Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


AÇÃO COLETIVA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ATES: REFLEXÕES SOBRE EXPERIÊNCIAS NO PROJETO DE ASSENTAMENTO SURUBIM, MEDICILÂNDIA – PARÁ

Autores e infomación del artículo

Luiz Carlos Bastos Santos*

Universidade Federal do Pará, Brasil

luizcarlosbs@ufpa.br.


RESUMO
Muitos países sofreram críticas por terem seus modelos de assistência técnica e extensão rural considerados esgotados. Emergia a necessidade por transformações que resultaria em mudança, sendo indispensável a participação dos principais envolvidos e de novos modelos institucionais de parcerias entre instituições goveridntais, não goveridntais, agricultores e suas organizações. Nesse contexto, este trabalho tem como objetivo caracterizar a participação dos atores envolvidos na ação coletiva para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural, no Projeto de Assentamento Surubim, no município de Medicilândia, estado do Pará. Além de fazer uma breve discussão sobre a abordagem participativa na construção de demandas de serviços dessa natureza. A metodologia utilizada na construção desse trabalho ocorreu através do levantamento de dados bibliográficos e de relatórios e anotações de trabalhos desenvolvidos no Projeto de Assentamento Surubim, a fim de obter registros de ações desenvolvidas. Como resultado, verificou-se que houve uma ação coletiva que envolveu organizações goveridntais, não goveridntais, agricultores e suas organizações em busca de um objetivo comum, que era a execução de serviços de assistência técnica e extensão rural a assentados da reforma agrária no município de Medicilândia, no estado do Pará. Por fim, considerou-se que foi possível compreender que o processo participativo de construção da demanda de serviços de ATES, no caso apresentado por este trabalho, esteve alicerçado de ações conjuntas em busca de um objetivo comum, portanto, passível de compreendê-la como propulsora de uma ação coletiva.
Palavras-chave: Abordagem Participativa. Assistência Técnica. Assentamento Rural. Desenvolvimento Sustentável. Amazônia.

ABSTRACT
Many countries have been criticized for having their models of technical assistance and rural extension considered exhausted. The emergence of the need for transformations that would result in change was indispensable for the participation of the main stakeholders and for new institutional models of partnerships between governmental and non-governmental institutions, farmers and their organizations. In this context, this work aims to characterize the participation of the actors involved in the collective action for the provision of technical assistance and rural extension services in the Surubim Settlement Project in the municipality of Medicilândia, state of Pará. In addition to making a brief discussion on the participatory approach in the construction of service demands of this nature. The methodology used in the construction of this work was done through the collection of bibliographic data and reports and annotations of works developed in the Surubim Settlement Project, in order to obtain records of actions developed. As a result, there was a collective action involving governmental, nongovernmental organizations, farmers and their organizations in pursuit of a common goal, which was to implement technical assistance and rural extension services to agrarian reform settlers in the municipality of Medicilândia, in the state of Pará. Finally, it was considered that it was possible to understand that the participatory process of construction of the demand for ATES services, in the case presented by this work, was based on joint actions in search of a common objective, therefore, capable of understanding it as a propeller of collective action.
Key Words: Participatory Approach. Technical Assistance. Rural Settlement. Sustainable Development. Amazon.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Luiz Carlos Bastos Santos (2018): “Ação coletiva na prestação de serviços de Ates: reflexões sobre experiências no projeto de assentamento Surubim, Medicilândia – Pará”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (junio 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2018/6/prestacao-servicos-ates.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1806prestacao-servicos-ates


INTRODUÇÃO
            Muitos países sofreram críticas por terem seus modelos de assistência técnica e extensão rural considerados esgotados. Emergia a necessidade por transformações que resultaria em mudança sendo indispensável a participação dos principais envolvidos e de novos modelos institucionais de parcerias entre instituições goveridntais, não goveridntais, agricultores e suas organizações. Dessa forma esses serviços passaram a ser orientados pela demanda do cliente em substituição ao modelo praticado em que havia uma intervenção do Estado. O projeto Lumiar foi criado para atender a uma clientela especial, os agricultores familiares assentados em áreas da reforma agrária, como proposta diante a crise da assistência técnica e extensão rural estatal no Brasil (SCHMITZ; MOTA; MAGALHÃES, 2010, p. 155-156).
            A criação de cooperativas de prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural, por técnicos dessa área profissional, foi uma alternativa que possibilitou a não execução exclusiva desses serviços com recursos públicos por empresas do Estado. A Cooperativa de Prestação de Serviços em Desenvolvimento Sustentável, Técnico e Social da Agricultura (COODESTAG) era uma cooperativa de serviço1 , que atuou ao longo da Transamazônica nos municípios de Pacajá, Uruará e Medicilândia, durante as décadas de 1990 e 2000.
No período de 1997 a 2000, os técnicos da COODESTAG realizavam suas atividades através do Projeto Lumiar. De acordo com Schmitz, Mota e Magalhães (2010, p. 156), a proposta do projeto “[...] é que os assentados contratem a assistência técnica que será paga pelo INCRA na medida em que os assentados aprovem oficialmente a qualidade dos serviços prestados”. Schmitz (2010, p. 174), evidencia que “O Projeto Lumiar pretende melhorar a assistência técnica não apenas em termos quantitativos, mas também em termos qualitativos, orientando o desenvolvimento sustentado dos assentamentos”.
Porém, após o ano 2000, houve o encerramento do referido projeto e a Cooperativa continuou desenvolvendo suas atividades com base naquele mesmo modelo, para isso foi acessado recursos do Governo Federal para prestação de serviços de Assessoria Técnica, Social e Ambiental (ATES) em projetos de assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) por meio de processos licitatórios na modalidade concorrência pública.
Nesse contexto, este trabalho tem como objetivo caracterizar a participação dos atores envolvidos na ação coletiva para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural, no projeto de assentamento Surubim, no município de Medicilândia, estado do Pará. Além de fazer uma breve discussão sobre a abordagem participativa na construção de demandas de serviços dessa natureza.
A produção deste trabalho foi motivada a partir de reflexões sobre propostas de atividades acadêmicas relacionadas a disciplina Ação Coletiva no Espaço Rural, ministrada pelo professor doutor Heribert Schmitz. Naquela ocasião, me senti instigado a aprofundar em leituras referentes a modelos de ações conjuntas em busca de um objetivo comum. Naquele momento senti algo muito familiar e resgatei minha experiência profissional na função de técnico, junto a COODESTAG, no município de Medicilândia, ocorrida no período de outubro de 2004 a junho de 2008 onde tive a oportunidade de presenciar a execução do modelo de assistência técnica e extensão rural em que as atividades direcionadas aos beneficiados eram demandadas por eles mesmos através de seus representantes. A execução de todo esse processo envolvia diversos atores com diferentes formas de atuação a fim de assegurar a oferta de um serviço de qualidade para aqueles assentados da reforma agrária.
A metodologia utilizada na construção desse trabalho contou inicialmente com o levantamento de referências que tivesse uma abordagem dirigida a temática aqui estudada, e que apresentassem experiências que permitissem o estabelecimento de um diálogo afinado sobre o assunto. Nesse sentido, é relevante enfatizar sobre a dificuldade em encontrar trabalhos que possuam harmonia com esse tema especifico, mas aqueles que foram acessados têm uma forte sintonia com a proposta aqui trabalhada.
Após a oxigenação teórica em livros e periódicos científicos, o passo seguinte foi realizar um levantamento de dados secundários, em relatórios e anotações de trabalhos desenvolvidos no Projeto de Assentamento Surubim, a fim de obter informações da época em que a COODESTAG esteve atuante e que tivesse relação com a proposta deste trabalho.
Considerando que o modelo de assistência técnica e extensão rural no Brasil vêm passando por significativas transformações ao longo das últimas décadas, considerou-se relevante apresentar a experiência da COODESTAG que prestou serviço de ATES por meio de convênio com o INCRA aos assentados do Projeto de Assentamento Surubim, no município de Medicilândia, no estado do Pará, durante os anos de 2004 a 2008. Assim, busca-se nesse trabalho evidenciar os seguintes questioidntos: Quais e como os atores participavam desse modelo de assistência técnica e extensão rural? Como a COODESTAG construía sua demanda de trabalho para a prestação de serviços junto aos seus clientes?

2 AÇÃO COLETIVA: BREVE APRESENTAÇÃO TEÓRICA
Existe um grande debate sobre a dificuldade na gestão de recursos naturais de uso comum. Hardin (2002) em seu trabalho “A tragédia dos comuns” alertava para a desproporção existente entre o crescimento exponencial da população, que se apropriavam dos recursos naturais de uso comum, apontados como finito. Dessa forma esses recursos estariam sujeitos à degradação (HARDIN, 2002, p. 34).
Entende-se que para a solução daquele problema são sugeridas duas possibilidades, sendo elas: a “estatização” ou a “privatização” da gestão dos recursos naturais. Porém, algum tempo depois, reconheceu-se outra possibilidade, a “propriedade comum”, com potencial viabilidade mediante “arranjos sociais” onde instituições criam responsabilidades por meio de “coerção mútua”. Para a criação desses arranjos, no entanto, exige ação coletiva (FEENY et al. 2001; CUNHA, 2002).
Cunha (2002) faz uma abordagem sobre a racionalidade individual e a racionalidade coletiva. Para o autor é na contradição entre essas duas racionalidades que está à base dos dilemas da ação coletiva. Interpreta-se assim que um indivíduo envolvido numa ação coletiva pode preferir romper com o acordo e garantir a aquisição de benefícios, por mais que estes sejam inferiores aqueles previstos por meio da cooperação. (CUNHA, 2002, p. 55).
Naquela interpretação é possível visualizar a figura do “free rider”2 , um dos elementos apontado como o problema da cooperação, isto é, quando o individuo opta por descumprir as regras estabelecidas para o uso proporcional dos recursos de uso comum, ele está colocando em risco a sustentabilidade do sistema e consequentemente provocando prejuízos aos demais membros que participam do uso compartilhado.
Nesse cenário de interpretações sobre as abordagens dos autores apresentados nesse tópico, é possível considerar que grupos com objetivos comuns passam a estabelecer uma relação na busca para alcançar um resultado que satisfaça a todos aqueles envolvidos na demanda proposta. Sendo necessário para tanto o estabelecimento de regras, assim como o seu monitoramente, a fim de evitar que interesses individuais se sobreponham aos interesses coletivos e provoquem resultados desproporcionais para os membros envolvidos.

3 AÇÃO COLETIVA PARA EXECUÇÃO DA ATES NO P A SURUBIM: IDENTIFICAÇÃO E DESCRIÇÃO DAS AÇÕES DOS ATORES
É possível que por influência da experiência adquirida durante o projeto Lumiar, os técnicos da COODESTAG conservaram, no período de 2004 a 2008, o modelo de prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural que praticavam no período de 1997 a 2000. Na verdade entende-se que continuava em vigor a tentativa de manter uma prestação de serviços nesse setor nos mesmos moldes daquele da época do projeto Lumiar, porém com uma nova “roupagem”. Nessa nova fase o Estado selecionava prestadoras de serviços por meio de processos licitatórios e aquelas que iriam concorrer deveriam atender a requisitos bem peculiares estabelecidos em edital. Os assentados que eram os beneficiários, por meio de suas organizações, eram os responsáveis pela avaliação dos serviços prestados, isso justificaria a manutenção ou encerramento do contrato com a prestadora de serviços no Projeto de Assentamento.
A COODESTAG participou do processo licitatório no ano de 2004 que previa a contratação de prestadoras de serviços de assistência técnica e extensão rural, sendo a vencedora que passou a ter a oportunidade de atuar nos municípios de Pacajá, Uruará e Medicilândia. No entanto, destaca-se que as informações prestadas neste trabalho são especificamente relacionadas ao município de Medicilândia.
Para a contratação dos serviços da COODESTAG, pelo INCRA, foi aprestada, durante o processo de licitação, uma proposta de serviço que havia sido construída com a participação de representantes de organizações dos assentados, do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) de cada município e da Fundação Viver Produzir e Preservar (FVPP). No entanto, essa proposta era passível de modificações de acordo com o que os assentados demandassem em reuniões periódicas que eram realizadas com esse fim.
Após a homologação da contratação da COODESTAG como prestadora de serviços de ATES para o P A Surubim, no município de Medicilândia, o coordenador da equipe local, que também era secretário municipal de agricultura, fez uma reunião que contou com a participação de mais de 100 (cem) assentados, bem como de todos os presidentes de associações e cooperativas, que tinham como sócios os assentados da reforma agrária daquele município, para apresentar-lhes a equipe de técnicos que atuariam no projeto de assentamento, que era composta por: 01 (um) sociólogo, 01 (um) engenheiro florestal, 02 (dois) engenheiros agrônomos, 01 (um) médico veterinário e 11 (onze) técnicos em agropecuária.
Em decorrência da diversidade produtiva que o P A Surubim possuía, assim como a variedade de atividades demandadas na proposta inicial, foram estabelecidas parcerias institucionais a fim de potencializar a atuação das demais organizações com atuação local e assegurar que a cooperativa atendesse as demandas estabelecidas na proposta.
Entre as instituições que manteve parceria com a COODESTAG pode-se citar a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (CEPLAC), para onde foram alocados um técnico em agropecuária e um engenheiro agrônomo do quadro de técnicos da cooperativa. Em contrapartida, os técnicos da cooperativa receberiam qualificação na área da cacauicultura e atenderiam de forma mais pontual aos assentados que produzissem cacau e aqueles que tivessem interesse em produzir.
No início das atividades do Projeto Lumiar em 1997, os técnicos de escritórios locais da CEPLAC que coordenariam as equipes locais do Projeto Lumiar foram surpreendidos com a chegada de técnicos do projeto. Essa falha de comunicação aconteceu pelo fato do convênio ter sido articulado às presas por funcionários da instituição representantes na Comissão Estadual Procera / Lumiar (SCHMITZ; MAGALHÃES, 1999, p. 4).
No início das atividades da COODESTAG também ocorreu uma falha de comunicação, porém, dessa vez foi o inverso daquela que aconteceu em 1997, conforme registraram Schmitz e Magalhães (1999, p. 4). Pois, em 2004, não houve surpresas com a chegada de técnicos da COODESTAG para atuarem nos escritórios da CEPLAC, devido a articulação ter ocorrido em âmbito local. Mas, foram os dirigentes superiores do órgão quem não estavam cientes, por isso os técnicos da COODESTAG, que foram cedidos para desenvolverem suas atividades nas dependências do escritório da CEPLAC, tiveram que esperar por aproximadamente dois meses 3, após o acerto em reunião que confirmava suas disponibilidades para atenderem os assentados com a cultura do cacau, para poderem iniciar suas atividades naquele Órgão.
Outra instituição participante daquela ação coletiva foi a Casa Familiar Rural de Medicilândia (CFR) que por intermédio da FVPP recebeu um técnico em agropecuária da equipe contratada pela COODESTAG para prestar serviços educacionais naquele estabelecimento de ensino, justificando-se haver um expressivo número de filhos de assentados estudando naquele estabelecimento de ensino. Nesse caso deve-se considerar a metodologia de ensino adotada pela escola que é a pedagogia da alternância, onde o aluno divide ao longo do ano letivo o tempo de permanência entre escola e seu estabelecimento agrícola, para que possa desenvolver atividades agropecuárias em sua propriedade com o devido acompanhamento do professor (técnico) por meio de visitas itinerantes que efetuava in loco.
A Prefeitura Municipal de Medicilândia (PMM), através da Secretaria Municipal de Agricultura (SEMAGRI), também participava dessa aliança e contava com um técnico em agropecuária cedido pela COODESTAG. Por meio dessa relação viabilizou-se, por exemplo, o atendimento a uma demanda dos assentados por capacitação em mecanização agrícola, que teve como desdobramento, inclusive, a realização de um “Seminário Municipal sobre Mecanização Agrícola” ocorrido no ano de 2005 e contou com a presença de aproximadamente 60 (sessenta) participantes. Para a execução das atividades de mecanização pelos assentados, a SEMAGRI disponibilizou o maquinário (trator e implementos) e a COODESTAG realizou a capacitação dos assentados.
Como resultado do “Seminário Municipal sobre Mecanização Agrícola” alguns assentados confirmaram suas aptidões pela atividade e manifestaram interesse em fazer uso dessa técnica em suas propriedades, tendo como foco o preparo de área para o plantio do arroz (Oryza sativa L.). Para que isso se tornasse possível a SEMAGRI disponibilizou o maquinário e a COODESTAG fez o acompanhamento dos trabalhos. No entanto, esta atividade se dissolveu por motivos de conflitos quanto ao uso do bem público (trator e implementos), pois, havia reclamações de que alguns agricultores estariam sendo mais beneficiados do que outros por pertencerem ou serem simpatizantes de partidos políticos ligados à gestão municipal.    
Havia também a Agência de Defesa Agropecuária do Pará (ADEPARÁ) para onde foi realizada a cessão de um médico veterinário e um técnico em agropecuária pela COODESTAG, a fim de somar forças no monitoramento do processo de sanidade animal, na melhoria da qualidade e diversificação da produção animal dentro dos limites do projeto de assentamento.
O STTR apoiava essa ação e para possibilitar o acesso ao crédito pelos assentos o Sindicato fazia a emissão de Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP). A cédula representava um atestado que confirmaria ao agente financeiro que assentado era efetivamente um trabalhador rural. Com essa declaração os assentados tinham seus projetos de crédito elaborados pela COODESTAG (uma vez que ela não possuía habilitação para fazer a emissão deste documento) e encaminhados para análise e, conforme o caso, contratação pelo agente financeiro.
Entre os atores que se destacaram nesse cenário de ação coletiva para uma prestação de serviços de ATES, registra-se também a participação do INCRA, órgão responsável pela realização do processo licitatório. Através do INCRA que o Governo Federal repassava os recursos para a prestação dos serviços de assistência técnica e extensão rural gratuita aos assentados da reforma agrária no município de Medicilândia.
O INCRA tinha ainda a incumbência de supervisionar as atividades realizadas no assentamento. Essa verificação possuía diferentes metodologias, sendo: reuniões periódicas diretamente com os agricultores no assentamento; reuniões com as lideranças de cada vicinal; reuniões com o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais.
A COODESTAG, através desse arranjo, além de disseminar sua atuação no assentamento por meio da realização de atividades com as demais instituições parceiras, realizava mensalmente reuniões com os assentados, através de suas organizações, a fim de discutir suas propostas de ações e direcionar a execução das próximas atividades que fossem consideradas, pelos assentados, necessárias e prioritárias. Por meio dessa prática, tornava-se possível fazer um levantamento das demandas dos assentados que eram executadas pela COODESTAG, quer fossem diretamente pela equipe do escritório local ou por meio dos técnicos alocados em outras instituições.
É salutar registrar também a participação massiva dos assentados por meio de suas organizações sociais (associações e cooperativas) que contribuíram substancialmente com todo o processo. Mensalmente eram realizadas reuniões com os presidentes das organizações de representação dos assentados, na sede do município, onde eram avaliadas as ações da COODESTAG. As demandadas de atividades previstas na proposta de execução de ATES para o assentamento na etapa seguinte, eram apreciadas e confirmadas, redirecionadas ou transformadas em outras de maior interesse. Há um expressivo registro de substituição de atividades da proposta inicial, pois, fatores diversos desfavoreciam a sua execução no cronograma proposto, além de outros anseios dos assentados que se tornavam prioritárias. Esse era o diferencial desse modelo de prestação de serviços, a demanda não era imposta, era construída de forma democrática.
No entanto, mesmo com todo esse cenário positivo, ainda assim haviam descompassos, esse é o caso do crédito rural, pois os agentes financeiros (bancos) não estavam em simetria com esse modelo de assistência técnica e extensão rural, e permaneciam ofertando propostas de crédito das quais os agricultores classificavam-nas de “pacotes” ou “kits” pelo fato de ofertarem recursos financeiros para aquisição de bens ou produtos que não condiziam com suas aptidões.
Além disso, houveram momentos de instabilidades, tais como demora no repasse de recursos pelo INCRA para a realização dos serviços, que prejudicavam o bom andamento das atividades. Impasse semelhante a esse ocorria na época em que era executado o Projeto Lumiar (SCHMITZ, 2010, p. 184). Consequentemente essas falhas provocavam insegurança aos atores envolvidos e evidentemente aos técnicos da COODESTAG, motivo esse que resultava numa fuga massiva de profissionais. Essa era uma das principais dificuldades que a Cooperativa encontrava para contratar profissionais.
Considerando essa exposição, nota-se uma ação coletiva que envolveu organizações goveridntais, não goveridntais, agricultores e suas organizações em busca de um objetivo comum, que era a execução de serviços de assistência técnica e extensão rural a assentados da reforma agrária no município de Medicilândia, no estado do Pará.

4 ABORDAGEM PARTICIPATIVA NA CONSTRUÇÃO DA DEMANDA DE SERVIÇOS DE ATES
            A definição da demanda de serviços para ser considerada participativa não deve ser uma tarefa que surja de forma espontânea ou que seja deliberada unilateralmente por uma instituição que pretenda desenvolve-la. É necessário que os atores envolvidos estabeleçam um diálogo permanente, e que de inicio se apresente uma primeira proposta que possa ser transformada até alcançar o formato desejado capaz de contemplar as necessidades dos beneficiários. Ou seja, as demandas nesse setor devem ser revitalizadas para que adquiram capacidade de atender as necessidades do público a quem deverá ser destinada, nesse caso, os agricultores familiares assentados da reforma agrária. Essa construção deve passar por um processo que envolva todos aqueles que participam direta ou indiretamente na sua formatação, diferentemente do modelo no qual as propostas são pensadas e executas por atores que não consideram as necessidades reais dos beneficiados. Alguns autores discutem a relevância da definição da demanda em serviços de pesquisa e extensão, entre eles está o trabalho de (SCHMITZ; SIMÕES, 2005/2008) ao descrevem que:
[...] Esta etapa inclui o processo de chegar, a partir do surgimento inicial de uma demanda aparente a uma primeira proposta, um objetivo de atuação, que alimenta o processo de planejamento. O problema inicial (demanda negociada) deve ser compreensível para todos os atores envolvidos. Porém, apenas depois de um processo de construção da demanda social através da ação, pode se alcançar uma compreensão mútua (SCHMITZ; SIMÕES, 2005/2008, p. 108).

            Nota-se que na construção da demanda de serviços deve-se contar com a participação dos atores que estejam envolvidos nesse levantamento. Portanto o processo de definição da demanda passará por algumas etapas até chegar num estágio de consenso ou “demanda social” que é “resultado de um processo de construção social, que envolve diálogo e negociações entre vários atores e que passa por uma ação” (SCHMITZ; SIMÕES, 2005/2008, p. 108).
Dessa forma é possível perceber que o processo participativo de construção da demanda de serviços de ATES, no caso apresentado por este trabalho, esteve alicerçado de ações conjuntas em busca de um objetivo comum, portanto, passível de compreendê-la como propulsora de uma ação coletiva.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
            A ação coletiva para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no Projeto de Assentamento Surubim, no município de Medicilândia, no estado do Pará, se confirmou como uma solução eficiente para que se conseguisse atender as demandas que representavam as necessidades dos assentados na busca da promoção de seus desenvolvimentos social, ambiental e econômico.
A experiência profissional vivenciada por técnicos da COODESTAG, com o Projeto Lumiar, os alicerçaram adequadamente para a condução da construção participativa da proposta inicial de serviços. Essas propostas foram submetidas à avaliação pelo INCRA durante a concorrência para contratação de prestadora de serviços de ATES para Projetos de Assentamentos nos municípios de Pacajá, Uruará e Medicilândia.
A atuação da COODESTAG pode ser considerada positiva, pois, ela conseguiu manter-se como a prestadora de serviços de ATES nos projetos de assentamentos que atuou durante todo o período de vigência do convênio (2004 a 2008). A avaliação formal de sua atuação, efetuada pelos representantes de organizações dos assentados, acontecia periodicamente.
Por fim, foi possível constatar que por meio da ação coletiva arranjos institucionais foram estabelecidos e organizações goveridntais e não goveridntais, que não possuíam capacidade de desenvolver pleidnte suas atividades, passaram a contar com profissionais, veículos e subsídios para atender aos assentados do Projeto de Assentamento Surubim, no município de Medicilândia, dentro de suas áreas de atuação.

REFERÊNCIAS
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FEENY, David; BERKES, Fikret; MCCAY, Bonnie J.; ACHESON, James M. A tragédia dos comuns: vinte e dois anos depois. In: DIEGUES, Antonio Carlos; MOREIRA; André de Castro C. (Orgs.). Espaços e recursos naturais de uso comum. Trad. André de Castro C. Moreira. São Paulo: NUPAUB/LASTROP-USP, 2001. p. 17-42. <Original: 1990>.

HARDIN, Garret. La tragédia de los bienes comunes. In: SMITH, Richard Chase; PINEDO, Danny. El Cuidado de los bienes comunes: gobierno y menejo de los lagos y bosques em la Amazonia. Lima: IEP; Instituto Del Bien Común, 2002. p. 33-48. (Estudios de la Sociedad Rural, 21).

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SCHMITZ, Heribert; MOTA, Dalva Maria da; PRADO, Edy Silva de Azevedo Carvalho. Ação coletiva com fins econômicos: reflexões teóricas a partir de dois estudos de caso no espaço rural. In: SOCIEDADE BRASILEIRA DE SISTEMAS DE PRODUÇÃO - SBSP. 7., 2007, Fortaleza. Anais... Disponível em:<https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/60415/1/74.pdf>. Acesso em: 19 abr. 2018.

SCHMITZ, Heribert; SIMÕES, Aquiles. A identidade da demanda numa pesquisa sobre mecanização na Transamazônica. In: Agricultura Familiar: Pesquisa, Formação e Desenvolvimento. n. 5/8, Belém: UFPA / NCADR / PPGAA. 2005/2008.

*Doutorando em Geografia e Mestre em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável, pela Universidade Federal do Pará. Técnico de Laboratório área Florestal, da Universidade Federal do Pará / Campus Universitário de Altamira. luizcarlosbs@ufpa.br.
1 Considerando a tipologia indicada por Schmitz, Mota e Prado (2007, p. 5) cooperativa de serviço é aquela que oferece serviços a terceiros, que são os beneficiários, através do trabalho coletivo de profissionais.
2 Aproveitador ou “carona” – é o individuo que tem conhecimento de que receberá os benefícios independente de sua participação. Esses benefícios são obtidos através de ação de outras pessoas (OLSON, 1998).
3 Durante esse tempo a coordenação do escritório local da CEPLAC tramitou o processo de solicitação de autorização, para a Superintendência do Órgão em Belém, para a permanência dos técnicos cedidos pela COODESTAG naquela instituição.

Recibido: 19/04/2018 Aceptado: 21/06/2018 Publicado: Junio de 2018


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