Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


MÚLTIPLOS ACIDENTES OCUPACIONAIS COM MATERIAL BIOLÓGICO ENTRE PROFISSIONAIS DA SAÚDE

Autores e infomación del artículo

Maria Cristina Mendes de Almeida-Cruz*

Silmara Elaine Malaguti Toffano**

Elucir Gir ***

Universidade de São Paulo, Brasil

Correo: marciafonsecabio@hotmail.com


RESUMO

Esse artigo tem como finalidade, identificar a ocorrência de múltiplos acidentes ocupacionais com material biológico em um mesmo profissional de saúde. A metodologia usada foi o estudo transversal quantitativo, analítico, desenvolvido em um Serviço de Atendimento Especializado. A amostra foi composta por profissionais que sofreram mais de um acidente ocupacional com material biológico no período de seis anos consecutivos. O resultado foi conclusivo e identificou que 45 profissionais estavam envolvidos em acidentes múltiplos, destes 31 (68,9%) eram da equipe de enfermagem, sendo a maioria do sexo feminino 37 (82,2%). Os profissionais com até cinco anos de atuação tiveram maior ocorrência 14 (31,1%) e a exposição percutânea foi a mais prevalente, 25 (55,6%). O número máximo de exposições observadas neste estudo foi de quatro acidentes envolvendo um mesmo profissional, três (6,7%) profissionais. Concluisse que a ocorrência de múltiplos acidentes ocupacionais é uma situação presente na realidade dos profissionais da saúde e identificar os fatores envolvidos em sua recorrência é uma tarefa desafiadora.

Palavras-chave: Pessoal de Saúde. Exposição Ocupacional. Exposição a Agentes Biológicos.  Ferimentos Penetrantes Produzidos por Agulha. Recidiva

ABSTRACT
This article aims to identify the occurrence of multiple occupational accidents with biological material in the same health professional. The methodology used was the quantitative, analytical cross-sectional study developed in a Specialized Attention Service. The sample consisted of professionals who suffered more than one occupational accident with biological material in the period of six consecutive years. The results were conclusive and identified that 45 professionals were involved in multiple accidents, of which 31 (68.9%) were nursing staff, with a majority of females 37 (82.2%). The professionals up to five years of performance had a higher occurrence 14 (31.1%) and the percutaneous exposure was the most prevalent, 25 (55.6%). The maximum number of exposures observed in this study was four accidents involving the same professional, three (6.7%) professionals. It is concluded that the occurrence of multiple occupational accidents is a situation presents in the reality of health professionals and identify the factors involved in their recurrence is a challenging task.

Keywords: Health Personnel. Occupational Exposure. Exposure to Biological Agents. Needlestick Injuries. Accidents Occupational.

RESUMEN
Este artículo tiene como finalidad, identificar la ocurrencia de múltiples accidentes ocupacionales con material biológico en un mismo profesional de salud. La metodología utilizada fue el estudio transversal cuantitativo, analítico, desarrollado en un Servicio de Atención Especializada. La muestra fue compuesta por profesionales que sufrieron más de un accidente ocupacional con material biológico en el período de seis años consecutivos. El resultado fue concluyente e identificó que 45 profesionales estaban involucrados en accidentes múltiples, de estos 31 (68,9%) eran del equipo de enfermería, siendo la mayoría del sexo femenino 37 (82,2%). Los profesionales con hasta cinco años de actuación tuvieron mayor ocurrencia 14 (31,1%) y la exposición percutánea fue la más prevalente, 25 (55,6%). El número máximo de exposiciones observadas en este estudio fue de cuatro accidentes involucrando un mismo profesional, tres (6,7%) profesionales. Concluir que la ocurrencia de múltiples accidentes ocupacionales es una situación presente en la realidad de los profesionales de la salud e identificar los factores involucrados en su recurrencia es una tarea desafiante.

Palabras clave: Personal de Salud. Exposición Ocupacional. Contención de Riesgos Biológicos. Lesiones por Pinchazo de Aguja. Recurrencia.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Maria Cristina Mendes de Almeida-Cruz, Silmara Elaine Malaguti Toffano y Elucir Gir (2019): “Múltiplos acidentes ocupacionais com material biológico entre profissionais da Saúde”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (abril 2019). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2019/04/multiplos-acidentes-ocupacionais.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1904multiplos-acidentes-ocupacionais


  • INTRODUÇÃO

Profissionais que atuam direta ou indiretamente na assistência à saúde estão expostos ao risco biológico(1). Diante de um acidente ocupacional (AO) envolvendo material biológico há riscos de transmissão de patógenos veiculados por via sanguínea e que podem causar doenças graves como o vírus da imunodeficiência humana (HIV), vírus da hepatite B (VHB) e o vírus da hepatite C (VHC)(2,3). Além dos riscos de transmissão de patógenos, os profissionais ainda estão expostos a desconfortos psicológicos, como ansiedade, depressão e necessitam de apoio para adotar medidas de enfrentamento, como assistência médica imediata e notificação da exposição(4).
Alguns fatores podem contribuir para a ocorrência destes acidentes como carga horária semanal, categoria profissional, cansaço, falta de atenção ou não adesão às medidas preventivas(5). Tais condições e outras relacionadas à cultura organizacional e a falta de treinamentos contribuem para a ocorrência de um primeiro acidente, mas também para a recorrência de outros acidentes envolvendo o mesmo profissional, mesmo local de trabalho e até mesmo situação idêntica(6-8).
Os fatores de risco para a ocorrência de acidentes também foram avaliados em laboratórios de ensino e pesquisa em uma universidade brasileira; os resultados apontaram que houve pessoas que sofreram mais de uma exposição(9).
No Brasil, a transmissão ocupacional do HIV já foi descrita em alguns estudos(10-13). Assim como a transmissão de VHC(14-16). No estado de São Paulo, foram notificados 125.060 casos de acidentes com material biológico entre profissionais da saúde no período de janeiro de 2007 a junho de 2016(17).
As notificações no Brasil vêm aumentando na proporção de 525 casos por ano, destes, 281,93 casos envolveram técnicos e auxiliares de enfermagem, enquanto que as demais categorias permanecem estáveis. Em 2013 houve o registro de um caso de soroconversão para o HIV, porém foi encerrado com o status de abandono ou desfecho desconhecido(17).
Nos EUA em uma investigação de casos de infecção pelo HIV entre trabalhadores da saúde no período de 1981 a 2010, identificou que 57 trabalhadores apresentaram soroconversão após exposição perfurocortante envolvendo material biológico(18).
Diante da magnitude desta problemática sabe-se que há o risco de contaminação do profissional envolvido em acidente com material biológico, entretanto este risco aumenta quando o mesmo profissional é exposto a repetidos acidentes.
Há escassez de dados na literatura que apontem a ocorrência de múltiplos acidentes ocupacionais entre o mesmo trabalhador. Portanto conhecer a epidemiologia das repetições dos acidentes, bem como desvelar suas causas e os fatores envolvidos em sua recorrência é uma ferramenta valiosa que pode contribuir na prevenção de novas exposições.
Desse modo considera-se relevante a temática por ser pouco explorada na literatura e por oferecer subsídios para compreender os motivos que permeiam a ocorrência de múltiplos acidentes ocupacionais.

1.2 MÉTODOLOGIA

            A metodologia usada foi o estudo transversal quantitativo, analítico, desenvolvido em um Serviço de Atendimento Especializado. A amostra foi composta por profissionais que sofreram mais de um acidente ocupacional com material biológico no período de seis anos consecutivos.
Este projeto foi aprovado pelo Comite de ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Trata-se de um estudo transversal, retrospectivo, período de seis anos consecutivos, de abordagem quantitativa, desenvolvido em um Serviço de Atendimento Especializado, localizado no interior do Estado de São Paulo no Brasil. A população do estudo foi composta por profissionais da saúde que sofreram múltiplos acidentes ocupacional com material biológico no período determinado neste estudo.
A coleta de dados ocorreu por meio da consulta das fichas de atendimento à pessoas vítimas de exposição ocupacional. Foram selecionadas as fichas correspondentes aos acidentes envolvendo material biológico e que acometeram profissionais da saúde com mais de um acidente no período.
Definiu-se como profissional da saúde os indivíduos (médicos, enfermeiros, farmaceuticos, dentistas, e técnicos e auxiliares de enfermagem, de dentista e de farmaceutico) que desempenham atividades que envolvem contato com pacientes, sangue ou outros fluidos orgânicos, em ambientes de assistência à saúde, laboratórios e correlatos(19).
Para transcrição dos dados elaborou-se um instrumento semiestruturado, o qual foi adaptado da ficha de atendimento a acidente ocupacional preconizada pelo Ministério da Saúde(20). A validação quanto a forma e o conteúdo desta versão ocorreram por três especialistas na temática. A versão final da ficha contemplou as seguintes variáveis sociodemográficas e clínicas: idade; sexo; categoria profissional; tempo de serviço na função, situação vacinal, características sorológicas   da fonte; mecanismos envolvidos no acidente; número de exposições no período; adesão aos seguimentos clínicos.
Para a categorização das variáveis idade, tempo de serviço na função e situação vacinal utilizou-se as informações obtidas no registro do primeiro atendimento a exposição.

ANÁLISE DOS RESULTADOS E ESTATÍSTICA

Utilizou-se estatística descritiva, para caracterizar os sujeitos quanto às variáveis do estudo.
Para a análise dos dados, os profissionais foram agrupados em categorias, são elas:

  • Equipe de enfermagem: auxiliar de enfermagem, técnico de enfermagem e enfermeiro.
  • Equipe odontológica: técnico em odontologia e dentista.
  • Equipe farmacêutica: técnico em farmácia e farmacêutico.
  • Médico: por não haver no Brasil profissionais de nível técnico no exercício da medicina, apenas os médicos representaram esta categoria.

            Os dados foram submetidos ao teste de associação Qui-quadrado para verificar a associação entre as variáveis do estudo (categoria profissional, tipo de acidente e o número de acidentes) com relação a variável adesão ao seguimento clínico,

RESULTADOS
A partir da consulta aos arquivos institucionais foram identificados 45 profissionais envolvidos em múltiplos acidentes, dos quais 37 (82,2%) eram do sexo feminino. A idade do profissional na data do AO variou de 24 a 60 anos.
Quatro acidentes a um mesmo profissional foi o número máximo observado neste estudo e ocorrem com três (6,7%) profissionais, um (2,2%) enfermeiro, uma auxiliar de enfermagem (2,2%) e um (2,2%) dentista. A maioria, 37 (82,2%), tiveram dois AO, destes 24 (53,3%) eram da equipe de enfermagem, um (2,2%) médico, dois (4,4%) farmacêuticos, nove (20,0%) dentistas e um (2,2%) auxiliar de dentista. Já os acidentes com três repetições foi observado em cinco (11,1%) pessoas, todos pertencentes a equipe de enfermagem.
O tempo decorrido entre os acidentes foi variado, o menor intervalo entre eles foi de uma semana, e o maior foi de 213 semanas, ambos intervalos observados entre o primeiro e o segundo AO.
O período de exercício na função variou desde o profissional com menos de cinco anos 14 (31,1%), até o profissional com mais de vinte anos de experiência 11 (24,4%). Destacando-se que, os profissionais acometidos por quatro acidentes apresentaram entre dez e vinte anos de atuação na carreira.
Todos os profissionais 45 (100,0%) envolvidos nos múltiplos acidentes apresentavam situação vacinal adequada contra o vírus da hepatite B, porém sobre a antitetânica apenas 24 (53,3%) continham a informação referente a esta vacina na ficha de atendimento.
Os múltiplos acidentes contemplaram diferentes tipos de exposições como percutânea, não percutânea e mista, sendo que a percutânea apresentou maior prevalência 25 (55,6%). Ao analisar o seguimento clínico, evidenciou-se que, independente do tipo de exposição, a taxa de adesão prevaleceu em relação a não adesão.
Quanto ao tipo de acidente, destacam-se os profissionais da equipe de enfermagem com 31 (68,9%) dos acidentes sendo 19 (42,2%) destes acidentes de origem percutânea.
No que se refere à adesão, 28 (62,2%) dos profissionais expostos aderiram aos seguimentos clínicos. Destes, a exposição percutânea foi a via de maior adesão com 28,9% dos casos.
Dentre os casos de abandono ao seguimento clinico, identificou-se um caso envolvendo material perfurocortante em que o paciente fonte do acidente apresentava sorologia positiva para HIV. Situação também observada envolvendo acidentes mistos em que cinco casos de abandono ao seguimento clinico a fonte era conhecida e positiva para o HIV.
Destaca-se que todos os três profissionais envolvidos em quatro AO, número máximo de exposições por profissional encontrada nesta pesquisa, aderiram ao seguimento clínico no último acidente.
O teste de associação Qui-quadrado não apresentou significância estatística entre as variáveis categoria profissional, tipo de acidente e número de acidentes em relação a variável adesão ao seguimento clínico.

DISCUSSÃO
Exposições ocupacionais com agulhas e objetos perfurocortantes que expõem a patógenos transmitidos pelo sangue é um sério problema resultando em aproximadamente 385 mil ferimentos anualmente(22).
Os fatores, de maior importância, associados a ocorrência de acidentes perfurocortantes foram descritos na literatura como o estresse e o cansaço, bem como o movimento do paciente na hora do procedimento e a falta de treinamento do profissional(23). Entretanto, os motivos associados a recorrência de múltiplos acidentes são pouco explorados.
A exposição perfurocortante originária de uma fonte conhecida e sabidamente portadora de doença crônica infeciosa causa alto nível de ansiedade ao trabalhador exposto, porém se a fonte for positiva para o HIV a ansiedade é maior(23). Em nosso estudo encontramos que mesmo diante de AO com fonte HIV positiva não houve adesão ao seguimento clínico para tratamento e acompanhamento do desfecho.
Informações do sistema de saúde ocupacional da Inglaterra entre os anos de 2002 e 2011 registraram a ocorrência de 3140 acidentes percutâneos dos quais 678 envolvia paciente fonte HIV positivo, e 1428 exposições ao VHB, havendo relato de soroconversão apenas ao VHC em 14 trabalhadores(24).
Em um estudo brasileiro a adesão dos profissionais de saúde ao seguimento clínico com 2102 exposições envolvendo material biológico em um hospital universitário, evidenciou que a adesão ao seguimento clínico foi correlacionada positivamente com o sexo feminino (p = 0,009); com o fato de o paciente-fonte ter sido identificado (p = 0,026); sorologia positiva para o HIV (p = 0,029) e quando profissional não tinha antecedentes de outros acidentes (p = 0,047) (15). Neste estudo, a adesão ao teste sorológico recomendado foi melhor na avaliação prevista para três meses após a exposição (a avaliação inicial) do que para aqueles agendada para seis e 12 meses após a exposição (p = 0,004).
Por outro lado, em um estudo realizado nos EUA evidenciou que a probabilidade de completar o seguimento clínico foi 98% menor, segundo a análise multivariada, quando a fonte era sabidamente positiva para HIV(25).
Já foram descritos múltiplos acidentes com profissionais da área de saúde, porém sem informações que valorizem tais resultados(26).
No presente estudo identificou-se apenas um médico com duas exposições. Observa-se médicos expostos a material biológico em outros estudos(24,25). Múltiplos acidentes com médicos também foi relatado na literatura(26).
Pesquisadores de uma investigação realizada em Berlim com 1.214 estudantes de graduação em medicina identificaram que 281 sofreram exposições com agulha ou outro material perfurante contaminado em dois anos e apenas 44,8% notificaram suas exposições. Dentre os expostos, 68,7% sofreram mais de   um acidente com agulha; 24,9% mais de um com material perfurante e outros 6,4% mais de um acidente com ambos(27).
            As limitações deste estudo são apontadas pela coleta de dados ter sido realizada em fonte secundária, podendo assim haver ausência de informações.
Esta pesquisa foi financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, Programa de excelência acadêmica - PROEX.

CONCLUSÃO

            A ocorrência de múltiplos acidentes ocupacionais é uma situação presente na realidade dos profissionais da saúde, e expõe com maior frequência o trabalhador a um risco de adquirir patógenos veiculados pelo sangue. Identificar os fatores envolvidos em sua recorrência é uma tarefa desafiadora, porém essencial para o planejamento de ações de prevenção e minimização de agravos.
Além disso, desvelar os motivos associados ao abandono do seguimento clínico podem contribuir para um plano de prevenção da transmissão desses patógenos podendo impactar significativamente na vida produtiva dos profissionais da saúde.

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*Graduada em Enfermagem, pela Universidade de São Paulo, em 2009- Mestre em Ciências pela escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Especialista em Controle de Infecção relacionado a assistência à saúde pela Universidade Federal de São Paulo, UNIFESP, 2014. Doutorado em andamento pelo Programa de Enfermagem Fundamental da escola de Enfermagem de Ribeiraão Preto da Universidade de São Paulo.
**Graduada em Enfermagem epal Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Doutora em Ciências da Saúde - (Professora Adjunto IV da Universidade Federal do Triângulo Mineiro) - Uberaba, MG - Brasil.
*** Enfermeira. Livre docência - (Professora Titular do Departamento de Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo) - Ribeirão Preto, SP - Brasil.

Recibido: 18/04/2019 Aceptado: 30/04/2019 Publicado: Abril de 2019


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