Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


O POLÍTICO NAS RELAÇÕES DE GÊNERO

Autores e infomación del artículo

Aurea Gardeni Sousa da Silva*

Michael Jhonatan Sousa Santos**

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

cereusjamacaru@gmail.com


Resumo: O presente artigo propõe um panorama acerca do posicioidnto do Estado brasileiro em face da violência doméstica contra a mulher no âmbito das relações de gênero, considerando que a essa instituição cabe regular a conduta dos membros da sociedade e que a lei Maria da Penha é uma ação Estatal para harmonizar as relações de gênero. Antes da promulgação da referida lei, e ao longo dos séculos, o Estado legitimou a opressão feminina, a condição subjugada relegada às mulheres. Assim, neste trabalho, abordamos o processo de construção da lei, destacando que não se deu apenas por livre iniciativa ou mera vontade do Estado brasileiro, mas em decorrência de pressões políticas de caráter internacional. O delineamento desse panorama possibilitou destacar mudanças processuais no atendimento às demandas relacionadas à violência contra mulher.  

Palavras-chave: Lei Maria da Penha. Política internacional. Relações de gênero.

Abstract: This article proposes a landscape about the position of the Brazilian State in the face of domestic violence against women in the context of gender relations, considering that this institution regulates the conduct of members of society and that the Maria da Penha law is an action To harmonize gender relations. Before the promulgation of this law, and over the centuries, the state legitimized female oppression, the condition subjugated relegated to women. Thus, in this work, we approach the process of construction of the law, noting that it was not only due to free initiative or mere will of the Brazilian State, but because of political pressures of an international character. The outline of this panorama made it possible to highlight procedural changes in meeting the demands related to violence against women.

Keywords: Law Maria da Penha. International policy. Relations of gender.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Aurea Gardeni Sousa da Silva y Michael Jhonatan Sousa Santos (2018): “O político nas relações de gênero”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (junio 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2018/06/relacoes-genero.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1806relacoes-genero


1 Introdução

Para o bom andamento de uma nação é preciso manter relações políticas amigáveis com outros países. Por isso, as sociedades têm se organizado em instituições internacionais para interferir em todos os aspectos da vida humana que ocasionam prejuízos para o bem-estar da humanidade. O Brasil participa de algumas dessas organizações, desde 1984, como o CLADEM (Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher), Cedaw (Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher) e CVM (Convenção de Belém do Pará). Todas as citadas buscam melhorar as condições de vida da mulher. Mas tal preocupação é relativamente recente no país.
A violência contra a mulher acontece na esfera privada, mas os problemas dela decorrentes se alastram por todos os ambientes sociais e se estendem além dos indivíduos envolvidos diretamente. O caráter pessoal das relações conjugais, onde acontece com mais frequência, e a divisão da sociedade nas instâncias privada e pública foram fatores que fizeram com do Estado não legislasse sobre as relações entre homem e mulher. Isso cooperou para o repúdio social relativo à questão da violência contra a mulher. Outro fator que contribui para isso, que pode ser entendido como um atraso quanto à criminalização da violência contra a mulher, é o fato de que a presença feminina em meios políticos, sobretudo na defesa dos seus interesses, é algo recente na história, que só ganhou força no século XX, até então as manifestações femininas eram pouco representativas, restritas a grandes centros. Além disso, a próprio construção do conceito de cidadão se deu de forma exclusiva, corroborando para a inércia do Estado nas circunstâncias de agressão contra mulher:

O conceito de cidadania é construído ao longo de toda a história do pensamento universal tomando por base o modelo masculino, voltado para atender aos interesses dos homens, na medida em que reflete, em todos os processos históricos de sua construção, a hierarquia sexual existente na sociedade, ou seja, a do patriarcado, diretamente relacionada as instâncias pública e privada. (CUNHA, 2007, p. 53)   

O espaço público sempre foi de domínio masculino. A busca pelo sustento para além do limiar doméstico o manteve desvinculado deste, o campo de suas ações não era a casa, a domesticidade estava inerente as mulheres, e aos acontecimentos domésticos atribuiu-se a significação de privado, onde o Estado não intervém: “O gênero feminino foi associado ao doméstico, ao privado e à intimidade emocional. O Gênero masculino assumiu o espaço externo como próprio, a fria competência para o trabalho [...]”. (CUNHA, 2007, p. 57).                         De acordo com Cunha (2007, p. 54), a partir de 1960, buscando redefinir os limites do público e do privado e resolver o impasse da divisão da sociedade em instância pública e privada, impedimento para o reconhecimento da igualdade entre os gêneros, os novos movimentos sociais, entre eles o movimento feminista, perceberam a importância de mostrar a interrelação entre estes espaços, enfatizando a urgência de politizar o privado. Antes de ser individual, o sujeito está dividido em gênero/raça/etnia e classe, “o pessoal é político”. Isso implica que a violência de gênero não tem caráter privado, mas público. Como resultado das atuações do movimento feminista, a violência doméstica ganhou visibilidade, emergindo do espaço privado, passando a ser enfrentada como um problema de ordem social, de ordem pública, principalmente porque a violência que se pratica contra mulher passou a ser um problema de saúde pública, transferiu-se do espaço privado para o espaço público. O seu caráter privado dificultava a percepção de sua natureza política. A família, lugar projetado como privado, e onde subentende-se harmonia, proteção, nega as características que lhe atribuíram: “nela, o poder não é distribuído de forma democrática, mas em função do sexo e da idade dos seus membros. A sociedade legitima essa divisão do poder e concede ao homem todas as condições para exercê-lo e fazer-se respeitado.” (Cunha, 2007, p.54 - 56)                                           Sobrepondo-se aos fatos que contribuíram para que crimes cometidos sob a égide do lar não aparecessem aos olhos da sociedade enquanto tal, Cunha (2007, p. 65) afirma que estamos no tempo em que a violência contra a mulher deixa de ser assunto privado, com o reconhecimento internacional de que esse tipo de violência é um problema que envolve diretamente a responsabilidade do Estado. A Anistia Internacional responsabiliza o Estado por todos os atos violentos praticados contra mulheres, independentemente do contexto em que foram cometidos e de quem quer que os tenha cometido. Os Estados são cúmplices dessa violência, na medida em que a mascaram e permitem sua continuidade, sem colocar obstáculos a sua progressão. Ainda uma Carta de Direitos Humanos é reivindicada, pela Anistia Internacional, com o objetivo de combater a violência exercida contra mulheres com a reafirmação de que face à lei, os Estados são responsáveis pela proteção das mulheres tanto em relação aos atos cometidos por representantes do próprio Estado quanto por indivíduos comuns.                                               
A criação do Estado pelo ser humano surge da necessidade de evitar a própria destruição no conflito de interesses de classes divergentes. Surgindo num contexto conflituoso, ele adquire uma característica “pacificadora”, coercitiva, para aqueles que violam a norma, ou para frear comportamentos que não são adequados para a sociedade. É uma instituição criada pelos sujeitos que passam a ser definidos por ela.

Está entre o conjunto de fenômenos e de instituições que concretizam a vida social, este conjunto de fenômenos e instituições é o resultado da “produção social da existência”, que engloba bens materiais e ideias, das quais os homens são autores no início, tornando-se depois totalmente determinados por essa produção. (MIALLE apud LAGAZZY, 1998, p.52)

Para Marx, o Estado representa o interesse das classes dominantes, a questão da violência contra a mulher não está ligada a problemas de classe, mas de gênero. E o gênero dominante é o masculino:

Não resta dúvida de que o Estado tem uma orientação masculina... se o macropoder é macho, branco e rico, o estado, instância cristalizada desse poder, só pode apresentar as mesmas características. Não quer dizer que ele seja estático, movido por relações sociais, está em permanente movimento. Nem sempre representa com a mesma força, os interesses dos machos, ricos e brancos. Embora visem a realização de seus interesses, cedem a pressões de segmentos da sociedade civil. Conduzido, em geral, por homens, este mesmo Estado não se apresenta, como masculino, chegando a absorver mulheres álibi, modeladas para respaldar a falocracia ou o androcentrismo. (ALMEIDA apud CUNHA, 2007, p. 67)

 Como um espaço predominantemente masculino, o Estado atestou a desigualdade entre os sexos e foi um dos meios pelo qual o homem manteve a mulher em condição subordinada: “Só em 1988 a igualdade entre homem e mulher no âmbito doméstico foi consagrada na Constituição. E até 2005 vigorava um inciso no Código penal que extinguia a punibilidade de um estuprador se ele casasse com a vítima ou se ela se casasse com outra pessoa.” (Revista Veja, ed. 1947, 15/03/2006)
A predominância masculina no Estado também desfavoreceu a mulher no desenvolvimento de políticas que as beneficiassem. Isso porque, conforme dito, sendo a esfera privada um ambiente tipicamente feminino, os fatos que nela sucediam não tinham relevância, apesar das consequências nefastas afetarem toda a sociedade e assim o Estado. 
Uma das reivindicações feministas é para que o Estado, “por meio de sua constituição artigo 226, parágrafo 8, cumpra a sua função de assegurar relações familiares harmoniosas.” (CUNHA, 2007, p.58). Sendo este o responsável por assegurar uma existência equilibrada a seus cidadãos e cidadãs e tomar providências quanto ao desequilíbrio e à ordem, o Estado brasileiro foi denunciado pela senhora Maria da Penha, pelas organizações internacionais de defesa dos direitos da mulher, CLADEM e CEJIL (Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional) como tolerante à violência sofrida pela senhora Maria da Penha cometida por seu ex-marido. Em consequência da denúncia, o país foi responsabilizado por não ter tomado providência na solução do caso em mais de 15 quinze anos, em parte do relatório 54/01 do Cladem, caso 12.051, lê-se o seguinte:                                                                     

[...] o Estado violou, em prejuízo da Senhora Maria da Penha              Maia Fernandes, os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial assegurados pelos artigos 8 e 25 da Convenção Americana, em concordância com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos, prevista no artigo 1(um) do referido instrumento e nos artigos II e XVII da Declaração, bem como no artigo 7 da Convenção de Belém do Pará. Conclui também que essa violação segue um padrão discriminatório com respeito a tolerância da violência doméstica contra mulheres no Brasil por ineficácia da ação judicial. A Comissão recomenda ao Estado que proceda a uma investigação séria, imparcial e exaustiva para determinar a responsabilidade penal do autor do delito de tentativa de homicídio em prejuízo da Senhora Fernandes e para determinar se há outros fatos ou ações de agentes estatais que tenham impedido o processamento rápido e efetivo do responsável; também recomenda a reparação efetiva e pronta da vítima e a adoção de medidas, no âmbito nacional, para eliminar essa tolerância do Estado ante a violência doméstica contra mulheres.1

A violência contra a mulher é reconhecida internacionalmente como violação dos direitos humanos. O Brasil, como membro das organizações de defesa dos direitos da mulher, estava obrigado a cumprir os acordos ratificados.  Fazendo parte dessas organizações e sendo atribuído ao Estado à responsabilidade pela violência contra a mulher, o governo brasileiro criou a Lei Maria da Penha de acordo com os termos da CEDAW.
Tratando-se da Lei e seus propósitos, torna-se relevante mencionar o posicioidnto de mulheres ocupantes de cargos de poder, no âmbito judiciário, visto se tratar de uma instituição do Estado. Nas palavras da promotora de justiça mato-grossense Lindinalva Rodrigues Corrêa:

A lei 11.340/2006 nasce com o desafio significativo de combater a violência de gênero, concebida como uma forma de dar significados às relações de dominação e poder que terminam por ensejar as desigualdades, que concederam, ao longo do tempo, aos homens funções nobres e valorizadas pela sociedade, restando às mulheres papéis menos apreciados social e culturalmente. A violência contra a mulher é um acontecimento extremamente complexo, com raízes profundas nas relações de domínios baseadas no gênero, interligadas à condição sexual da vítima, que independem das classes sociais culturais e encontram sua maior complexidade nas dificuldades para se conhecer a real magnitude do problema. Até o advento desta Lei, ela era vista como uma questão da esfera privada, que não dizia respeito ao poder público, o que promoveu a banalização do problema, gerando impunidade e mais violência. Décadas de submissão e desigualdades produziram uma espécie de empoderamento dos homens em relação às mulheres e junto com ele a ideia nefasta de que a mulher “sendo sua” estaria sujeita aos seus comandos e a todo tipo de violência, tidas como aceitáveis, ainda que de forma não expressa. Buscando equilibrar esta desigualdade de gênero, surge a lei Maria da Penha.

As palavras da promotora alcançam a amplidão do problema da violência contra a mulher e a missão da lei num contexto amplo onde mais que punir os agressores será necessário a reprovação ao padrão de dominação de um sexo sobre o outro.
A participação feminina nas esferas do poder é um fato recente, os homens sempre estiveram maciçamente em todas as instituições, sendo assim todas as permissões eram por eles consentidas. O destino da mulher estando, irremediavelmente, em poder dos homens demonstra que a evolução da sua condição foi antes uma necessidade masculina também, não convinha ter ao seu lado uma criatura inepta, débil, impedida de estruturar-se em todos os aspectos, principalmente intelectualmente:

                                       [...] através de uma anexação total, a mulher seria rebaixada ao nível de uma coisa; ora, o homem pretende revestir de sua própria dignidade o que conquista e possui [...] como fazer da esposa ao mesmo tempo uma serva e uma companheira, eis um dos problemas que procurará resolver; sua atitude evoluirá através dos séculos, o que acarretara também uma evolução no destino feminino. (BEAUVOIR, 1949, p.102)

Assim como não convém à sociedade a permanência e a conivência com a dominação masculina, uma vez que ela lhe prejudica duplamente com reparação de danos causados pelas agressões e pelo que as mulheres deixavam e deixam de desenvolver por terem menos oportunidades, e estarem em condição submissa. A existência feminina como imprescindível para a existência masculina, torna necessário a supressão de padrões como o patriarcal, porque atrasam as mudanças que contribuem para o crescimento humano.       
A participação da mulher na produção a partir do século XIX encaminhou a sociedade para destinos que alteraram sua condição, uma existência parasitária não lhes convém, restringi-las ao pai ou ao marido não permite a exploração do seu trabalho, de suas capacidades em prol da sociedade. O prejuízo e o crescimento que impede a continuação da subjugação feminina explicita-se no texto do acordo da CEDAW e os países participantes:

 A discriminação contra a mulher viola os princípios de igualdade de direitos e do respeito à dignidade humana, dificulta a participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social, econômica e cultural de seu país, constitui um obstáculo ao aumento do bem-estar da sociedade e da família e dificulta o pleno desenvolvimento das potencialidades da mulher para prestar serviço ao seu país e à humanidade. (CEDAW, 2018)

Em Roma, quando a soberania patriarcal se tornou incômoda para o Estado, restringiu-se o poder do homem sobre a mulher dentro da família e passou ao Estado, com a criação da lei Maria da Penha, no Brasil, dá-se um processo similar, pois a criação da lei é uma limitação da extensão do poder masculino, uma restrição à disposição do uso das mulheres como bem entendiam os homens.

2 Percurso de criação da Lei Maria da Penha

            A lei Maria da Penha, nº 11.340, foi criada em 07 de agosto de 2006 com o objetivo de punir e erradicar a violência doméstica contra a mulher no Brasil. Produto de um demorado processo de elaboração, a lei regulamenta meios para punir, combater, prevenir e erradicar esta violência no país. Sua criação envolveu a pressão de órgãos internacionais de defesa dos direitos da mulher, a luta de movimentos feministas e a luta pessoal da senhora Maria da Penha Maia.                         
A violência doméstica afeta social e economicamente os lugares em que ocorre, o Brasil registra uma perda de 10,5% do PIB como consequência da violência contra a mulher. Com tantos prejuízos, a intervenção do Estado reconhecendo a gravidade do problema e tomando providências para solucioná-lo, tornou-se imprescindível, considerando os extremos que relatam as denúncias, a tão recente promulgação da lei está aquém da urgência do problema.                                                                                                                  
O Brasil tem em 1984 um ano destaque na tomada de posição em defesa das mulheres. Neste ano, em 1º de fevereiro de 1984, aconteceu a ratificação da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher – Cedaw (Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against Women), com reservas a alguns dispositivos. Em 1994, tendo em vista o reconhecimento pela Constituição Federal Brasileira de 1988 da igualdade entre homens e mulheres, em particular na relação conjugal, o governo brasileiro retirou as reservas. Para a, e na Cedaw:

                                    [...] a participação máxima da mulher, em igualdade de condições com o homem, em todos os campos, é indispensável para o desenvolvimento pleno e completo de um país, para o bem-estar do mundo e para a causa da paz. [...] a discriminação contra a mulher viola os princípios de igualdade de direitos e do respeito à dignidade humana, dificulta a participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social, econômica e cultural de seu país, constitui um obstáculo ao aumento do bem-estar da sociedade e da família e dificulta o pleno desenvolvimento das potencialidades da mulher para prestar serviço ao seu país e à humanidade. (CEDAW, 2018)

Outro importante passo deu-se com a participação do Brasil na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – conhecida como "Convenção de Belém do Pará"(CVM), adotada pela Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos - OEA, em 6 de junho de 1994, e ratificada pelo Brasil em 27 de novembro de 1995. O tratado complementa a CEDAW e reconhece que a violência contra a mulher constitui uma violação aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, de forma a limitar total ou parcialmente o reconhecimento, gozo e exercício de tais direitos e liberdades.                Entre as afirmações do seu texto está que "a violência contra a mulher é uma ofensa à dignidade humana e uma manifestação de relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e homens" (BRASIL, 2018) , para então concluir que a "adoção de uma convenção para prevenir, punir e erradicar toda forma de violência contra a mulher, no âmbito da Organização dos Estados Americanos, constitui uma contribuição positiva para proteger os direitos da mulher e eliminar as situações de violência que possam afetá-las"(BRASIL, 2018).      Em 28 de junho de 2002, o Brasil fez a ratificação Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW), que ofereceu a possibilidade de as denúncias individuais serem submetidas ao Comitê. Esse mecanismo adicional firmado pelo país veio fazer parte da sistemática de fiscalização e adoção de medidas contra Estados assinantes desses acordos internacionais que estejam condescendentes com casos isolados de discriminação e violência contra a mulher. Como parte dos acontecimentos que resultaram na criação da Lei Maria da Penha temos o próprio caso Maria da Penha. Maria da Penha sofreu duas tentativas de homicídio por parte de seu, na época, esposo, Marco Antônio Heredia Viveiros. Na primeira vez ele tentou assassiná-la com um tiro de escopeta, incidente este que a deixou paraplégica, a segunda vez, logo após o retorno do hospital, ele tentou eletrocutá-la durante o banho. Em 20 de agosto de 1998, a senhora Maria da Penha Maia Fernandes juntamente com o Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) apresentaram denúncia a Comissão Interamericana de Direitos Humanos – OEA,( órgão internacional responsável pelo arquivamento de comunicações decorrentes de violação desses acordos internacionais), alegando a tolerância brasileira, do Estado, para com a violência cometida pelo ex esposo da Sr.ª Maia. Tendo o Brasil ratificado acordos com estes órgãos internacionais de defesa dos direitos da mulher, a maneira como foi conduzido o caso Maria da Penha, e provavelmente muitos outros, implica no descumprimento desses acordos:

                           Denuncia-se a tolerância do Estado, por não haver efetivamente tomado por mais de 15 anos as medidas necessárias para processar e punir o agressor, apesar das denúncias efetuadas. Denuncia-se a violação dos artigos 1(1) (Obrigação de respeitar os direitos); 8 (Garantias judiciais); 24 (Igualdade perante a lei) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, em relação aos artigos II e XVIII da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (doravante denominada "a Declaração"), bem como dos artigos 3, 4,a,b,c,d,e,f,g, 5 e 7 da Convenção de Belém do Pará.” (COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2000)

Após a denúncia além de ser responsabilizado por negligência e omissão em relação à violência doméstica, o Estado brasileiro recebeu algumas recomendações de providências a serem tomadas na adoção de medidas emâmbito nacional. O envolvimento do país nas organizações que têm como propósito erradicar a violência contra a mulher demonstra interesse e preocupação na solução do problema. Mas as providências tomadas até então, nos casos de agressão, pouco ou nada mudaram a situação. Para uma ação eficiente do Estado seria necessária uma rejeição social à manifestação da violência contra a mulher. Passo difícil de ser alcançado, pois muitas situações que caracterizam violência são banalizadas e corriqueiras, socialmente toleradas, não se caracterizam como agressivas e violentas:       

O silêncio em torno desse tipo de violência é resultado de um poderoso coquetel cultural, que coloca a mulher em situação inferior à do homem e, no caso da relação conjugal, mais do que isso. Na cultura patriarcal, o marido acha que tem plenos poderes sobre a mulher. Essa situação banaliza a violência como algo que “faz parte”, tenta-se colocar no mesmo nível os embates verbais mais acalorados que ocorrem em qualquer casamento e agressões físicas que vão de safanões e puxões de cabelo a assassinatos. (SOARES, 2006, p. 57).

Em 17 de junho de 2004, a edição da lei. 10.886 altera o Código Penal de 1940 "acrescentando parágrafos ao art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, criando o tipo especial denominado ‘Violência Doméstica’."O artigo lei modificado trata do crime de lesão corporal e, entre os tipos contemplados, está à tipificação do crime que passou a ter como denominação legal de "violência doméstica", sendo, pois, a lesão corporal praticada "contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade", estabelecendo pena de detenção de seis meses a um ano, intensificada em um terço, quando a violência doméstica praticada for de natureza grave.  
Esta tentativa de cumprimento dos tratados e convenções assinados trouxe uma incoerência diante das determinações destes, resolvida após a sanção da lei Maria da Penha. Com esta lei, a pena máxima fixada em um ano, a violência doméstica equiparada à lesão corporal leve e colocada no rol de delitos de menor potencial ofensivo foi questionada. A CEDAW redefiniu a violência doméstica e a discriminação contra a mulher como violação dos Direitos humanos. Assim, a comunidade internacional reconheceu a fundamental importância dos Direitos Humanos, bem como a necessidade de repressão na violação destes, dessa forma não poderia ser admitido que os casos de violência doméstica permanecessem entre os delitos de menor potencial ofensivo.
Anterior a esta polêmica, os crimes de violência doméstica eram encaminhados para os Juizados Especiais, criados com a aprovação da Lei 9.099/95. Este procedimento serviu apenas como porta de acesso ao Poder Judiciário para as mulheres vítimas dessa violência, sem suprir a real exigência dos casos de agressão. O resultado deste processo foi a impunidade e a baixa repressão aos agressores. Os métodos da lei 9.099/95 por mais louváveis que fossem não supriam a necessidade de justiça das vítimas e de repressão dos agressores.                                                                                                                         Entre as esferas sociais mobilizadas, a magistratura empenhou-se para que a estrutura pública estatal adotasse medidas de combate à violência contra a mulher, aderiu a tendência mundial com decisões jurisprudenciais modelo, mas que para sua execução não dependem apenas do estado ou do poder judiciário. Em certos contextos, este empenho é barrado pela cumplicidade social, presa a padrões unilaterais ultrapassados.      
Com a finalidade de apresentar uma ampla visão da sensibilização jurisdicional brasileira, o país apresentou um relatório ao Comitê para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, em de 7 de julho de 2003 (apud ALVES, 2006), em que o seguinte relata caso:

Em 1991, o Superior Tribunal de Justiça anulou a decisão do Júri Popular de uma cidade do sul do país que absolveu réu acusado de ter assassinado sua ex-mulher, recorrendo à chamada "tese da legítima defesa da honra". O STJ definiu que essa argumentação de defesa não constitui tese jurídica, revelando tão somente uma concepção de poder do homem contra a mulher e manifestou-se pela anulação do julgamento. No entanto, em novo julgado o Júri Popular dessa mesma cidade absolveu o réu, sem que o Superior Tribunal pudesse modificar tal decisão face à soberania do Júri Popular. Assim, apesar de nos grandes centros urbanos do país esse argumento de defesa estar em desuso, em grande parte pela pressão dos movimentos feministas e de mulheres, ainda, em muitas cidades do interior, advogados de defesa continuam utilizando tal tese, para sensibilizar o júri popular ainda orientado por visões preconceituosas e discriminatórias contra as mulheres.

Para Alves:      

[...] além da sensibilização do Poder Judiciário, faz-se necessário um amplo processo de educação popular, através de campanhas na mídia que atinjam toda a sociedade brasileira, no sentido de mudar mentalidades e dar amplo conhecimento aos instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos, em especial, aos direitos humanos das mulheres (ALVES, 2006).

Todas as tentativas de repressão e punição para os responsáveis por delitos como a violência contra a mulher foram, contudo, ineficientes. Por isso, ainda caminhando na direção da solução do problema da violência doméstica, o país passou a discutir as imprescindíveis e profundas alterações no papel jurisdicional do Estado para redefinir sua atuação na repressão a tal conduta. Com essa finalidade, foi criado o Grupo de Trabalho Interministerial, composto pelos seguintes órgãos: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) da Presidência da República (coordenação); Casa Civil da Presidência da República; Advocacia-Geral da União; Ministério da Saúde; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República; Ministério da Justiça e Secretaria Nacional de Segurança Pública.
Segundo Alves (2006), como resultado deste esforço da SPM surgiu o projeto de lei n° 4.559, de 2004, encaminhado ao Congresso pelo presidente da República em 3 de dezembro daquele ano. Muitas inovações foram propostas no Projeto de Lei 4.559/04: definição de violência doméstica e familiar contra a mulher em cada uma de suas manifestações: física, sexual, psicológica, moral e patrimonial; equiparação desse tipo de violência a uma das formas de violação dos direitos humanos; alterações no procedimento das ocorrências que envolvam a violência doméstica e familiar contra a mulher, quanto ao atendimento da autoridade policial; estabelecimento de amparo à vítima através do atendimento por equipe multidisciplinar, formada por profissionais de diversas áreas de conhecimento, como psicólogos, assistentes sociais e médicos; participação ativa e mais veemente do Ministério Público nas causas envolvendo essa forma de violência; ampliação das formas de medida cautelares em relação ao agressor e de medidas de proteção à vítima com efeitos cíveis e penais; acréscimo de nova hipótese de prisão preventiva, quando o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, qualquer que seja a pena aplicada; entre outras medidas importantes.                 
Entre os objetivos do Poder Executivo estava o resgate do inquérito policial previsto no Código de Processo Penal para abolir o Termo Circunstanciado previsto na lei nº 9.099/95, objetivando permitir uma visão mais aprofundada dos fatos à autoridade judicial. Excluir a vedação à prisão em flagrante e permitir a decretação de prisão preventiva, resgatando-se esses procedimentos para os crimes de violência doméstica contra a mulher. Providenciar para que vítima passasse por uma audiência de apresentação, na qual seria ouvida pelo juiz antes do agressor e diante de uma intenção conciliadora, não à induzirem a fazer acordos. Audiência esta que só poderia ser dirigida por juiz ou bacharel em Direito capacitado na questão desse tipo de violência.                                                
Sendo estas as principais alterações propostas pelo Poder Executivo, muitas mudanças à proposta original foram implementadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. A Câmara dedicou-se às alterações de mérito por intermédio de três comissões analisadoras. Em mais de 14 reuniões, seminários e audiências públicas realizados em todo o País, foram incorporados ao projeto os verdadeiros anseios das entidades representativas das mulheres.                                                                                              
O Senado, através de sua Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, promoveu uma revisão no projeto, chamando-o PLC 37, de 2006. As mudanças incluídas pelo senado   foram redacionais, objetivando enxugar e harmonizar o texto, permitindo sua execução social com clareza e precisão, como, aliás, reza a lei complementar nº. 95, de 1998.           Dessa forma, o país atendeu as pressões internacionais dos órgãos de defesa dos direitos da mulher, em amparar ainda que de forma parcial suas cidadãs, pois somente a promulgação da lei não resolveria os problemas das relações de gênero. 

3 O tratamento processual da violência contra a mulher através da Lei Maria da Penha

            A Lei Maria da Penha, nº 11.340 – 2006, conforme dito, impõe à sociedade uma nova postura diante das relações homem e mulher, a dominação e o privilégio masculino não mais convém às demandas da sociedade do século XXI. A sanção da lei é o reconhecimento da violência contra a mulher como crime. As mudanças trazidas são um posicioidnto veemente de rejeição ao papel patriarcal que muitas vezes o homem tem dentro do lar e da sociedade. Através da lei procura-se dar oportunidades iguais a ambos os sexos e criar meios para que a sociedade mude as imagens do que é ser homem e do que é ser mulher.                           
Entre as principais mudanças no atendimento às vítimas de violência estão as medidas protetivas de urgência inclusas no capitulo II, dos artigos 18 ao 24, medidas que obrigam: suspensão da posse ou restrição do porte de armas; o afastamento do agressor do lar; proibição de determinadas condutas, entre as quais; aproximação da mulher, familiares, testemunhas, fixando o limite mínimo de distância; contato com a mulher, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; restrição ou suspensão de visitas aos filhos menores e ainda o agressor poderá ser preso em flagrante e sua prisão preventiva poderá ser decretada pelo juiz, quando houver riscos à integridade física ou psicológica da vítima.                           Nos casos de violência contra a mulher, de acordo com a nova Lei, o atendimento policial deverá disponibilizar à vítima a proteção necessária, encaminhamento ao atendimento médico e ao Instituto Médico Legal (para exames de corpo de delito). O transporte a abrigos seguros, em caso de risco de morte, o acompanhamento para a retirada de seus pertences de sua casa e o acesso à informação sobre seus direitos e aos serviços de reparação disponíveis.        A lei prevê que, em todas as audiências, a mulher esteja acompanhada de advogado ou defensor habilitado e o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação comportamental, bem como especificações sobre a violência doméstica e as formas da violência:

Para efeitos desta lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: Art.7º São formas de violência contra a mulher,
I– a violência física, entendida como   qualquer conduta que  ofenda sua integridade ou saúde corporal; II- a violência psicológica, entendida como qualquer conduta  que lhe cause danos emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularizarão, exploração e limitação do direito de ir e vir ou a qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar , a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar de qualquer modo sua sexualidade, que a impeça de usar  qualquer método contraceptivo ou que force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades. V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

 A retirada da violência contra as mulheres do rol de “delitos de menor potencial ofensivo”, na qual era equiparada à briga de vizinhos e aos acidentes de trânsito, garante uma maior atenção e a não banalização dos atos de violência. Era aplicada a esses casos a lei dos juizados especiais criminais que julgam crimes com pena de até dois anos ou chamadas “menor potencial ofensivo.” A pena máxima até agosto de 2006 para a violência doméstica era de 1 ano e o mínimo de seis meses; as penas agora foram triplicadas: o tempo mínimo de três meses e máximo de três anos. Além disso, proibiu-se a aplicação de penas pecuniárias como pagamento de cestas básicas e multas.

Art. 17 É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, depenas de cesta básica ou outra de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.

A lei determina que a violência doméstica independe da orientação sexual. Antes não havia tratamento das relações de pessoas do mesmo sexo.

Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem da orientação sexual.

Os juizados especiais criminais da lei 9099/95 tratavam apenas do crime. Uma das novas determinações é a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar com competência cível para abranger todas as questões do caso como separação, pensão, guarda dos filhos. Até então a mulher agredida teria que ingressar com um novo processo na vara da família.

                                          Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher. 

Em conformidade com o artigo 14, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso foi pioneiro no país quando em 22/09/2006, data em que a Lei entrou em vigor, instalou duas varas especializadas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher em Cuiabá.  No mesmo período, direcionou para Várzea Grande e Rondonópolis, as próximas cidades do estado a terem a Vara com atendimento especializado.
Como sempre, houve muitas desistências das denúncias nas próprias delegacias. Agora é vedada à autora a desistência da denúncia a não ser perante um juiz.

Art. 16 - Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

Outra mudança introduzida pela lei foi a proibição da entrega da intimação, pela própria vítima, ao seu agressor. Entre as obrigações da justiça, com a nova Lei, está a de notificar a mulher dos atos processuais tanto quanto da entrada e saída da prisão do agressor.

Art.21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público.

Alteração do artigo 61 do Código Penal, que torna a violência doméstica agravante de pena:

Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não  constituem ou qualificam o crime: (Alterado pela L-007.209-1984)
II - ter o agente cometido o crime:                                                                  f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações  domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; (Alterado pela L-011.340-2006)

                     Ainda se verifica na lei, o aumento da pena em 1/3, quando a agressão for cometida contra mulher portadora de deficiência.

4 Considerações finais

Como procuramos demonstrar neste trabalho, a Lei nº 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, surgiu da confluência de problemas sociais e culturais internos ao Brasil, quais sejam a violência física contra a mulher e um comportamento coletivo, tácito ou não, que legitimou tal violência, com a pressão externa de organizações internacionais de monitoramento dos direitos humanos.
Segundo a narrativa que aqui propomos, a Lei Maria da Penha é efeito dessa pressão internacional. A tese que aqui se procurou defender é a de que o fato de o Brasil haver assumido o compromisso de defender os direitos das mulheres decorreu da necessidade de estabelecer relações políticas internacionais amistosas com países que já haviam se posicionado quanto ao tema. Isso implica dizer que, dentre outros apontamentos realizados, a lei não decorreu do reconhecimento da situação de opressão da mulher como uma problemática que mereça atenção estatal, genuiidnte, que só ocorreu quando motivações políticas, baseadas, via de regra em questões econômicas, se fizeram sentir.   
Nesse sentido, atualmente, à Lei Maria da Penha cabe fazer oposição a relações de gênero baseadas na dominação masculina, ao mesmo tempo que se insere no âmbito das lutas dos movimentos feministas que visam construir uma sociedade na qual o ser mulher não seja uma extensão dos desejos e necessidades masculinas. Trata-se, portanto, de uma lei que busca reestruturar padrões comportamentais socialmente aceitos, mais do que apenas punir as ações de violência, busca desconstruir as condições sociais que possibilitam a existência de tais ações.

 

5 Bibliografia

 

ALVES, M. F. Lei Maria da Penha: das discussões à aprovação de uma proposta concreta de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8764/lei-maria-da-penha . Acesso em: 27/05/2018.

BEAUVOIR, Simone de. O Segundo sexo – Fatos e Mitos. Tradução de Sérgio Milliet. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1949.

BENTES, Anna Christina: MUSSALIM, Fernanda. Introdução à Linguística – domínios e fronteiras (orgs.)  4. ed.  São Paulo: Cortez, 2004.

BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. 7 ed.  Campinas, SP: Editora da Unicamp.

BRASIL. Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-humanos-e-politica-externa/ConvIntVioMul.html . Acesso em: 27/05/2018.

BRASIL. Código penal. Brasília, 2017. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/529748/codigo_penal_1ed.pdf . Acesso em: 27/05/2018.

CEDAW. Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/discrimulher.htm  Acesso em: 27/05/2018.

COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Relatório nº 51/01: caso Maria da Penha Maia Fernandes. 2000. Disponível em: https://www.cidh.oas.org/annualrep/2000port/12051.htm . Acesso em: 27/05/2018. 

CUNHA, Tânia Rocha de Andrade. O preço do Silêncio: Mulheres ricas também sofrem violência. – Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007.

LAGAZZY, Suzy Rodrigues. ORLANDI, Eni Pucinelli. (orgs). Discurso e Textualidade: Introdução as ciências da Linguagem – Campinas, SP : Pontes, 2000.

LAGAZZY, Suzy Rodrigues. O Desafio de dizer não. – Campinas, SP: Ponte, 1998.

MARX, K. ENGELS, F. A Ideologia Alemã. 5 ed. São Paulo : Hicitec, 1986

ORLANDI, Eni Pucinelli. Análise do Discurso: princípios e procedimentos  Campinas, SP: Pontes, 2000.

ORLANDI, Eni Pucinelli. Discurso e Texto: formulação e Circulação dos sentidos. Campinas, SP: 2001.

ORLANDI, Eni Pucinelli. A Linguagem e seu Funcioidnto: As formas do Discurso. 4 ed. – São Paulo: Pontes, 1996.

PÊCHEUX, Michel. O Discurso: Estrutura ou acontecimento. Trad. Eni Puccinelli Orlandi. 3ª ed. Campinas, SP: Pontes, 2002.

SOARES, Fernanda. O fim do silêncio. In: Revista Veja ed. Ano 39, 2006.

* Professora da rede estadual de ensino do estado de Mato Grosso desde 2008. Especialista em Relações Raciais e Educação na Sociedade Brasileira NEPRE/ UAB - UFMT (2013). Mestre em Educação pelo Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso (PPGE-UFMT). cereusjamacaru@gmail.com
** Professor EBTT de português e literatura do quadro efetivo do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT - Campus Primavera do Leste), doutorando em Estudos de Literários na UFMT (quadriênio 2017-2020), michael_jhonatam@hotmail.com
1 Comissão Internacional de Direitos Humanos. Disponível em: https://www.cidh.oas.org/annualrep/2000port/12051.htm . Acesso: 17/05/2018.
2 Revista Tribuna Livre, ed. 8, julho de 2007- pg. 8-9.

Recibido: 29/05/2018 Aceptado: 05/06/2018 Publicado: Junio de 2018


Nota Importante a Leer:
Los comentarios al artículo son responsabilidad exclusiva del remitente.
Si necesita algún tipo de información referente al articulo póngase en contacto con el email suministrado por el autor del articulo al principio del mismo.
Un comentario no es mas que un simple medio para comunicar su opinion a futuros lectores.
El autor del articulo no esta obligado a responder o leer comentarios referentes al articulo.
Al escribir un comentario, debe tener en cuenta que recibirá notificaciones cada vez que alguien escriba un nuevo comentario en este articulo.
Eumed.net se reserva el derecho de eliminar aquellos comentarios que tengan lenguaje inadecuado o agresivo.
Si usted considera que algún comentario de esta página es inadecuado o agresivo, por favor, escriba a lisette@eumed.net.

URL: https://www.eumed.net/rev/caribe/index.html
Sitio editado y mantenido por Servicios Académicos Intercontinentales S.L. B-93417426.
Dirección de contacto lisette@eumed.net