Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


QUALIDADE DE VIDA E O DESENVOLVIMENTO: UMA QUESTÃO PARA A FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Autores e infomación del artículo

Marinara Ferreira Calisto *

Zina Angélica Cáceres Benavides **

Aniram Lins Cavalcante***

Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil

E-mail: marinaracalisto@yahoo.com.br


RESUMO: Esta pesquisa trata das questões relacionadas à Qualidade de Vida (QV), com o objetivo de analisar os aspectos conceituais do tema, relacionado com a questão do desenvolvimento e das políticas públicas. Ao reporta-se ao contexto histórico percebe-se que até a década de 80 o único parâmetro para analisar a QV e desenvolvimento da sociedade era o PIB, porém este era limitado para avaliar o grau de desenvolvimento social e os aspectos ambientais. O debate atual remete à construção de novos indicadores como IDH, índice da felicidade e mesmo o de QV. Este inclui aspectos sociais, econômicos e ambientas, e exige uma abordagem multidimensional e até mais complexa do que a mensuração do IDH. A construção do índice QV coloca em questionamento qual seria o modelo de desenvolvimento que promoveria a qualidade de vida, por outro lado, sua discussão subsidiará nas formulações de políticas públicas, para melhorar os níveis de vida.

Palavras-Chave: Qualidade de Vida. IDH. Desenvolvimento. Abordagem Multidimensional e Políticas Públicas


ABSTRACT: This research deals with issues related to quality of life (QoL), with the objective of analyzing the theme concepts, related to the issue of development and public policies. When referring to the historical context until the 80s, the only parameter to analyze a QoL and the development of society was GDP, but this was limited to assess the degree of social development and the minimum. The current debate refers to the construction of new indicators such as HDI, happiness index and even QoL. This type of combination of resources, both economic and environmental, requires a multidimensional and even more complex approach than measuring the HDI. The construction of the QoL index asks in question what the development model that promotes a quality of life, on the other hand, its subsidiary discussion in the formulation of public policies, to improve living standards.

Keywords: Quality of Life. HDI. Development. Multidimensional Approach and Public Policy

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Marinara Ferreira Calisto, Zina Angélica Cáceres Benavides y Aniram Lins Cavalcante (2019): “Qualidade de vida e o desenvolvimento: uma questão para a formulação de políticas públicas”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (noviembre 2019). En línea:
https://www.eumed.net/rev/cccss/2019/11/qualidade-vida-desenvolvimento.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1911qualidade-vida-desenvolvimento


  1. INTRODUÇÃO

           Até a década de 80 o critério fundamental para mensurar o desenvolvimento de uma sociedade era através da variável PIB, porém este ficou limitado, pois não permitia observar qual era o grau de desenvolvimento social, isto é, abordar as questões de equidade, justiça social e melhorias nas condições de vida da população, o que possibilitaria constatar um extraordinário aumento da pobreza e desigualdade das sociedades (FEU, 2005).
Devido ao contexto de grandes desigualdades econômicas e sociais nas agendas políticas a nível internacional das décadas de 60 e 70 abriu-se um novo espaço de debate sobre a categoria e mensuração da qualidade de vida, principalmente devido ao avanço do movimento ambientalista motivado pela escassez relativa aos recursos naturais, devido as consequências da industrialização. Dessa forma, começa a se discutir sobre os conceitos de desenvolvimento e progresso. Nesse contexto, nas últimas décadas, as metas sobre o desenvolvimento da sociedade evoluíram, surgindo um frutífero debate sobre novos indicadores para representar o patamar de desenvolvimento atingido, em termos de: bem-estar, bem-estar subjetivo e qualidade de vida. Tais indicadores são utilizados para estudar e mensurar os problemas sociais, econômicos e ambientais, o que amplia a noção de desenvolvimento, a qual serve de subsídio para a tomada de decisões sobre as políticas.
Assim, o presente artigo visa estudar a evolução dos conceitos do bem-estar e da qualidade de vida, relacionado com o debate sobre a mensuração do desenvolvimento econômico, no intuito de contribuir para as questões sobre a formulação de políticas públicas, que visem intervir na melhoria das condições de vida de uma sociedade. Em relação aso aspectos metodológicos foi realizado uma discursão teórica sobre as principais teorias que norteiam o tema.

  1. A EVOLUÇÃO DO CONTEÚDO DA NOÇÃO DE DESENVOLVIMENTO

As desigualdades de acesso à riqueza e as condições precárias de vida são características inerentes da evolução da sociedade capitalista.  No entanto, através da fase industrial do capital, o crescimento acelerado e o capital global intensificaram essa desigualdade, pois estes elementos mudaram a forma de organização da sociedade e seus respectivos padrões de vida. Assim, enquanto a geração de riqueza aumentava, acentuava-se a pobreza e as também desigualdades, comprometendo assim a qualidade de vida das pessoas.
Torna-se importante observar que o único parâmetro até a década de 80 para avaliar bem estar e desenvolvimento de uma sociedade era o PIB, ou seja, o crescimento econômico, porém este se mostrou limitado, pois não conseguia observar as questões sociais. Dessa forma, começa a se observar que crescimento econômico não era garantia de desenvolvimento e nem melhoria dos níveis de vida, tal como aponta Furtado (1983) ao distinguir os conceitos de crescimento econômico e desenvolvimento. Este autor aborda que o conceito de desenvolvimento compreende a ideia de crescimento, e a supera, pois aborda fatores como a diversidade das formas sociais e deve satisfazer às múltiplas necessidades de uma coletividade, enquanto, o crescimento deve ser reservado para exprimir apenas a expansão da produção real no conjunto econômico. Nesse sentindo, é possível inferir que o crescimento econômico não necessariamente seja capaz de garantir o desenvolvimento, ou seja, pode existir crescimento econômico sem que haja uma melhora na qualidade de vida da população.
Uma nova visão sobre desenvolvimento das sociedades foi proposta por Sen (2000) e marcou uma mudança de paradigma na mensuração do bem estar e da qualidade de vida. Essa visão abordava que mercadorias e renda representam a base material do bem-estar das sociedades, mas dependem das circunstâncias pessoais e sociais. Deste modo, Sen argumenta que a ideia de desenvolvimento se refere ao alargamento das capacidades humanas, que é um tipo de liberdade, isto é, a liberdade substantiva de realizar combinações alternativas de funcionamentos (ou menos formalmente expresso, a liberdade para ter estilos de vida diversos, ou seja, não existe um padrão dominante e/ou homogêneo de capacidade ou liberdade).
Souza et al (2014) observa uma relação entre o conceito de desenvolvimento baseado na visão de Sen, com o de Celso Furtado (1983), o qual afirmava que o desenvolvimento está diretamente relacionado com a questão das realizações das potencialidades humanas, ou seja, o desenvolvimento ocorre quando o indivíduo expande sua capacidade criativa nas técnicas produtivas e na formulação de valores existenciais, essa expansão conduzirá um autoconhecimento, o qual trará consequências tanto no aspecto material como no subjetivo. O que se observa entre esses dois conceitos, seja no aspecto da expansão das potencialidades desenvolvidas por Furtado ou nas Capacidades por Sen, é que a base do conceito de desenvolvimento é a dimensão humana e social.
Além disso, Crocker (1993) aponta que Sen em conjunto com Nussbaum elaboraram uma estrutura normativa para compreender o desenvolvimento, de um ponto de vista mais moral do que com foco na utilidade, bens primários ou necessidades humanas. A primeira contribuição deles foi sobre o conceito de desenvolvimento, que critica as teorias fundamentadas nos aspectos valorativos do crescimento do PIB per capita, pois segundo eles essas são somente meios, e para a compreensão de outros assuntos diversos. Esses assuntos diversos referem-se ao "bem-estar", à "qualidade de vida" e ao "padrão de vida". Por isso, os autores definem que o desenvolvimento tem como finalidade melhorar os tipos de vidas dos indivíduos, além disso, segundo visão dos mesmos, duas categorias de análise surgiram para identificar a questão do desenvolvimento, dessa forma, pode-se avaliar o desenvolvimento da sociedade e consequentemente, a qualidade de vida por meio dessas categorias, sendo em termos de capacitação que é habilidade de alcançar certas funcionalidades, sejam estas básicas (saúde, educação, segurança, etc.) ou em termos de auto-respeito e integração social (participar da vida em comunidade). Nesse sentido, cabe analisar as diretrizes políticas e sociais quando existem privações dessas capacidades (SEN, 2000).
Atualmente a principal referência para analisar o desenvolvimento e qualidade de vida é o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que surgiu devido a limitação do PIB em avaliar as questões sociais, esse índice agrega em sua estrutura não somente a questão econômica (renda) como os aspectos referentes a longevidade e educação, porém, esse apesar de ser um avanço em relação ao PIB ainda é limitado para analisar a QV, pois esta ao integrar a evolução da noção de desenvolvimento e suas respectivas variáveis conduz a uma abordagem multidimensional complexa e também subjetiva, tal qual aponta Moreira (2004) ao afirmar que o conceito de qualidade de vida apresenta-se relacionando tanto aos aspectos quantitativos quanto a percepções subjetivas.
Esta maneira de definir a QV não sobrepõe os importantes aspectos quantitativos (renda, moradia, nível de instrução), mas amplia a noção considerando os fatores subjetivos. Esta abrangência inclui a percepção do que cada um considera como melhor ou pior. Tal subjetividade está atrelada a aspectos concretos como a condição social de cada cidadão e o nível de desenvolvimento de cada sociedade. A partir desse enfoque no conceito sobre desenvolvimento torna-se nítido como a qualidade de vida é parte integrante desse conceito, assim, o próximo tópico tem como foco analisar a evolução do conceito da QV.

  1. QUALIDADE DE VIDA- RECONSTRUINDO UM CONCEITO

Segundo Guimarães (2005), desde os períodos mais antigos da história a QV tem chamado atenção, como é possível ver em passagens bíblicas e períodos da Grécia antiga, nos diversos relatos históricos de Platão e Plínio, por exemplo. No entanto, o cuidado acerca da qualidade de vida e meio ambiente emergiu com maior intensidade em meados do século XIX, devido as consequências iniciais da Revolução Industrial. Pois, esse período de um cenário de pobreza, desigualdade social e econômica, degradação do meio ambiente, entre outros agravantes. Dessa forma, diante de tal cenário, começaram a surgir políticas e ações de forma internacional, que visasse melhorar a QV da população, amenizando as problemáticas agravadas pela Revolução Industrial (GUIMARÃES, 2005),
No entanto, a o termo qualidade de vida é recente nas ciências sociais, pois esse deriva de outros dois conceitos: bem-estar e bem-estar social, a QV é uma expressão mais atual adotada a partir dos anos 60. Dessa forma, torna-se importante analisar essa reconstrução conceitual, porém para essa reconstrução é necessário analisar inicialmente o que é um bem segundo algumas correntes de pensamento, já que este vai nortear a formulação do conceito de bem-estar e posteriormente, qualidade de vida (NOGUEIRA, 2002).
Nesse sentindo, os estudos da Ciência Política de Aristóteles propõe o bem como inseparável do ser, e ainda de caráter relativo em relação à sociedade. Segundo o filósofo, o bem não é algo único e universal, pois se assim fosse não poderia ser utilizado em todas as categorias, mas somente em uma. Outro aspecto é o relacional, isto é, o bem existe em relação ao ser da sociedade, ou seja, as finalidades das ações seria o bem, e, se existe mais de uma, serão os bens realizáveis através dela. Assim, o bem, no discernimento aristotélico, vincula-se à virtude e ao caráter do homem que o leva a fazer o bem, sendo a maior das virtudes a justiça (ARISTÓTELES, 1999).
Existem quatro correntes de pensamento sobre a noção de bem, segundo Nogueira (2002), e apresentam relação com o bem-estar: a utilitarista, focalizada em bens e serviços; a das necessidades básicas das capacidades e efetividades humanas, conforme a tabela 1.

A visão utilitarista foi derivada de uma escola filosófica nascida no século XVIII, e desenvolvida por dois economistas ingleses Jeremy Bentham e John Stuart Mill, que abordavam que o bem é o que é útil. Essa perspectiva influenciou o Estado do Bem-Estar, que compreende de 1945 a 1975, momento histórico no qual foram desenvolvidas políticas sociais as quais se regiam pelos direitos da cidadania e pela democratização de bens e serviços em caráter coletivo (PEREIRA, 2010). Nesse período, as políticas sociais desenvolvidas eram baseadas em termos de “felicidade”, “bem-estar” e “qualidade de vida”. Crocker (1993) aponta que nessa época associava o bem com a concepção de bens e mercadorias, a qual se encontra relacionada ao período do pós-guerra, momento no qual o desenvolvimento e o bem-estar eram avaliados pelas categorias do PIB e o crescimento econômico (bens e serviços). Isso implicava na hipótese de que a acumulação de bens e serviços poderia em consequência aumentar o bem estar da sociedade.
A perspectiva focalizada em bens, logo foi criticada e discutida pelo filósofo norte americano John Rawls (1920-2002), um dos principais teóricos da democracia liberal, que 1971 mostrou outra vertente no campo ético, ao publicar sua Teoria da Justiça, que apontava que existia uma diversidade de ideias sobre o que é bem nas atuais sociedades democrática, e que bem-estar individual partia da premissa do conceito de “bens primários sociais”, os quais são um conjunto de aspectos como: direitos e liberdades, prerrogativas e oportunidades, renda e riqueza, autorrespeito, o tempo de lazer e ausência de dor física. Por conseguinte, esse conjunto de bens se tornaria desejáveis para qualquer cidadão.
Outras contribuições são desenvolvidas pela filósofa Martha Nussbaum e a economista Amartya Sen (1993) que reconhecem que o desenvolvimento não ocorre sem a prosperidade material e que o indivíduo necessita de bens para ter uma boa vida, porém, abstraindo-se da questão materialista do consumo, os bens e mercadorias só podem ser valorizados se realmente contribuírem para o bem-estar dos indivíduos, pois esses podem ser benéficos em termos de bem-estar para uns, mas para outros nem tanto. Os autores também alegam a necessidade de análises sobre as diferenças culturais e no plano psicológico, ou seja, verificar como esses aspectos podem influenciar nas atitudes e comportamentos.
Todavia na visão desses autores em relação ao último aspecto, analisaram o bem-estar e a QV  em consonância com o crescimento e o desenvolvimento econômico. Tal abordagem enfocou o bem-estar humano a partir das noções: 1) da capacidade e 2) da efetividade (NUSSBAUM; SEN, 1993). A capacidade de uma pessoa consiste nas combinações alternativas de funcionamentos cuja realização é factível para ela. Após explanação do que é um bem, pode-se agora compreender a evolução dos conceitos: bem-estar, bem-estar social e Qualidade de vida.
Dessa forma, observa-se que as obras dos economistas clássicos anteriores à Arthur Cecil Pigou identificavam a ciência econômica como a ciência da Acumulação de Riqueza, mas esse economista identificou a Economia, em sua obra Economics of Wellfare, com a maximização da renda, integrando ao conceito do tamanho da renda nacional as questões de sua distribuição e estabilidade. Numa perspectiva crítica argumentou que o sistema de liberdade (ajuste automático pelas forças de mercado) não pressupunha a maximização da riqueza ou do bem-estar da sociedade e que uma má distribuição da renda afetaria grandes porções da população. O bem-estar para este economista é uma noção complexa, que além de se preocupar com as determinantes que afetam a estimativa do tamanho da riqueza, há outros componentes não econômicos ou em decorrência da atividade econômica, tais como o estado de consciência sobre o bem-estar. Todavia o autor assinala os obstáculos para alcançar o bem-estar social estar vinculado à desigual distribuição, o que cria barreiras de acesso (PIGOU, 1962).
No entanto, assim como Pigou outros economistas abordaram o tema, entretanto, abordando o conceito simplesmente a termos econômicos. Porém, com o passar do tempo, esse conceito foi desenvolvido em outra proporção, Forton (1974), já tece algumas críticas sobre esse aspecto, pois ele afirma que o bem-estar não pode ser limitado a uma grandeza mensurável, pois abrange outras grandezas além de renda, que podem ser históricas, culturais, sociais, etc.            Nesse sentido, a partir dessa nova concepção sobre bem estar, em 1978 na Conferência do International Council of Social Welfare, apresentou-se os seguintes elementos que integra o tema como: bem-estar fisiológico e material, através da satisfação das necessidade básicas (alimentação, moradia, vestuário, etc.); segurança em todos os seus aspectos; saber; as possibilidades de comunicação humana (amizade, amor, inserção na vida em comunidade); a liberdade de circulação, de expressão e liberdade-autonomia nas diversas atividades; trato com respeito e dignidade, com igualdade e equidade;
Nessa perspectiva, observa-se que esse conceito de bem-estar vai além de aspectos restritamente quantitativos, como renda, mas também às questões subjetivas das realizações individuais de cada ser humano. Nogueira (2002) aponta que o termo bem-estar social aparece no final da década de 1940 e início dos anos 1950, pois nessa época a preocupação dos acadêmicos e políticos passava a ser a questão da vinculação do homem ao ambiente social. Nessa perspectiva, começa-se a perceber que o bem-estar não pode ser alcançado unicamente como condição individual, mas também social e dependente de uma intervenção do Estado. Por isso, o bem-estar social de forma global passa ser um objetivo e uma política a ser conduzida pelo Estado, no contexto desta época.
A conjuntura deriva-se de alguns aspectos históricos, como por exemplo, as consequências da Revolução Industrial que provocou diversas revoltas ao longo do século XIX, aumentando assim, a pressão social e a demanda por melhores condições de vida. Entretanto, as mudanças em termos sociais ainda eram mínimas. Sendo assim, foi apenas com a Grande Depressão que o economista inglêJohn Maynard Keynes fez proposições que contrariavam o liberalismo, o principal modelo econômico da época. Keynes criticou o modelo e propôs a crescente presença do Estado na economia, com o intuito de buscar o pleno emprego e elevar o bem-estar social, criando assim, a teoria keynesiana. Essa teoria foi responsável pela disseminação, em vários países, de políticas que tinham como objetivo elevar o nível de bem-estar da população. As ideias de Keynes, acompanhado pelos períodos do New Deal e do período pós II Guerra Mundial (1939-1945), foi um marco essencial na adoção do Estado de bem-estar social (Welfare State). Mesmo sendo baseado na propriedade privada, o Estado apresentava um papel essencial na condução de políticas públicas e sociais.
Dessa forma, o Estado do bem-estar social surge como um propósito de implementar programas e ações os quais tinham como objetivo promover de forma ampla os interesses sociais dos indivíduos e uma relação “equilibrada”, entre o avanço das forças de mercado e uma relativa estabilidade social, para que a sociedade possa usufruir de benefícios sociais, tentando garantir o mínimo de base material para a população, no intuito de ter condições para enfrentar os efeitos da natureza desigual e excludente do capitalismo (GOMES, 2006).
O bem-estar social e a sua promoção passam a ser o enfoque das agendas públicas dos Estados Nacionais e Organismos Multilaterais, visto que, em 1945 foi criada a Organização das Nações Unidas (ONU), inicialmente composta por 51 países, como objetivo de melhorar os níveis de bem-estar ou qualidade de vida, além disso, contribuir para elevação do nível de desenvolvimento das sociedades. Em 1946 por iniciativa da ONU elaborou-se o conceito de bem-estar social construído pela Organização Mundial da Saúde (OMS), qual aponta que desfrutar de um nível de vida elevado é um direito básico, sem nenhum tipo de distinção, tais como: econômica, social, racial, etc. Desse modo, tanto as organizações nacionais como as internacionais, passaram a considerar o bem-estar social além da perspectiva econômica, acentuando, sobretudo, o enfoque no bem-estar individual e comunitário, na autonomia e nos componentes de autorrealização (NOGUEIRA, 2002)
A partir desse prisma, começou a formular uma equipe de pesquisa, a qual pudesse estudar o tema, no intuito de descobrir métodos mais indicados para avaliar e comparar os níveis e padrões de vida, a fim de substituir o PNB, por averiguar que esse não era insuficiente para avaliação das questões sociais (OLIVEIRA, 2002). Dessa forma, percebe-se que a ideia de bem-estar social adquire um sentido vinculante entre o bem-estar individual e as instituições estatais, acompanhado pelo desenvolvimento da sociedade.
No entanto, como o termo qualidade de vida surge nesse contexto? E o que ela apresenta de diferente em relação às primeiras definições? A questão do termo ‘qualidade de vida’ vem sendo utilizado nas três últimas décadas e sua origem está fundamentada na incorporação da crítica das questões ambientais; esse contexto é devido ao processo pujante da industrialização, que se caracterizou de forma invasiva e predadora. Outro aspecto é que em 1960, a ideia que crescimento econômico era o ideal para promover a progresso e bem-estar à sociedade, começou a decair, pois se observava, de forma conceitual, que desenvolvimento não é igual a crescimento, então se começa a estudar novos conceitos sobre o desenvolvimento econômico e social. Nesse prisma, o conceito de qualidade de vida se desenvolve, ou seja, acompanhado pelo ideal de desenvolvimento (OLIVEIRA, 2002).
Em 1964, percebe-se a primeira vez que é utilizado o termo “qualidade de vida” pelo presidente dos Estados Unidos, Lyndon Johson, ao abordar sobre os índices desenvolvimento, ao afirmar que “os objetivos não podem ser medidos através do balanço dos bancos. Eles só podem ser medidos através da qualidade de vida que proporcionam às pessoas” (GUIMARÃES, 2005, p. 4).
Em meados da década de 70, começaram a surgir muitos trabalhos acerca do tema QV procurando explorar os conceitos que o envolve. Dentro dessa perspectiva, na década de 80, foi possível perceber a emergência de estudos que tinham como foco os aspectos subjetivos, qualitativos e apreciativos, que se fundamentavam na percepção dos indivíduos e dos grupos (GUIMARÃES, 2005). A partir desse contexto, o conceito de Qualidade de Vida começa a incorporar-se à outras perspectivas, tais como: econômica, social, psicológica, cultural e ambiental. É, nesta conjuntura que, em 1990, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), elabora o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), com o objetivo de capturar os aspectos sociais.

 3.1 Conceitos e Definições da Qualidade de Vida (QV)

É frequente encontrar nas pesquisas científicas abordagens e critérios diferentes para definir a QV, e essa diversidade está atrelada a uma gama de aspectos correlacionados ao grau de desenvolvimento da sociedade, já que este evoluiu com o passar do tempo e assim influenciou no conceito e mensuração da QV. Atualmente, existe uma crescente preocupação dos gestores em melhorar as condições de vida da população, dessa forma, é muito comum encontrar políticas, programas governamentais e ações de forma geral que promovam a QV.  Porém, inicialmente o conceito de QV era muito relacionado com a área da saúde, e muitos autores defendem essa vinculação, no entanto, sob outra vertente mais especializada, a questão da saúde é apenas um aspecto que compreende o tema da qualidade de vida.
Pereira et al (2012, p.1) afirma que a “qualidade de vida se apresenta como uma temática de difícil compreensão e necessita de certas delimitações que possibilitem sua operacionalização em análises científicas”. Dessa forma, denota a complexidade do tema, pois este está relacionado não somente a aspectos globais, os quais podem ser mesurados ou quantificados, mas a aspectos ligados a percepção de cada indivíduo, no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais vivem e em relação aos seus objetivos ou expectativas. Torna-se nesse contexto que a complexidade do conceito se encontra, ou seja, na subjetividade que o mesmo apresenta, pois esta é difícil de ser mensurada. Diante desse cenário, muitos os estudos se limitam apenas nas descrições dos indicadores, sem fazer as devidas relações como tema qualidade de vida em seu contexto mais amplo, dessa forma, tal posicionamento se constitui em uma limitação, pois não adianta analisar apenas em termos quantitativos, se não investigar o objetivo disso para as pessoas envolvidas e como realmente se encontra a satisfação dos indivíduos.
A ONU relaciona o conceito de qualidade de vida através da satisfação do cidadão no que tange ao acesso à alimentação, aos serviços de saúde e seguro de vida, ao conhecimento, às boas condições de trabalho, à segurança contra o crime e contra a violência física, ao lazer e à participação nas atividades econômicas, culturais e políticas. Dessa maneira, QV torna-se compreendida como um bem imprescindível para a satisfação das necessidades individuais e coletivas, assim como, Renwick e Brown (1996) definem a qualidade de vida pelos aspectos de poder aproveitar as possibilidades da vida, de escolher, de decidir e ter controle de sua vida. Os autores definem alguns componentes do QV como: ser, pertencer e tornar-se. Nessa perspectiva, o “ser” refere-se a aspectos como: alimentação, habilidades individuais, inteligência, valores, entre outros. Já a questão do “pertencer” refere as relações interpessoais no meio em que os indivíduos convivem, participações em grupos e inclusões em programas recreativos e serviços sociais. O “tornar-se” compreende aspectos de desenvolvimento de habilidades, estudos formais ou não, etc.,
No entanto, uma importante contribuição para o debate atual e conceituação sobre a QV foi lançada em 1993, pelo economista indiano Amartya Sen em conjunto com a filosofa Martha Nussbaun, ambos contribuíram primeiramente com a definição do conceito de desenvolvimento, principalmente nos aspectos valorativos do mesmo, assim, inserem a noção de QV como um objetivo do desenvolvimento. A questão da QV abordada pelos autores relaciona-se com a questão das capacidades humanas, pois estas, quando desenvolvidas, permitem que o indivíduo tenha liberdade para fazer suas escolhas e obter certos funcionamentos (NUSSBAUM; SEN, 1993). Porém, os autores alertam para um aspecto, a questão do delineamento dos funcionamentos, estes devem ser analisados cuidadosamente, pois existem diferenças a depender do nível de desenvolvimento e cultura do espaço analisados.
Nesse sentido, observa-se que a QV não deve ser entendida ou avaliada através de um simples conjunto de bens e serviços, mas sim no que cada um é capaz de ser por meio das oportunidades efetivas que dispõem, levando-se em consideração o aspecto histórico, cultural e desenvolvimento. Abaixo, um quadro explicativo dos principais parâmetros que contribuíram na evolução do conceito sobre qualidade de vida:

3.2 Métodos de mensuração da qualidade de vida

Nas últimas décadas, foi possível observar a quantidade de pesquisas, estudos levantados por órgãos multilaterais/nacionais, meio acadêmico e gestores públicos sobre o desenvolvimento de conceitos, metodologias e indicadores para analisar a qualidade vida da população (AZEVEDO et al, 2004).
Segundo Herculano (2000, p. 5) a avaliação ou mensuração da QV vem sendo feitas por meios de duas vertentes: a primeira diz respeito sobre os recursos disponíveis, a capacidade efetiva de um determinado grupo de satisfazer suas necessidades, como por exemplo: as condições de saúde pela quantidade de leitos hospitalares e número de médicos disponíveis, ou o grau de instrução pelo número de escolas, níveis de escolaridade atingidos etc.; A segunda vertente refere-se mensurar a qualidade de vida através das necessidades por meio da satisfação e dos patamares dos desejos, ou seja, pela distância entre o que se deseja e o que se alcança (HERCULANO, 2000).
Segundo Ulengin et al (2001) tanto como não existe um consenso conceitual sobre a QV, o mesmo ocorre com os parâmetros de mensuração, mesmo que estes em sua maioria abordem aspectos parecidos como educação e renda. Observa-se também a presença de elementos subjetivos, imateriais e pessoais que são de difícil medição, pois a QV está relacionamento com a percepção que cada indivíduo tem sobre sua vida e meio em que convive. Dessa forma, surge o seguinte questionamento, como fazer então a mensuração da qualidade de vida? A Forattini (1991) responde a esse questionamento quando afirma que a QV, em um contexto amplo, somente poderá ser analisada por meio de indicadores concretos, no entanto, pode ocorrer discordância em relação aos resultados obtidos com os abstratos
Nesse contexto, ao reporta-se sobre a temática do desenvolvimento esses seus aspectos históricos, observa-se a ineficiência de mensurá-lo através do PIB, somente, em 1990 que a ONU levando em consideração o caráter restritivo desse parâmetro desenvolve o IDH, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), este é o mais difundido e o mais utilizado. Segundo a PNUD (2012), o IDH foi elaborado por Mahbubul Haq com a colaboração do economista indiano Amartya Sen, ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 1998, este índice apesar de ampliar o conceito de desenvolvimento humano, ainda não abrange todo o conceito acerca desse tema, pois não contempla questões mais subjetivas tais como: "felicidade", nem indica "o melhor lugar no mundo para se viver", democracia, participação, equidade e sustentabilidade.
Desde 2010, novas metodologias foram inseridas para calcular o IDH e atualmente este se baseia em três âmbitos: educação, renda e saúde. Este índice é uma referência mundial, e tem sido utilizado pelo governo federal e por administrações regionais através do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M). Este, por sua vez, é um ajuste e desdobramento do IDH geral, foi publicado pela primeira em 1998 e compreende três dimensões: longevidade, educação e renda (PNUD, 2012). Além disso, o IDH inspirou a criação de outros métodos, tais como: o índice de Condições de Vida (ICV), o qual foi elaborado pela Fundação João Pinheiro, em Belo Horizonte, com intuito de averiguar a situação de municípios mineiros, sendo logo depois adequado em consórcio com o IPEA, o IBGE e o PNUD para a análise dos municípios brasileiros. O ICV é composto por 20 indicadores distribuídos em 5 dimensões, tais como: renda, educação, infância, habitação e longevidade.
No entanto assim como IDH, o ICV refere-se somente a aspectos objetivos, e a qualidade de vida vai muito, além disso, pois esta se encontra relacionada a subjetividade. Assim, em 1999 o Jornal Folha de S. Paulo criou o Índice de Qualidade de Vida (IQV), o qual tinha como foco avaliar nove fatores, tais como: trabalho, segurança, moradia, serviços de saúde, dinheiro, estudo, qualidade do ar, lazer e serviços de transporte. A população entrevistada iria classificar esse conjunto de fatores, como: satisfatório, insatisfatório e péssimo, em um intervalo de 0 a 10 (MINAYO et al, 2000).
Desde então, Segundo Nahas (2002) percebe-se o desenvolvimento de diversas ações semelhantes para avaliação das condições e/ou a qualidade de vida, seja em estados, distritos ou municípios. Tal cenário também se expandiu para outras regiões brasileiras, determinando o surgimento de vários indicadores, os quais sempre foram agregados em índices para o nível ou a qualidade de vida de populações no meio urbano. Tais indicadores destinaram-se a analisar o contexto intra-urbano, não mais a cidade como um todo, mas sim as desigualdades sociais e espaciais existentes no próprio interior do município. Essa concepção é de extrema importância, principalmente no que tange as grandes metrópoles e cidades, que apresentam desigualdades em múltiplos aspectos que o IDH-M não consegue perceber. Esses indicadores são podem ajudar na formulação de políticas públicas que possam sanar ou reduzir essas desigualdades.  No Brasil, os principais exemplos são os índices elaborados ao longo da década de 90 para Curitiba (Paraná), São Paulo (São Paulo) e Belo Horizonte (Minas Gerais) (NAHAS, 2002).
O Índice Sintético de Satisfação da Qualidade de Vida (ISSQV) foi desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC, 1996), em Curitiba. Esse índice geo-referenciou setenta e cinco bairros da cidade e teve como objetivo mostrar e hierarquizar os bairros onde a população apresenta mais acesso a certos “Grupos de Necessidades” sociais tais como: habitação, Saúde, Educação e Transporte (NAHAS, 2002).
Em São Paulo foi elaborado o Índice de Exclusão Social (IEx), que produziu um Mapa da Exclusão/Inclusão Social da cidade definindo noventa e seis distritos administrativos da cidade. O IEx tinha como foco identificar o quanto a população se encontrava excluída do acesso de quatro dimensões: Autonomia, Desenvolvimento Humano, Qualidade de Vida e Equidade. Já na experiência do Estado Mineiro, em Belo Horizonte, foi elaborado um conjunto de indicadores compreendido pelo Índice de Qualidade de Vida Urbana (IQVU) e pelo Índice de Vulnerabilidade Social (IVS), que geo-referenciou oitenta Unidades de Planejamento (UP) da cidade. Esse último foi Desenvolvido pela Secretaria de Planejamento da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte juntamente com uma equipe de pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (NAHAS, 2002).  O IQVU, por sua vez, é composto por setenta e cinco indicadores os quais se referem a fatores como: Abastecimento Alimentar, Assistência Social, Cultura, Educação, Esportes, Habitação, Infraestrutura, Saúde, Segurança Urbana e Serviços Urbanos.
Entretanto, Cardoso e Ribeiro (2015) elaboraram um estudo que buscou construir um Índice Relativo de Qualidade de Vida (IRQV) para os municípios mineiros utilizando dados para o ano de 2010. O objetivo era hierarquizar os índices e analisar o quanto que um município é mais desenvolvido do que outro de acordo com o nível de qualidade de vida. Para esse estudo, foram selecionados 21 variáveis que contemplavam as seguintes dimensões: saúde, renda, educação, habitação e acesso a bens e serviços, segurança pública, vulnerabilidade e cultura, esporte e lazer.
Por outro lado, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) - Observatório das Metrópoles criou o Índice de Bem-estar Urbano (IBEU), lançado em 2013, este índice procura avaliar o bem-estar dos cidadãos das áreas urbanas por meio da análise de indicadores de mobilidade urbana; condições ambientais urbanas; condições habitacionais urbanas; atendimento de serviços coletivos urbanos; infraestrutura urbana, para os 15 grandes aglomerados urbanos, que o INCT identificou como metrópoles brasileiras (OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES, 2014).
A nível internacional, um estudo de caso feito para calcular o Índice de Qualidade de Vida com base em dados quantitativos de 43 países, esse estudo foi realizado por Rahman, Mittelhammer e Wandschneider, em 2005, este tem foco analisar a QV por meio de oito domínios: o primeiro deles refere-se ao relacionamento com amigos, que focaliza a questão sobre a satisfação família; bem-estar emocional, partindo da premissa que o bem-estar individual não depende apenas da sua renda e consumo, mas também pela sua saúde emocional; a questão da saúde;  bem-estar material; sentir-se parte de uma comunidade local e da sociedade; questões de trabalho e atividade produtiva; segurança pessoal, pois é indispensável para o bem-estar individual; qualidade do ambiente. O objetivo desse trabalho é comparar e analisar as condições de vida em diversos países com intuito de facilitar as descobertas dos problemas sociais (RAHMAN; MITTELHAMMER; WANDSCHNEIDER, 2005).
Ainda no cenário internacional, a OECD, em 2009, apresentou um relatório intitulado “como vai a vida? ”, que tinha como propósito avaliar a qualidade de vida partindo do conceito multidimensional. Nesse relatório, foram analisados aspectos objetivos e subjetivos, os quais permitissem o estudo da QV nos aspectos ambientais, sociais e econômicos de uma forma mais ampla. Nesse sentido, os domínios analisados foram: saúde, equilíbrio entre vida e trabalho, educação, conexões sociais, segurança pessoal, engajamento cívico e de governança, meio ambiente e bem-estar subjetivo.
A partir da análise de todas as metodologias apresentadas acima, é possível perceber que os índices de QV apresentam variáveis semelhantes, tanto a nível nacional como internacional. Entretanto, ao observar o nível internacional, percebe-se que esses não consideram aspectos da infraestrutura e condições habitacionais urbanas. Tal aspecto é explicado pelo ideal de desenvolvimento, pois enquanto os índices brasileiros reportam-se a uma sociedade em desenvolvimento, os internacionais observam aspectos da QV em países desenvolvidos.
Segundo Surbhi (2015), os países desenvolvidos são conhecidos como de primeiro mundo, em que apresentam um alto padrão de vida, PIB, IDH proximo a 1, excelentes condições de infraestrutura, saúde, educação, etc., enquanto os paises em desenvolvimento ainda não apresentam tais aspectos, ao contrario, torna-se marcada por um contexto de profundas desiguadaldes socioespaciais.

  1. A QUESTÃO DA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A QUALIDADE DE VIDA DA SOCIEDADE

Teixeira (2002) aborda que as políticas públicas têm como objetivo responder as demandas, principalmente nas camadas mais marginalizadas ou vulneráveis da sociedade. Essas demandas são criadas pela sociedade civil por meio de uma mobilização social, e são interpretadas pelos gestores públicos. As políticas públicas podem surgir com várias finalidades como: ampliar e efetivar direitos de cidadania; promover o desenvolvimento, por meio da criação de emprego e renda; administrar conflitos entre os diversos atores sociais que, mesmo hegemônicos, apresentam diferenças de interesses que necessitam de mediação, entre outros. De uma forma geral, os objetivos perseguidos por uma política pública apresentam uma referência valorativa e mostra a visão e demandas da sociedade por aqueles que estão no poder. 
Nesse sentindo, partindo do pressuposto que a qualidade de vida é um conjunto de condições que promovem o bem-estar, tanto de forma individual quanto coletiva, e esse bem-estar é garantido por lei, pois a Constituição Federal de 1988 garante que a ordem social tem como base o primado do trabalho, e assim, como objetivo o bem-estar e a justiça social, para a sua população. Sendo assim, nessa definição, cabe ao Estado promover bem-estar social, portanto, trata-se de uma questão pública e coletiva.
Tonon (2010) aborda que as políticas públicas devem ser criadas com o objetivo de garantir a qualidade de vida da população, já que a QV envolve o desenvolvimento de cada indivíduo tanto de forma subjetiva, mas também na comunidade a que pertence. No entanto, essa autora faz uma ressalva, diante dos indicadores que são habitualmente utilizados para avaliar a QV de uma sociedade, será que estes realmente são capazes de construir diagnósticos concisos para nortear a questão pública? Já que estes em sua grande maioria, como foi observado no item anterior, analisam apenas a questão quantitativa e deixam de lado o aspecto subjetivo, e dado a natureza da QV, a qual apresenta uma abordagem multidimensional e agrega essas duas questões no seu conceito, tal questionamento apresenta-se de forma significativa nesse debate.
Entretanto, os indicadores e índices demonstram a questão das condições sociais de uma determinada sociedade, e são técnicas de monitoramento para a questão pública, como aponta Herculano (2000, p. 10) ao abordar sobre a importância da criação de indicadores e índices mensuráveis, pois, os esses simplificam a informação para o gerenciamento de questões públicas. Assim, não somente mostra ao público quanto a eficácia ou não das políticas públicas, como também pode servir de ferramenta por meio do qual os cidadãos cobrem do poder público ações interventoras. Dessa forma, na visão dessa autora o estudo de indicadores e índices é primordial para a formulação de políticas públicas, porém esses estudos, principalmente no que tange a QV, devem ser feitos de forma desagregada, isto é, mesurados através de micro- espaços, como por exemplo, um município ou região.
Ainda na perspectiva da autora, essa ênfase no micro é essencial, pois possibilitaria adotar medidas contra a estratificação espacial, que refletirá na guerra contra a desigualdade socioeconômica. Desta forma, a criação de um Índice de Qualidade de Vida local nortearia políticas públicas para a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes, além de servir como parâmetro para o público, pois sua análise pode mostrar a eficácia ou não das políticas públicas adotadas, e assim servir como instrumento para que os cidadãos cobrem do poder público ações interventoras. Entretanto, tais índices rejeita o aspecto subjetivo, pois segundo a autora, apercepção limitaria essa a comparação entre as regiões.
No entanto, tal posicionamento é contrário ao de Tonon (2010), pois esta argumenta que as generalizações por meio de índices para avaliar a QV, ignora o processo histórico, cultural e de desenvolvimento da sociedade, o qual pode camuflar o real nível de QV do ambiente estudado. Dessa forma, o bem-estar de uma sociedade deve tanto analisar os aspectos objetivos (quantitativos) através índices ou indicadores, mas também em conjunto com a questão subjetiva, ou seja, percepção do indivíduo em relação a sua QV.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que a compreensão do que seja qualidade de vida é uma temática sobre a qual muitos já se debruçaram, e não existe um consenso na sua definição, enquanto é reconhecido que essa depende dos aspectos históricos e culturais do desenvolvimento. Dessa forma, necessita ampliar as visões e abordagens para que se chegue ao entendimento mais aprofundado. Este estudo, abordou a questão da qualidade de vida como aspecto fundamental nas discussões sobre o desenvolvimento de uma sociedade. Além disso, as definições do bem; bem-estar e bem-estar social, atentando-se principalmente ao contexto social e histórico de cada pressuposto, foi importante, pois corrobora no entendimento da noção sobre a qualidade de vida e sua evolução. 
A diversidade de conceitos e metodologias existentes sobre a qualidade de vida deve-se ao contexto histórico e as demandas advindas dos problemas sociais, temas muito discutidos e preponderantes nas publicações dos órgãos oficiais internacionais e os de escala nacional. Ao mesmo tempo, o estudo de tal diversidade de noções e definições conduzem a questionamentos sobre a diversidade de vida das sociedades, e, relação a sua cultura, níveis de desenvolvimentos distintos, desigualdades sociais e até questões de ordem regional. Nesse contexto, é necessário considerar tais realidades ao analisar e definir as dimensões e variáveis da qualidade de vida.
Embora, predomine certo viés urbano no tratamento do problema de qualidade de vida, é imprescindível desenvolver mais estudos que atentem a abordar e propor métodos para identificar a qualidade de vida das populações das zonas rurais, sobretudo se os indicadores demográficos apontam níveis importantes dessa população, como acontece nos países do sul.
A questão da mensuração da QV é primordial para avaliar o nível de vida dos indivíduos de uma sociedade, assim, possui um importante papel para a formulação de políticas públicas. Observa-se que a maioria das metodologias existentes, principalmente no Brasil, concentram-se na questão quantitativa, ou seja, negligência a questão da multidimensionalidade da QV, pois esta como já visto apresenta no seu conceito tanto aspectos objetivos como subjetivos.  Isso não significa dizer que, os índices não são importantes para avaliação da QV em uma região, pelo contrário, são essenciais, já que estes podem servir de ferramenta de monitoramento tanto para o gestor público como para o cidadão, para que este cobre ações eficazes no provimento de melhoria das condições de vida.

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*Mestre em Economia Regional e Políticas Públicas pela Universidade Estadual de Santa Cruz- UESC, professora adjunta da Faculdade Madre Thais – FMT, Bahia - marinaracalisto@yahoo.com.br;
**Doutora em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade, professor adjunta da Universidade Estadual de Santa Cruz – zbc99@yahoo.com.br;
*** Pós-Doutorado em Economia Regional e Políticas Públicas, Universidade Estadual de Santa Cruz - anyranlyns@yahoo.com.br.

Publicado: 04/11/2019

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