 'multi-polo' sustentável, possibilitada pelo desenvolvimento de cinco campos industriais estratégicos: indústrias relacionadas a infraestrutura água e ferrovia; soluções energéticas da próxima geração; indústrias criativas; indústrias relacionadas à saúde; e campos de fronteira (por exemplo, robôs e espaço).
Outras medidas estão sendo interceptadas na ordem de estimular a expansão do conhecimento ampliando a interação entre universidades, empresas e governo. Fukugawa (2017) ressalta que novos centros de P&D de classe mundial, com a participação da indústria, academia e governo, também foram anunciados para promover a aglomeração industrial e a comercialização de pesquisas conjuntas. Espera-se que esses centros contribuam para um maior investimento em P&D no setor privado e contribuam para alcançar a meta nacional de investimento em P&D de 4% do PIB até 2020.
No entanto, há de se atentar para alguns problemas enfrentados pelo Japão que influenciam diretamente no prosseguimento de suas diretrizes para a Indústria 4.0, conforme aponta Sakong (2017) no trecho a seguir:
Primeiro, o Japão tem relativamente poucos dados virtuais e o tamanho do processamento de big data é pequeno. Portanto, a nação tem limitações para estabelecer grandes volumes de dados e habilidades limitadas para analisar dados com AI em comparação com os EUA. Segundo, problemas de governança fazem com que as empresas japonesas tenham dificuldades em investimentos ativos ou em inovação.(...) Por essa razão, o Japão não possui um modelo de negócios que tenha crescido de uma empresa de risco para uma grande empresa. Terceiro, o Japão não possui mão de obra suficiente no campo de software comparado ao hardware, nem tem uma conexão orgânica com pesquisadores e indústrias nos campos de software e AI. Em quarto lugar, as culturas e a gestão das corporações japonesas não são adequadas para a inovação aberta. A nação tem o melhor nível mundial de tecnologia, qualidade e confiança. No entanto, falta-lhe uma visão de longo prazo, faz pouco do software, não tem investimentos suficientes nas instalações nem desafia os riscos. Em vez disso, suas estruturas de negócios são divisional e verticalmente integradas. Além disso, leva cerca de 10 anos para ser conectado com as fábricas. Quinto, o Japão tem pouca importância na plataforma global. As empresas japonesas estão se esforçando para participar do IIC (Industrial Internet Consortium) dos EUA e da plataforma Industry 4.0 da Alemanha. No entanto, ainda não é competitivo (SAKONG, 2017, pag. 42-43).
Outro desafio destacado pelo Ministério da Economia, Comércio e Indústria (METI) é a escassez esperada de mão de obra devido ao envelhecimento da população do Japão. Estima-se que o país experimentará uma redução de 8 milhões de pessoas em idade ativa em 2020 em comparação com 2009 (METI, 2010b). Como resultado, cerca de 10 milhões de novos trabalhadores serão necessários nos próximos 10 anos, e mais 2 milhões serão necessários para mudar seus empregos (METI, 2012).
4 ANÁLISE COMPARATIVA E LIÇÕES PARA O BRASIL
Apresentadas as características e esforços de ordem política e econômica da Alemanha e do Japão, pode-se, neste momento, fazer uma análise comparativa entre os dois países com o propósito de destacar lições que sejam importantes para o Brasil. Vale aqui ressaltar que o conceito de indústria 4.0 começou a ser difundida no Brasil com a denominação de “manufatura avançada”, tendo sido inicialmente apresentada por empresas multinacionais alemãs (DAUDT; WILLCOX, 2016; YANAI et al., 2017).
De modo geral, percebe-se que a estratégia alemã formula objetivos bem definidos e claros em diversas áreas, além de apresentar de forma estabelecida suas prioridades. Para tanto, toda essa estratégia de base da política alemã de desenvolvimento tecnológico se apoia no conceito de tecnologias habilitadoras.
Em se tratando da questão da inovação no contexto da importação ou exportação, destaca-se que a Alemanha trabalha com estratégias para se tornar não apenas uma excelente exportadora de produtos e tecnologias dentro de cadeias europeias de valor e em mercados emergentes – como o Brasil –, mas também uma grande produtora das ditas “fábricas inteligentes”.
No Japão, o governo tem feito contínuos esforços para fazer política da quarta revolução industrial através de um roteiro de longo prazo por meio da construção de um sistema de promoção da cooperação entre o setor privado e os órgãos públicos como as universidades e o próprio governo (SAKONG, 2017). Além disso, lançou o Future Investment Committee sob o Gabinete do Primeiro Ministro do Japão, também com discussões de políticas relevantes baseadas na New Industry Structure Association. Nesse sentido, é razoável afirmar que a criação de programas e órgãos estatais especificamente para promover o desenvolvimento da indústria 4.0 parece estar colaborando para colocar o Japão num lugar de destaque nesta nova revolução da indústria.
No caso do Japão, o governo vê a Quarta Revolução Industrial como uma boa chance de criar mercado e fortalecer a competitividade dos setores da indústria japonesa, como manufatura, medicina, agricultura, distribuição. Portanto, pode-se dizer que o Japão tem respondido ativamente à nova onda através da IoT (Internet das Coisas), Big Data, Inteligência Artificial (AI), robótica desde 2015 (SAKONG, 2017). Para Chang e Andreoni (2016), isso se deu visto que o governo japonês foi extremamente ativo, a partir da década de 1950, no emprego de uma política industrial forte para desenvolver as indústrias de maior valor agregado, como aço, automóvel, eletrônica e máquinas.
O panorama da Indústria 4.0 e os impactos previstos no cenário industrial chama atenção para desafios do Brasil. Segundo consenso de especialistas, a indústria nacional ainda se encontra em grande parte na transição do que seria a Indústria 2.0 (caracterizada pela utilização de linhas de montagem e energia elétrica) para a Indústria 3.0 (que aplica automação através da eletrônica, robótica e programação) (FIRJAN, 2016).
Tal fato pode ser exemplificado conforme relatório da Federação Internacional de Robótica, o qual aponta que no Japão e na Alemanha há cerca de 300 robôs industriais para cada 10 mil trabalhadores, no Brasil este número é reduzido em 11 robôs (FIR, 2015). A partir desse dado, ressalta-se a relevância do governo brasileiro em analisar as ações adotadas em diversos países, como é o caso da Alemanha e do Japão, e trazer as perspectivas da realidade enfrentada no Brasil com a produção majoritariamente de bens primários, o fraco relacionamento entre empresas e universidades, a falta de investimento na criação de startups, a fome e a pobreza que ainda assolam grande parte da população brasileira.
Atenta-se para a necessidade de investimentos em inovação e tecnologia de ponta, uma vez que uma das bases para a implantação do conceito da indústria 4.0 é a utilização de sistemas ciberfísicos e da internet das coisas combinada à internet dos dados e dos serviços. Assim sendo, o governo brasileiro precisa o quanto antes definir estratégias e ações em parceria com grandes empresas para buscar fomentar pesquisas ou financiar projetos que possibilitem não apenas importar e utilizar essas novas tecnologias, como também criar e inovar.
5 CONCLUSÃO
A quarta revolução industrial já é uma realidade e a Indústria 4.0 está possibilitando avanços em diversos campos e contribuindo para o desenvolvimento dos países. Para tanto, como visto durante este trabalho, é necessário que haja uma força conjunta entre os atores sociais (Estado, mercado/indústrias/empresas e sociedade civil) de modo a definir estratégias, planos e metas que busquem a melhor forma de destinar recursos a investimentos nas áreas de inovação e tecnologia.
Com a chegada da Indústria 4.0 e sua implementação em indústrias brasileiras, o grande desafio para o país concentra-se em fatores como: obter políticas estratégicas inteligentes, incentivos e fomentos por parte do governo; reunir empresários e gestores da indústria com visão, arrojo e postura proativa; dispor de desenvolvimento tecnológico e formação de profissionais altamente qualificados por parte das instituições acadêmicas e de pesquisa, preferencialmente em grande proximidade com a indústria (TADEU; SANTOS, 2014). Superando-se progressivamente os desafios, será possível absorver e implementar na indústria nacional o conjunto de tecnologias e vantagens que esta quarta revolução industrial é capaz de trazer, firmando a competitividade brasileira perante às grandes potências mundiais e até mesmo pioneiras neste processo de adoção da Indústria 4.0.
Apesar disso, sabe-se que o Brasil já tem feito alguns movimentos e avanços para se aproximar de países como Alemanha e Japão. De acordo com o portal do governo brasileiro, o país vem buscando articulações com a Alemanha, com a finalidade de acompanhar as tendências das Indústrias 4.0 (BRASIL, 2016). Neste sentido, desde 2016 o governo do Brasil vem dispendendo esforços a partir da secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação, do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) para que a parceria com o governo e empresas alemãs, de fato, aconteça (BRASIL, 2016).
Os esforços para a concretização desta parceira entre Brasil e Alemanha ainda estão acontecendo, apesar das situações políticas e econômicas que o Estado brasileiro vem enfrentando. Conforme noticiado pelo jornal O Povo online (2018), o instituto de pesquisa alemão, Instituto Fraunhofer, vem prestando consultoria a alguns centros de inovação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), e, em parceria com outros institutos e pesquisas privadas, já foram investidos 3 bilhões de reais em 25 centros de inovação em 12 estados brasileiros. Boa parte desse dinheiro financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e os primeiros resultados já apontam que a combinação entre a gestão alemã e o conhecimento brasileiro deu tão certo que tem gerado frutos permanentes no Brasil (O POVO, 2018).
Um dos estados brasileiros contemplados com os investimentos, Santa Catarina, recebeu representantes do Instituto Fraunhofer de Sistemas de Produção e Tecnologia de Design em abril de 2018 como forma de o Departamento Regional do Senai de Santa Catarina ampliarem a cooperação com a Alemanha, promovendo debates e desenvolvimento da manufatura avançada nas indústrias de Santa Catarina, além de possibilitar oportunidades para startups desenvolverem seus projetos em parceria com a FIESC e dentro dos institutos de Inovação do Senai (FIESC, 2018).
No tocante às relações com o Japão, por sua vez, o cônsul do governo nipônico em São Paulo e a presidente da Japan House São Paulo foram recebidos pelo Ministério da Indústria e Comércio (MDIC) para discutir como os dois países podem cooperar nessas áreas (MDIC, 2018). A parceria Brasil-Japão deverá ser desenvolvida em cinco eixos: intercâmbio de startups que atuam no setor automobilístico, envio de funcionários de órgãos e de empresas brasileiras para período de vivência no Japão e troca de informações nas áreas de indústria 4.0, design e agricultura. Nos próximos meses, uma comitiva formada por integrantes do MDIC e da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) deverá viajar ao Japão para definir a agenda de trabalho (MDIC, 2018).
No texto de Arbix et al., (2017) são sintetizados outros movimentos que o Estado brasileiro, juntamente com algumas indústrias estão
Em 2016, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou estudo sobre a adoção da manufatura avançada no Brasil, com um mapeamento das potencialidades do país. Segundo a pesquisa, 48% das empresas brasileiras adotam tecnologias digitais em sua produção, com destaque para o setor de equipamentos de informática, eletrônicos e ópticos. No entanto, as empresas brasileiras ainda estão longe da adoção intensiva da automação, prototipagem rápida ou impressão 3D, assim como da utilização de serviços em nuvem, características essenciais para sustentação da manufatura avançada. Na mesma direção atuam o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e o BNDES (com uma prospecção sobre internet das coisas), também empenhados em formular políticas de desenvolvimento e modernização da estrutura industrial do país. Do ponto de vista técnico, o Sistema Nacional de Aprendizado Industrial (SENAI) adaptou algumas de suas estruturas de formação para a formação de competências em manufatura avançada. Exemplo maior é dado pelo Senai-Cimatec, que se concentrou na qualificação de profissionais de processos automatizados e na implantação de uma fábrica integrada de demonstração, testes e ensino, em moldes alinhados com o conceito de testbeds. Em sintonia com esse esforço, a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) certificou institutos específicos voltados para manufatura avançada, como o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ita) e o próprio Senai-Cimatec. Como agrupamento privado, a Mobilização Empresarial para Inovação (MEI) há tempos fomenta o debate entre lideranças empresariais, complementados por estudos e análises explicitados nos “Diálogos da MEI”. Com a mesma preocupação, a MEI diversificou esse debate com expositores brasileiros e estrangeiros no Congresso Nacional de Inovação da CNI, realizado em 2017.
Com base nesses fatos e, mesmo com todas as suas dificuldades e carências, o governo em parceria com as empresas privadas e as universidades devem-se preparar para não ficar marginalizados ao processo de consolidação da nova indústria digital.
Para tal, é fundamental não perder de vista que a diversificação do sistema nacional de inovação exigirá a alocação de recursos para viabilizar a parceria com a iniciativa privada e impulsionar a transição da manufatura brasileira para um patamar mais elevado (ARBIX et al., 2017). No mesmo sentido, a utilização de instrumentos como o poder de compra do Estado e as encomendas tecnológicas será essencial para abreviar as fases de absorção e desenvolvimento de novas tecnologias.
Quanto mais tardia for sua reação, maior a distância em relação às empresas mais dinâmicas e maiores serão os obstáculos a serem vencidos para reposicionar a indústria brasileira. A sistematização do que os dois países pesquisados fazem de modo semelhante pode ajudar a definir direcionadores para a elaboração de uma estratégia brasileira de manufatura avançada. Para além dos pontos comuns, há diferenças nada desprezíveis para a formulação de diretrizes públicas. Assim, cabe uma distinção entre as grandes tendências estabelecidas pelos principais players dessa evolução da manufatura global e as características intrínsecas à cada país e região, seu contexto, questões culturais e trajetória percorrida. Nesse sentido, evidencia-se a necessidade de estimular mais parcerias e movimentos para que o Brasil possa fazer jus ao título de 5 maior economia do mundo, estando no páreo dos mercados competitivos da indústria 4.0.
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