Contribuciones a las Ciencias Sociales
Marzo 2012

A FRONTEIRA COMO ESPAÇO DE DIFERENCIAÇÃO

Nathália Karoline de Carvalho Soares
nathy.c.soares@gmail.com
Universidade federal da Grande Dourados

RESUMO: O presente artigo procurará discutir o papel do território no mundo atual e globalizado. A fronteira também será discutida, não apenas como delimitação de áreas para o exercício do poder pelo governo, e sim como um espaço de interação cultural, passando muitas vezes por espaços de conflitos sociais. O mito da desterritorialização, do fim das regiões e das fronteiras também serão abordados, mostrando como a migração e os deslocamentos podem ser encarados como uma nova territorializção.

PALAVRAS-CHAVE: Fronteira; região; território; desterritorialização; culturas.

ABSTRACT: This paper discusses the role of territory around the world and globalized. The boundary will also be discussed, not only as the delimitation of areas for the exercise of power by the government, but as a space of cultural interaction, often passing by spaces of social conflicts. The myth of dispossession, of the order of regions and boundaries will also be discussed, showing how migration and displacement can be seen as a new territorializção.

KEYWORDS: border; region, territory, deterritorialization; cultures




Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Carvalho Soares, N.: "A fronteira como espaço de diferenciação ", en Contribuciones a las Ciencias Sociales, Marzo 2012, www.eumed.net/rev/cccss/19/

INTRODUÇÃO:
O tema fronteira é na literatura originária dos estudos das Ciências Sociais, apesar de entre os anos trinta e cinqüenta, geógrafos e antropólogos terem tomado certa preocupação com a questão, realizando alguns trabalhos de campo que contribuíra, na literatura brasileira, para a sua concepção sociológica.
Em se tratando de senso comum, quando se fala em fronteira o que vem a mente são as fronteiras físicas, algum acidente geográfico que seja capaz de diferenciar uma área de outra, ou melhor, que seja capaz de garantir aos governantes um poder por uma extensão de terra, algo puramente para delimitar.
Ocorre, portanto, que diante dos vários problemas enfrentados por populações que se encontram localizadas em lugares de integração com outras, as fronteiras passaram a ser encarada não mais apenas como algo palpável, mais sim como um elemento diferenciador de culturas, onde muitas vezes, na zona de interação acorrem lutas pela imposição de destas
Como exemplo da invasão das fronteiras com violência, pode-se citar o que ocorreu com os indígenas do Brasil. Com a desculpa de explorar o território, os povos aqui residentes, foram expulsos de suas terras, suas fronteiras não foram respeitadas. A eles, foram impostas novas crenças, novos costumes. Historiadores estimam que em território brasileiro haviam cerca de cinco milhões de nativos, algo em torno de 200 etnias. Hoje esse número gira em torno dos trezentos mil nativos, cerca de 0,2% da população brasileira.
É assim, portanto, com diferentes costumes, crenças e hábitos, com a tentativa de sempre se sobressair, que ocorre as lutas entre diferentes nações, mostrando que apesar das fronteiras físicas, há também as ideológicas, cuja importância necessita de uma maior atenção por parte da sociedade em gera.

A FRONTEIRA COMO ESPAÇO DE DIFERENCIAÇÃO
A questão fronteiriça é realmente muito importante atualmente. Não só nos meios acadêmicos, mas também no cotidiano da sociedade em geral, pela abrangência que representa a sua definição perante as questões que influenciam os mais diversos ramos de conhecimento.
É comum, encararmos a palavra fronteira como uma barreira física do meio, algo que nos trás a idéia de intransponibilidade, ou de coisas onde até certo ponto se tem uma homogeneidade de todos os componentes pertencentes à certa área, e aí, quando ultrapassamos essa barreira física chamada fronteira, tudo muda, a paisagem, as pessoas os direitos sociais. Enfim, através da fronteira temos uma ruptura substancial entre duas áreas.
O que não se pode esquecer é que muitas vezes geramos fronteiras ideológicas, que podem ser muito mais eficientes que as físicas. Barreiras culturais, sociais geram linhas e/ ou fronteiras totalmente eficientes em se tratando da exclusão humana, fazendo com que toda a história de uma sociedade seja esquecida, apenas pelo fato de um caprichoso preconceito da sociedade ocidental moderna. Com esse fato, corrobora Oliveira, 2005, p. 10, ao dizer que: “A representação que a cultura ocidental faz atualmente da fronteira é de uma pobreza tão absoluta, que precisa ser alertada, pois ela é a negação de toda uma história”.
De maneira geral, se faz uso da palavra “fronteira”, associando-a a um aspecto físico, imposto por um governo, a fim de delimitar uma área que o pertence, a área pelo qual é responsável, onde suas leis são feitas e suas ordens são obedecidas. Porém o que parece mais peculiar nesse assunto é que dentro dessas áreas delimitadas por fronteiras, é possível encontrar outros tipos de barreiras, sendo que apenas sua morfologia é uma maneira pobre de analisá-la. Assim, Oliveira diz que:
“... sem dúvida também, porque mais do que um fato geográfico e um fato social, a fronteira é um fato biológico incrustado no hipotálamo. Espaço-temporal, a fronteira é também bio-social: ela delimita um “para cá” e outro “pra lá”, um “antes” e um “depois”, com um limite marcado e uma área de segurança. (OLIVEIRA, 2005, p11)
Assim, o autor afirma ser a fronteira, um aspecto claro de, não só delimitação de áreas, mas também e, sobretudo um fator de diferenciação de raças e culturas, uma criação a favor do preconceito que inclui os mais favorecidos, e deixa à margem do sistema, os menos favorecidos socialmente, sendo que um lado sempre prevalecerá sobre o outro. Este pensamento vai ao encontro do que diz Santos, ao enfatizar, que há uma impossibilidade de existência entre os dois lados da linha abissal. É como se essa linha em questão fosse a conhecida fronteira, agindo de modo a diferenciar pessoas, costumes, credos e raças, sempre dando a preferência de uma em relação à outra.
“A divisão é tal que “o outro lado da linha” desaparece como realidade,torna-se inexistente e é mesmo produzido como inexistente. Inexistência significa não existir sob qualquer modo de ser relevante ou compreensível. Tudo aquilo que é produzido como inexistente é excluído de forma radical porque permanece exterior ao universo que a própria concepção de inclusão considera como o “outro”. A característica fundamental do pensamento abissal é a impossibilidade da co-presença dos dois lados da linha.O universo “deste lado da linha” só prevalece na medida em que esgota o campo da realidade relevante: para além da linha há apenas inexistência, invisibilidade e ausência não-dialética”. (SANTOS, 2007, p.71).

Mais será que o mundo moderno, dito globalizado, esta modificando suas fronteiras, como alguns acreditam? Ou ainda, nesse mundo globalizado há ainda fronteiras, já que uma linha do pensamento acadêmico acredita em fim dos territórios e das regiões, em prol de um mundo totalmente globalizado, um mundo desterritorializado?
Segundo Haesbaert 2004, p.16, desterritorizalização seria:
“O mito dos que imaginam que o homem não pode viver sem território, que a sociedade pode existir sem territorialidade, como se o movimento de destruição de territórios não fosse sempre, de algum modo, sua reconstrução em novas bases”.
Portanto, Haesbart não acredita em um mundo desterritorializado, ele diz que isso não passa de um mito, pois diz que como recurso básico, a humanidade precisa territorializar-se. O que muda, portanto, são as formas como isso acontece, sendo assim, ele acredita ser algo relacional, dizendo que o que muda não é a existência de territórios, fronteiras, e/ou regiões, mas sim a maneira com que essas relações se mostram em determinado momento, pois diz que todos esses itens dependem “do movimento, fluidez, interconexão – em síntese e num sentido mais amplo, temporalidade” (HAESBAERT, 2004, p.82). Simplifica esse pensamente, exemplificando o que ocorre na América Latina:
“Na América Latina, podemos dizer, o hibridismo cultural não é simplesmente sinônimo de “desterritorialização”, de desenraizamento, mas a forma encontrada, principalmente pelos povos subjugados, de se “reterritorializar”, reconstruir, de algum modo, seus territórios”(HAESBAERT, 2005 p.90).
Assim, o mesmo autor não compartilha da idéia do fim das regiões, pois, implicitamente estaria corroborando da idéia do fim das fronteiras e do fim dos territórios. O que segundo Haesbaert ocorre, é um significado polissêmico, principalmente quando seu significado é analisado perante o senso comum.
“Não pensamos que a região haja desaparecido. O que esmaeceu foi a nossa capacidade de reinterpretar e de reconhecer o espaço em suas divisões e recortes atuais, desafiando-nos a exercer plenamente aquela tarefa permanente dos intelectuais, isto é, a atualização dos conceitos” (SANTOS, 1994:102 apud HAESBAERT 2010:15).
Assim, o fim das regiões, pode-se dizer, também não passa de um mito. A heterogeneidade presente nas várias partes do território permite que haja múltiplas interpretações do território, várias divisões possíveis do que pode ser delimitado como região. O que depende é a interpretação do pesquisador, qual vai ser o seu objeto de estudo, qual a sua pretensão ao analisar tal espaço, ao delimitá-lo como uma região, pois apesar de toda a questão globalizadora que afirma estar formando um mundo heterogêneo, o que se tem na verdade são várias reconfiguração do território, e inúmeras recriações de desigualdade.
“... apesar da propalada globalização homogeneizadora, o que vemos concomitante, é uma permanente reconstrução da heterogeneidade e/ou da fragmentação via novas desigualdades e recriação da diferença nos diversos recantos do planeta” (HAESBAERT, 2010 p.15).
Voltando a questão das fronteiras, esta não ocorre apenas em sua forma física, que seria a delimitação de uma área por um acidente geográfico, seja este um rio, uma vale, ou algo parecido.
Hoje temos fronteiras bem mais amplas e complexas, que ainda precisam ser mais detalhadamente estudadas, pois como já dito, a idéia de fronteira física é ainda a mais e talvez a única difundida. A própria idéia do fim das fronteiras político-administrativas não são muito bem quistas por Haesbaert, já que o mesmo não acredita em um mundo desterritorializado:

“Na verdade, mais do que desaparecendo, as fronteiras político-administrativas estão mudando seu papel (muito mais relevante no controle da mobilidade humana, por exemplo) e, muitas vezes, mudando de escala, especialmente no caso de grandes blocos econômicos, como a União Européia” (HAESBAERT, 2005, p. 56).
Podemos mesmo assim, pensar em várias formas de fronteira social e cultural. Talvez o Apartheid, regime que constituía na segregação racial adotado de 1948 a 1994(46anos) pelos sucessivos governos do Partido Nacional na África do Sul, no qual os direitos da grande maioria dos habitantes foram cerceados pelo governo formado pela minoria branca, tenha sido uma das mais violentas formas de representação de fronteiras. A fronteira imposta pela etinia, pelo sentimento de superioridade, da não igualdade entre as culturas segregou durante anos uma população. Essa legislação dividia a população em grupos raciais ("negros", "brancos", "de cor", e "indianos") segregando as áreas residenciais, muitas vezes através de remoções forçadas. Nesta forma de legislação é possível encontrar os dois tipos de fronteira, a física (já que cada etnia possuia a sua área) e a racial/social (pois a população não era tratada como igual, sofrendo discriminação e até violência física).
Nesta perspectiva, a autora Núbia Hanciau, em seu trabalho intitulado entre - lugar, diz:
“Passagem do velho ao novo, do homogêneo ao heterogêneo, do singular ao plural, da ordem à desordem, a idéia de mistura /hibridação/mestiçagem compreende, desde então, conotações complexas e apriorismos ambíguos, que pressupões a existência de grupos humanos puros, fisicamente distintos e separados por fronteiras, as quais a mistura dos corpos viria pulverizar” (HANCIAU, 2005, p.131).
Assim, as fronteiras são também construídas através das relações sociais, das diferenças entre as sociedades e da vontade de não se misturarem, ou melhor, de preservarem seus costumes através da não integração com o outro. Esse é um fator primordial na criação de fronteiras “ideológicas”.
Dentro deste pensamento, muitas vezes quem está do outro lado da fronteira desaparece aos olhos do outro. Torna-se invisível, ou sem importância, acabando por gerar um preconceito sem fundamento, apenas pautado na diferença de culturas.
Essa perspectiva serve não somente como alerta para a sociedade, mas também e primordialmente para que os estudiosos da área entendam a não ver somente o único, ou a maioria. É preciso compreender que por menor que seja uma comunidade, ela possui hábitos, credos e crenças que lhe conferem a identidade. É como diz Hanciau:
“Compreender a mestiçagem implica defrontar-se com hábitos intelectuais que levam a preferir os conjuntos monolíticos aos espaços intermediários. Embora as abordagens dualistas e maniqueístas seduzam por sua simplicidade, tal maneira de ver limita e empobrece a realidade, além de eliminar os elementos que desempenham papéis determinantes na contemporaneidade: as trocas de um mundo a outro, os cruzamentos, os indivíduos e grupos que fazem as vezes de intermediários, de “passadores...”
Apesar de toda essa diferenciação, das lutas por poder e pelo extermínio de culturas inteiras, tem-se hoje uma nova configuração espacial. Através da globalização, dos deslocamentos e das novas formas de interação da sociedade, é possível perceber que uma cultura não necessita mais estar enraizada em um único território, é a chamada reterritorialização.
Ao deslocarem-se no mundo, pessoas levam consigo suas culturas, sem, no entanto, deixarem de lado a cultura do lugar para onde se destina. A absorção de novas culturas, porém, não pressupõe um abandono da sua cultura, mas sim uma nova forma de sobreviver em um mundo heterogêneo, sem ser bombardeado por pré-conceitos. Diz-se assim então que a fronteira nasce da diferença. Oliven compartilha da idéia de absorção de outras culturas e exemplifica essa questão em termos de Brasil afirmando que:
“No Brasil, é muito forte a tendência de se apropriar de manifestações culturais originalmente restritas a um grupo social determinado, reelaborá-las e transformá-las em símbolos de identidade nacional. Esta aquisição de um novo significado cultural aconteceu não somente com a feijoada, mas também com o samba, a malandragem, o futebol e o carnaval – as três primeiras manifestações se originaram nas classes populares, as ultimas duas nas classes altas” (OLIVEN, 2006, p.158).

Assim diz-se que toda desterritorialização resultará em uma reterritorialização, já que como dito anteriormente, a idéia de que o homem pode viver sem um território, não passa de um mito.
“Cada um de nós necessita, como um recurso básico, territorializar-se. Não nos moldes de um “espaço vital” darwinista - ratzeliano, que impõe o solo como um determinante da vida humana, mas num sentido muito mais múltiplo e relacional, mergulhado na diversidade e na dinâmica temporal do mundo” (HAESBAERT, 2004, p.16).

CONCLUSÃO:
Conclui-se assim, que o mundo globalizado, como muitos acreditam não excluí os territórios, não acaba com as regiões e não dissolve as fronteiras. Ao contrário, a globalização acaba por extenuar as diferenças, excluindo mais e favorecendo menos,
O espaço, em nenhum momento passa pela chamada desterritorialização, o que ocorre é uma reorganização, a fim de torná-los algo próximo à realidade vigente. Nenhum ser humano é capaz de organizar-se sem uma base territorial sólida. É verdade que não há mais um território uniformemente distribuído, hoje o que se vê são territórios muitas vezes descontínuos, porém por tê-los essa característica não deixam de o ser.
As fronteiras por sua vez partem do mesmo princípio. Diferentes culturas sempre irão existir, e até co-existir. O fato é que esses locais de diferenciação necessitam ser mais cuidadosamente estudados, sendo que não são apenas locais de demarcação de um território, não servem apenas para demarcar até onde vai o poder de um governo. Elas são permeáveis, se reconstroem a cada mudança de temporalidade, porém não deixam de existir, seja como relações de subordinação e/ou de dominação.
Assim concluímos que o que há realmente uma mudança no contexto temporal dos conceitos, não há fim, e sim um constante movimento. As fronteiras se deslocam, os territórios já não são contínuos, as regiões são vistas de múltiplos ângulos, dependendo do objeto de estudo do pesquisados, por isso há tantas regiões quantos olhares.

BIBLIOGRAFIA:
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