Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


IMPERIALISMO CLÁSSICO E CONTEMPORÂNEO: DEBATES E APONTAMENTOS TEÓRICOS

Autores e infomación del artículo

Juliano Oliveira Pizarro*

Carmen Silvia de Moraes Rial**

Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil

jopizarro@hotmail.com


Resumo
A presente pesquisa visa fazer uma análise sobre as teorias clássicas e contemporâneas do imperialismo. A metodologia utilizada no trabalho foi revisão bibliográfica de abordagem qualitativa. Teve-se como critérios a utilização de literatura clássica sobre a temática, artigos e estudos contemporâneos. Este trabalho é dividido em três partes: na primeira, há uma breve análise do seu conceito histórico, na qual a contribuição de Lenin torna-se indispensável. Na segunda, a atenção é voltada para as novas teorias do imperialismo, à luz do que ocorreu após sua formulação original (período posterior às duas guerras mundiais). David Harvey, Atilio Borón, Hardt e Negri contribuem aqui para a pertinência ou não do conceito para o mundo atual. Por fim, na terceira parte, o trabalho busca exemplos de eventos empíricos.

Palavras-chave: Imperialismo; Relações Internacionais; Debates; Teorias; Mundo Contemporâneo.

Resumen
La presente investigación pretende hacer un análisis sobre las teorías clásicas y contemporáneas del imperialismo. La metodología utilizada en el trabajo fue revisión bibliográfica de abordaje cualitativa. Se tuvo como criterios la utilización de literatura clásica sobre la temática, artículos y estudios contemporáneos. Este trabajo se divide en tres partes: en la primera, hay un breve análisis de su concepto histórico, en el que la contribución de Lenin se vuelve indispensable. En la segunda, la atención se dirige a las nuevas teorías del imperialismo, a la luz de lo que ocurrió después de su formulación original (período posterior a las dos guerras mundiales). David Harvey, Atilio Borón, Hardt y Negri contribuyen aquí a la pertinencia o no del concepto para el mundo actual. Por último, en la tercera parte, el trabajo busca ejemplos de acontecimientos empíricos.

Palabras-clave: Imperialismo; Relaciones Internacionales; Debates; Teorías; Mundo Contemporáneo.

Abastract
The present research aims to make an analysis on the classic and contemporary theories of imperialism. The methodology used in the study was a bibliographical review of a qualitative approach. The criteria used were the use of classical literature on the theme, articles and contemporary studies. This work is divided into three parts: in the first, there is a brief analysis of its historical concept, in which Lenin's contribution becomes indispensable. In the second, attention is focused on the new theories of imperialism, in the light of what occurred after its original formulation (after the two world wars). David Harvey, Atilio Boron, Hardt and Negri contribute here to the relevance or not of the concept for the world today. Finally, in the third part, the work looks for examples of empirical events.

Keywords: Imperialism; International relations; Debates; Theories; Contemporary world.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Juliano Oliveira Pizarro y Carmen Silvia de Moraes Rial (2018): “Imperialismo clássico e contemporâneo: debates e apontamentos teóricos”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (julio 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/cccss/2018/07/imperialismo-classico-contemporaneo.html

//hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1807imperialismo-classico-contemporaneo

Introdução

            Imperialismo pode-se entender como a política de expansão e o domínio territorial, cultural ou econômico de uma nação sobre outras. A escolha do tema imperialismo para este trabalho implica em algumas precauções. A primeira precaução a ser tomada é a não confusão entre os termos imperialismo e globalização. Mesmo a dupla Hardt e Negri (2001), em seu Império, explica a questão do imperialismo de forma sofisticada, mas ao falarem de globalização a mencionam de forma dada, nos mesmos termos da grande mídia. Em certa medida, este é um indício que converge com os objetivos deste trabalho.
É muito emblemático um exemplo de Hobsbawm, ao citar Walter Bagehot, quando este definiu nação como algo que “sabemos o que é quando não somos perguntados, mas não podemos rapidamente defini-la ou explicá-la” (Bagehot, 1887, p. 20-21 apud Hobsbawn, 2008, p. 11). A situação do que significa a globalização é idêntica. É uma palavra envolta numa espécie de imanência enganosa que faz a todos acreditar que sabem do que se trata, quando na verdade apenas ouvem falar dela o tempo inteiro no jornalismo televisivo (cujos jornalistas também não saberiam explicá-la). Nesses exemplos, a diferença crucial entre nação e globalização é que a primeira se constituiu há mais de um século em conceito acadêmico, recebendo inúmeras obras a teorizá-la, enquanto a segunda, muito embora também já tenha migrado para os Campi, ainda está entre dois fogos.
Este trabalho é dividido em três partes: na primeira, há uma breve análise do conceito histórico de imperialismo, na qual a contribuição de Lenin torna-se indispensável; na segunda, a atenção é voltada para as novas teorias do imperialismo, à luz do que ocorreu após sua formulação original (período posterior às duas guerras mundiais). David Harvey, Atilio Borón, Hardt & Negri etc. contribuem aqui para a pertinência ou não do conceito para o mundo atual; e na terceira, o trabalho tenta buscar exemplos de eventos empíricos, uma inversão do objetivo da segunda parte. E após a terceira parte, uma breve conclusão.

1. Uma Breve Leitura de Lenin

            Lenin não foi o único intelectual de sua época a teorizar o imperialismo. E, conforme Hardt e Negri (2001) construiu sua teoria em grande parte relendo alguns pontos de outros autores, como Hobson, por exemplo. Primeiramente, creio ser indispensável começar em primeira mão, analisando diretamente a obra do intelectual revolucionário.
Para ele, o “capitalismo transformou-se num sistema universal de subjugação colonial e de estrangulamento financeiro da imensa maioria da população do planeta por um punhado de países avançados” (Lenin, 2010, p. 11). Quanto à subjugação colonial, na fase imperialista já não se trata de conquistar territórios inóspitos ou ainda não colonizados pelas potências capitalistas.
Diversamente disso, no imperialismo – Lenin se refere ao período iniciado a partir da crise de 1873 até a Primeira Guerra Mundial – a partilha se dá de forma monopolista entre poucas potências de terras já encampadas. No que se refere ao estrangulamento financeiro, o principal a destacar é a dependência com que os países periféricos se veem diante dos empréstimos dos países centrais, financiamento que é invariavelmente acompanhado da exigência de se importar produtos manufaturados do país credor.

1.1 Cinco Pontos Cruciais do Imperialismo

No capítulo VII de O Imperialismo: fase superior do capitalismo Lenin destaca cinco pontos:

  1. a concentração da produção e do capital levada a um grau tão elevado de desenvolvimento que criou os monopólios, os quais desempenham um papel decisivo  na vida econômica;
  2. a fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação, baseada nesse capital financeiro da oligarquia financeira;
  3. a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande;
  4. a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si;
  5. o termo da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes (Lenin, 2010, p. 88).

Esse é o resumo que Lenin faz do imperialismo, portanto. Na segunda revolução industrial, a produção se concentrou e adquiriu tamanha escala que a livre concorrência acabou se transformando em um discurso ideológico, induzindo as empresas a se associarem em cartéis (modelo da Alemanha) e trusts (principalmente nos Estados Unidos).Este período na verdade teve início com a crise econômica de 1873, quando muitas empresas quebraram ou se tornaram vulneráveis e, após um breve intervalo, o processo ressurgiu em 1890 atingindo seu auge em 1895. A partir daí a própria concentração produtiva elevou enormemente o capital circulante nos bancos e a dependência das empresas em relação a estes. Surgiu então o predomínio do capital financeiro.
Por sua vez, a preponderância da exportação de capital sobre a de mercadorias deveu-se em grande parte ao próprio crescimento exponencial do setor financeiro. Lenin explica que, sendo o capital feito para gerar lucro, não faria sentido permitir que ele estanque dentro de um mesmo país, pois haveria pressão social, política e econômica para distribuí-lo. O outro grande fator a incidir sobre a exportação de capitais era o fato de nos países coloniais e dependentes a sua taxa de retorno ser muito maior do que nos próprios países avançados.
Quanto aos itens 4 e 5, ambos podem ser considerados analogamente. Pois as empresas dividiram entre si o mercado – em um movimento oposto ao da livre concorrência – da mesma forma que os países dividiram entre si as colônias. Ocorria numa correlação de forças em que, para evitar o conflito, os próprios estados de origem eram chamados a arbitrar a partilha. Empresa A (de um país X) ficaria com o mercado de tantos países, e a Empresa B (de um país Y) com outros tantos. O período de duração da partilha dependeria então da correlação de forças políticas e econômicas (guerras, falências etc.). Foi o próprio fato de não haver mais terras a serem conquistadas que levou a esta forma de economia política (Lenin, 2010).
Historicamente, o imperialismo é o capitalismo monopolista, de uma burguesia rentista e parasitária. Para Lenin, a união das empresas, dos bancos e do capital em geral constitui uma forma de socialização que corresponde à degeneração do capitalismo, onde a própria noção de “privado” já não possui mais serventia jurídica, já que as determinações dos conglomerados financeiros não ocorrem a nível pessoal. É a decomposição do sistema.

2. Algumas Teorizações Alternativas do Imperialismo

2.1. David Harvey

            Segundo Bobbio (apud Estenssoro, 2003, p. 106) “a teoria das relações internacionais marxistas é a teoria do imperialismo ou, mais precisamente, a teoria econômica do imperialismo”. Em que pese a veracidade da afirmação de Norberto Bobbio, está longe de ser verdade que todas as interpretações marxistas chegam à mesma conclusão. Se Lenin via o imperialismo como a última etapa do capitalismo, David Harvey nos lembra – para reforçar sua própria tese – que Hannah Arendt o considerava a primeira etapa da dominação burguesa no mundo (Harvey, 2004).  
Harvey teoriza o imperialismo em termos da produção de espaço no tempo, ou, ajustes espaço-temporais. Esse ocorre quando um determinado território já não consegue absorver nem o trabalho e nem o capital (excedente de ambos). O ajuste temporal ocorre com projetos para o futuro, como educação e pesquisa, por exemplo. O espacial é principalmente a migração do capital e/ou abertura de novos mercados. Caso o ajuste não ocorra, o capital fixo em um lugar sofre desvalorização.
Entre 1884 e 1945 (primeira etapa de Arendt) os Estados-nação desenvolvidos empreenderam duas guerras mundiais para aliviar as pressões político-sociais internas (conflitos de classe), ao mesmo tempo em que extorquiam riquezas de lugares periféricos, já que era impossível continuarem a reprodução ampliada do capital. Esse tipo de reprodução citado se constitui no próprio crescimento interno, quando o capital consegue se reproduzir sem gerar novos espaços e sem praticar a espoliação. Após 1945 (segunda etapa), para evitar novos e futuros conflitos, os Estados Unidos pressionaram os países europeus para que concedessem independência às colônias, gerando mais espaço, além de cederam parte de seu próprio espaço interno para o capital excedente da Europa e do Japão. Harvey classifica isto como a formação de um super imperialismo americano, construído mais por consenso político-militar do que por imperativos econômicos. Para o então Terceiro Mundo sobraram conflitos em torno de questões como independência e desenvolvimento, como guerras civis, golpes militares apoiados pelas potências etc. Isso acabou gerando ressentimento nestes países por permanecerem em situação de subordinação espaço-temporal.
As alternativas – revolução, desenvolvimentismo, socialismo etc. – não resistiram aos anos 1970, quando mesmo no Primeiro Mundo havia surgido uma era de incertezas. A terceira etapa do imperialismo burguês (neoliberal) é explicada na terceira parte, na análise do mundo atual. É baseada em Harvey com as contribuições da teoria econômica de François Chesnais.

2.2. Michael Hardt e Antonio Negri

            Hardt e Negri (2001) trabalham o imperialismo dentro da noção de suspensão da história e do que eles entendem por globalização. Essa suspensão advém de todas as relações de poder mundiais às quais eles denominam Império, juntamente com o surgimento de uma ordem global. Ocorre por metáfora, ou seja, os autores utilizam os exemplos do Império Romano e Sacro Império Romano (medieval) para afirmar que todo império possui ideologicamente a pretensão de estar além da história. Impérios são atemporais. E a época atual de fluxos de riqueza e mercado livre procura justamente desqualificar qualquer ideia de mudança histórica.
No entanto, a dupla de autores sustenta que não há nem uma conspiração da globalização e nem um centro de poder transcendente na política mundial. Eles enfatizam a crise do Estado-nação e do sistema da Paz de Westfália sem, no entanto, substituí-lo por outro. Enfatizam na verdade uma transição para uma nova forma jurídica esboçada principalmente pelas Nações Unidas.
Na economia, diferentemente da teoria marxista, eles não se detêm na produção e nem na financeirização, mas sim na informação e prestação de serviços. Ou, a economia em rede. Dois aspectos opostos são explicados por Hardt e Negri. A internet seria um sistema democrático de informações, na medida em que as pessoas se conectam sem a intermediação de um ponto central fixo. E o rádio e a televisão seriam sistemas oligopolistas de difusão, pois há uma central de difusão das informações e imagens.
Enfim, o livro Império, para ser comentado em seus pormenores, exigiria um artigo bem mais extenso. De um modo geral, é uma obra de fôlego, longa, mas de linguagem acessível. E apesar das críticas severas, por exemplo, de Atilio Borón, possui muitos acertos factuais. Porém, concordo com Borón na análise teórica. Mesmo que não tivesse lido a crítica do sociólogo argentino, algumas obviedades saltariam em evidência. Apenas para citar um exemplo, Hardt e Negri quase desprezam a maior e talvez realmente única instituição global existente: o setor financeiro.
            Uma das afirmações refutadas por Borón é relativa ao papel das Nações Unidas. O total desrespeito com o direito internacional que levou os norte-americanos a invadirem o Iraque, por exemplo, e não apenas ao direito, mas à própria resolução da ONU. Também destacada é a observação a respeito da classe dominante americana, sua oligarquia financeira e seu papel hegemônico dentro do aparato estatal, com a prática abusiva do lobby e também muita corrupção. Quanto ao suposto enfraquecimento e decadência do Estado-nação, Borón responde que a soberania nacional é relativa à qual grupo de países pode ou não ser soberano.
Os países dominantes e aliados dos Estados Unidos têm sua soberania respeitada e garantida. O principal a destacar, no entanto, é o demasiado otimismo da dupla de autores, e entre as críticas de Borón está justamente a observação de que o mainstream jornalístico recebeu muito bem o lançamento de Império.

3. O Imperialismo Hoje

Recomenda-se, no mundo acadêmico, que a visão de mundo não invada o campo da pesquisa, ou que no mínimo o pesquisador tenha a capacidade de realizar certo afastamento pessoal do objeto de pesquisa. Mas, além desses elementos, é possível constatar determinados fatos característicos do imperialismo, de acordo com a teoria clássica sobre o assunto.

Para os grandes grupos do setor de manufaturas ou serviços, a estreita imbricação entre as dimensões produtiva e financeira da mundialização do capital representa hoje um elemento inerente ao seu funcionamento cotidiano. [...] No tocante ao grande grupo industrial, já deve ser banida a ideia de que haveria uma separação estanque entre operações direta ou indiretamente ligadas à valorização do capital na produção, de um lado, e de outro lado as operações dirigidas à obtenção de lucros de tipo puramente financeiro (Chesnais, 1996, p. 275).

            O que deve ficar entendido a respeito dessa explicação feita por François Chesnais é que esta imbricação entre a produção e a finança começou com a crise dos anos 1970. O acúmulo de excedentes começou gradualmente a ser transferido dos Estados Unidos para a Europa (principalmente Alemanha Ocidental) e o Japão. Com sua indústria voltada para a Guerra do Vietnã, os americanos começaram a perder competitividade na indústria de bens de consumo e bens de capital. Aliam-se a isso os ganhos favoráveis aos trabalhadores, numa época de sindicatos fortes. Com o acúmulo de capital fora dos Estados Unidos, o mercado mundial passou a ser inundado por dólares fora do alcance do país. Era necessário retomar o controle da economia mundial. A partir do governo Nixon, os Estados Unidos incentivaram novos acordos internacionais que privilegiavam o setor financeiro. Era uma forma de retomar a lucratividade sem os custos de produção e tecnologia. A recusa em intervir nos países árabes em 1973-74 significava não falta de capacidade de intervenção, mas uma conivência necessária, pois o aumento no preço do petróleo prejudicava a Europa e o Japão (altamente dependentes de importações de commodities), mais que a América (Harvey, 2004).
A crise que seguiu aqueles eventos ocasionou inúmeras quebras. O número de marcas de vários produtos, mais visivelmente automóveis, diminuiu enormemente. Empresas se fundiram, umas compraram outras etc. Isso é o princípio do que David Harvey chama de “acumulação por espoliação”. Soma-se a isso o aumento dos juros das dívidas externas dos países periféricos, pressionando-os, pela via política, a venda de empresas (ativos) a preços defasados, ajustes fiscais, desvalorização da moeda (tornando proibitiva a importação de maquinário, por exemplo).
Os dólares acumulados pelos países árabes com o aumento do petróleo favoreceram também o oligopólio ocidental de menos de dez empresas petrolíferas. Além disso, o setor financeiro liberou o capital necessário para as aquisições e fusões sem intermediações, criando títulos financeiros para o setor produtivo, investido diretamente nas bolsas. Era o embrião da financeirização da economia mundial que ocorreria a partir de meados da década de 1980, sob a égide política do conservadorismo de Thatcher e Reagan.
Enfim, a explicação dos parágrafos acima apenas ilustra e fornece o campo apropriado para o imperialismo americano. Pois, longe de um consenso entre grandes países desenvolvidos, o qual realmente predominou entre 1945 e 1973, após esse período o que ficou evidente é um novo recrudescimento da competição internacional. Quem pode esquecer, por exemplo, a competição entre Alemanha Ocidental e Estados Unidos pelo fornecimento de tecnologia nuclear para o Brasil, durante o governo Geisel? Ou a disputa entre americanos e franceses pelo fornecimento de tecnologia de vigilância aérea na Amazônia, durante o governo Collor? Ou ainda a competição feroz entre as empresas automobilísticas japonesas, americanas e europeias pelo mercado mundial a partir de 1985?
Nos anos 1980, a guerra travada pela Itália e Estados Unidos contra a Líbia só foi apaziguada no final dos anos 90, quando o país do norte africano se tornou grande fornecedor de petróleo para a Itália e outros países europeus. Há, neste momento, uma luta velada (que já teve uma prévia com a derrubada de Khaddafi e a expulsão de empresas e trabalhadores chineses da Líbia) entre o capital chinês e o capital europeu/americano pela posse do petróleo africano e outras matérias-primas para o setor eletrônico e de alta tecnologia, como o cobalto (Congo), por exemplo.
Pode-se argumentar em contrário com o fato de que, diferentemente do imperialismo da Belle Époque, a hegemonia atual não envolve ocupações territoriais generalizadas, ou seja, a maioria ou quase todos os países são independentes. Neste caso, podemos refutar essa hipótese na medida em que, por exemplo, a Grã-Bretanha nunca ocupou maciçamente a Índia, pois apenas uns poucos milhares de soldados britânicos eram fixados em alguns postos militares. O que ocorria de fato era um domínio baseado em alianças do Estado britânico com governantes regionais e locais indianos. De forma semelhante, o domínio americano na América Latina nos anos 1960, 1970 e 1980 ocorria basicamente por alianças entre elites locais e o Estado norte-americano. Obviamente que os dois casos não significam a mesma coisa, mas não é uma diferença tal que impeça a comparação. Pois a independência de um país muitas vezes não vai além do formalismo jurídico.

Conclusão

            Há certa controvérsia, não a respeito do imperialismo em si, mas de um suposto consenso no mundo atual. Como bem observa Harvey (2004), após a Segunda Guerra Mundial até meados da década de 1970 ocorreu de fato um consenso entre as potências capitalistas. E após este período, os Estados Unidos viram a necessidade de reformular a sua relação com os demais países, configurando um domínio financeiro, já que em termos produtivos não possuía vantagens tecnológicas em relação à Europa Ocidental e ao Japão.
Pelo contrário, alguns autores (Panitch; Gindin apud Garcia), ainda enxergam um consenso liderado pelos Estados Unidos, e o sintoma disto seria a ausência de guerras entre os países desenvolvidos e, principalmente, a capacidade de liderança americana. Mas pode existir um equívoco, pois o imperialismo simplesmente não avisa quando surgem conflitos entre grandes potências. Em 1913 poderia ter sido dito a mesma coisa, que havia um consenso liderado pela Grã-Bretanha.

Referências

Borón, A. (2004). Imperio e Imperialismo: uma lectura crítica de Michael Hardt y Antonio Negri. Buenos Aires: CLACSO.
Chesnais, F. (1996). A Mundialização do Capital. São Paulo: Xamã.
Estenssoro, H. (2003). A Grã-Bretanha fez o mundo moderno? Primeira Leitura, São Paulo, n.21, nov.
Garcia, A. S. (2010). Hegemonia e Imperialismo: Caracterizações da Ordem Mundial Capitalista pós a Segunda Guerra Mundial. Contexto. Rio de Janeiro, v.32, n.1, jan/jun2010, p. 155-177. Disponible en: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-85292010000100005&script=sci_abstract&tlng=pt  Consultado em: 19/01/2018.
Hardt, M.; Negri, A. (2001). Império. Rio de Janeiro: Editora Record.
Harvey, D. (2004). O “Novo” Imperialismo: acumulação por espoliação. Socialist Register, v. 5, p. 95-125. Disponible en:
http://biblioteca.clacso.edu.ar/ar/libros/social/2004pt/05_harvey.pdf Consultado en: 15/01/2018.
Hobsbawn, E. (2007). Globalização, Democracia e Terrorismo. São Paulo: Companhia das Letras.
Hobsbawn, E. (2008).  Nações e Nacionalismo desde 1780. São Paulo: Paz e Terra.
Lenin, V.I. (2010). O Imperialismo: fase superior do capitalismo. São Paulo: Centauro Editora, 2010.

*Doutorando do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina.
** Orientadora. Professora Doutora do Departamento de Antropologia e do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina.

Recibido: 16/03/2018 Aceptado: 19/07/2018 Publicado: Julio de 2018

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