Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


LEGADO DO PROGRAMA DE COLETA PARTICIPATIVA DE RESÍDUOS SÓLIDOS DO TRT-MT

Autores e infomación del artículo

Zequias Pinheiro Nobre Junior *

Alexandre Magno De Melo Faria **

UFMT, Brasil

junioronobre@gmail.com.


Resumo
O presente artigo analisa um programa de coleta de resíduos sólidos do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT-MT) que funcionou entre 2006 e 2016. O objetivo foi identificar o impacto desse programa na segregação e coleta de resíduos durante sua operação e na formação de uma consciência ambiental nos participantes após a sua desativação. Foi realizado um levantamento histórico do programa, bem como calculado o volume de material recolhido e a renda gerada com a comercialização dos resíduos. Após aplicação de questionário junto ao público interno, chegou-se à conclusão de que o programa foi inovador no serviço público e obteve sucesso não apenas ao contribuir com a segregação e coleta de resíduos, mas como fator preponderante para a mudança de comportamento dos participantes, pois 79% dos entrevistados disseram estar mais conscientes quanto ao seu papel na preservação do meio ambiente.
Palavras-chave: Sustentabilidade; coleta seletiva; consciência ambiental, Cuiabá.

Legacy of the TRT-MT Collection of Solid Waste Program

Abstract

This paper analyzes a solid waste collection program of the Regional Labor Court of Mato Grosso (TRT-MT) that operated between 2006 and 2016. The objective was to identify the impact of this program on the segregation and collection of waste during its operation and in the formation of an environmental awareness in the participants after their deactivation. A historical survey of the program was carried out, as well as the volume of material collected and the income generated from the sale of the waste. After the application of a questionnaire to the internal public, it was concluded that the program was innovative in the public service and succeeded not only in contributing to segregation and waste collection but as a preponderant factor for the behavioral change of the participants, as 79% of respondents said they were more aware of their role in preserving the environment.

Key-words: Sustainability; selective collect; environmental awareness, Cuiabá.

Legado del Programa de Recolección Participativa de Residuos Sólidos del TRT-MT

Resumen

El presente artículo analiza un programa de recolección de residuos sólidos del Tribunal Regional del Trabajo de Mato Grosso (TRT-MT) que funcionó entre 2006 y 2016. El objetivo fue identificar el impacto de ese programa en la segregación y recolección de residuos durante su operación y en la formación de una conciencia ambiental en los participantes después de su desactivación. Se realizó un abordaje histórico del programa, así como calculado el volumen de material recogido y la renta generada con la comercialización de los residuos. Después de la aplicación del cuestionario al público interno, se llegó a la conclusión de que el programa fue innovador en el servicio público y obtuvo éxito no sólo al contribuir con la segregación y recolección de residuos, sino como factor preponderante para el cambio de comportamiento de los participantes, porque el 79% de los encuestados dijo estar más conscientes en cuanto a su papel en la preservación del medio ambiente.

Palabras clave: Sostenibilidad; recogida selectiva; la conciencia ambiental, Cuiabá.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Zequias Pinheiro Nobre Junior y Alexandre Magno De Melo Faria (2018): “Legado do programa de coleta participativa de resíduos sólidos do TRT-MT”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (febrero 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/cccss/2018/02/coleta-residuos-solidos.html

//hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1802coleta-residuos-solidos

Introdução

A necessidade de uma nova relação entre o homem e o planeta Terra tem ganhado destaque nas últimas décadas, em especial devido aos relatórios e alertas produzidos pela comunidade científica quando ao impacto da ação antropológica sobre a natureza, entre as quais se destaca o aumento da temperatura global pela emissão de CO2 na atmosfera. Economicamente, a sustentabilidade passou a ser objeto de estudos a partir de 1970, quando conceitos como “ecodesenvolvimento”, “desenvolvimento sustentável” e “economia ecológica” passaram a ser difundidos, todos, de alguma forma, tentando incluir nas variáveis econômicas de crescimento e desenvolvimento a degradação ambiental ocasionada pelo processo produtivo (Sachs, 1986).
Destas, a que mais se destacou, justamente por mais avançar em comparação à economia convencional, foi a economia ecológica, que introduziu a quebra de paradigma na relação economia com o meio ambiente ao propor a limitação da atividade econômica à capacidade do planeta em suprir com recursos naturais e renovação. Nesta linha, três autores despontam no processo de construção de seu eixo central. Apesar de algumas divergências teóricas, todos eles destacam a importância “da escala e do tamanho físico da economia diante do ecossistema” (Klein, 2014).
Kenneth Boulding foi o primeiro a tocar neste ponto ao usar a metáfora do planeta Terra como uma espaçonave, marcada por ser algo fechado e com uma capacidade finita para atender a seus ocupantes. Era um contraponto à “Economia do cowboy”, a qual considerava que a expansão do sistema econômico não seria suficiente para provocar algum impacto ecossistêmico. Na “economia da espaçonave”, em síntese, a economia é um subsistema (a tripulação) de algo maior, a Terra. E como tal, ela não pode se dar ao luxo de ser maior e consumir recursos a ponto da espaçonave não mais conseguir supri-la (Boulding, 1966).
Georgescu-Roegen (1977) deu sua contribuição ao introduzir o conceito da termodinâmica na economia. Segundo ele, o processo produtivo de transformação da matéria traz degradação entrópica irreversível. Trata-se de uma característica própria da física, presente em todo o universo. Tal aspecto seria alavancado pelo fato da Terra ser um sistema fechado, não havendo troca de matéria com o meio externo.
O resultado é que o processo produtivo traz como consequência, além dos produtos, resíduos de alta entropia, muito dos quais não podem ser reciclados. Como o planeta é finito e materialmente fechado, o sistema econômico não pode existir indefinidamente, mesmo que não aumente de tamanho (Cechin e Veiga, 2010). Daí a defesa de Georgescu-Roegen para a necessidade imperiosa de um crescimento econômico negativo, o que tem se materializado atualmente pelo movimento pelo decrescimento (Georgescu-Roegen, 1971; Latouche, 2009).
Daly (1973; 1991), o principal teórico da economia ecológica, usou essas duas visões para apresentar uma terceira. Concorda com o fato da existência de recursos limitados no planeta, mas se diferencia do pensamento de Georgescu por acreditar que o crescimento zero, e não o decrescimento, poderia ser suficiente para fazer frente à problemática. Na base da argumentação do autor estaria a capacidade da Terra em promover o fornecimento dos recursos e de absorção dos resíduos (capacidade de carga do planeta), porém essa escala seria ainda desconhecida e objeto de estudos e avaliações.
Em complemento a Daly (op. cit.), Faria (2013: 24) argumenta que a preocupação seria identificar “qual a escala sustentável da economia que garanta os fluxos de insumos e energia necessários à satisfação das sociedades humanas e que garantam ao mesmo tempo a manutenção da estabilidade do planeta”. A questão não seria limitar a satisfação humana, mas encontrar um tamanho da economia que não afete o funcionamento dos ecossistemas.
O problema ambiental não ganhou espaço somente nas discussões no campo científico. Ele também tem sido tratado de forma institucional pelas nações. O primeiro encontro formal a possibilitar esse debate foi a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, realizada em 1972 em Estocolmo, na Suécia, seguindo por um segundo encontro em 1982 em Nairóbi (Quênia). Ao final da década de 1980, o relatório Brundtland (Nosso Futuro Comum, 1987), da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, definiu o desenvolvimento sustentável como aquele “que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades”. Em 1992, a cidade do Rio de Janeiro seria o palco do terceiro encontro organizado pala ONU, que teve como principal resultado a Agenda 21, um documento de trabalho com a identificação dos problemas prioritários, dos recursos e meios para enfrentá-los, bem como das metas a serem perseguidas.
Um capítulo específico da Agenda 21 tratou de forma exclusiva do manejo dos resíduos sólidos, tema abordado neste trabalho. O texto elencou metas e ações que deveriam ser buscadas pelas nações nos anos seguintes, dada a importância da área para garantia de um desenvolvimento pautado na sustentabilidade. Além de estabelecer a necessidade de redução na produção de resíduos, o documento também detalhou uma série de outras ações, como a de que os governos, instituições e organizações não-governamentais, inclusive grupos de consumidores, mulheres e jovens, em colaboração com os organismos pertinentes do sistema das Nações Unidas, deveriam lançar programas para demonstrar e tornar operacional a reutilização e reciclagem de um volume maior de resíduos. Entre as medidas que deveriam ser adotadas estavam: 1) a revisão e reforma de políticas públicas para a área; e 2) o desenvolvimento de programas de conscientização e informação do público (Agenda 21, 1995).
O processo de educação da sociedade para a importância da adoção de medidas que mitiguem o impacto do homem na natureza é um dos principais pontos relacionado com a instituição de políticas públicas voltadas à sustentabilidade. Conforme destacado por Backes et al. (2013), em trabalho que analisou o programa de coleta seletiva no município de Primavera do Leste, em Mato Grosso, o processo de conscientização da população local levou a um aumento expressivo na participação do programa, que se mostrava tímido em seu início, principalmente nos bairros mais carentes e com menor nível de escolarização. Conforme pesquisa conduzida pelos autores, após um processo de conscientização e educação ambiental, a adesão cresceu ao ponto de 80% dos entrevistados declararem sempre realizar a separação dos resíduos e outros 9% dizerem que o faziam frequentemente. Mesmo quatro anos após o encerramento do programa, 55% da população ainda continuavam a fazer a separação dos resíduos sólidos.
A metodologia utilizada pela Prefeitura de Primavera do Leste foi baseada em uma moderna sistemática de ação, cada vez mais adotada pelos governos para fazer frente aos problemas ambientais: os Instrumentos de Comunicação Social (ICS, também chamados de educação ambiental). Para Margulis (1996), a informação e a educação podem ser eficazes para mobilizar as partes afetadas e aumentar o conhecimento acerca das condições ambientais e sanitárias.
Juntamente aos ICS, neste processo de maior controle ou mesmo desestímulo à prática de ações que prejudiquem o meio ambiente, estão os Instrumentos de Comando e Controle (ICC, chamados também de reguladores) e os Instrumentos Econômicos (IE, também chamado de estímulos de mercado). O primeiro pode ser definido como conjunto de normas e regras sobre padrões a serem obedecidos. Já o segundo trata da tentativa de internalizar as externalidades do processo produtivo, ou seja, os custos externos decorrentes da atividade econômica, como a emissão de resíduos por uma indústria, ou incentivar práticas de gestão ambiental consideradas eficientes.
É neste contexto teórico que está inserido o presente artigo, que busca identificar de que modo o Programa de Coleta Participativa do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT-MT)1, desenvolvido entre 1994 e 20162, auxiliou na segregação e coleta de resíduos urbanos e formação de uma consciência ambiental nos servidores e magistrados do órgão. Como objetivo geral, essa pesquisa buscou identificar o impacto do referido programa, não apenas durante sua vigência, mas os seus legados no comportamento dos servidores do TRT-MT. Especificamente, buscou-se caracterizar o programa institucional do TRT-MT quanto aos resíduos; depois estimou-se o volume de material coletado e enviado à reciclagem; em seguida, calculou-se o valor econômico recuperado com a comercialização dos resíduos; de forma principal, analisou-se a mudança comportamental da comunidade envolvida; e por fim, identificaram-se as lacunas e oportunidades de ajustamento da política.

 

Metodologia

Na construção do objeto de pesquisa foi utilizado o método dialético como abordagem para alcançar respostas ao objetivo geral. Quanto aos objetivos específicos, cada um requereu um método de procedimento adequado, segundo conceitos trazidos por Lakatos e Marconi (2003).
Para caracterizar o programa institucional do TRT-MT utilizou-se do procedimento histórico, buscando-se normativas e publicações do TRT que tratavam das ações que promoveram a gênese e a formatação do programa institucional de incentivo à segregação e coleta seletiva de resíduos sólidos. Nesse sentido, foram realizadas entrevistas com servidores que atuaram junto à área de Gestão Socioambiental do órgão e fornecido planilhas eletrônicas com os dados da coleta, de recursos gerados, bem como relatórios descrevendo cada um dos programas implementados pelo TRT ao longo dos anos.
Para estimar o volume de material coletado e enviado à reciclagem utilizou-se do procedimento estatístico e histórico, acessando os registros da série temporal de coleta de materiais recicláveis, como plástico, alumínio e papel/papelão, pilhas, óleo, sucata eletrônica, filme de radiografia, entre outros. Foram calculadas as taxas de crescimento geométricas, as médias anuais e a proporção de material coletado a cada período.
Para calcular o valor econômico recuperado com a comercialização dos resíduos utilizou-se do procedimento matemático e histórico, calculando os valores econômicos gerados a partir da recuperação das sucatas de materiais recicláveis, atualizando os valores por deflator (IGP-DI). Neste ponto, é importante destacar que foram identificadas na planilha com os dados de coleta e arrecadação algumas inconsistências. Por exemplo, o peso de vidros de perfumes coletados no ano de 2013 foi calculado de forma errada, segundo parâmetro da própria planilha, e itens como as lâmpadas recolhidas foram quantificadas em peso em um ano e, noutro, em unidades. Na medida do possível, essas inconsistências foram corrigidas ou os valores desconsiderados.
Para analisar a mudança comportamental da comunidade envolvida utilizou-se o procedimento estruturalista. A partir da população total dos servidores do TRT-MT, aplicou-se um questionário estruturado que visou identificar o grau de aderência da comunidade ao programa institucional de segregação e coleta seletiva de resíduos, dentre outros pontos. De uma população de 520 servidores, responderam voluntariamente ao questionário uma amostra de 169 indivíduos, que representou 32,5% do total.
Para identificar as lacunas e oportunidades de ajustamento da política foi utilizado o procedimento funcionalista. A proposta foi levantar a avaliação institucional dos resultados, bem como analisar as mudanças ocorridas e o impacto disso na vida de servidores e magistrados. Nesse aspecto, procurou-se medir o apoio à manutenção do programa e a incorporação de uma mudança comportamental suficiente para promover efeitos de transbordamento para a vida particular e comunitária fora das relações de trabalho, que seriam efeitos dos Instrumentos de Comunicação Social (ICS).

 

O Programa de Coleta Participativa do TRT de Mato Grosso

As ações desenvolvidas pelo TRT-MT relacionada com a coleta de resíduos sólidos e líquidos remontam a 1994 com o início do Projeto Reciclar3. Seu objetivo era o de realizar a coleta seletiva de materiais recicláveis (papel, plástico e alumínio) na sede do órgão e conscientizar magistrados, servidores e terceirizados sobre a importância da preservação ambiental. A instituição do programa foi uma iniciativa que partiu de alguns servidores que compreendiam a importância destas medidas e que restou encampada pela instituição (comunicação verbal)4. Como é de se esperar em toda atividade que começa a se desenvolver, a coleta era realizada de forma simples, sem maiores estruturas e mesmo sem regulamentações. Há uma clara ação independente dos Instrumentos de Comando e Controle.
No ano de 1996 o Tribunal também começou a organizar as “Semana do Meio Ambiente”, com foco na sensibilização e conscientização de todo o corpo de funcionários do órgão sobre os temas ligados à preservação ambiental. Os eventos sempre foram pensados como um momento mais festivo, voltado à realização de exposições, palestras, oficinas, feiras de produtos e artesanatos feitos com materiais reciclados, bem como de distribuição de mudas de árvores, entre outras ações.
A partir de 2006, as ações de sustentabilidade do Tribunal ganham corpo e passam por um período de valorização e crescimento. A data coincide com o início das regulamentações na área ocorridas no âmbito da Administração Pública, por meio do Decreto 5940/2006 da Presidência da República5. O documento instituiu a obrigatoriedade dos órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta realizarem a separação dos resíduos recicláveis descartados por eles, na fonte geradora, destinando-os às associações e cooperativas de catadores de materiais recicláveis. No Poder Judiciário, a Recomendação 11/2007 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)6 recomendava aos tribunais, entre outras coisas, a adoção de políticas públicas visando a formação e recuperação de um ambiente ecologicamente equilibrado, a conscientização de servidores e jurisdicionados sobre a necessidade de efetiva proteção ao meio ambiente e a instituição de comissões ambientais para o planejamento, elaboração e acompanhamento de medidas destinadas à preservação e recuperação do meio ambiente.
Foi nesse cenário que o TRT-MT, por meio da Portaria TRT SGP GP N. 548/20087, instituiu a Comissão de Gestão Ambiental, responsável pelo planejamento, elaboração e o acompanhamento de medidas, com fixação de metas anuais voltadas à preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente. Posteriormente, a Resolução Administrativa 150/20098 alterava a estrutura administrativa do órgão para, entre outras coisas, criar a Seção de Gestão Socioambiental. Essa nova unidade teria entre suas funções planejar, organizar, dirigir e controlar ações relacionadas com demandas socioambientais, bem como desenvolver projetos voltados à educação ambiental e comportamento proativo. Nesta nova fase, percebe-se uma indicação mais clara dos Instrumentos de Comando e Controle e uma indicação da necessidade de aprofundamento dos Instrumentos de Comunicação Social.
As ações de sustentabilidade na Justiça do Trabalho não se restringiram, apenas, à destinação correta de resíduos. O TRT-MT também passou a considerar critérios ambientalmente corretos de construções a partir de 2008. Essa ação foi posteriormente normatizada pela Resolução Administrativa 164/20109, que veio a estabelecer as diretrizes de cunho socioambiental e os referenciais de áreas a serem adotados para a elaboração de projetos de reforma ou construção de imóveis novos. Nesse processo, destaca-se a construção da sede própria da Vara do Trabalho de Alta Floresta, no norte do estado de Mato Grosso, que conta com sistema de reaproveitamento de água da chuva e de águas cinzas, iluminação externa em LED (com acendimento automático), além de paredes mais espessas para garantir maior conforto térmico e menor consumo de energia elétrica10.
Todas essas ações e normativas estavam respaldadas em algo ainda maior: o Plano de Gestão do Tribunal para os anos de 2008 a 2013. O documento, norteador das atividades do órgão naquele período, estabeleceu que a questão socioambiental teria um papel de destaque. Segundo o Plano de Gestão, ampliar e fortalecer projetos voltados à responsabilidade social e ambiental era um dos objetivos estratégicos da Justiça do Trabalho em Mato Grosso11. No documento seguinte, o Plano de Gestão 2014 a 2020, a sustentabilidade ganharia ainda mais relevância ao estar inserida na própria visão de futuro do Tribunal: “Ser reconhecido pela excelência na prestação jurisdicional, promoção da qualidade de vida e comprometimento com a sustentabilidade”12.
No auge de seu funcionamento, o Programa de Coleta Participativa do TRT de Mato Grosso contava com nove projetos de coleta e destinação de resíduos produzidos no próprio órgão e do resíduo doméstico gerado por servidores, magistrados, terceirizados e estagiários do TRT-MT, os quais eram trazidos das residências por eles e depositados em locais espalhados ao longo do Complexo-sede da Justiça do Trabalho em Cuiabá (MT). Alguns dos projetos, como o de coleta do óleo de cozinha e de pilhas e baterias, por exemplo, chegavam a envolver as unidades do interior do estado, distribuídas em 29 municípios. Nestes casos, o transporte do material até o centro de coleta, na sede do TRT-MT, aproveitava as viagens regulares feitas pelos veículos oficiais a até estas localidades13. Para serem viabilizados, os projetos eram desenvolvidos em parcerias com associações de catadores e cooperativas de catadores e artesãos. Os materiais eram repassados a essas entidades sem custos para que elas pudessem, então, vendê-los, gerando renda para os envolvidos. Já outros resíduos, cujo processo de reciclagem se mostrava mais difícil e especializado, eram comercializados com algumas empresas em troca de tickets e cupons, posteriormente repassados a associações e entidades carentes. Esse processo ocorria por meio do Comitê Pró-Infância, uma entidade sem fins lucrativos, existente desde 1993 e formada por servidores e magistrados do próprio TRT-MT, que presta serviços assistencialistas. Os projetos desenvolvidos no âmbito da Justiça do Trabalho de Mato Grosso eram:

  1. Vale Luz - Promovia o recolhimento de plástico duro e alumínio. Uma empresa recicladora fazia a pesagem do material e, de acordo com o valor de mercado, emitia os cupons, posteriormente revertidos para entidades beneficentes assistidas pelo Comitê Pró-Infância. O projeto, existente desde 2010, era resultado do aperfeiçoamento de um programa inicialmente idealizado pelo Governo do Estado de Mato Grosso.
  2. Óleo Ecológico - Lançado em 2011, o projeto consistia no recolhimento de óleo de cozinha usado, trazido por magistrados, servidores e colaboradores e pelo restaurante que funciona no Complexo-sede da Justiça do Trabalho em Cuiabá. O resíduo era entregue a uma empresa parceira, que o transformava em resina alquídica, matéria-prima usada na fabricação de tintas. A empresa emitia cupons denominados de “Vale Óleo Ecológico”, repassados às instituições assistidas pelo Comitê Pró-Infância para aquisição de tinta e materiais para construção em diversas lojas comerciais em Cuiabá.
  3. Papa-Pilhas – Existente desde 2012, o projeto se baseava na coleta de pilhas em geral e baterias de telefone celular, que contém materiais altamente tóxicos e de grande potencial contaminador. Inicialmente, os produtos eram encaminhados a uma empresa para reciclagem. A partir de 2014, todavia, passaram a ser destinados ao Centro de Gerenciamento de Residuais (CGR) de Cuiabá.
  4. Coleta Seletiva Solidária - Implantado em 2012, consistia na coleta seletiva de papel, papelão, vidro, metais em geral e sacolas plásticas. Os materiais eram doados a associações e cooperativas de catadores de recicláveis de Cuiabá. Além de resultar na reciclagem dos resíduos, o projeto beneficiava quem tirava do resíduo seu sustento, a partir da geração de renda, fortalecimento e a inclusão dessas pessoas.
  5. Sucata Eletrônica - Também implantado em 2012, o projeto possibilitava a destinação correta de resíduo eletrônico, como computadores, celulares, impressoras, monitores e lâmpadas, em especial os produzidos no âmbito da Justiça do Trabalho em Mato Grosso, com forte presença de substâncias químicas altamente poluentes, a exemplo do zinco, chumbo, manganês, mercúrio, cádmio e cloreto de amônia. Inicialmente, as sucatas eram repassadas a uma empresa parceria. Já a partir de 2014, passaram a ser destinadas ao Centro de Gerenciamento de Residuais (CGR) de Cuiabá.
  6. Longa Vida - Projeto implantado em 2012 consistia na coleta de embalagens desse tipo (Tetra Pak) para reaproveitamento. A empresa parceira realizava a desagregação da embalagem, separando as partes/componentes e transformando-as em matéria-prima para a fabricação de papel reciclado, tijolos e telhas ecológicas.
  7. Eco-Bolsa - Também de 2012, realizava o reuso de tubos de pasta dental e radiografias. O material coletado era encaminhado para artesãos e utilizados na confecção de bolsas e outros artesanatos, gerando renda e reduzindo os impactos ambientais causados pela destinação incorreta desses resíduos.
  8. Recicla Mais - Os recicláveis não comercializados na região de Cuiabá eram destinados para as brigadas de coleta da empresa TerraCycle do Brasil, que transforma os resíduos em novos produtos (de mochilas a bancos de jardim). O projeto foi lançado em 2013 e consistia na destinação de diferentes categorias, como material de escrita (canetas, lápis de cor), maquiagem, esmaltes, vidros de perfume, escova de dente, embalagens de salgadinho, refresco em pó, papel sulfite e congelados, entre outros.
  9. Reutilize - Lançado em 2013, o projeto era mais voltado à conscientização quando à necessidade de reaproveitamento de materiais/produtos do que propriamente à reciclagem. A ideia era ampliar a visão das pessoas sobre as várias opções de utilização que cada objeto poderia ter, agregando-lhe valor e adiando o descarte final. Era o caso do reaproveitamento de equipamentos de informática, mobiliários, vestuários, livros, etc. Existia nas dependências do Complexo-sede do Tribunal, inclusive, um local onde as pessoas poderiam deixar objetos que não mais lhe interessassem para que pudessem ser reaproveitadas por outras.

Volume de resíduos recolhidos

Conforme os projetos de coleta foram aumentando e contemplando novos itens, os valores e volumes arrecadados também cresceram. Os dados tabulados pelo Tribunal14 mostram que de 2010 a 2015 a quantidade de resíduos recolhido saltou de 643 quilos para 20.110,49 quilos. O maior volume coletado, no entanto, foi em 2013, quando chegou a 23.067,77 quilos. O valor gerado pela venda desse material também aumentou, passando de R$ 476,55 em 2010 para R$ 6.868,46 em 201515. O ápice da arrecadação, entretanto, foi em 2014, quando foram gerados R$ 11.181,01 com a venda dos materiais. A variação desproporcional entre volume recolhido e valor arrecadado é por conta da existência de itens cuja relação preço/peso é muito maior do que se comparado a outros itens. É o caso das radiografias. Esse material, por exemplo, representou em 2014 quase 15% dos recursos conseguidos, tendo apenas participação de 0,08% no volume. No ano seguinte, elas não geraram receita alguma, fazendo o próprio valor arrecadado cair.
A fim de possibilitar a análise estatística, os valores relativos a volume recolhido (em quilos) e renda gerada (em R$) foram convertidos em uma função logarítmica e, após, feito o teste estatístico de regressão linear simples, com o tempo como variável independente (Quadro 1).

Após realizar a regressão em software Excel®, conforme dados apresentados no Quadro 2, foi possível identificar que a taxa geométrica de crescimento (TGC) do volume de resíduos recolhidos foi de 103,8% ao ano (a 3% de nível de significância) entre 2010 e 2015, ao passo que a dos valores arrecadados com a comercialização desses itens foi de 75% ao ano (a 5% de nível de significância) no mesmo período. Esses dados indicam uma crescente adesão ao processo de reciclagem e uma tendência de geração de valor na atividade, com a possibilidade de reduzir a geração de material inservível em Cuiabá e reversão de um processo de destruição de valor residual nas sucatas de resíduos.

Extinção dos projetos

No início de 2016, todavia, o programa de coleta passou por modificações, sendo extinto nos moldes como funcionava até então. Em breve comunicado a servidores e magistrados, a Gestão Socioambiental do Tribunal justificou o encerramento das atividades informando que o programa havia sido pensado para funcionar em duas etapas. A primeira era a de desenvolver a consciência e a mudança de cultura no tocante à reciclagem e a preservação ambiental (atrelada, portanto, aos Instrumentos de Comunicação Social): “Trata-se, portanto, de projeto educativo e que, exatamente por isso, têm duração limitada, isto é, data para início e fim das atividades”16. Como esse objetivo, segundo o comunicado, tinha se mostrado exitoso, tendo o hábito da separação de resíduos com o encaminhamento para reciclagem passando a fazer parte da cultura das famílias que participaram do projeto, era o momento de ressignificá-lo.
A segunda etapa, segundo essa primeira explicação da Administração do TRT-MT, consistiria na propagação dessa cultura a familiares, vizinhos (condomínios) e amigos, ampliando a rede de conscientização. Em síntese, a proposta era que os resíduos recicláveis passassem a ser destinados diretamente pelos interessados aos locais e empresas em Cuiabá e Várzea Grande e não mais para a instituição. Para isso, foi criada até uma cartilha com orientações e endereços para envio dos materiais17. Em síntese, o TRT-MT não mais queria se responsabilizar por essa atividade. Além disso, notícia divulgada alguns dias depois em informativo interno destacava que o TRT-MT passaria a atuar em rede com outras instituições para operar politicamente junto aos executivos municipais de modo a viabilizar a implantação da coleta seletiva18.
Em março de 2017, o Diretor Geral do Tribunal Amadeu Rodrigues reforçou e ampliou os esclarecimentos feitos à época do encerramento da coleta seletiva do resíduo doméstico. Segundo ele, o entendimento do TRT-MT foi o de que perpetuar com a coleta seletiva sem adentrar na segunda fase começaria a gerar uma disfuncionalidade pedagógica e a Administração tinha consciência de que não poderia assumir em definitivo um papel que compete ao cidadão de forma privativa e ao município (informação verbal)19. Essa segunda fase que ele cita seria a articulação do TRT-MT junto a outros órgãos e mesmo município e Estado para a implantação da coleta seletiva em maior escala.
Segundo Rodrigues (2017), a proposta enquanto projeto pedagógico de consciência ambiental era desenvolver em cada um a experiência da coleta seletiva, ainda que naquele primeiro momento por meio dos locais de coleta no Tribunal, sempre com o objetivo de, posteriormente, a pessoa levar isso para sua vida e comunidade. “Se você perpetua a coleta indefinidamente, você acaba não ampliando o projeto, porque você acha que o local de coleta é o Tribunal”.
Na prática, o TRT-MT passaria a atuar politicamente para viabilizar a instalação de postos de coleta que atendessem a toda a comunidade, e não mais apenas aos servidores, magistrados e quem trabalha no órgão. Todavia, a primeira reunião nesse sentido ocorreu tão somente mais de um ano depois, no dia 5 de abril de 2017, quando a chefe da Gestão Socioambiental do órgão, Natália Pansonato, se encontrou com o então Secretário Municipal de Serviços Urbanos de Cuiabá, José Stopa (informação verbal)20.
Ainda de acordo com o diretor geral, a modificação no programa de coleta seletiva esteve envolta na reformulação pela qual a própria unidade que o coordenava passou. Isso porque, segundo ele, foram feitas mudanças internas de modo que o setor se adequasse as normas e mesmo ao que a teoria da sustentabilidade estabelece para a área. Na prática, a Seção de Gestão Socioambiental passou a gerir todos os projetos relacionados com o conceito de sustentabilidade, o qual compreende critérios econômico, social e mesmo ambiental. Assim, ações educativas e de participação em eventos sociais, como de combate ao trabalho infantil e de prevenção a acidentes no trabalho, que antes eram geridos por setores diferentes, passaram a ser responsabilidade da unidade.
Rodrigues (2017) também afirmou que a mudança no programa de coleta participativa já estava na agenda administrativa do órgão e que, juntamente com ele, outros projetos desenvolvidos pelo TRT-MT acabaram sendo revistos e modificados. Todavia, ele reconheceu que a decisão pelo encerramento dos trabalhos foi da gestão 2016/2017 e que, caso futuramente as outras administrações entendessem de modo diverso, o programa poderia ser reativado.
Embora a Administração afirme categoricamente que foram apenas os motivos elencados acima que levaram o TRT-MT a encerrar o programa de coleta e destinação correta do resíduo produzido em casa por servidores e magistrados, fato é que isso ocorreu num cenário externo de dificuldades financeiras. A forte crise econômica e a recessão brasileira iniciada no segundo governo da presidente Dilma Rousseff (2014) atingiram todos os órgãos públicos, que tiveram seus orçamentos reduzidos diante da necessidade da União de equilibrar seus gastos. Com isso, o TRT da 23ª Região (MT) passou a enfrentar problemas.
A Lei de Diretrizes Orçamentária de 2016 reduziu em 29% os recursos de custeio e em 90% os de investimentos no âmbito da Justiça do Trabalho em todo o país. O Tribunal esperava receber R$ 30 milhões para custear seu funcionamento, mas, no começo de 2016, foi informado de que somente teria cerca de R$ 17 milhões. Isso implicou em uma série de cortes de gastos, que atingiram todas as áreas, em especial a de serviços terceirizados. Dos 140 servidores terceirizados que atuavam na Justiça do Trabalho mato-grossense, 40 foram dispensados de suas atividades, alcançando, inclusive, as áreas de limpeza e segurança. Tal medida acabaria por afetar, também, o Programa de Coleta Participativa, já que o processo de triagem e separação dos resíduos era feito por dois servidores da empresa responsável pelo contrato de limpeza do órgão. O custo anual com a mão de obra dos dois funcionários girava em torno de 62 mil reais21.
Além disso, o processo de triagem e separação exigia a ocupação de um relativo espaço interno no órgão, ocupando diversas vagas que deveriam ser destinadas aos estacionamentos de veículos. Isso se mostra relevante porque a questão dos espaços passou a ser um problema para a Administração. Tanto que, em 2014, o TRT-MT instituiu uma Comissão de Análise de Adequação e Uso dos Espaços Físicos, responsável por propor medidas e saídas para racionalizar e aperfeiçoar a utilização da estrutura do Complexo-sede, em Cuiabá. Essa discussão tomou corpo após trocas de mensagens eletrônicas internas encaminhadas por servidores questionando o uso do estacionamento, diante da insuficiência de vagas para todos. Ou seja, apesar de não ser apontado pela Administração como um motivo para o fim do programa de coleta seletiva doméstica, certo é que o TRT-MT precisava maximizar os espaços relacionados com o estacionamento e o programa se mostrava um empecilho por ocupar algumas vagas.
Com a extinção do programa no modelo em que funcionava até então, a instituição passou a focar seus esforços em atender às normas sobre a questão socioambiental vigentes para o Poder Público, editadas a partir de 2006, (Decreto 5940/2006, Resolução n. 103/2012 do CSJT22, Ato Conjunto CSJT.TST n. 24/201423 e a Resolução n. 201/2015 do CNJ24) que, entre outras coisas e no que concerne ao tema deste trabalho, estabeleceram a obrigatoriedade dos órgãos do Poder Judiciário darem destinação adequadas aos resíduos produzidos internamente. Nesse sentido, o TRT-MT retirou todo o aparato de coleta dos resíduos gerados externamente e passou a distribuir em suas unidades cestos extra para separação do resíduo orgânico dos recicláveis produzidos dentro do Tribunal. Também foi iniciada uma campanha para estimular agentes socioambientais voluntários, cuja função, entre outras coisas, seria a de zelar pela adoção de práticas sustentáveis nos seus locais de trabalho.

O legado do programa

Um dos objetivos deste trabalho é medir o impacto do programa de coleta participativa do TRT-MT. Para isso, foi aplicado entre os servidores que trabalham no complexo-sede da Justiça do Trabalho em Cuiabá, formado pelas nove varas do trabalho, pelo Núcleo Administrativo e pelos órgãos judiciais e auxiliares do Tribunal, um questionário com dez perguntas. Em linhas gerais, a pesquisa visou identificar pontos como: o percentual de servidores que participavam do programa; percepção sobre o encerramento do programa de coleta de resíduo doméstico; o percentual de pessoas que continuavam a fazer a coleta em suas residências, mesmo após o encerramento do programa; o grau de interesse interno na reativação do programa; o desejo de contribuir ou não financeiramente para o seu retorno; o impacto da coleta seletiva do TRT-MT na mudança de comportamento dos participantes; e o grau de envolvimento da própria família dos servidores.
Inicialmente, a proposta era enviar o questionário de forma eletrônica nos endereços de correio eletrônico institucionais. Todavia, a medida não foi autorizada pela Administração, que afirmou serem os endereços de uso exclusivo para questões de trabalho. Assim, a fim de viabilizar a pesquisa, foram visitadas então as unidades do complexo-sede em Cuiabá e, servidores e magistrados, convidados a participar. Ao todo, 169 pessoas, de um total de 52025, responderam ao levantamento, representando 32,5% da população. As questões que, por algum motivo não foram respondidas pelos participantes, acabaram desconsideradas na hora da análise e cálculo do percentual.
Ao todo, 64,88% dos participantes afirmaram que participavam do programa de coleta seletiva, trazendo seus resíduos domésticos para o Tribunal. Dos que não participavam, 69,49% disseram não aderir por falta de interesse e 23,73% porque não eram, à época, servidores. Se for considerado apenas o número de participantes que já eram do quadro da Justiça do Trabalho quando o programa foi encerrado, o percentual de adesão ao programa sobe para 70,78%.
Ao questionar todo os servidores sobre como avaliavam o fim do programa, 66,22% disseram que “negativamente”, 9,46% “positivamente”, 10,81% se disseram “indiferentes” e 13,51% que “compreende os motivos”. Percebe-se um montante similar de servidores que aderiram ao programa (70,78%) e que apresentaram uma percepção negativa de sua desativação (66,22%), indicando que a maior parcela da população interna do TRT-MT estava engajada na política de reciclagem e recuperação de materiais. 
Perguntados se, mesmo com o fim do programa, continuavam fazendo a separação dos resíduos em suas casas, 25,33% afirmaram que sim, 48,67% disseram que não e 26% ainda a faziam, mas não de forma regular. Percebe-se uma menor aderência aos pressupostos da reciclagem no TRT-MT se comparados aos resultados de Backes et al. (2013) para o município de Primavera do Leste, onde após quatro anos de encerramento da coleta seletiva, 55% da população ainda mantinha a prática de segregação dos seus resíduos, contra 25,33% dos servidores do TRT-MT no ano seguinte à desativação do programa. Contudo, se os 26% dos servidores que realizam a segregação de forma irregular incorporasse novamente tais práticas, o grupo de aderentes à reciclagem chegaria a 51,33%, um percentual similar ao de Primavera do Leste.
Ao justificarem o motivo de não mais fazerem a coleta, 92,98% apontaram a dificuldade na hora de se fazer a destinação do resíduo e 7,02% porque não tinham mais interesse. Esses dados indicam que o sistema de coleta de resíduos em Cuiabá não está devidamente implantado, seja pela coleta pública ou pelos empreendimentos privados que operam reciclando materiais, estrutura ineficiente já identificada por Domingos et al. (2014; 2015). Caso houvesse maiores facilidades na coleta, o público potencial de aderência poderia alcançar 92,98%.
Ao serem questionados se aceitariam contribuir mensalmente para a reativação do programa, a maioria (55,95%) afirmou que não pagaria qualquer valor. Contudo, 44,05% da amostra revelou que estaria disposta a assumir algum valor para custear a reativação do programa. Os dados podem ser visualizados no Quadro 3.
Um grupo que representa 25% da amostra aceitou pagar até cinco reais mensais; outros 12,5% pagariam de cinco a dez reais; 0,6% de dez a quinze reais; outros 5,36% assumiriam entre quinze e vinte reais e apenas 0,6% aceitavam pagar mais do que vinte reais para ter a coleta novamente reativada. Ao utilizar o limite máximo de pagamento por faixa de preço sugerida (R$5,00, R$10,00, R$15,00, R$20,00 e R$25,00), a disposição a pagar (DAP) da população de servidores do TRT-MT alcançaria um montante mensal de R$ 640,00. Caso o montante total fosse assumido pelos 169 entrevistados, o valor médio seria de R$ 3,79 para se alcançar o mesmo montante de R$ 640,00. Contudo, considerando apenas os 44,05% dispostos a pagar, ter-se-iam R$8,65 por servidor para a reativação do programa de reciclagem. Porém, apenas 19,06% estariam dispostos a assumir um valor acima de R$5,00. A saída poderia ser uma discriminação de preços, considerando as diferentes DAP’s dos servidores, onde cada indivíduo assumisse o valor que lhe achasse conveniente.
Se estes dados pudessem ser extrapolados aos 520 servidores e se for considerado que 44,05% destes estariam dispostos a pagar conforme a discriminação de preços sugerida para a reativação do programa poder-se-ia arrecadar até R$1.980,85 mensais para que houvesse uma estrutura de recebimento dos materiais recicláveis. O valor anual chegaria a R$23.770,20, o dobro do valor arrecadado em 2014. Esses valores não consideram a venda dos materiais, mas tão somente para custear a estrutura de recebimento, estocagem e logística no TRT.

A grande maioria (79,01%) dos participantes afirmou que o programa de coleta participativa contribuiu para que se tornassem cidadãos mais conscientes sobre seu papel na preservação do meio ambiente, confirmando que os Instrumentos de Comunicação Social podem apoiar uma política de sustentabilidade, inclusive para além da ação direta da reciclagem de materiais. As áreas em que mais se tornaram conscientes foram na economia de energia (74,03%) e de água (68,5%), com ampliação do escopo de visão sobre as questões ambientais.
Além disso, os servidores também ampliaram a sua percepção quanto ao uso de combustíveis renováveis (15,75%), plantio de árvores (10,24%) e associação a ONGs ambientais (5,51%). Outros 23,62% apontaram ações como economia de papel e copos descartáveis, separação/destinação correta do resíduos sólido e reuso de materiais.
A última pergunta do questionário foi para medir o impacto do programa na vida familiar dos servidores e magistrados do Tribunal. Para 44,1% da amostra, os programas do TRT contribuíram com a conscientização de sua família e outros 19,88% afirmaram que houve uma reduzida contribuição. Esses dados indicam que 63,98% dos servidores entrevistados foram impactos em algum grau pelos Instrumentos de Comunicação Social e pelos Instrumentos de Comando e Controle. Para 36,02% da amostra, não houve impacto em suas famílias.
Entre todos os dados, a pesquisa mostrou alguns pontos interessantes. A grande adesão ao programa é um deles, considerando que a separação do resíduo exigia do participante não somente o fracionamento dos materiais, como também o transporte até o TRT-MT e a disposição nos locais corretos. Além disso, revela também como a falta de opções para destinação de resíduos na cidade fez com que quase 50% dos participantes parassem totalmente de fazer a coleta após o encerramento das atividades no TRT-MT, ao passo que tão somente 25,33% afirmaram ainda a realizar de forma regular.
Apesar do número de pessoas que disseram não aceitar pagar nenhum valor para a reativação do programa possa parecer alto (55,95%), o interessante é notar que 44,05% da amostra se revela disposta a pagar, o que poderia gerar R$ 640,00 apenas pelo serviço de coleta dos materiais segregados. E mesmo a pesquisa não indicando o motivo pelo qual a maioria rejeita custear os serviços, a fala de alguns dos participantes feitas no momento em que o questionário era aplicado pode apontar a razão: todos indicaram que sua carga tributária era suficiente e que seria obrigação do município viabilizar essa coleta, não considerando sua responsabilidade. Todavia, a verdade é que, do outro lado, prefeituras acabam esbarrando na questão orçamentária para implantar o serviço. Uma forma prática que poderia mitigar o problema sem onerar ainda mais o contribuinte seria o repasse de parte do processo aos grandes produtores, como já prevê a legislação do município de Cuiabá, por exemplo26. Se a saída for no sentido de aumentar ainda mais os tributos, os valores poderiam ser então incluídos como taxas, a serem cobradas no Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana (IPTU).
A pesquisa também revelou que a decisão da Administração pelo encerramento da coleta de resíduos domésticos não foi algo bem recebido internamente. Primeiro pelo alto índice de rejeição, com aproximadamente 66% dos entrevistados respondendo avaliar a medida de modo negativo. E isso se mostra ainda mais sensível ao verificar que cerca de oito em cada dez servidores gostaria que o programa fosse reativado nos moldes anteriores. O levantamento também indica uma falha sensível na comunicação institucional de explicar a razão do encerramento, já que apenas 13,51% disseram compreender os motivos.
Por fim, pode-se verificar que o programa de reciclagem de resíduos foi um importante mecanismo transformador e de quebra de paradigmas para a consciência ambiental, pois 79% dos participantes se disseram mais consciente quanto ao seu papel na preservação do meio ambiente, inclusive com impactos direto na vida de suas famílias. Esse percentual indica o grande desejo pela reativação do programa e a disposição de 44,05% dos entrevistados em ajudar a custeá-lo é revelador de seu impacto positivo. Provavelmente, se as ações tivessem se restringido apenas a palestras e medidas educativas, não dando a possibilidade de efetivamente os servidores aderirem a um processo real de segregação e coleta de resíduos, este índice poderia seria menor. A pesquisa ainda indica a possibilidade de discriminação de preços para custear o serviço de coleta, podendo ser reimplantado em bases mais sólidas, haja vista que os materiais podem gerar um valor de comercialização capaz de estruturar o programa no longo prazo através da comercialização dos materiais e do custeio pelos servidores.

Considerações finais

O Programa de Coleta Participativa do TRT-MT foi inovador em diversos aspectos. Em especial por ter sido contemporâneo às discussões políticas mundiais, como a conferência Rio 92 e a edição da Agenda 21, que alertou para a necessidade de governos, instituições e organizações não-governamentais lançarem programas para demonstrar e tornar operacional a reutilização e reciclagem de um volume maior de resíduos. Além disso, sua ampliação ocorreu quase que ao mesmo tempo em que as primeiras normatizações (ICC) para o Poder Público saíram, a partir de 2006.
Enquanto a grande maioria das ações no poder público se restringia a tão somente fazer o atendimento das determinações estabelecidas pelos decretos, resoluções e documentos afins, passando a dar destinação correta ao resíduo sólido produzido dentro dos próprios órgãos, o TRT-MT foi além e não restringiu seu escopo. Ao contrário, criou todo um aparato para receber e repassar o resíduo produzido na residência de seus servidores e prestamistas. Sem dúvida, um passo adiante do estabelecido nas regulamentações nacionais e uma conduta que certamente contribuiu para uma maior conscientização do público interno, dado a experiência direta que tal medida possibilitou aos indivíduos envolvidos, sabendo que os resíduos produzidos em suas casas estavam recebendo os tratamentos adequados.
O sucesso do projeto é demostrado pelo seu próprio avanço ao longo do tempo, bem como pelo crescente volume e renda gerada com a destinação e comercialização dos resíduos. Mais do que isso, é perfeitamente percebido com os resultados da pesquisa aplicada, a qual verificou a adesão dos servidores e magistrados ao programa, seu impacto como transformador de consciência, o desejo expresso do público interno por seu retorno aos moldes como funcionava e, até mesmo, à disponibilidade de 44,05% da amostra pesquisada disposta a custear a reimplantação do programa, por meio de contribuições individuais.
Se por um lado pode-se criticar a decisão da Administração em interromper a coleta do resíduo doméstico, visto que a relativa pequenez do impacto financeiro e mesmo operacional não é motivo para, no longo prazo, justificar a sua descontinuidade, é fato que a obrigatoriedade pela viabilização da coleta seletiva é uma obrigação do município, e não de um órgão público como um Tribunal do Trabalho. Afinal, é o poder executivo municipal que precisa dar condições para que toda a coletividade participe e se conscientize da importância do reuso de materiais ou mesmo da destinação correta dos resíduos para preservação e manutenção do bem-estar coletivo. Se o Tribunal realmente efetivar seu discurso de atuar politicamente junto a outros órgãos e poderes para viabilizar a coleta seletiva a toda a sociedade, a ressignificação (como foi chamada pelos gestores do TRT-MT) poderá gerar externalidades positivas. E a julgar pelo pioneirismo e inovação do órgão nessa área, é provável que algum avanço seja alcançado.

Notas

1. A sede do TRT-MT está localizada no município de Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso, no Centro-Oeste do Brasil.
2. As ações de cunho ambiental iniciaram em 1994, mas somente em 2006 foi implantado um sistema de gestão de resíduos sólidos, que acabou sendo desativado em 2016.
3. Hotsite da Gestão Socioambiental do TRT 23ª Região. Disponível em <http://portal.trt23.jus.br/portal/gest%C3%A3o-socioambiental> Acesso em: 20 set. 2016.
4. Informação repassada pelo ex-chefe da Seção de Gestão Socioambiental do TRT, Maurício Snowareski, em 10 de agosto de 2016.
5. BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 5940, de 25 de outubro de 2006. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5940.htm> Acesso em: 20 set. 2016.
6. BRASIL. Poder Judiciário. Recomendação Nº 11, de 22 de maio de 2007. Disponível em <http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=1215> Acesso em: 20 set. 2016.
7. BRASIL. Poder Judiciário. Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região. PORTARIA TRT SGP GP N. 548, de 23 de setembro de 2009. Disponível em<http://portal.trt23.jus.br/portal/sites/portal/files/groups/socioambiental/3._port_548_2008_institui_comissao_ambiental.pdf> Acesso em: 20 set. 2016.
8. BRASIL. Poder Judiciário. Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região. Resolução Administrativa n. 150, de 16 de dezembro de 2009. Disponível em <http://portal.trt23.jus.br/portal/sites/portal/files/groups/socioambiental/4._fragmento_ra_150_2009_-_cria_secao_socioambiental.pdf> Acesso em: 20 set. 2016.
9. BRASIL. Poder Judiciário. Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região. Resolução Administrativa n. 164, de 28 de outubro de 2010. Disponível em <http://portal.trt23.jus.br/portal/sites/portal/files/groups/socioambiental/8._ra_164_trt_23_diretrizes_socioambientais.pdf> Acesso em: 20 set. 2016.
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15. Valores corrigidos aos preços de 2015 pelo IPCA-DI.
16. DG. Comunicado: Coleta Seletiva [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por < trt23-todos@trt23.jus.br > em 22 de fevereiro de 2016.
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18. Coleta seletiva das residências deixará de ser feita a partir de 1º de março. Disponível em http://www4.trt23.jus.br/portal/trtnoticias/conteudo/7393> Acesso em Acesso em: 20 set. 2016.
19. Em entrevista realizada em março de 2017 como parte dos trabalhos de levantamento de informações para este artigo.
20. Informação repassada pela servidora Natália Pansonato em conversa no dia 13 abr. 2017.
21. Valor do contrato de prestação de serviços no ano de 2016.
22. BRASIL. Poder Judiciário. Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Resolução n. 103, de 25 de maio de 2012. Disponível em <https://juslaboris.tst.jus.br/handle/1939/24116> Acesso em: 20 set. 2016.
23. BRASIL. Poder Judiciário. Ato Conjunto CSJT.TST.GP Nº 24, de 13 de novembro de 2014. Disponível em <http://www.csjt.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=c8e43cbf-01a9-42fb-8599-d596aeb4ae85&groupId=955023> Acesso em: 20 set. 2016.
24. BRASIL. Poder Judiciário. Conselho Nacional de Justiça. Resolução n. 201, de 03 de março de 2015. Disponível em <http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2795> Acesso em: 20 set. 2016.
25. Número de servidores que trabalham no Complexo-sede.
26. CUIABÁ. Lei Complementar Nº 364, de 26 de junho 2014. Disponível em <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=279933> Acesso em: 17 abr. 2016.

 

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*Bacharel em Jornalismo e Ciências Econômicas (UFMT). Especialista em Direito Individual, Coletivo e Processual do Trabalho (UNIVAG). Jornalista do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT-MT). Contato: junioronobre@gmail.com.
** Bacharel em Ciências Econômicas (UFMT), Mestre e Doutor em Desenvolvimento Socioambiental (NAEA/UFPA), Pós-doutor em Gestão e Economia (UBI/Portugal). Docente da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Campus Cuiabá. Contato: dr.melofaria@gmail.com.

Recibido: 16/02/2018 Aceptado: 28/02/2018 Publicado: Febrero de 2018



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