Marcelo Nunes Apolinário
marcelo_apolinario@hotmail.com
Introdução
O sistema de duração da jornada laboral foi objeto de preocupação do legislador
Constituinte nos incisos XIII a XVII do art. 7º, sendo complementado pelos
comandos dispostos no art. 57 e seguintes da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Pretende-se, nessa pequena investigação, discorrer inicialmente sobre a evolução
histórica da jornada de trabalho e sua regulamentação pelos Estados Modernos,
incluindo-se o Brasil. Posteriormente, se buscará desenvolver os fundamentos
intrinsecamente atrelados a este instituto na Constituição Federal de 1988 e na
legislação trabalhista vigente, dando ênfase ao art. 62 da CLT que excluem
alguns empregados da proteção normal da jornada de trabalho e ao fenômeno da
flexibilização que permitiu a tutela sindical do número de horas trabalhadas em
sistema de revezamento, para diminuir ou acrescer a jornada, desde que
respeitada a duração máxima de 44 horas semanais.
1. Evolução histórica da jornada de trabalho: Retrospecto da regulamentação pelo ente estatal
Na antigüidade, em que o trabalho era realizado por escravos, não se cogitava regulamentar a duração da jornada de trabalho. No entanto, os proprietários desses escravos, exatamente para preservarem seu patrimônio, não os submetiam a longas e incomensuráveis jornadas; sem esse cuidado aumentaria por certo o índice de enfermidades e morte prematura entre os trabalhadores (escravos).
No medievo, de um modo geral, conforme os ensinamentos de GARCIA OVIEDO, prevaleciam à jornada de sol a sol . Apenas no trabalho realizado em minas havia jornadas mais reduzidas, sem o necessário controle por parte do patronato.
Com o liberalismo econômico, iniciado na França pela Revolução de 1789, aumentaram os abusos por parte do patronato. A matéria sujeita a normas do Direito Civil, determinava o livre ajuste de qualquer duração para a jornada de trabalho, assim como não havia a exigência de salários- mínimos, prevalecendo, dessa forma, a mais absoluta autonomia da vontade.
A jornada de trabalho chegava a dezoito horas por dia e os salários de natureza ínfima compeliam os homens a permitir e incentivar que suas esposas e filhos trabalhassem, o que aumentava a oferta de mão de obra, baixando os salários e favorecendo as jornadas excessivamente longas. Tudo isso, conjugado a nenhuma assistência social e condições de trabalho anti-higiênicas que contribuíam com o abalo gradual da saúde dos trabalhadores, colocando em risco o próprio futuro da humanidade.
Determinados patrões tentaram tomar iniciativas particulares para melhorar a situação dos empregados. Para DE LA CUEVA, foi Owen o primeiro a implantar uma jornada laboral reduzida, em seus estabelecimentos na localidade de New Lamark, mas seu exemplo, apesar de exacerbada propaganda, não foi seguido. Apenas em algumas indústrias, como a de tecidos, foi fixada a jornada de trabalho em onze horas.
Assim, a situação tornou-se insustentável ao ponto que o Estado, inclusive premido pela força ascendente das organizações sindicais, passou a interferir na regulamentação do número diário de horas de trabalho.
Na Alemanha, por exemplo, uma seqüência de leis, de 1839 a 1856, cuidou de tratar o assunto. Proibiu-se o trabalho dos menores de oito a dez anos, principalmente na indústria de lã. Outras ações de proteção ao trabalho, especialmente aos menores, foram adotadas. Inglaterra e França, entre outros países, legislaram no mesmo sentido. Em 1847, o parlamento inglês aprovou a lei que reduziu a 10 horas a jornada máxima de trabalho.
No ano seguinte, na França, chegou a ser implantada a jornada de dez horas em Paris e de onze nas províncias. Em setembro do mesmo ano, um decreto fez com que aumentasse a duração máxima do trabalho diário para onze horas nas usinas e manufaturas, não restringindo a jornada em outras atividades e impondo multas para aqueles que violassem as normas relativas à matéria, mas não organizando sistema de fiscalização algum visando ao cumprimento da lei.
Contudo, o movimento favorável a uma jornada laboral mais humana prosseguiu. Em 1866, o Congresso Geral dos Trabalhadores norte-americanos iniciou a luta pela jornada de oito horas, ou melhor, pela realização dos três oito: oito horas de trabalho, oito horas de repouso e oito para outras atividades. No mesmo ano, o Congresso Operário Internacional de Genebra aderiu ao movimento e a Internacional socialista propagou a idéia, entendendo-a como veículo eficaz para atrair os trabalhadores para o marxismo.
Entre os Congressos internacionais que tratavam da redução da jornada laboral diária de trabalho destacam-se o Internacional dos Trabalhadores (Genebra, 1866), o da Associação Internacional dos Trabalhadores (Baltimore, 1867), o Socialista (1877), o da Assembléia dos Industriais Cristãos da Região Norte da França realizado em Lille, a Conferência Operária de Paris (1883) e o Socialista de Paris.
A classe patronal alegava que a redução da jornada laboral iria encarecer os produtos, colocando os Estados que se vergassem às exigências dos empregados em posição difícil para fazer face à concorrência internacional. Os trabalhadores, por outro lado, sustentavam que a sua remuneração sofria com uma jornada demasiadamente longa e inclusive nem mesmo no inicio do dia era considerável pela falta de suficiente repouso entre duas jornadas de trabalho. Essa situação, perdurou no mundo todo até o término da Primeira Guerra Mundial, com exceção do Uruguai que já em 1915 fixara a jornada laboral máxima em oito horas.
Finalmente, a Carta internacional de Versalhes, em 1919, recomendou a adoção da jornada de oito horas ou da semana de quarenta e oito horas de serviço. Dessa forma também a Conferência Internacional do Trabalho, de 29.10.1919, em Washington.
Por conseguinte, verifica-se, que a semana de 48 horas, que pareceu intangível durante alguns anos, tende a ser substituída por uma duração menor do trabalho semanal, de que é precursora a lei americana que tratava das justas condições de trabalho, de 1938.
Entre nós, com a vigência da 1ª. Carta Magna da República, o Decreto 1.313, de 17.01. 1871 restringiu a duração da jornada de trabalho dos menores trabalhadores.
O Decreto n. 21.186, de 21.03.1932, regulou a jornada de trabalho no comércio em oito horas e o Decreto n. 21.364, de 04.05.1932, tratou do mesmo tema no âmbito industrial.
A Constituição de 1937 especificou o dia de trabalho em oito horas, que poderá ser reduzido, e somente suscetível de aumento nos casos previstos em lei (art. 137, i). Posteriormente, fora publicada a CLT, em 1.05. 1943, que incorporou o Decreto-lei n. 2.308 e o restante da legislação esparsa sobre a matéria.
A Constituição de 1946 estabeleceu a duração diária de trabalho não excedente a oito horas, exceto nos casos e condições previstos em lei (art. 157, V).
Já a Constituição de 1967 determinou a duração diária do trabalho não excedente de oito horas, com intervalo para descanso, salvo nos casos especialmente previstos (art. 158, VI). A EC n. 1, de 1969, praticamente tem a mesma redação: “duração diária do trabalho não excedente a oito horas, com intervalo para descanso, salvo casos especialmente previstos” (art. 165, VI).
Por fim, a Constituição de 1988 alterou a orientação que vinha sendo determinada constitucionalmente, estabelecendo no seu art. 7º: a “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.” No inciso XIV do mesmo artigo dispõe: “jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva.”
2. Conceito, denominação e natureza jurídica da jornada de trabalho
Para PINTO MARTINS, o conceito de jornada de trabalho é o tempo de labor diário do empregado. Segundo o autor, esse conceito deve ser analisado sob três enfoques: do tempo efetivamente trabalhado, do tempo à disposição do empregador e do tempo in itinere.
Além dessa concepção basilar, ressalta-se a importância, segundo ORLANDO GOMES, de que a duração do trabalho deve ser regulamentada com vistas à tutela da saúde, da vida moral e social do individuo, da economia em geral, e, ainda, da liberdade individual.
Para CARRION, a jornada “é o lapso de tempo durante o qual o empregado deve prestar serviço ou permanecer à disposição, com habitualidade, excluídas as horas extraordinárias.”
Já o vocábulo giornata, em italiano, significa dia. Em francês, utiliza-se a expressão jour, dia; journée quer dizer jornada e jornada quer dizer tudo aquilo que é diário. Em relação às 44 horas semanais, fala-se em módulo semanal.
Dessa Forma, a jornada de trabalho diz respeito ao número de horas diárias de trabalho que o trabalhador presta ao seu estabelecimento laboral.
O horário de trabalho, na concepção de PINTO MARTINS, é o espaço de tempo em que o empregado presta serviços ao patrão, contando do momento em que se inicia até o seu término, não se computando o período de intervalo.
Não obstante, a natureza jurídica da jornada de trabalho possui natureza pública, uma vez que é interesse do Estado limitar a jornada de trabalho, de modo que o trabalhador possa descansar e não venha prestar serviços em largas jornadas. Por outro lado, possui natureza privada, visto que as partes contratantes podem estipular jornadas inferiores às previstas na legislação ou nas normas coletivas, estabelecendo a legislação apenas parâmetros máximos de duração da jornada.
3. Jornada diária de trabalho desde uma perspectiva constitucional
Os incisos XIII e XIV do art. 7º, da Constituição Federal, garantem a jornada de trabalho não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, e de seis horas diárias para o trabalho realizado em turnos de revezamento , salvo, neste caso, negociação coletiva. A referência efetuada a acordos ou convenções coletivas de trabalho é para o propósito de diminuição da jornada e jamais de aumento.
Assim, ocorre que algumas profissões apresentam claras conveniências no sentido de terem a sua jornada laboral acrescida, como é o caso dos aeronautas. Estas, entretanto, poderão ver discutida sua validade ante o texto constitucional de 1988. Seria, para evitá-lo, necessária uma construção interpretativa com o intuito de determinar o entendimento segundo o qual o limite constitucional é para o trabalho normal e não para o trabalho excepcional, aquele que apresente condições distintas das normalmente vigentes.
Cabe sinalar, que a jornada prevista no inciso XIII também está garantida aos servidores públicos conforme o art. 39, § 3º., da Magna Carta.
Para a jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, a Constituição faculta a compensação de horários e a redução da jornada, desde que haja acordo ou convenção coletiva.
4. Duração do trabalho à luz da CLT
O legislador disciplinou em alteração “recente” ao art. 58 da CLT (Lei 10.243/01) duas inovações de monta em sede de duração do trabalho. Primeiro, fixou que fossem desconsideradas variações de horário quando presente registro em cartões ponto não excedentes a cinco minutos, no inicio e no final, até o máximo, portanto, a dez minutos.
Além disso, trouxe para a legislação antigo entendimento jurisprudencial derredor das conhecidas horas in itinere (CLT, art. 58, § 2º.). A jurisprudência tem se posicionado no sentido de que em locais de difícil acesso e não servido por transporte público regular, quando fornecida pelo empregador à condução, o tempo de deslocamento até o local do trabalho deveria ser computado e pago como horas extraordinárias, se já ultrapassada a jornada normal. Desse modo, a norma celetista estatui que se fornecida à condução pelo empregador, quer quando o trabalho se realize em locais de difícil acesso ou quando o referido local de trabalho não for servido de transporte público, será o período de deslocamento trabalho-residência; residência-trabalho, computado como de efetivo serviço (tempo a disposição do empregador).
O art. 59 da CLT permite a celebração de acordo de prorrogação de horas até o limite máximo de duas por dia. Assim, até o limite de duas horas extras por dia, se está nas chamadas horas extras licitas. É de suma importância ressaltar que o empregado não se encontra obrigado a acatar a ordem de trabalhar nesse período extra jornada, salvo se presente acordo de compensação de horas, que pode ser individual ou coletivo. O percentual previsto na Consolidação das Leis do Trabalho para remunerar as horas extraordinárias de 20% passou a ser, por aplicação da Constituição Federal, de 50%. Em virtude da força atrativa, as parcelas habitualmente pagas, a exemplo das horas extras, se integram ao salário.
Também cogita o legislador o banco de horas que permite anualizar a jornada nos termos do art. 59, § 2º., da CLT. São condições do banco de horas haver previsão anterior e autorização em acordo coletivo ou em convenção coletiva de trabalho, máximo de dez horas por dia de trabalho e compensação ao longo de um ano, de modo que na média anual não seja ultrapassado o limite de 44 horas semanais. Procedida a compensação nos termos supra não existirá pagamento de horas semanais. Caso termine o contrato do trabalhador antes do tempo, as horas não compensadas serão pagas enquanto horas extraordinárias. A dúvida reside na hipótese inversa, ou seja, quando o trabalhador for credor de horas, se inclinando a doutrina em rejeitar o desconto do eventual crédito das verbas inerentes à terminação do ajuste.
Em relação ao trabalho noturno, a CLT em seu art. 73, sujeita ao pagamento de adicional de 20%. Ademais, operou redução ficta da hora noturna que passou a ter 52 minutos e 30 segundos, de modo a que 7 horas de relógio (60 minutos) equivalem a 8 horas de trabalho noturno (52 minutos e 30 segundos). É considerado trabalho noturno aquele que se desenvolve às 22 horas de um dia até as 5 horas do dia seguinte.
Acrescente-se, contudo, que as normas acima referidas valem para o trabalhador urbano, ao rurícola não se aplica a redução ficta e existem dois horários noturnos, das 20 às 4 horas ou das 21 às 5 horas, conforme se esteja trabalhando em pecuária ou agricultura, respectivamente. No entanto, o rurícola possui adicional noturno de 25 %.
5. Empregados excluídos: a (in) constitucionalidade do art. 62 da CLT?
Alguns empregados são excluídos da proteção normal da jornada de trabalho, como se pode averiguar no texto do art. 62 da CLT. São os trabalhadores que exercem atividade externa incompatível com a fixação do horário de trabalho, o vigilante e vigia e os gerentes , diretores ou chefes de departamento. Vale dizer que estes não possuem direito a horas extras e a adicional de horas extras.
Os trabalhadores domésticos não possuem direito a horas extras, pois não se lhes aplica o inciso XIII do art. 7º., da Constituição Federal, que determina a duração de trabalho de oito horas diárias e 44 semanais. Da mesma forma, não é observado em relação aos domésticos o adicional de horas extras, pois o parágrafo único do art. 7º, da Carta Política não faz menção ao referido inciso, além do que a CLT não será aplicada nesses casos, conforme disposição do art. 7º, da CLT.
No entanto, se pode argüir, fazendo-se uma interpretação sistemática que o art. 62 da CLT é inconstitucional, uma vez que o inciso XIII do art. 7º, da Constituição estabelece que o empregado deva trabalhar oito horas diárias e 44 semanais. Porém, o art. 62 da CLT não está indicando que o trabalhador deva trabalhar mais do que a jornada especificada na Constituição, apenas que aqueles empregados não têm controle de horário ou os gerentes, de modo geral, deixam de ter direito a horas extras, pois no primeiro caso é difícil dizer qual o horário exato em que prestam os serviços, por trabalharem externamente e, no segundo caso, o empregado faz o horário que bem entender, podendo entrar mais cedo e sair mais tarde ou vice-versa. Nesse último caso, verifica-se que o poder de direção do empregador é muito menor, e em diversos casos é o próprio empregado que determina os rumos das atividades, justamente por usufruir de um cargo diretivo. Por outro lado, tem entendido a jurisprudência e a doutrina que tais empregados não possuem direito a horas extras e tampouco se trata de inconstitucionalidade do dispositivo celetista, uma vez que o art. 62 foi recepcionado pela atual Constituição, pois excetua circunstâncias de trabalho não sujeitas a horário ou nas quais o controle da jornada se faz impraticável, em presença das quais inexiste obrigação de remunerar como extraordinário o trabalho prestado. Essas disposições, conforme CARRION, não se atritam, mas ao contrário, complementam a norma genérica do art. 7º, inciso XIII, da Carta Magna.
6. A jornada em contratos especiais de trabalho
Algumas profissões possuem dentre as suas peculiaridades jornadas especiais ou intervalos diferenciados, como por exemplo, o advogado empregado que terá uma jornada de quatro horas, salvo se presente dedicação exclusiva quando, então, a jornada será de oito horas.
A jornada do aeronauta é bem variada, dependendo do número de membros da tripulação, de 09, 12 ou 15 horas. Ao bancário se deferiu jornada reduzida de seis horas, todavia, se perceber gratificação de função equivalente a um terço do salário passará a ter jornada de oito horas. Os bancários que se subsumirem na previsão abstrata do art. 62, § 2º, da CLT estarão excluídos da duração do trabalho, para tanto deverão possuir amplos poderes de mando e gratificação, se houver, superior a 40 % dos demais empregados.
Já médicos e dentistas têm assegurados um piso salarial de três salários mínimos para trabalho por quatro horas. Cogita-se de fixação, conforme a jurisprudência, de piso salarial e não de jornada de trabalho. Por outro lado, o professor não poderá ministrar mais do que quatro aulas seguidas, e seis alternadas. Vedado o trabalho aos domingos em regência de aulas e correção de exames.
7. Contrato a tempo parcial
A CLT, em seu art. 58-A, considera trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a 25 horas semanais. Ordinariamente o empregador ao contratar um empregado o faz para prestar o máximo de horas que a norma constitucional permite (limite indicado no inciso XIII do art. 7º, em 44 horas semanais). No entanto, é perfeitamente possível e obviamente aceitável que alguém necessite e contrate um empregado para labutar horas em número inferior ao limite máximo estabelecido na norma. Se alguém assim o faz, obriga-se a pagar proporcionalmente as horas que utiliza. Eis, então, o chamado contrato de trabalho a tempo parcial, ou contrato de trabalho com a jornada reduzida.
Esse contrato consiste no fato de que o empregador remunera o empregado de acordo com as horas proporcionalmente trabalhadas, em que o legislador, por razões de política legislativa, estabeleceu o limite máximo de horas passiveis de serem contratadas em 25.
8. Regras Gerais Passivas: Os institutos da inter-jornada e da intrajornada
Dentro de uma perspectiva passiva da jornada e intra-jornada se pode averiguar os intervalos legalmente previstos, os quais são de duas espécies: inter-jornada e intrajornada. O primeiro, previsto no art. 66 da CLT, se consolida no final da jornada de um dia ao inicio da posterior, e restou estabelecido em onze horas. A sistemática da intrajornada, conforme o art. 71 da CLT pode ser brevemente resumido da seguinte forma: até quatro horas, não existirá intervalo; de quatro a seis horas, quinze minutos; e acima de seis horas, mínimo de uma hora, redutível com autorização do MPT ao limite de 30 minutos, quando presentes refeitórios e não houver prestação de horas extraordinárias e máximo de duas horas, passível de majoração por acordo individual ou coletivo na modalidade escrita.
Assim, a violação tanto ativa quanto passiva da jornada atrai idêntica conseqüência, neste sentido, ambos, acarretam pagamento do adicional de 50%, conforme o art. 71, § 4º, da CLT, ou seja, ultrapassada a jornada pagar-se-á hora mais 50% e suprimido intervalo legalmente determinado ou criado intervalo não previsto, pagar-se-á intervalo mais 50%.
Em relação ao repouso semanal remunerado (Lei 605/49), a expressão preferencialmente aos domingos, presente na Constituição há que ser interpretada conforme a legislação posterior (Lei 10.101/ 2000, art. 6º, parágrafo único, ou seja, deve o repouso semanal recair em domingo ao menos uma vez a cada quatro semanas.
Dispõe a Lei 605/49 que a remuneração do repouso fica condicionada a ter sido o trabalhador pontual e assíduo. Nesse caso, a falta de assiduidade ou pontualidade implica em perda da remuneração do repouso.
O entendimento da Súmula 146 do TST, no caso em que o empregado trabalhe em dia destinado ao repouso, estabelece entendimento contra-legem de pagamento em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso, ou seja, na prática, matematicamente em triplo (dobro + um dia). Esse entendimento foi resultado da alteração da Súmula pela Resolução 121/2003 do TST.
Por fim, cabe ressaltar que o repouso semanal remunerado, assim como ocorre com as férias, implica em hipótese de interrupção do contrato de trabalho.
9. A flexibilização da jornada de trabalho
Segundo PINTO MARTINS, a flexibilização das condições de trabalho é um conjunto de normas que têm por finalidade instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica ou social existentes na relação entre o capital e o trabalho, que é usada principalmente no contexto anglo-saxônico, em que o funcionário entra mais cedo e sai mais cedo, ou ingressa mais tarde no serviço, saindo, também mais tarde, estabelecendo assim, seu próprio horário de trabalho, trabalhando mais horas em determinado dia ou semana para trabalhar um número menor em outros dias e semanas.
Pretende-se com a flexibilização, assegurar algumas garantias constitucionais mínimas do trabalhador e, por outro lado, busca garantir a sobrevivência da empresa, por meio da alteração de comandos legais, procurando atribuir aos empregados alguns direitos e ao patrão a possibilidade de adaptação de seu negócio, mormente em épocas de crise econômica. No entanto, para controlar essa flexibilização o sindicato passa a exercer um papel fundamental pela garantia dos direitos mínimos do trabalhador, principalmente quando atuar nas negociações coletivas que conduzirão ao acordo ou à convenção coletiva de trabalho, de modo a permitir também a continuidade do emprego do trabalhador e a sobrevivência da empresa. Na verdade, se trata de uma forma de adaptação das normas vigentes às necessidades e conveniências de trabalhadores e empresas.
São exemplos principais no direito brasileiro do fenômeno flexibilizatório: art. 7º, incisos VI, XIII, XIV; banco de horas (CLT, art. 59, § 2º); suspensão negociada do contrato de trabalho (CLT, ART. 476-A); Comissões de conciliação prévia (CLT, art. 625-A); terceirização (Lei 6.019/74); cooperativas (CLT, art. 442, parágrafo único).
Em realidade, inexiste norma geral sobre flexibilização, que costuma assim ser tratada pelo constituinte ponto a ponto. Todavia, convém argüir que dela foram objeto os tópicos mais essenciais do contrato de emprego, jornada e remuneração.
10. Observações finais
O mercado de trabalho pátrio, ao longo da década de noventa e nos primeiros anos do século XXI, apresentou forte deterioração na sua estrutura: aumento das taxas de desemprego, aumento do emprego doméstico, queda dos rendimentos, aumento da informalidade, intensificação do ritmo de trabalho com o desenvolvimento tecnológico, precarização de algumas atividades laborais, diminuição das garantias constitucionais dos trabalhadores (flexibilização).
A fragmentação das condições e das estruturas no Brasil assim como a heterogeneidade das jornadas de trabalho se acentuaram. Ademais, a normativa que define a jornada normal de trabalho segue sendo referência na fixação das jornadas seja no setor informal e formal da economia.
Desse modo, o aumento da utilização das horas extras configura-se em um problema a ser analisado. Se por um lado, desde uma perspectiva considerada em curto prazo, a realização das horas extras compensa a diminuição da remuneração, por outro, no longo prazo, reforça sua tendência de diminuição. Além desse inconveniente, o próprio alargamento da jornada de trabalho configura trabalho precário como também pode acarretar que o impedimento do crescimento econômico origine mais postos de trabalho.
BIBLIOGRAFIA
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TOSTES MALTA, Cristóvão Piragibe / Rodrigues Alves, Ivan Dias. Você conhece direito do trabalho? Editora Rio, 1979
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