Cláudio Neutzling
César Augusto Soares da Costa
csc193@hotmail.com
Resumo: Nascido em 1912, Leopoldo Zea é o principal representante do grupo de pensadores mexicanos “americanistas”, assim chamado por se ocupar, com base em Ortega y Gasset (+1955), do problema da América Latina e de seu lugar na história da cultura universal. Discípulo de Antônio Caso (+1946), admirador de Samuel Ramos (+1959), Zea foi influenciado fortemente por José Gaos (+1969), do grupo de Ortega, exilado no México. Zea é influenciado por Ortega y Gasset através de J. Gaos e de S. Ramos. De Ortega aceita a concepção histórica da humanidade e da cultura, concepção que implica na capacidade criadora do homem. Assim, a importância que Zea dá à história da cultura, leva-o a pesquisar a mentalidade do povo mexicano através de sua filosofia. Neste filão, podem situar-se as obras sobre o positivismo no México e outras dedicadas à filosofia mexicana e americana. Tais obras são a premissa e a base de apoio para pesquisar o significado e o destino da América.
Palavras-chave: América Latina, história, filosofia.
Abstract: Born in 1912, Leopoldo Zea is the main representative of the group of Mexican thinkers "Americanists", so called to mind, based on Ortega y Gasset (+1955), the problem of Latin America and its place in history universal culture. Disciple of Antonio Caso (+1946), an admirer of Samuel Ramos (+1959), Zea was strongly influenced by Joseph Gaos (+1969), the group of Ortega, exiled in Mexico. Zea is influenced by Ortega y Gasset through J. Gaos and S. Ramos. Ortega accepts the historical conception of humanity and culture, a concept that implies the creative capacity of man. Thus, the importance it gives to Zea cultural history, leads him to search the mentality of the Mexican people through his philosophy. In this vein, may lie the works on positivism in Mexico and others dedicated to Mexican and American philosophy. Such works are the premise and basis for support to research the meaning and destiny of America.
Keywords: Latin America, history, philosophy.
Introdução
Nascido em 1912, Leopoldo Zea é o principal representante do grupo de pensadores mexicanos “americanistas”, assim chamado por se ocupar, com base em Ortega y Gasset (+1955), do problema da América Latina e de seu lugar na história da cultura universal. Discípulo de Antônio Caso (+1946), admirador de Samuel Ramos (+1959), Zea foi influenciado fortemente por José Gaos (+1969), do grupo de Ortega, exilado no México. As principais obras de Leopoldo Zea são: El positivismo en México (1943); Apogeo y decadencia del Positivismo en México (1944); Entorno a una filosofía americana (1946); La filosofía como compromiso y otros ensayos (1952); América como conciencia (1953); La Filosofía en México (1955); América en la historia (1957 – obra chave, traduzida em muitas línguas); Dos ensayos (1960); El pensamiento latinoamericano (1965); América Latina y el mundo (1965); Latinoamérica en la formación de nuestro tiempo (1965); La filosofía americana como filosofía sin más (1969 – obra que pode ser considerada uma síntese do pensamento de Zea); Dependencia y liberación en la cultura latinoamericana (1974); Filosofía de la historia americana (1978); Filosofía Latinoamericana (1987); Discurso desde la marginación y la barbarie (1988).
Professor de Filosofia da História na Universidade Autônoma do México, Zea é influenciado por Ortega y Gasset através de J. Gaos e de S. Ramos. De Ortega aceita a concepção histórica da humanidade e da cultura, concepção que implica na capacidade criadora do homem. Assim, a importância que ele dá à história da cultura, leva-o a pesquisar a mentalidade do povo mexicano através de sua filosofia. Cabe em nosso breve artigo, situarmos as obras sobre o positivismo no México e outras dedicadas à filosofia mexicana e americana. Tais obras são a premissa e a base de apoio para pesquisar o significado e o destino da América.
1 Conteúdo e importância da obra de Leopoldo Zea
Na obra “La filosofía como compromiso”, Zea procura as razões da atividade filosófica. Ele observa que a filosofia não é uma ocupação gratuita e acessória. De fato, quando e enquanto se sente a necessidade da filosofia, sente-se a exigência de responder aos problemas que se nos impõe o ambiente em que vivemos. O homem está inserido no mundo e ali é forçado a agir, assumindo-se a cada instante, com a responsabilidade de enfrentar escolhas sempre novas. Com sua atividade, o homem envolve os outros e, por sua vez, é envolvido por eles. Na verdade, a vida humana é um entrelaçar de empenhos e responsabilidades recíprocas. Nesta situação, o filósofo é um homem que tem maior consciência desta sua condição empenhada. Diante desta condição, o filósofo não se limita a assumir a própria responsabilidade como indivíduo, mas procura assumi-la como se ele encarnasse a humanidade. A resposta que o filósofo pretende oferecer “para todos os problemas” e “para qualquer situação humana”, de fato, é dada a partir da emergência de “seus” problemas, na realidade da “sua” situação. O filósofo deve perseguir o universal, mas através do particular. Diante disto, Zea enfrenta a questão da filosofia a partir da realidade de mexicano e latino-americano.
Na obra “América como conciencia”, Zea pergunta-se de que modo o filósofo latino-americano desenvolveu sua tarefa como pensador. Para responder, o autor recorda como os europeus consideraram a América. A opinião deles pode ser resumida na celebre frase de Hegel na “Filosofia da História”, afirmando que a América é o país do futuro. Se é o país do futuro, diz Zea, então atualmente a América é pura potencialidade, ou seja, é “sem” história. Ora, sendo o homem um ser essencialmente histórico, ao negar a historicidade ao americano, nega-se-lhe a humanidade. O que é grave, acrescenta Zea, é que esta posição foi assumida pelos próprios latino-americanos. De fato, após a independência, eles creram poder projetar-se para o próprio futuro, negando e desprezando seu passado. Mas, negando o passado, teimam em viver a utopia européia (e, posteriormente, norte-americana), rejeitando o que lhes era próprio, o seu “ser” latino-americano. Deste modo, os problemas não foram resolvidos e até se agravaram. Frente a isso, Zea conclama os latino-americanos a tomarem consciência de sua identidade, do seu ser. Somente deste modo poder-se-á criar uma cultura que não seja européia. Zea, contudo, alerta que não se trata de um fechamento em si. O que é preciso é reagir, a modo próprio, às idéias dos outros, afirmando a própria originalidade. O europeu soube fazê-lo. Isto faltou ao latino-americano. Este apenas se esforçou por repetir e copiar servilmente os frutos da cultura européia, em vez de copiar o espírito que os produziu.
Em “América en la historia”, Zea pergunta-se pela possibilidade latino-americana de participar da Cultura Ocidental, sem ser puramente imitativo. O autor, então, distingue a América de origem anglo-saxônica e a de origem latina, afirmando que a primeira assimilou de tal forma a cultura ocidental moderna, que se fez continuadora da mesma. Enquanto isso, o americano de origem latina encontrou o problema da tradição católica. De fato, a Espanha transplantou para a América um cristianismo que, no resto da Europa, estava desaparecendo. Desta forma, a América Latina ficou à margem da história. Então, à certa altura, ela se encontrou defronte ao enorme progresso do mundo ocidental e caiu na ilusão de poder faze-lo seu, rejeitando seu próprio passado colonial. Contudo, para Zea, o passado somente deve ser negado de um modo tal que, ao mesmo tempo, seja conservado. Melhor dito, na assimilação do novo, não se deve amputar o passado. Enquanto a Europa moderna entende seu passado como útil, o latino-americano se projeta para o futuro e este seu projetar-se fica no estado utopístico, porque não tem raízes no passado.
2 A Reflexão Filosófica de Leopoldo Zea
Afirmando que a história é uma descoberta ocidental, inicialmente cristã, Zea entende que ela encontrou sua máxima expressão no mundo moderno. Mais ainda, o mundo moderno europeu inseriu na concepção de história a idéia de “progresso”. Esta idéia, aparentemente, parece abranger todos os homens, sem distinção de classe ou raça: todos podem progredir. Ora, na idéia de progresso, deifica-se a atividade criadora do homem. Na prática, porém, é a Europa que se projeta como a única protagonista da história.
Um dos títulos para legitimar esta situação é o sistema liberal. O liberalismo é mais uma mentalidade do que uma doutrina. É uma mentalidade na qual a idéia de liberdade, fundida com a de progresso, une-se, por sua vez, com a legitimidade da expansão e do domínio. Assim, o colonialismo encontra no liberalismo o clima adaptado ao seu desenvolvimento e, ao mesmo tempo, à sua justificação. Como no caso do progresso, também na idéia de liberalismo a igualdade é teoricamente afirmada, diz Zea, mas negada na prática. Há homens e povos colocados ao nível de subordinados, quando não, até mesmo, considerados sub-humanos, destinados a uma perpétua servidão.
Apesar disso, Zea reconhece que este racismo e imperialismo econômico-político e cultural não impediram que o Ocidente tenha assumido um significado de validade e alcance universal. A expansão do Ocidente pôs fim aos arquipélagos culturais. A técnica, que ele impôs junto com sua economia, torna impossível o isolamento. O Ocidente converteu-se em mestre do mundo. Os próprios representantes mais autorizados do Ocidente tomaram consciência de que a cultura não é mais exclusiva do europeu. Deste modo, o ocidental tornou-se, por um lado, um homem entre os homens e, por outro, desenvolveu um papel fundamental na história, ou seja, fez com que os outros homens tomassem consciência de sua humanidade. Zea afirma que a origem desta consciência é ocidental e é desta perspectiva que o Ocidente se universalizou. O autor, então, mostra as relações que travaram entre si a Rússia, a Espanha, a Europa, a América Latina e a América Anglo-Saxônica. O autor retoma, depois, o tema inicial: o da preocupação da originalidade dos latino-americanos, enquanto experimentam um sentimento de marginalidade histórica e cultural. Exatamente esta marginalidade começa a aparecer hoje como uma condição não de modo negativa. Pode-se sistematizar em bases histórico-culturais o conjunto de sentimentos dos latino-americanos quanto à sua posição na história do mundo.
Em “El pensamiento latinoamericano”, Zea retoma alguns destes temas, para culminar numa reflexão sobre a filosofia como dominação e como libertação, prenunciando a chamada Filosofia da Libertação.
Em “La Filosofía Americana como Filosofía sin más”, o autor volta a tratar da originalidade da filosofia na América Latina, mostrando a importância da tomada de consciência desta questão, bem como alertando para a necessidade do enfoque antropológico.
Na década de 1970, Leopoldo Zea participa ativamente na elaboração da chamada Filosofia da Libertação, viajando várias vezes à Argentina, entre 1972 e 1975, quando esta filosofia começava a dar ali seus primeiros passos de forma concreta e consciente. Ainda em 1974, participa, em Buenos Aires, do “Simpósio de Filosofia Latino- Americana”, que teve por tema “América Latina: Filosofía y Liberación”, com a presença de uma plêiade de pensadores deste Continente. A intervenção de Zea no referido “Simpósio” traz o significativo título, praticamente pioneiro naquela época: “La Filosofía Latinoamericana como Filosofía de la Liberación”. Esta tem sido a sua preocupação posterior, em continuidade com sua obra. Ele o faz sem xenofobia, pois sua postura sempre foi a do diálogo respeitoso com o pensamento europeu.
Em conclusão, Zea procura investigar as condições e o conteúdo de uma filosofia mexicana e, depois, latino-americana, procurando exprimir reflexivamente as criações culturais autênticas deste Continente.
Referências Bibliográficas
MEDIN, Tzvi. Leopoldo Zea: Ideología, historia y filosofía de América Latina. México City: Universidad Nacional Autónoma de México, 1986.
SARTI, Sergio. Panorama della filosofia ispanoamericana contemporanea. Milano: Cisalpino-Goliardica, 1976, pp. 520-527.
SCHUTTE, Ofelia. Cultural Identity and Social Liberation in Latin American Thought. Albany: SUNY Press, 1993.
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