Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


CRISE DE LUCRATIVIDADE E SUPEREXPLORAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO: NOTAS SOBRE O BRASIL RECENTE

Autores e infomación del artículo

Guilherme Nunes Pires*

Universidade Federal de Santa Maria, Brasil

gnpires@hotmail.com


RESUMO
O objetivo do presente artigo é compreender que a queda da taxa de lucro é fundamental para explicar a crise político-econômica e o aumento da superexploração da força de trabalho no Brasil recente. Para isso, é esboçado um panorama da queda da taxa de lucro no âmbito internacional e nacional. Aponta-se também que a transferência internacional de mais-valor é a essência da superexploração da força de trabalho na periferia capitalista. Percebe-se que a queda da taxa de lucro é fundamental para compreender a crise econômica e política no Brasil. As reformas neoliberais que estão sendo aplicadas servem justamente como contra tendência a queda a taxa de lucro como forma de ampliar a superexploração da força de trabalho no Brasil.

Palavras-chave: Queda da Taxa de Lucro, Superexploração da Força de Trabalho, Brasil recente.

CRISIS OF PROFITABILITY AND SUPER-EXPLOITATION OF THE WORKFORCE: NOTES ABOUT RECENT BRAZIL

ABSTRACT
The aim of the present article is to understand that the fall of the rate of profit is fundamental to explain the political-economic crisis and the increase of the super-exploitation of the workforce in recent Brazil. For this, a panorama of the fall of the rate of profit in the international and national scope is sketched. It is also pointed out that the international transfer of surplus-value is the essence of the super-exploitation of the workforce in the capitalist periphery. It is perceived that the fall in the rate of profit is fundamental to understand the economic and political crisis in Brazil. The neoliberal reforms that are being applied precisely serve as a counterproductive tendency to lower the rate of profit as a way to expand the super-exploitation of the workforce in Brazil.

Key-words: Fall of the rate of profit, Super-exploitation of Work Force, Recent Brazil.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Guilherme Nunes Pires (2018): “Crise de lucratividade e superexploração da força de trabalho: notas sobre o Brasil recente”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (mayo 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2018/05/superexploracao-forca-trabalho.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1805superexploracao-forca-trabalho


1 INTRODUÇÃO

Desde a emergência da crise financeira que se instalou no âmbito global a partir de meados de 2008, as economias capitalistas mundo afora se encontram em um período de esgotamento do potencial de recuperação econômica (CARCHEDI e ROBERTS, 2013). No caso brasileiro não é diferente. O Brasil tem vivenciado desde meados de 2011 um esgotamento econômico com profundas consequências políticas (MARQUETTI, HOFF E MIEBACH, 2016; PRADO, 2017). Basta pensar no rompimento da ordem democrática burguesa que foi perpetuada por seguimentos que tem como objetivo aplicar medidas de austeridade econômicas mais severas. Mais especificamente, as diversas consequências que o país tem enfrentado com a crise econômica estão inseridas em um contexto mais amplo. Isto é, o esgotamento econômico capitalista se apresenta em um contexto global. 
O presente artigo concentra-se na variável que demonstra a situação de vitalidade da economia capitalista, isto é, na taxa de lucro. Mesmo que diferentes autores atribuam à crise econômica capitalista contemporânea a diversos fatores, como Foster e Magdoff (2009) e Chesnais (2009); Lapavitsas (2009), nas teorias subconsumistas da crise e o fenômeno da financeirização, respectivamente, compreende-se aqui que todas elas se apresentam como fenômeno aparente da crise. Contudo, a queda da lucratividade do sistema é um dos fatores para as crises econômicas vivenciadas por esse modo de produção (GRESPAN, 2012; KLIMAN, 2011). Como apontado por Marx (1986, p. 183), “a taxa de valorização do capital global, a taxa de lucro, é o aguilhão da produção capitalista (assim como a valorização do capital é sua única finalidade)”.
A queda da lucratividade no Brasil é um fator importante para entender a crise econômica. Dentre os seus efeitos, segmentos econômicos que apoiavam as políticas praticadas pelo Partido dos Trabalhadores (PT) passam a ser oposição com intuito de acelerar reformas que possam reverter à queda acentuada da taxa de lucro no âmbito nacional. Dado que o partido não teria o apoio e a rapidez necessária para aplicar políticas de austeridade social, para o trabalho e não ao capital, vale lembrar, foi destituído do poder.
Como argumentam Marquetti, Hoff E Miebach (2016, p. 15), “[a] redução simultânea da taxa de lucro e da rentabilidade financeira está na origem do fim da composição de classes que havia sido constituída no governo Lula”. O rearranjo do poder da burguesia no Brasil consolidou setores da política nacional declaradamente em favor dos grandes capitais que se tornaram oposição ao antigo governo com o intuito de aplicação de reformas austeras mais severas.
Por outro lado, como demonstrado por Marini (2008), nos países periféricos, como o Brasil, há uma tendência a uma superexploração da força de trabalho que pode ser um meio de reverter as perdas dos capitais perante a concorrência no mercado mundial. É justamente esse mecanismo que é imposto à população brasileira como forma de reverter à queda da lucratividade no território nacional que vem sendo implantada no Brasil contemporaneamente.
Dessa forma, objetiva-se compreender, a partir do legado teórico de Marx, a crise contemporânea e os mecanismos de superexploração da força de trabalho no Brasil recente. O artigo está divido em três seções. No primeiro momento é apresentada a queda da taxa de lucro no nível internacional e no Brasil. Na segunda seção argumenta-se que a transferência internacional de mais-valor é a essência da superexploração da força de trabalho no Brasil. Por último, é exposta a superexploração no Brasil.

2 A CRISE DE LUCRATIVIDADE CONTEMPORÂNEA: BREVES CONSIDERAÇÕES

A Lei da Queda Tendencial da Taxa de Lucro, exposta por Marx no Livro III de O Capital, sinteticamente, diz que a relação entre o capital constante (meios de produção) e capital variável (força de trabalho) tende a aumentar. Isto é, aumenta o que Marx chama de composição orgânica do capital (MARX, 2013; 1986). De acordo com Roberts (2016, p. 13), se essa relação cresce e a taxa de mais-valor extraída permanece constante, então, “the rate of profit must fall”.
Nas palavras de Marx (1986, p. 164):

(...) com o progressivo decréscimo relativo do capital variável em relação ao capital constante, gera uma composição orgânica crescentemente superior do capital global, cuja consequência imediata é que a taxa de mais-valia, com grau constante e até mesmo crescente de exploração do trabalho, se expressa numa taxa geral de lucro em queda contínua. (...) A tendência progressiva da taxa geral de lucro a cair é, portanto, apenas uma expressão peculiar ao modo de produção capitalista para o desenvolvimento progressivo da força produtiva social de trabalho.

De acordo com Roberts (2016) e Carchedi e Roberts (2013), se analisada a série histórica da taxa de lucro das principais economias capitalistas desde a segunda metade do século XIX, é perceptível uma tendência geral negativa da taxa de lucro no conjunto dos países ditos avançado, isto é, aqueles que adentraram ao modo de produção capitalista de forma clássica. Não obstante, a série histórica apresenta sempre oscilações periódicas em decorrência das contra tendências a sua queda1 .
Como mostra o gráfico 1, mesmo com as oscilações periódicas a tendência geral se apresenta em um contínuo declínio da taxa de lucro. Em uma rápida visualização, pode-se perceber, por exemplo, que o período marcado pela Grande Depressão dos anos 1930 apresentou uma queda drástica da taxa de lucro das economias capitalistas centrais. Como se observa também, a ascensão de políticas keynesianas com massivos gastos públicos proporcionou uma retoma ascendente, mesmo que momentânea, da taxa de lucro.
Por outro lado, mesmo no período marcado pelas políticas do Estado de Bem-Estar Social, que só foram possíveis nos países capitalistas avançados, a taxa de lucro tendeu a queda. Nesse sentido, a partir dos anos 1980, o neoliberalismo surge como alternativa para retomar a lucratividade do sistema econômico capitalista. Não obstante, as políticas de austeridade, aplicadas a classe trabalhadora, possibilitou com que os capitalistas auferissem taxas de lucro mais elevadas.

Ainda segundo Roberts (2016), analisando o comportamento da taxa de lucro na, até então, principal economia capitalista contemporânea, os EUA, é possível visualizar sua tendência de eminente queda, mesmo que as contra tendências operem em determinado período de tempo. Conforme o gráfico 2, é perceptível as oscilações da taxa de lucro ao longo do tempo. A crise de rentabilidade capitalista nos EUA que vigorou de meados do fim dos anos 1960 até o início dos anos 1980 foi revertida momentaneamente com a adesão das políticas de austeridade neoliberais. Percebe-se também que a taxa de lucro declina no período da bolha das empresas de tecnologias no início dos anos 2000 e tem sua retomada com a intervenção militar norte americana no Oriente Médio. Contudo, a taxa de lucro declina drasticamente no período da crise financeira instaurada em meados de 2007.

Gráfico 2 – Taxa de lucro nos EUA (%)

No caso brasileiro, de igual modo, embora diversas interpretações da crise se apresentem, como Bacha e Bonelli (2005), Bonelli (2016) em perspectiva neoliberal, e Bresser-Pereira (2015a, 2015b) em uma visão novo-desenvolvimentista, Prado (2017) argumenta que a explicação marxista da crise de lucratividade é a mais completa e coerente até então.
Conforme apontam Marquetti, Hoff e Miebach (2016), a taxa de lucro no Brasil demonstrou ascendência de 2002 a 2007, devido ao ciclo de valorização das commodities agrícolas e aumento da demanda internacional que favoreceram o país no mercado mundial, dentre outros fatores como estímulos estatais ao investimento como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e de demanda praticados pelo governo Lula. No auge de 2007, a taxa de lucro chegou a ser superior a 30% do montante investido.
De acordo com o gráfico 3, o aumento da utilização da capacidade produtiva instalada e o aumento da produtividade do capital de pleno emprego possibilitaram com que a taxa de lucro se elevasse no período de 2002 a 2007. A política de reajuste dos salários foi fundamental para a transferência da parcela da renda para os trabalhadores. Isto é, “[o] conjunto das políticas públicas e a elevação dos termos de intercâmbio permitiram combinar o aumento da taxa de lucro e a redistribuição da renda em favor do trabalho”. (MARQUETTI, HOFF E MIEBACH, 2016, p. 9).
O declínio da taxa de lucro inicia-se em decorrência da queda da produtividade do capital de pleno emprego através da redução dos preços internacionais das commotidies e ao redirecioidnto dos investimentos para o setor de construção, que até meados de 2008 eram destinados para aquisição maquinário e equipamentos. Contudo, a trajetória do aumento do salário se manteve por razões políticas e institucionais (RUGITSKY, 2016).
Na fase que apresenta declínio da taxa de lucro, pode-se visualizar que a diminuição da parcela dos lucros na renda nacional, o aumento da parcela dos salários aliado ao declínio da produtividade do capital de pleno figura uma possível explicação para o fenômeno, conjuntamente com a crise que se instaura no âmbito internacional (FILGUEIRAS, 2015a).
O governo Dilma Rousseff passa a praticar políticas econômicas de estímulo na tentativa de conter a desaceleração econômica a partir de 2011:

Entre as medidas destacam-se a forte ampliação das desonerações fiscais e a concessão de subsídios; a utilização dos bancos públicos para forçar uma redução do spread bancário e da taxa de juros ao tomador final; o emprego de medidas setoriais para a redução dos custos, como a revisão das concessões de energia elétrica; as desonerações da folha de pagamentos; e a oferta de juros subsidiados através do BNDES para o investimento em máquinas, equipamentos e construção residencial (MARQUETTI, HOFF E MIEBACH, 2016, p. 13).

Como bem apontado por Marquetti, Hoff e Miebach (2016), segmentos econômicos que apoiavam as políticas praticadas pelo Partido dos Trabalhadores (PT) desde 2003 passam a ser oposição com intuito de acelerar as reformas que possam reverter à queda acentuada da taxa de lucro no âmbito nacional. Um fator importante na explicação disso é o corte da taxa de juros SELIC que remunera os títulos da dívida pública de 12,5% para 7,25% em 2012. Dado que as grandes empresas possuem grandes investimentos do mercado financeiro, suas receitas diminuírem.
Como bem mostra o gráfico 3, o declínio da taxa de lucro se acentua a partir de 2011. Em 2014, a taxa de lucro líquida brasileira se configurava pouco acima de 20%. A retomada da taxa de lucro a partir de 2014 foi possível graças à mudança para uma política econômica de matriz neoliberal com o segundo mandato do governo Dilma Rousseff (FILGUEIRAS, 2015b).

Para Marquetti, Hoff e Miebach (2016), a queda da taxa de lucro brasileira é fundamental na explicação da crise econômica e política. Prado (2017) argumenta que a queda da taxa de lucro é uma explicação pertinente da crise brasileira contemporânea. De 2003 a 2014 a parcela dos lucros caiu de aproximadamente 40% para 32%, respectivamente. Nesse sentido, uma importante consequência política se apresentaria. “A redução simultânea da taxa de lucro e da rentabilidade financeira está na origem do fim da composição de classes que havia sido constituída no governo Lula” (MARQUETTI, HOFF E MIEBACH, 2016, p. 15).
A partir do segundo mandato do governo Dilma, políticas neoliberais foram aplicadas a fim de contornar o esgotamento das políticas econômicas passadas e a tentativa de retomar a confiança da burguesia. A redução dos gastos do governo implicou queda de 14,1% nos investimentos; a revisão dos preços administrados pelo governo e a desvalorização cambial implicaram em aumento da inflação, o que elevou a taxa de juros como resposta; a taxa de desemprego aumentou a partir das políticas de austeridade. Esses fatores, dentre outros, como as desonerações fiscais para o empresariado, possibilitaram uma retomada na taxa de lucro a partir de 2014 com consequência de queda de 3,8% no PIB em 2015 (Ibidem, p. 20).
Dado que o Partido dos Trabalhadores não teria o apoio e a rapidez necessária para aplicar políticas de austeridade social, para o trabalho e não ao capital, vale lembrar, foi destituído do poder. O rearranjo do poder da burguesia no Brasil consolidou setores da política nacional declaradamente em favor dos grandes capitais que se tornaram oposição ao antigo governo com o intuito de aplicação de reformas austeras mais severas. Entra em cena o governo Temer, declaradamente neoliberal, com o intuito de retomar a lucratividade na economia brasileira.
Como apontado por Marx (1986) no livro terceiro de O Capital e a visualização nos gráficos, à tendência a queda da taxa de lucro se comporta com certa volatilidade. Uma vez que contra tendências possam se manifestar como inibidores momentaneamente dessa tendência geral de queda, é evidente que seu comportamento se apresenta com ciclos instáveis de ascensão e declínio. Por outro lado, como indicado por Marini (2008), mesmo com condições econômicas favoráveis, nos países periféricos, há a tendência a uma superexploração da força de trabalho. Justamente esse fenômeno pode servir como contra tendência a queda da taxa de lucro.

3 TRANSFERÊNCIA INTERNACIONAL DE VALOR: A ORIGEM DA SUPEREXPLORAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO NA PERIFERIA CAPITALISTA

O objetivo dessa breve seção é apresentar a superexploração da força de trabalho como consequência da transferência de mais-valor entre os países do centro e da periferia do capitalismo no mercado mundial, apresentando uma relação de dominação internacional. A superexploração da força de trabalho é o mecanismo na qual o capitalismo dependente encontra para minimizar as perdas na concorrência no mercado mundial.
Para compreender a transferência de mais-valor e a superexploração da força de trabalho como sequência necessária desse fenômeno, é fundamental visualizar como os países da periferia se inserem no mercado mundial de forma subalterna (MIRANDA, 2017). Como argumenta Marx (2011, p. 254), nos Grundrisse, as relações econômicas capitalistas não possuem fronteiras nacionais, isto é, “[o] mercado mundial (...) constitui ao mesmo tempo o pressuposto e o portador da totalidade”.
Como exposto anteriormente, a composição orgânica do capital é a sua relação entre a parte constante e a variável. Em consequência das diversas composições orgânicas dos capitais que são alocados em distintos ramos produtivos, “capitais de igual grandeza põem em movimento quantidades muito diferentes de trabalho, quantidades também muito diferentes de mais-trabalho são apropriadas por eles” (MARX, 1986, p. 117). Disso decorre que as taxas de lucro que emergem em ramos de produção distintos se apresentam muito diferentes. Contudo, essas taxas são igualadas perante a concorrência. A concorrência é “essa locomotiva fundamental da economia burguesa” (MARX, 2011, p. 737).
Como aponta Marx:

Essas diferentes taxas de lucro são igualadas pela concorrência numa taxa geral de lucro, que é a média de todas essas diferentes taxas de lucro. O lucro que, de acordo com essa taxa geral de lucro, cabe a um capital de grandeza dada, qualquer que seja sua composição orgânica, chama-se lucro médio (MARX, 1986, p. 123).

A tendência de migração dos capitais para setores com taxa de lucro relativamente maior indica como ocorre o processo de produção de mais-valor e sua apropriação para cada capital individual. Isto é, “[o] capital (...) retira-se de uma esfera com baixa taxa de lucro e se lança em outra, que proporciona lucro mais elevado”. Diante desse processo contínuo de “emigração e imigração, numa palavra, mediante sua distribuição entre as diversas esferas” produtivas (Ibidem, p. 150), acontece que “o lucro médio nas diversas esferas da produção se torna o mesmo” (Ibidem, p. 150). Sinteticamente, “isso ocorre mediante a transferência contínua de capital de uma esfera para outra, em que momentaneamente o lucro está acima da média” (Ibidem, p. 159).
Para Marx, um capital pode se apropriar de um mais-valor superior a ele originado através da transferência intercapitalista, isso porque pode se apropriar de mais-valor de outros capitais de menor magnitude através da concorrência. Isso também ocorre no âmbito das relações entre os países no mercado mundial. De acordo com Marx, em nota nos Grundrisse:

Tendo em vista que o lucro pode ser inferior ao mais-valor, ou seja, que o capital [pode] trocar-se lucrativamente sem se valorizar no sentido estrito, segue-se que não só os capitalistas individuais, mas também as nações podem trocar continuamente entre si, e repetir continuamente a troca em escala sempre crescente, sem que por isso precisem ganhar de modo uniforme. Uma pode apropriar-se continuamente de uma parte do trabalho excedente da outra (...) (MARX, 2011, p. 1207, grifos no original, adendo da edição).

“Como o desenvolvimento da força produtiva de trabalho é muito desigual em diferentes ramos da indústria” (MARX, 1986, p. 195) e nas diferentes nações, na relação internacional entre os países no mercado mundial, aqueles que possuem força produtiva do trabalho mais desenvolvida, ou seja, com composição orgânica maior, possuem maior vantagem na apropriação do mais-valor global porque, segundo Dussel (1988, pp. 329-330), “produce mercancías con menor valor y por ello obtiene plusvalor de la que tiene más valor que el precio de producción”.
Para Marx, os capitais que são investidos internacionalmente podem proporcionar maiores taxas de lucro devido ao fato de que a concorrência entre mercadorias que são produzidas em países com “menores facilidades de produção” possibilita a venda de suas mercadorias “acima de seu valor” mesmo que muito mais barato do que nos países concorrentes (MARX, 1986, p. 181). Conforme Marx, essa “mesma relação pode ocorrer no caso do país para onde são enviadas mercadorias e do qual são adquiridas mercadorias”. Isto é, o país pode dar “mais trabalho objetivado in natura do que recebe e que, não obstante, obtenha assim a mercadoria a preço mais baixo do que ele mesmo poderia produzir” (Ibidem, p. 181).
Dussel (1988) argumenta que os capitais, com nível de desenvolvimento mais elevado, isto é, com composição orgânica maiores e salários no âmbito nacional maiores, intercambiam mercadorias com menor valor; com isso, a mercadoria com menor valor possui um preço maior do que seu próprio valor, apropriando-se do mais-valor da mercadoria com valor maior.
De acordo com Carcanholo (2013, p. 82), os países periféricos tendem a possuir uma baixa produtividade média em relação à média dos países centrais. Dessa forma, “ocorre a transferência de uma parte da mais-valia produzida nas economias dependentes, que será apropriada, na forma de um lucro médio superior à mais-valia produzida, pelos capitais operantes nas economias centrais”.
A transferência de mais-valor para os países com capitais mais desenvolvidos acarreta em perdas para as nações periféricas. Dessa forma, analisando os países da América Latina, Marini (2008) argumenta que há mecanismos que buscam compensar os capitais desses países. O autor propõe, então, que a condição necessária para isso é a exploração da força de trabalho em maior patamar. Uma superexploração da força de trabalho impera nessas economias2 . O aumento da exploração da força de trabalho nas economias periféricas não ocorre através do aumento da produtividade do trabalho, evidentemente, mas ocorre através do aumento da exploração física do trabalhador, isto é, “permitem a elevação do grau de exploração da força de trabalho mediante a redução dos salários para patamar inferior ao valor da força de trabalho” (CARCANHOLO, 2013, p. 77).
De acordo com Luce (2013, p. 146):

[a] superexploração se pode dar mediante quatro formas ou modalidades: i) a remuneração da força de trabalho por baixo do seu valor – conversão do fundo de consumo do trabalhador em fundo de acumulação do capital; ii) o prolongamento da jornada implicando o desgaste prematuro da corporeidade físico-psíquica do trabalhador; iii) o aumento da intensidade do trabalho provocando as mesmas consequências, com a apropriação de anos futuros de vida e trabalho do trabalhador; e iv) o aumento do valor da força de trabalho sem ser acompanhado pelo aumento da remuneração.

Isso permite visualizar o porquê no Brasil, por exemplo, a redução dos salários seja a principal motivação das reformas que tem ocorrido, de forma acelerada, a partir de 2016. As reformas, principalmente a trabalhista, surgem como uma necessidade para a retomada do crescimento econômico do país, mas, na verdade, é um dispositivo para que a superexploração da força de trabalho seja ampliada a fim de retomar a lucratividade da economia brasileira.

4 NOTAS SOBRE A SUPEREXPLORAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO NO BRASIL RECENTE

A queda da lucratividade no Brasil é um fator importante para entender a crise econômica e política. Dentre as reformas com maior impacto negativo para a população, a reforma trabalhista é uma das pedras angulares para aumentar a superexploração da força de trabalho com o objetivo de retomar a taxa de lucro para o capital. A reforma, Lei Nº 13.467, que entrou em vigor em 11 de novembro de 2017, teve como objetivo modificar a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) que vão desde a negociação com o empregador, jornada de trabalho, condições de trabalho, demissão até a flexibilização e redução dos salários. Referente à jornada de trabalho, o limite de 44h semanais foi mudado pelo teto de 220h mensais. Há também uma redução do tempo de intervalo durante o expediente pela metade (BRASIL, 2017).
Concentremo-nos na remuneração da força de trabalho brasileira. No Brasil, um indicador muito importante para visualizar a remuneração e a superexploração da força de trabalho é o salário mínimo necessário (SMN). O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) é o responsável pelo cálculo que é feito desde 1970, sendo o SMN não apenas um indicador de mínimo de salário, mas também expressa a quantia necessária para cobrir os custos da reprodução do trabalhador. Isto é, moradia, alimentação, educação, transporte, vestuário, lazer, etc. (LUCE, 2013).
De acordo com Luce (2013, p. 150), o SMN é calculado através do “levantamento do preço médio dos treze produtos alimentares que constam do Decreto-Lei no 399/1938, nas quantidades especificadas por este. Posteriormente, é calculado o gasto mensal agregado de cada um dos produtos”. Utilizando como média quatro pessoas em uma família (pai, mãe e dois filhos), e multiplicando por três vezes o preço da cesta básica mensal, “o resultado é novamente multiplicado, agora pelo peso da inflação na porcentagem que a alimentação representa entre os gastos essenciais de uma família no rol dos demais itens avaliados pelo índice do custo de vida (ICV)” (Ibidem).
Em perspectiva histórica, pode-se perceber que o SMN com relação ao salário mínimo vigente na série histórica tem a tendência de se distanciar cada vez mais, salve os períodos de tendência oposta. Na mínima histórica do ano de 1995, o salário mínimo correspondia a 25,02% do poder de compra, conforme a tabela 1. Mesmo no período de 2003 a 2007 no qual se compreende um aumento relativo nos salários, de acordo com o discurso dominante, o poder de compra se manifestou abaixo de 50%.

De acordo com o DIEESE, o SMN para o mês de março de 2018 era de R$ 3.706,44 para uma família composta por quatro integrantes. Percebe-se que o salário de uma família que recebe o mínimo, com tanto o pai como a mãe trabalhando, é muito inferior ao SMN, dado que o salário mínimo vigente é de R$ 954,00.
Vejamos alguns números referentes aos rendimentos do trabalho no Brasil. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2017, entre 80 a 90% dos trabalhadores no Brasil viveram com até três salários mínimos e meio mensais, aproximadamente, isto é, R$ 3.314,00. Chama-se a atenção no fato de que, praticamente, a totalidade dos trabalhadores brasileiros não alcança o SMN para uma vida digna no Brasil.
Ainda segundo os dados do IBGE, em 2017 um grupo formado por 44,5 milhões de trabalhadores recebeu R$ 754,00 mensais, em média. Isto é, abaixo do salário mínimo de R$ 937,00, vigente no ano. O correspondente aos 50% dos trabalhadores com menores rendimentos auferiram rendimentos um terço inferior à média nacional de R$ 2.112,00. A média nacional foi elevada graças ao rendimento de 889 mil trabalhadores (1%) que receberam, em média, R$ 27.213,00 mensais. O caso mais alarmante diz respeito aos 5% com menores rendimentos. Aproximadamente 4,5 milhões de trabalhadores receberam, em média, R$ 47,00 mensais. Deve-se perceber que os casos em que o trabalhador não aufere renda suficiente para reproduzir, de maneira adequada, sua força de trabalho confere caso de superexploração da força de trabalho.
Apenas a título de exemplo, se atentar para as consequências imediatas da reforma trabalhistas, pode-se perceber que ela serve justamente para rebaixar ainda mais os salários dos trabalhadores com o intuito de cortar custos para o capital como contra tendência à queda da taxa de lucro.
Uma forma de contrato que passou a vigorar com a reforma trabalhista é o contrato de trabalho intermitente. Nessa nova forma de contrato, o trabalhador fica a disposição do empregador para quando apenas demandar seus serviços, ou seja, o trabalhador é chamado apenas para trabalhar quando requisitado, recebendo um salário fixo por hora trabalhada e não um salário fixo mensal. Essa modalidade tem consequências visíveis no aumento da superexploração da força de trabalho.
De acordo com essa nova modalidade, o trabalhador pode receber, no mínimo, R$ 4,26 por hora trabalhada ou R$ 31,23 mensais, por lei. Se o contrato estabelecer um mínimo de 4 horas por dia durante 6 dias no mês, o salário mensal do trabalhador será de R$ 102,24. Na prática, isso tem consequências diretas para o trabalhador. A título de exemplo, após a reforma da previdência, de acordo com matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo no dia 27 de novembro de 2017 3, uma rede de supermercados passou a contratar operadores de caixa na modalidade intermitente, com salários de R$ 4,81 por hora, seis dias por mês com jornada de trabalho de 4 horas diárias. Ou seja, com um salário de R$ 115,44 mensais. As consequências dessas políticas somente poderão ser devidamente compreendidas, isto é, suas consequências reais, futuramente. Procurou-se apenas apontar esse fenômeno para que, em trabalhos futuros, possam ser estudados com maior profundidade os seus reais efeitos para a classe trabalhadora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Viu-se que a queda da lucratividade brasileira é um componente importante para explicar a crise econômica e política. A taxa de lucro sinaliza a saúde da economia capitalista. Percebeu-se que no período marcado de 2002 a 2007, atrelado aos estímulos internacionais e políticas que favoreceram o investimento e a demanda, a taxa de lucro no Brasil teve crescimento. Com a crise internacional de meados de 2007 e a queda da participação do lucro na renda nacional os grandes capitais, a crise política se instaurou.
Como foi exposto, nos países periféricos, necessariamente, há uma superexploração da força de trabalho no sentido de expressar uma remuneração abaixo de seu valor. Como contra tendência a queda da taxa de lucro, é evidente que reformas como a trabalhista busquem ampliar cada vez mais essa superexploração. Contudo, apenas indicam que a classe trabalhadora será cada vez mais penalizada em detrimento da retomada da lucratividade econômica.
Dentro das limitações desse artigo, isto é, desenvolver as modalidades de superexploração, os reais efeitos das políticas econômicas austeras realizadas contemporaneamente no Brasil só podem ser analisadas post festum. Na medida em que as ofensivas do capital, a reforma trabalhista, por exemplo, se apresenta como algo recente, apenas em trabalhos futuros é possível visualizar as consequências nas modalidades da superexploração da força de trabalho.

REFERÊNCIAS

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*Mestre em Economia e Desenvolvimento (PPGE&D) pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: gnpires@hotmail.com
1 Marx (1986) expõe 6 (seis) contra tendências a queda da taxa de lucro: o aumento do grau de exploração do trabalho; diminuição dos salários abaixo de seu valor; preços mais baratos do capital constante; o exército industrial de reserva; e, ampliação do comércio exterior.
2 Dussel (1988, pp. 326-327), contudo, argumenta que, mesmo que a categoria da superexploração da força de trabalho seja adequada, a forma como Marini a concebe confunde a essência e o fenômeno da relação de dominação internacional. Para Marini (2008, p. 132), a superexploração da força de trabalho é a essência da dependência e não seu resultado, o trabalhador latinoamericano superexplorado é a “esencia de la dependência”. A superexploração da força de trabalho deve ser compreendida como consequência da transferência de mais-valor e não o seu contrário.
3 Disponível em: http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,com-regra-de-trabalho-intermitente-empregado-corre-risco-de-ter-de-pagar-para-trabalhar,70002099195

Recibido: 14/05/2018 Aceptado: 18/05/2018 Publicado: Mayo de 2018


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