Revista: CE Contribuciones a la Economía
ISSN: 1696-8360


UM ENSAIO TEÓRICO CRÍTICO E REFLEXIVO: QUEM É O GESTOR NAS ORGANIZAÇÕES?

Autores e infomación del artículo

Elias José Mediotte*

Universidade Federal de Viçosa (UFV), Brasil

eliasmediotte@gmail.com

RESUMO
O objetivo do ensaio teórico é apresentar uma visão crítica e objetiva sobre como o gestor é percebido nas organizações. Não se trata apenas de conceituar o gestor nas organizações, haja vista o dissenso e a pluralidade do termo, mas sim contextualizá-lo frente aos desafios comumente emergentes, face à influência da globalização. Por outro lado, pretende-se apresentar uma visão crítica e objetiva sobre como o gestor é percebido nas organizações. A partir das principais teorias das organizações (TO) o gestor é comumente colocado em situações que permeiam não apenas as suas habilidades técnicas e instrumentais, mas também suas reações relacionais frente às adversidades situacionais constantes na cultura intraorganizacional. Por ser um ensaio crítico e reflexivo, abordam-se no presente estudo algumas inquietudes provocativas para que novos diálogos possam emergir sobre não apenas discutir quem é o gestor nas organizações, mas como ele próprio se vê representado enquanto parte do ambiente organizacional.

Palavras-chave: Teoria Organizacional. Gestor Organizacional. Burocracia Organizacional. Tipos de Liderança.

A THEORETICAL CRITICAL AND REFLECTIVE TEST: WHO IS THE MANAGER IN ORGANIZATIONS?

ABSTRACT
The objective of the theoretical essay is to present a critical and objective view on how the manager is perceived in organizations. It is not only a matter of conceptualizing the manager in organizations, given the dissent and plurality of the term, but rather contextualizing it in the face of the commonly emerging challenges, given the influence of globalization. On the other hand, it is intended to present a critical and objective view on how the manager is perceived in organizations. From the main theories of organizations (TO), the manager is commonly placed in situations that permeate not only his technical and instrumental abilities, but also his relational reactions to the situational adversities that are constant in the intraorganizational culture. Because it is a critical and reflexive essay, some provocative concerns are raised in this study so that new dialogues can emerge about not only discussing who the manager in the organizations is, but how he himself is represented as part of the organizational environment.

Keywords: Organizational Theory. Organizational Manager. Organizational Bureaucracy. Types of Leadership.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Elias José Mediotte (2019): “Um ensaio teórico crítico e reflexivo: quem é o gestor nas organizações?”, Revista Contribuciones a la Economía (abril-junio 2019). En línea:
//eumed.net/2/rev/ce/2019/2/gestor-organizacoes.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/ce192gestor-organizacoes


  1. INTRODUÇÃO

Quem é o gestor nas organizações? Seu papel está realmente claro dentro das suas atribuições diárias? As firmas enxergam esse personagem como protagonista ou coadjuvante no processo de gerar eficiência e lucro? Ele sabe lidar com o caráter relacional em congregar objetivos coletivos e transformá-los em resultados? Qual a racionalidade lhe é exigida, a instrumental ou a substantiva? Ele consegue lidar com a emancipação do pensamento crítico, e disseminá-la, ou a ele resta apenas que cumpra com as regras burocráticas, possivelmente impostas pelas organizações?
Se você, leitor, já fez pelo menos um desses questionamentos, então torna-se pertinente refletir sobre o que realmente está nos bastidores, e arrisca-se afirmar, ninguém ou poucos possuem a ousadia de revelar ou criticar o que lhes são implícitos, tendo em vista a parcimônia apática e a cultural cordialidade revelada por Sergio Buarque de Holanda ao se referir sobre o “homem cordial” (ALCADIPANI; CRUBELLATE, 2003; SOUZA, 2007), entre pensadores, pesquisadores e acadêmicos, bem como nas suas pesquisas, proposições ou teses.
Direcionar o melhor conceito sobre gestor, qual o seu papel frente às organizações e seus subordinados, lhe “ensinar” como deve fazer para se encaixar dentro de uma cultura organizacional, como lidar com a dinâmica da globalização, além de gerenciar conflitos de todas as partes, sejam intersetoriais, individuais ou coletivas (ao seu grupo). Essas são as tentativas de definir a figura e o papel do gestor no contexto das organizações. Porém, não há uma convergência entre as ideologias quanto ao seu modelo teórico, pois a prática é uma realidade bem diferente das proposições e hipóteses que se estendem em torno dessa figura, que ora é tratada como um ser dotado de racionalidade instrumental ou substantiva, articulador, manipulador de interesses e resultados, ora é vista como um “apagador de incêndios diários”, no qual tornam-se esquecidas ou em segundo plano as suas atribuições estabelecidas contratualmente. Existe uma cartilha para isso?  
O fato de ser mencionada a palavra “esquecidas” acima, é um paradoxo, pois raramente importam as atividades formais específicas ao seu cargo (apesar de não haver consenso, cada organização atribui ao gestor o que, como, quando e para quem ele deve se [com]portar) quando ele traz bons resultados às firmas. No entanto, basta um desafeto, um deslize, um não cumprimento de prazo, uma meta não batida, que lhe estatela-se às costas todo o peso das suas responsabilidades (leiam-se burocráticas) “não cumpridas”. Esse é o cenário, “os fins justificam os meios” (GUERREIRO RAMOS, 1989), mas quando os fins não são compensados, consequentemente não são justificados os meios, não importam as horas de sono perdidas, os almoços e lanches deixados de lado para bater aquela ou outra meta, as mudanças e reuniões de última hora, aquela gripe ou resfriado inconvenientes devido à baixa imunidade relativa ao trabalho incessante, e aquela dor de cabeça que nunca passa (não importa quantos analgésicos são empurrados pelo gorgomilo) causada principalmente pelo estresse de trabalho acumulado com prazo para ser finalizado e entregue, além, é claro, da difícil tarefa de gerenciar os conflitos existentes entre seus pares e subordinados, inclusive dos seus intrínsecos.
Algumas vezes o gestor é comparado, metaforicamente, como um funil, no qual recebe demandas de todos os lados, mas que na sua ponta saiam resultados limpos, transparentes e eficientes. Mas e as impurezas que ficam presas nesse funil, como são expurgadas? Ou realmente fica subentendido que o funil deve ser descartável para que outros possam substituí-los no processo de filtração?
Neste caso, parte-se para a seguinte problematização que envolverá este ensaio teórico: De que forma o gestor é entendido como parte de um contexto organizacional, tendo em vista as suas definições nas Teorias da Administração, clássicas e contemporâneas?
O objetivo presente neste ensaio não se trata de conceituar o gestor nas organizações, haja vista o dissenso e a pluralidade do termo, mas sim contextualizá-lo frente aos desafios comumente emergentes, face à influência da globalização. Por outro lado, pretende-se apresentar uma visão crítica e objetiva sobre como o gestor é percebido nas organizações.
Para a presente discussão, a fim de alcançar o objetivo proposto, será realizada uma análise crítica a partir de conceitos encontrados na literatura, confrontando-os, através das reflexões pontuadas no decorrer da contextualização deste ensaio teórico.

  1. METODOLOGIA

Este estudo caracteriza-se como um ensaio teórico, de “natureza reflexiva e interpretativa” (Meneghetti, 2011, p. 322) na qual deriva-se da percepção qualitativa baseada na literatura apresentada no decorrer da discussão, além das proposições provenientes das experiências e percepções do autor deste ensaio.

O ensaísta procura trazer o leitor para o universo do ensaio, permitindo a relação da sua subjetividade com a do leitor. Os espaços não se consolidam como arenas de disputas pela razão baseada em verdades provadas por fatos e evidências. O ensaio permite que os sujeitos relacionados a ele desenvolvam sua autonomia intelectual e formem seu próprio conhecimento, sem cair na racionalidade totalitária, que tende a enquadrar a compreensão da realidade a partir do estabelecimento de verdades aparentes. Por este motivo, o ensaio não necessita apresentar conclusões afirmativas. Os questionamentos, em forma de reflexões e de novas perguntas, são mais relevantes do que conclusões que estabelecem o marco final e definitivo (MENEGHETTI, 2011, p 330).

Portanto, para este ensaio, as formalidades racionalizadas de um trabalho científico tradicional darão lugar a uma ação contínua de reflexões, tendo em vista que a “importância de estabelecer perguntas adequadas garante a relação dialética entre subjetividade e objetividade” (MENEGHETTI, 2011, p 330).

  1. QUEM É O GESTOR NAS ORGANIZAÇÕES?

Este ensaio contextualiza a figura do gestor a partir da Revolução Industrial, no século XIX, marcada pela mecanização do trabalho nas indústrias. Portanto, de acordo com as teorias da administração de Taylor, Fayol e Weber, o gestor era visto como uma autoridade dotada de racionalidade instrumental, na qual sua finalidade era o controle e a centralização do trabalho dos seus subordinados. Seu principal objetivo era garantir que resultados eficientes através da sistematização da estrutura organizacional fossem alcançados (MOTTA; VASCONCELOS, 2010), não importando que para isso o trabalhador fosse privado de sua emancipação humana, senso crítico e sua capacidade de pensar e agir por si próprio. As organizações eram comparadas à metáfora da máquina, vistas nos estudos de Morgan (2005) como algo ortodoxo e estruturalista. Este paradigma funcionalista eleva o poder controlador e altamente especializado do gestor através da busca pela máxima eficiência, responsabilizando-o mediante a uma estrutura hierárquica, pela linha de comando, e ao funcionamento da organização, visando obter maior produtividade, qualidade e lucro. Seria por isso que Foucault comparava as organizações como prisões psíquicas? Segundo esse filósofo, os gestores são comparados a guardas das organizações devido ao seu extremo controle e vigia, e a obediência a eles é algo inquestionável (BURREL, 1998), pois lhes são conferidas a dominação pelo poder.
Outro aspecto relevante à contextualização dos gestores nas organizações denuncia a sua atuação na burocratização monocrática trazida por Weber, quando a partir desse processo racionalizado, tanto o gestor quanto os seus subordinados possuem uma predeterminação de objetivos, regras e atribuições fixos, formalizados e estruturados. Neste ambiente organizacional não existem lacunas, interpretações ou perguntas que não possam ser racionalmente respondidas (BRAVERMAN, 1977). Tudo é controlado e esquematizado rigorosamente na burocracia, uma vez que o próprio Weber aproxima a racionalidade técnica com a racionalidade da dominação, presentes no capitalismo (GIDDENS, 1973). O problema desse controle exacerbado e funcionalista é a perda da criatividade no exercício do trabalho, que caracteriza a diversidade no comportamento humano, seus erros, opiniões, pressupostos, ideologias, crenças e valores.
Essa intensificação de trabalho racional acompanhado pelo excessivo controle dos gestores faz com que o trabalho perca cada vez mais o seu significado (BRAVERMAN, 1977), e que os valores das organizações passam a ser aceitos como os seus próprios valores (GUERREIRO RAMOS, 1989), em uma confusa e perigosa sobreposição da individualidade pessoal e social, para a industrialização organizacional à (re)produção do caráter humano. Confusa no sentido de que a particularidade inerente à personalidade de uma pessoa dominada passa a não ser admitida como uma identidade autêntica, na qual torna-se a incluir os valores das organizações também como o seu modo de pensar, agir e viver, profissionalmente e pessoalmente; e perigosa, no sentido de que essa crise de personalidade possa ser irreversível.   
Se por um lado a racionalidade técnica e instrumental exerceram papel fundamental na ordem do capitalismo em crescente evolução (e por que não dizer até hoje?), que segundo Weber não seria possível a existência da nossa sociedade (como sugere, dividida estruturalmente através da separação de funções e cargos por meio de disciplina, regras e especialização), em transformação de autoridade tradicional feudal para o espaço industrial urbano burguês sob o controle da autoridade racional-legal; por outro lado, começa-se a especular quanto à necessidade de uma nova abordagem no perfil do gestor, baseado no excesso de calculabilidade no exercício do trabalho, no que tange a expansão do sistema capitalista de produção (GIDDENS, 1973). Assim, novas discussões sobre as capacidades dos indivíduos entenderem sua situação substantiva dentro das organizações, torna-se relevante para compreendê-las como uma metáfora do organismo, funcionando como um sistema vivo em busca de interação, relacionamento e sobrevivência no ambiente, prevista por Morgan (2005).

São fortes e claras as ligações entre a metáfora do organismo e boa parte da teoria das organizações contemporânea. A principal ênfase da abordagem dos sistemas abertos, por exemplo, é o estreito relacionamento interativo entre a organização e o ambiente, e o fato de que a vida ou sobrevivência da organização depende de um relacionamento apropriado. Também se enfatiza a idéia de que a organização tem necessidades ou funções imperativas que devem ser satisfeitas para que ela alcance esse tipo de relacionamento com o ambiente (MORGAN, 2005, p. 65).

A partir de então, uma nova postura começa a ser exigida dos gestores ao lidarem com os desafios trazidos da evolução da racionalidade instrumental para a substantiva, na qual deverá lidar com a diversidade do pensamento humano e seus diversos objetivos, convergentes e dissonantes.  
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a globalização começou a ganhar força a medida que as nações vitoriosas sentiam a necessidade de criar um mecanismo que aproximasse as nações uma das outras, dando início aos avanços tecnológicos e ao tecnicismo do trabalho nas organizações com o intuito de aumentar a produção, expandir seus negócios e obterem lucros extraordinários, sendo representados rigorosamente pela dominação da figura do gestor, também obediente às regras e estruturas impostas nas indústrias, influenciadas pelo mercado inevitavelmente ávido por desenvolvimento (SOROS, 2003).
Não nega-se aqui que a racionalidade presente na burocracia weberiana tenha sido de extrema importância, pois ela foi e ainda é relevante para controlar o mecanismo hobbesiano de conflitos e buscas individuais desonestas, tendo em vista os interesses oportunistas presentes na natureza selvagem dos indivíduos, segundo Hobbes. A globalização facilita esses comportamentos, sendo que quanto mais livres forem as transações econômicas e sociais, maior o nível de conflitos sociais e de desconfiança alheia, e maior é a busca pela individualização (GRANOVETTER, 2007; BAIARDI, 2011; VASCONCELOS; OLIVEIRA, 2012; BRULON, 2013). Neste caso torna-se complexo ao gestor lidar com esses conflitos presentes internamente nas organizações. Entretanto, concorda-se que uma das saídas é atuar nas redes de relações, que poderão exercer confiança e garantia de ordem no mercado econômico, afetado pela competitividade individualista e oportunista, não as descartando totalmente, tendo em vista que não há garantia de que o oportunismo, a desconfiança, a má fé e os conflitos não existirão, mesmo na perspectiva de imersão econômica com viés às redes de relações sociais.
O próprio Weber não descarta o subjetivismo presente no comportamento dos indivíduos, pois a partir dessa racionalidade interpretativista é possível que se perceba a realidade das organizações nas quais os indivíduos estão inseridos, e possam ter uma visão do ambiente econômico, indicando e direcionando suas ações, seja individual ou em grupo, rumo à produção. Marx conversa com Weber ao afirmar que quanto maior é o número de trabalhadores reunidos em prol de um ofício, maior a necessidade de uma forma de gerência para coordená-los e controlá-los (BRAVERMAN, 1977). Segundo Elinor Ostrom, Marx também pondera quanto ao envolvimento das relações sociais intraorganizacionais, contribuindo para uma participação entre gestão e seus subordinados por meio da governança, que favorece a cooperação (BAIARDI, 2011). Porém, o dissenso está na observação de duas vertentes sobre trabalho, mais especificamente quanto à divisão social do trabalho atribuída ao vocabulário marxista (quando permite ao homem executar e explorar várias habilidades na execução de tarefas), e a divisão parcelada do trabalho (quando favorece à alienação humana em relação à mecanização e divisão sistemática das tarefas e subtarefas), presentes no capitalismo. Eis aqui um (entre outros) desafio ao gestor, de organizar e aproximar as duas ideias, marxistas e weberianas, no contexto organizacional, a fim de articular e direcionar os objetivos coletivos.
Em uma sociedade centrada no mercado, o termo racionalidade está diretamente relacionado ao modus operandi funcionalista e pragmático previsto na instrumentalidade da burocracia weberiana. Contudo, essa relação é uma deturpação, proveniente de uma sociedade moderna acostumada a desconfigurar os significados das coisas a fim de garantir o seu equilíbrio (GUERREIRO RAMOS, 1989).
Neste caso, sugere-se que a razão seja o ato de interpretar e decidir o que é melhor para si próprio, independentemente de ser instrumental ou substantiva, a razão é a capacidade do indivíduo de construir a realidade, pois essa responsabilidade de construtor lhe é percebida como correta desde que ele se baseie nos seus pressupostos, e que podem ser mutáveis. Esse talvez seja o ponto crucial em que o gestor possa atuar, sabendo lidar com as divergências, diversidades e conflitos existentes em cada indivíduo. O gestor perde, então o seu caráter atomizado e instrumental e passa a agir como um articulador de interesses e objetivos coletivos (FLIGSTEIN, 2007). Sendo assim, há aqui uma concordância na forma de atuação do gestor nas organizações, nas mudanças estratégicas, no desenvolvimento humano, nas relações interpessoais, na integração e ajustamento dos objetivos dos indivíduos e às políticas rotineiras, nas lideranças e na satisfação profissional. Portanto, é preciso defender o sujeito emancipado, tal qual transcendendo a sua forma natural, de forma que a práxis possa substituir a performance, de tal forma que a emancipação do homem o faz pensar por si próprio e buscar alternativas que lhe auxiliem na obtenção de outras realidades (PAES DE PAULA, 2009).
Ressalta-se também, que o gestor possui um papel importante na perpetuação da cultura organizacional, metaforicamente, compreendida como parte de um organismo, funcionando para garantir a sua sobrevivência no ambiente no qual ela está inserida, como já citado anteriormente (MORGAN, 2005).
Portanto, quanto mais tempo se perpetuem os gestores, mais forte se torna a cultura em uma organização. No que se refere às mudanças da cultura nas organizações, tem-se como principal agente responsável por esse processo, o gestor, pois nos momentos cruciais de (re)adaptação ao ambiente ou resolução de problemas que comprometam a sua sobrevivência, o gestor precisa atuar estrategicamente desenvolvendo novas formas de responder às adversidades, e isso reflete, inclusive, em um novo posicionamento ou um novo modelo de cultura organizacional. Sendo assim, todo o conjunto de acertos e de experiências assertivas equivalem à construção de certezas que consequentemente (re)formularão os aspectos culturais das empresas, tendo em vista que a percepção do que é certo influenciará na rotina dessas organizações (MOTTA; VASCONCELOS, 2010; CARRIERI, 2002; ALCADIPANI; CRUBELLATE, 2003; CHU; WOOD JR, 2008).
Essa relação entre cultura e gestão pode também desencadear outro tipo de ação, à qual faz-se a seguinte crítica: além de assegurar as posições dos gestores em seus cargos, a responsabilidade sobre a cultura organizacional que lhes é concedida pode gerar uma forma de imposição de poder quanto ao direcionamento e diretrizes aos outros membros que ocupam cargos e funções inferiores, sem que possam contestar, sendo obrigados a tomar tais regras como o modelo de trabalho a ser seguido baseado na ideologia das construções de certezas da gestão. Em suma, observa-se que a cultura exerce uma relação de poder, onde os gestores direcionam os valores e os comportamentos que os indivíduos deverão seguir, como cotidiano em seu ambiente organizacional, além de estabelecerem métodos de excelência a serem atingidos de forma que não é a organização que se molda ao ambiente, mas sim o ambiente que se (re)adapta à cultura imposta pelos dirigentes das organizações.
Outro desafio enfrentado pelo gestor, diz respeito ao processo de comunicação, tal qual é percebida na racionalidade instrumental, por possuir distorções, por exemplo em relação aos seus seguidores – quando se submetem incontestavelmente ao gestor por receio de se opor a ele, ou por se sentir ameaçado por ele – e ao gestor – quando receia que uma oposição é um sinal de insubordinação. Nestes casos, o processo de comunicação exerce um caráter inteiramente pragmático, quando a finalidade encontra-se implícita (permitir o desenvolvimento do pensamento crítico e discussões acerca do conteúdo das orientações transmitidas) e portanto, o gestor comunica-se a fim de apenas transmitir informações, como um roteiro de regras e normas impostas, geralmente eximindo-se da responsabilidade da formulação das orientações, isto é, o gestor apenas “passa o recado”, o que pode consequentemente resultar em distorções de entendimento e opiniões não declaradas. Sugere-se que o gestor possa permitir o desenvolvimento de relações interpessoais, considerando a intersubjetividade entre os sujeitos (AZEVEDO; ALBERNAZ, 2015; GUERREIRO RAMOS, 1989; SOUZA; CARRIERI, 2011; VIZEU, 2005).  
O gestor organizacional pode ser identificado na figura de líder sob alguns tipos de estilos, com os quais podem ser apontados a seguir:
O gestor autocrático: geralmente referem-se a ele como “chefe” tendo em vista o seu distanciamento com os seus seguidores. Adota um perfil centralizador e funcionalista, não permitindo questionamentos ou opiniões sob as suas decisões, e não incentiva que isso aconteça. Em sua gestão há uma predominância da reprodutibilidade em vez da criatividade. O processo de reprodutibilidade faz com que o indivíduo permaneça refém do instrumentalismo, uma vez que este não lhe permite autenticidade (SOUZA; CARRIERI, 2011).
O gestor liberal: também conhecido como líder laissez-faire, estimula a autonomia entre seus seguidores e lhes concede liberdade na execução do trabalho, acreditando que sua ausência não influenciará nos resultados. Engana-se, pois a falta de direcionamento e feedback podem prejudicar o desempenho do seu grupo, além de perder a autoridade que lhe confere o cargo. Isso faz reforçar os argumentos de Weber quanto à necessidade de coordenação e controle dos gestores nas organizações através da divisão de atribuições bem definidas (POSSI, 2006).
O gestor relacional: sua principal característica é incentivar a cooperação dos seus seguidores e de grupos muito diferentes, criando significados aos objetivos coletivos aos diversos tipos de atores. O gestor relacional possui o que Fligstein (2007) chama de habilidade social, contrária ao individualismo metodológico e as teorias neo-institucionalistas, isto é, “a habilidade social pode ser definida como a capacidade de induzir a cooperação nos outros. Atores sociais hábeis se relacionam empaticamente com as situações das outras pessoas e, ao fazê-lo, são capazes de fornecer a essas pessoas razões para cooperar” (Ibidem, 2007, p. 67).
Essa habilidade é a capacidade de motivar os outros a cooperar e a participar de ações coletivas. Em síntese, através da cooperação dos grupos presentes no campo organizacional, o gestor relacional atua como um articulador, reunindo os objetivos coletivos e coordenando-os para que todos (organizações e indivíduos) possam obter resultados a partir dos seus envolvimentos no processo de execução do trabalho.

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observando esse breve contexto, é possível inferir que ainda hoje prevalecem traços muito marcantes do perfil gestor burocrático, disciplinar e coercitivo, fazendo seguir as normas e regras impostas nos termos contratuais das organizações. Contudo, ainda percebe-se que os resultados (não importando os meios) são mais importantes do que articular objetivos, e que as atribuições devem ser cumpridas, mas acima de tudo, que os resultados sejam alcançados, pois empresas que não lucram não se tornam competitivas e consequentemente estarão fora do círculo organizacional aos quais pertencem. Cabe salientar que os parênteses acima não refletem a realidade generalizada nas organizações, pois faz parecer que todas as empresas são negligentes quando se trata de atingir resultados. No entanto, cabe deixar aqui uma inquietude para reflexão: por que as organizações são tão morosas ao lidarem com determinados meios e posturas fora do padrão, quando estes estão trazendo resultados satisfatórios? É uma questão de ineficiência ou comodidade?
Essa provocação é importante para se entender e criticar como o gestor, é na maioria das vezes responsabilizado pela “falha” em não observar desvios comportamentais e de conduta em seu grupo. Contudo, em sua rotina diária muitas vezes sua atenção está voltada em “vestir a camisa da empresa” ou ter “sangue nos olhos” (WILLMOTT, 1993), quando se trata de elevar resultados, lucros e números (entende-se por produtividade) cada vez mais humanamente impossíveis. De um lado, o gestor é visto como um explorador dos seus subordinados, como se ele estivesse imune aos efeitos causados pelas relações de poder nas organizações (top-down); de outro, ele é retaliado quando não cumpre com a lógica instrumental que lhe exige um caráter atomizado (disfarçado de caráter relacional) em obter resultados cada vez mais desafiadores. Mas afinal, quem é o gestor nas organizações? Como ele se vê nesse contexto? Apontam-se os dedos para defini-lo, mas não para interpretá-lo sobre a sua própria realidade. Não se espera aqui romantizar o termo gestor, mas sim trazer críticas sobre a forma positivista de conceituá-lo e o seu papel nas organizações, principalmente através da dinâmica da globalização, mesmo quando as teorias tentam adotar o modelo interpretativista ou substantivo para isso, e ao fazê-lo acabam por perpetuar a racionalidade instrumental entre esses conceitos.
Talvez um, entre tantos, dos desafios enfrentados pelo gestor nas organizações seja romper com a tradicional burocracia da gaiola de ferro (DIMAGGIO; POWELL, 2005), e seus desencantamentos percebidos no pessimismo de Weber.

  1. REFERÊNCIAS

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*Especialista em MBA em Gestão Estratégica de Pessoas pela Universidade FUMEC. Mestrando em Administração pela Universidade Federal de Viçosa – UFV. Membro Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Gestão e Desenvolvimento de Territórios Criativos (GDTeC), Brasil. E-mail: eliasmediotte@gmail.com.

Recibido: 20/05/2019 Aceptado: 29/05/2019 Publicado: Mayo de 2019

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