Revista: Atlante. Cuadernos de Educación y Desarrollo
ISSN: 1989-4155


ASPECTOS E APONTAMENTOS DA EDUCAÇÃO COM ÊNFASE NA REFORMA DO ENSINO DE 1º E 2º GRAUS NO CONTEXTO HISTÓRICO DA DITADURA TECNOCRÁTICA, CIVIL E MILITAR

Autores e infomación del artículo

Mônica Cícera Kubiak Nunes *

Ana Karine Braggio**

Universidade Estadual do Oeste do Paraná campus Cascavel, Brasil

MunicaKN@hotmail.com


RESUMO: Considerando as mudanças ocorridas no âmbito educacional no Brasil, especialmente no governo ditatorial, em que se estruturou a reforma do ensino de 1º e 2º graus, principalmente através da Lei 5692 de 1971 a qual fixou as diretrizes e as bases para esses níveis de ensino, este trabalho objetiva analisar como foram construídos o discurso e a prática, para elaboração desta reforma. Recorreu-se à pesquisas bibliográficas como livros, relatórios do MEC e da USAID. Buscou-se apresentar a partir desses documentos quais foram os interesses políticos e quem foram os indivíduos envolvidos nos estudos e no desenvolvimento de relatórios de análise da educação brasileira. Desse modo, tornou-se possível visualizar a importância e os interesses contidos na necessidade de reformar estes níveis de ensino e apontar quais resultados foram obtidos com a educação no período em questão. Este trabalho colabora com a área da história da educação e da política educacional, ao apresentar como o modelo tecnicista chegou ao Brasil através dos acordos MEC-Usaid, que reorganizou o sistema educacional brasileiro, modificando as normativas referentes ao conhecimento e a cultura.

Palavras-chave: reforma do ensino, Estado Militar, política educacional, Acordo Mec-Usaid, ensino técnico.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Mônica Cícera Kubiak Nunes y Ana Karine Braggio (2019): “Aspectos e apontamentos da educação com ênfase na reforma do ensino de 1º e 2º graus no contexto histórico da ditadura tecnocrática, civil e militar”, Revista Atlante: Cuadernos de Educación y Desarrollo (marzo 2019). En línea:
https://www.eumed.net/rev/atlante/2019/03/aspectos-apontamentos-educacao.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/atlante1903aspectos-apontamentos-educacao


1. ESTADO MILITAR E EDUCAÇÃO NO BRASIL

            Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, as Forças Armadas almejavam um Estado que adotasse práticas militares, a fim de garantir a Segurança Nacional, para tanto criou a Escola Superior de Guerra (ESG), instituição responsável por traçar ideais capazes de fundamentar o controle do Estado sob a ótica militar. Historicamente as intervenções dos militares no Brasil, eram utilizadas sob a justificativa de conter ações de determinados grupos que representassem risco à segurança da nação e aos princípios democráticos, recebendo, portanto, a aceitação da maioria da população. Porém, convém destacar que das seis intervenções militares que o Brasil sofreu desde os anos de 1930 (elas ocorreram nos anos de 1937, 1945, 1954, 1956, 1961 e 1964), somente duas destas efetivamente contribuíram para a garantia dos direitos democráticos.
Na última intervenção militar de 1964, o país passou a ser governado por militares, que sob a análise de Chiavenatto (1994),

[...] não vieram para “pacificar” a nação. Tinham um projeto político originário da ESG [Escola Superior de Guerra], Estimulado por forças internas e externas, apoiado na Doutrina de Segurança Nacional, esse projeto mostrou-se autoritário, liquidando o processo democrático, além de caótico, suicida no campo econômico. E em poucos anos passou-se do milagre ao pesadelo (CHIAVENATTO 1994, p. 51)

            Apesar dos discursos iniciais em prol à democracia, os acontecimentos do período em que o Brasil foi governado por militares entre os anos de 1964 e 1985, produziram questioidntos e crises de ordem política, econômica, social e cultural. Pois, como aponta Cunha (1991, p. 238),

[...] intensificou-se o processo econômico de concentração de propriedade, capital, renda e mercado, devido à política econômica adotada [...]. Houve, então, grande quantidade de falências de pequenas empresas [...]. Com isso, ficavam mais dificultadas as possibilidades de ascensão da classe média via poupança, investimento e reprodução de capital, através da instalação de pequenas empresas, artesanatos e de exercícios de profissão liberal.

Desse modo privilegiando a classe dominante e excluindo a classe popular ou subalternas1 .

Isso não significa que o Estado Militar não desenvolveu políticas sociais em diversos campos: educação, saúde, previdência, habitação, assistência social, emprego, “desenvolvimento comunitário” etc., mas significa que ele privilegiou, diretamente e de forma “selvagem”, a manutenção da desigualdade social e a acumulação de capital, mesmo no que concerne ao domínio da política social. Sua atuação pautou-se pelo emprego em grande escala, de uma violenta repressão política. Assim deve-se destacar que o Estado concorreu decisivamente para o desenvolvimento das forças produtivas do país, ao mesmo tempo em que foi o responsável maior pela perversa concentração de renda e da riqueza verificada no lapso de tempo em apreço (1964-1985), bem como atuou, de forma persistente, no sentido de reprimir, destroçar e aniquilar os setores mais avançados da sociedade civil brasileira. Trata-se de um Estado arbitrário, que viola suas próprias leis. (GERMANO, 2011, p.23).

            Como bem destaca Germano, em certos momentos, as ações do governo vigente, atendiam algumas necessidades para diminuir as tensões e os conflitos.
Segundo Germano (2011, p.21) o Estado Militar serviu “aos interesses dos conglomerados internacionais, de grandes grupos econômicos nacionais e das empresas estatais, formando um bloco cuja direção é recrutada nas Forças Armadas e que conta com o decidido apoio dos setores tecnocráticos”, assim, o país passou por severas mudanças desde o golpe de 1964, inclusive no setor educacional. De acordo com Cunha (1991, p. 240) “[...] uma série de atos oficiais expressaram a nova política educacional cujo objetivo é o de permitir que aquela função do Estado de concentrador de renda não mudasse de direção nem de intensidade”, assegurando a ideologia do novo governo. A política educacional e as mudanças na grade escolar, durante o período de Estado Militar atingiu milhares de pessoas de diversas faixas etárias e classes sociais, colocando em destaque o Estado de Segurança Nacional 2 para manter em ordem os anseios políticos sem questioidntos. Todas essas mudanças atendiam aos interesses dos militares e da classe dominante, sabendo o momento certo de agir e como agir, para justificar sempre os seus atos de violência e dominação; e os quais em seus discursos utilizavam a palavra democracia para convencer as classes subalternas.
A fase em que mais se intensificou o Estado Militar foi entre 1969 a 1978, com a aplicação do Ato Institucional número cinco (AI-5), que em apenas 12 artigos concedia ao Presidente da República os poderes de cassar mandatos, intervir em estados e municípios, suspender direitos políticos de qualquer pessoa e, o mais importante, decretar recesso do Congresso e assumir suas funções legislativas no ínterim. O AI-5 também suspendeu o Habeas Corpus para crimes políticos. Por consequência, jornais oposicionistas ao regime militar foram censurados, livros e obras consideradas subversivas3 , foram retiradas de circulação e vários artistas e intelectuais sentiram necessidade de se exilar no exterior. Com a intensificação da repressão  indivíduos, grupos e instituições estavam sob vigilância, como por exemplo, escolas e universidades. Conforme Heller,

os conceitos ideológicos dos militares, seus programas político-administrativos e seus métodos de gestão se estenderam também às universidades, incluindo a escolha de reitores, os rumos da pesquisa científica e as limitações ao livre curso das idéias entre alunos e professores. O sistema de informações e de repressão adquiriu proporções gigantescas entre 1964 e 1984, infiltrando-se em todos os poros da sociedade. Encabeçada pelo SNI [(Serviço Nacional de Informações)], montou-se uma extensa rede constituída pelos centros de informações do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, Polícia Federal, políticas militares e delegacias de ordem Política e Social. (HELLER, 1988, p. 50).

            Esses mecanismos de controle transcendiam para além dos de consenso, ampliando-se também para a utilização de mecanismos de coerção, visando a obtenção de domínio e direção social. Não para menos, grandes verbas passaram a ser investidas no setor de segurança, inclusive empresas privadas contribuíram com tal financiamento, pois estavam entusiasmadas com as possibilidades de abertura de novos campos de produção e portanto de desenvolvimento econômico (FON, 1979).          
Graças a grande entrada de investimentos estrangeiros, principalmente durante o governo do general Médici, o Produto Interno Bruto (PIB) aumentou consideravelmente, ficando este período conhecido como “milagre econômico”. Durante este período surgiu a necessidade de mão de obra qualificada para atender as novas indústrias, o que forçou a alteração no sistema de ensino, afim de capacitar a classe operária para setores industriais que estavam recebendo muitos investimentos, portanto o que faltava para o país continuar o seu crescimento, na visão do governo vigente, era uma reforma educacional, pois, com toda expansão da demanda social da educação, o governo necessitou criar mecanismos para obter recursos para atender questões educacionais, porém deveria ser contida para não colocar em risco a política econômica que foi planejada. A partir do momento em que se configura, de uma forma aguda, a crise, o governo se dispôs a tomar medidas que visavam à sua solução a curto e longo prazo. Esse período de transição caracterizou-se pela constituição de comissões para estudar os problemas relativos à crise e propor soluções. (ROMANELLI, 1986, p.197).

Para desenvolver tais estudos o Ministério da Educação e Cultura (MEC) contou com o apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid). Os acordos entre MEC-Usaid visavam remodelar o sistema educacional brasileiro a fim de atender ao sistema de dominação implantado pelo Estado Militar, atendendo os anseios econômicos e políticos, e possibilitar uma consequência eficaz para os problemas que o sistema de ensino vinha acumulando.
O ensino técnico foi intensificado, visando capacitar mão de obra para atender as empresas multinacionais, que estavam firmando projetos com o Estado Militar juntamente com os interesses da elite, trazendo para o Brasil o modelo norte-americano, orientado principalmente pelo pedagogo Ted Goertzel. Assim a meritocracia passou a ganhar maior destaque: o ensino técnico de segundo grau seria ofertado à todos os interessados em qualificar-se para o mercado de trabalho, assim cabendo somente ao indivíduo a responsabilidade do sucesso profissional via educação,
Após a tomada do país em 1964 pelos militares, com as mudanças vertiginosas na maneira de organizar as políticas, em especial a política econômica, acentuou-se o poder econômico da elite, que detinham o capital, a propriedade e mercado de trabalho; resultando na falência de pequenas empresas e/ou em dificuldades financeiras para continuarem ativas, e no aumento da busca pelo ensino superior como possibilidade de garantia e ingresso no mercado de trabalho. Como comenta Cunha (1991), o aumento da demanda por este nível de ensino e a quantidade de vagas ofertadas, não foram suficientes para atender toda a procura, portanto o número de inscritos era maior do que a de vagas disponíveis:
O fato de haver um número dão elevado de excedente fez com que se criassem condições para a contestação da própria política educacional. Houve também, tentativas de se improvisarem soluções para o aumento do número de vagas a curto prazo. (CUNHA, 1991, p.239)
Devido à crise educacional que se instaurava as classes que visaram ascensão social via educação começaram a se organizar e reivindicar seus direitos ao Estado, que por sua vez, buscou soluções paliativas, por exemplo, ampliando o número de alunos em sala de aula, sem adequá-las com recursos físicos e humanos. A quantidade de professores capacitados era insuficiente para atender a demanda, resultando em um ensino insatisfatório.
Os grupos oposicionistas, como alguns movimentos de estudantes e intelectuais manifestavam-se em defesa do nacionalismo, porém muitos foram inibidos com a ampliação dos atos de investigação, censura e repressão.

2. ACORDO MEC-USAID
           
Em época anterior ao período tecnocrático civil e militar, o governo americano destinou recursos para a educação. Conforme Germano (2011, p.125), no período de 1960 a 1964 “a ‘Aliança para o Progresso’ e a Usaid destinaram recursos para à educação primária e à alfabetização de adultos – sobretudo no Nordeste – tendo mesmo financiado as experiências iniciais de Paulo Freire em Angicos, no Rio Grande do Norte”. Com os militares no comando, os recursos norte-americanos foram intensificados por meio de acordos. Para a concretização  desse financiamento, a Usaid enviou peritos, para treinar os profissionais brasileiros e financiou os estudos de pesquisadores no exterior, visando implantar um modelo de educação de excelência nos moldes americanos, assim:
milhares de brasileiros – notadamente técnicos de nível superior – foram treinados nos EUA. Assim entre 1963-1970, somente a Usaid-Nordeste enviou cerca de 1.200 bolsistas para os Estados Unidos, entre os quais 20% obtiveram graus de pós-graduação em universidades norte-americanas (cf. Catálogo de Bolsistas da Usaid-NE). Além disso, impuseram o consumo de tecnologias avançadas – como uso de satélites – no campo da educação, [...] envolvendo interesses multinacionais do ramo eletrônico e espacial. (GERMANO, 2011, p.126).

O governo norte-americano teve grande influência na política educacional durante o governo militar. Ao analisar a educação brasileira foram produzidos dois relatórios que merecem destaque, o Relatório Atcon e o Relatório Meira Mattos. O Relatório Atcon, concluído em 1966, enfatizava a importância de racionalizar a universidade, organizando-a em moldes empresariais, privilegiando, a privatização do ensino. “Partia do pressuposto de que a educação era essencial ao desenvolvimento econômico da sociedade e sugeria a adoção de medidas como: sistema de créditos, organização departamental, ciclo básico e ciclo profissional, juntamente com a privatização do ensino”. (GERMANO, 2011, p.117, 123). O relatório Meira Mattos representou um reforço às propostas surgidas com os Acordos MEC-USAID, sua comissão teve dupla função: atuar como interventora nos focos de agitação estudantil e estudar a crise em si, para propor medidas de reforma. (ROMANELLI, 1986, p.197).
Quando o governo norte-americano analisou o sistema educacional brasileiro, percebeu a oportunidade de colocar em prática seus ideais educacionais.
A congruência dos resultados dos relatórios abriu caminho para o MEC e a Usaid firmarem parceria na educação com os acordos MEC-Usaid. No dia 23 de junho de 1965 foi consolidado o primeiro acordo, focando no ensino superior. Este, foi firmado através de duas grandes figuras políticas da época: o ministro do MEC, Flávio Suplicy de Lacerda, e o diretor da Usaid, Stuart Van Dyke.
O primeiro acordo foi apresentado ao congresso em novembro de 1966, para atender a demanda da educação superior, para isso necessitaria de um investimento grande, resultando em um aumento da despesa pública, e essa ampliação das matrículas no ensino superior dificultaria o desenvolvimento do ensino primário e ginasial. Outro ponto a destacar sobre a expansão nas vagas seria o grande contingente de profissionais ao final de cada curso, que como comenta Cunha (1991), seria desfavorável à política econômica, pois

sabia-se que o acréscimo de profissionais formados não seria facilmente empregável no setor privado, cabendo, então, ao setor público o ônus de criar oportunidades “artificiais” de trabalho, isto é, de emprego. Isso também comprometeria o esforço do Estado de concentração de capital cuja destinação não era a de financiar, pelo menos diretamente, as aspirações das camadas médias mas, sim, a de garantir, facilitar e subsidiar a expansão das empresas industriais privadas na direção da manutenção e elevação da taxa de lucro. (CUNHA, 1991, p.240).

            Por isso, depois que os relatórios foram apresentados colocando as informações necessárias para a reforma educacional a Usaid apresentou a proposta para ser colocada em prática, como confirma Arapiraca (1979), as obrigações que a Usaid deveria cumprir, era o financiamento de até US$ 410.000,00 para realizar as consultorias, as quais incluíam: equipe norte americana especializada na área de planejamento do ensino secundário; formação para os funcionários brasileiros que fossem do MEC; projetos a serem aplicados nas escolas públicas brasileiras; enquanto que ao MEC, era a responsabilidade de: selecionar os funcionários que receberiam essa formação; colaborar com os norte-americanos de forma a apresentar os resultados conforme o andamento dos projetos; viabilizar estabelecimento adequado e auxiliar em tarefas de escritório para os norte-americanos e selecionar bolsistas brasileiros para serem enviados para os EUA.  Para que esse acordo fosse realmente colocado em prática a Usaid impôs a condição para o MEC de dar enfoque por meio da publicidade do acordo, como Arapicara (1979, p.157) “[...] envidarão os melhores esforços para dar publicidade ao andamento desse projeto, através da imprensa, rádio e outros meios de difusão, identificando-o especificamente como parte da Aliança para o Progresso.”
A atuação da Usaid nos programas desenvolvidos incluía a assistência financeira e técnica juntamente com os profissionais das instituições educacionais brasileiras, permitiu que a Usaid durante a assistência técnica, reformulasse estratégias e incluíssem modelos utilizados por eles; pois a estratégia de ação funciona quando são aceitas e colocadas em prática. As estratégias também necessitam dos relatórios de avaliação do sistema de ensino que precisam de reformulação, para que os programas a serem implantados atuem permanentemente, para atingir os resultados em ambos os lados.  Os objetivos estratégicos da Usaid foram:
1. Estabelecer uma relação de eficácia entre recursos aplicados e produtividade do ensino escolar; 2. Atuar sobre o processo escolar em nível do microssistema, no sentido de “melhorarem” conteúdos, métodos e técnicas de ensino; 3. Atuar diretamente sobre as instituições escolares, no sentido de conseguir delas uma “função” mais eficaz para o desenvolvimento; 4. Modernizar os meios de comunicação de massa, com vistas à melhoria da “ informação nos domínios da educação extra-escolar”; 5. Reforçar o ensino superior, “com vista ao desenvolvimento nacional”. (ROMANELLI, 1986, p. 210).
Dessa maneira, o modelo MEC-Usaid beneficiou o aumento das multinacionais, e formou intelectuais que atendessem aos seus interesses. Para Chiavenatto (1994), esses intelectuais são os intelectuais orgânicos, que se adaptam as elites culturais e sentem-se responsáveis em definir as regras da cultura. Esse modelo foi colocado para atender os anseios de classe e as necessidades do sistema, que os militares planejavam.
Muitos intelectuais brasileiros como aponta Shiroma (2002) orgânicos ao regime e interessados nas políticas educacionais, como o complexo Instituto Brasileiro de Pesquisas e Estudos Sociais e Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IPES/IBAP), o Instituto Euvaldo Lodi(IEL), criado pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI), colaboraram com as formulações das diretrizes políticas e educacionais, em especial as leis 5692/68 e 5692/71colaboraram com as formulações das diretrizes políticas e educacionais, em especial as leis 5540/68 e 5692/71.

A política educacional do regime militar apoiou-se basicamente nas leis nas leis 5540/68 – que reformou o ensino superior- e a 5692/71- que reformou o ensino de primeiro e segundo graus. Mesmo relativizando o peso dos acordos MEC-Usaid. Na definição das diretrizes da educação brasileira, as duas leis, como toda a legislação do regime militar, não fugiram do quadro geral de suas recomendações. (SHIROMA, 2002, p. 35-36).
Por meio desses relatórios e projetos; com a política educacional necessitando urgente de alterações, os acordos MEC-Usaid, tiveram por resultado no período tecnocrático civil e militar: a reforma universitária em 68; posteriormente a reforma do ensino de 1º e 2º graus através da lei 5692/71, a qual desde o início dos planejamentos para as políticas educacionais apontou a necessidade de reorganizar o modo como se aplicavam os conteúdos no ensino fundamental e médio.
3. LEI Nº 5.692/71
A Lei nº 5692 de 1971 que fixou diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º grau foi a décima reforma educacional brasileira, considerando-se o percurso histórico desde a proclamação da República4. Conforme Germano (2011, p. 164) essa lei expôs dois pontos principais: “a extensão da escolaridade obrigatória, compreendendo agora todo o denominado ensino de 1º grau, junção do primário com o ginásio e a generalização do ensino profissionalizante no nível médio ou 2º grau”. Essa lei resumiu-se em uma proposta de profissionalização durante o ensino do 2º grau, nas quais existiam as seguintes condições básicas:

— existência de relações estreitas e racionais entre escola e mercado de trabalho; — carência de técnicos de nível médio no País; — valorização da escolaridade formal por parte da empresa; — possibilidade de se atribuir ao sistema educacional a maior responsabilidade pelo preparo dos recursos humanos necessários à modernização do setor econômico; — viabilidade de uma proposta única de ensino médio para todo o País, capaz não só de integrar o desenvolvimento intelectual do adolescente com sua formação profissional, mas também de promover a regulação das novas relações surgidas — ou por surgir — entre a educação e o sistema econômico. (INEP-ensino profissionalizante, 1982, p.28).

            Um grupo formado por nove especialistas foi nomeado pelo governo Médici em 1970 para fazer e apresentar a proposta da reforma educacional que o Brasil necessitava para o crescimento econômico, e também para atender as exigências feitas pelos investidores internacionais, fizeram parte: padre José de Vasconcellos (presidente); Valnir Chagas(relator); Aderbal Jurema; Clélia de Freitas Capanema; Eurides Brito da Silva; Geraldo Bastos da Silva; Gildásio Amado; Magda Soares Guimarães e Nise Pires. Então, em 11 de agosto de 1971, foi promulgada a lei 5.692, sem nenhum veto. Os partidos políticos de ambos os lados, direita e esquerda, aceitaram a reforma, como aponta Germano:

Desse modo, não houve espaço para a atuação dos grupos de pressão, pois de um lado os interesses privatistas foram contemplados e de outro os partidários da escola pública e da ampliação de verbas para a educação estavam desarticulado e mesmo destroçados, incorporados a outras formas de lutas, com vistas à derrubada do Regime ou, ainda, aderiram à Reforma. (GERMANO, 2011, p.161).

Essa reforma aconteceu no momento em que alguns grupos de intelectuais e lideranças estudantis estavam sendo reprimidos e estavam concentrados em realizar uma transformação na sociedade brasileira como um todo, pois as mudanças em leis e em organizações aconteciam rapidamente e não conseguiam focar nas reformas de bases.  Com a promulgação do AI-5, muitos desses intelectuais se exilaram do país e assim “o Estado venceu o confronto, silenciando a sociedade através do terror, viabilizado pela montagem de aparelho repressivo descomunal. É nessa conjuntura que o Estado vai propor e institucionalizar a reforma da educação brasileira”. (GERMANO, 1994, p. 94).
Dessa maneira, dependendo de como se organizavam politicamente, a educação de segundo grau acabou ficando como algo de segundo plano, ao contrário do que aconteceu na Reforma Universitária de 1968 que teve muitas mobilizações para que o Estado aumentasse o valor das verbas destinadas à educação e abrisse um maior número de vagas para ingresso ao ensino superior. Já no período de 1969 iniciava o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral)5 , para acabar com o analfabetismo dos jovens e adultos; e em 1971, a repressão do Estado Militar foi enorme, com grupos guerrilheiros exterminados as reformas políticas educacionais ganhavam legitimação. Assim a militarização chega ao ponto mais alto com o titular do MEC sendo o militar que escreveu o AI-5, o coronel Jarbas Passarinho.
Com a reforma do ensino do 1º grau e 2º grau atendendo as políticas educacionais e as políticas econômicas instauradas pelos militares a fim da necessidade de qualificação do indivíduo para as indústrias, os problemas em que a educação fundamental passava, continuaram e até se intensificaram, pois o aumento das matrículas para o ensino fundamental resultou apenas em um aumento quantitativo, com uma má qualidade do ensino prestado pelas escolas públicas, e os baixos investimentos na educação foram insuficientes para a demanda.

A reformulação do ensino de 1ºgrau era mais importante e atendia melhor aos interesses da retomada da expansão econômica eminente, do que a reformulação do ensino de 2ºgrau. Essa expansão num país dependente como o Brasil, exigiria um aumento do nível geral de escolaridade do trabalhador, mas por sua vez, esse aumento teria de ser concedido, de forma compatível com a posição periférica de nossa economia: a industrialização crescente exige uma base de educação fundamental e algum treiidnto, o suficiente para o indivíduo ser introduzido na manipulação de técnicas de produção e aumentar a produtividade, em, contudo, ter sobre o processo nenhum controle, nem mesmo qualquer possibilidade de exigências salariais que um nível mais elevado de escolarização e qualificação acabaria por suscitar. (ROMANELLI, 1986, p.234).

            Conforme Germano (2011) o Brasil contava com grande parte da população sem acesso escolar, assim com a extensão da escolarização o mercado de trabalho tornar-se-ia regular e atenderia a demanda social, dessa maneira, poderiam ser exigidas melhores formações para atender as necessidades da indústria, sem precisar aumentar o salário dos empregados como forma de apresentar uma condição de igualdade, que se trata de um preparo da dominação do Estado Militar. Os empresários tiveram mão de obra barata com uma educação básica e função técnica, resultaria em grande produtividade.

O “Estado pode preservar a sua própria legitimidade, ou seja, o apoio e o reconhecimento dos cidadãos somente na medida em que logra manter a ficção de igualdade entre eles e defender-se efetivamente da responsabilidade pelas experiências de desprivilegiamento e exploração que, através dos mecanismos econômicos de uma sociedade capitalista, são permanentemente criados”. Desse modo, “a própria instituição do Estado corre o risco de que a sua aparente neutralidade seja desmascarada”. Possibilitando assim que “ele seja identificado e combatido como parte da classe dominante”. (CLAUS OFFE apud GERMANO, 2011, p.165).

            Na política educacional, o Estado Militar conseguiu dar uma forma aparente de que estavam ofertando oportunidades para as classes subalternas, mascarada de igualdade, para acalmar a situação que estava se agravando cada vez mais, as diferenças de classes, e legitimar ações de políticas educacionais introduzidas pelo EUA, como explica Arapiraca:

Admitimos que houve intenção em legitimar toda uma transformação modernizadora imposta à nacionalidade brasileira, no sentido de direcionar sua racionalidade pelo modo de produção capitalista. Com essa direção impuseram-se mudanças radicais no processo do ensino, objetivando modernizá-lo pela internalização da filosofia pedagógica desenvolvida nos EUA. Houve toda uma mobilização dos quadros da inteligentzia pedagógica brasileira, no sentido da absorção das práticas educativas observadas nos EUA, principalmente com referência à efetividade e à eficiência do aparelho escolar alternativo para as minorias, ali desenvolvido. (ARAPIRACA, 1979, p.151).

             Assim com as reformas educacionais acontecendo, e oportunizando aos indivíduos a procura pelo ensino, diminuíram as possibilidades de organização de grupos para discussões políticas. A reforma 5692 anexou por completo o ensino profissionalizante ao sistema regular de ensino, como  descreve em seu artigo primeiro: “ O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania.” BRASIL (1971). 

Rezava a lei que o ensino do segundo grau com três anos de duração – perdia seu tradicional perfil propedêutico e transformava-se uma estrutura que, como recomendava o art. 1º visava: “proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente de cidadania”. (SHIROMA, 2002, P.40).

            Para fins de uma continuação dos estudos como forma de preparar um trabalhador para o mercado de trabalho, no período tratado em questão, a reforma educacional, dada pela lei 5692 reforçou a dualidade do sistema de ensino, ou seja escola para ricos e escola para classes subalternas, a partir da reforma tornava a aquisição de uma profissão pelo estudante durante o ensino médio, relacionando à classe trabalhadora, assim as elites poderiam continuar com um ensino propedêutico, com conhecimentos melhores, enquanto aos que ficaram com o ensino profissionalizante, cessar o conhecimento com a preparação técnica, e ir para o mercado de  trabalho, assim com mais possibilidades do ensino técnico os alunos deixariam de procurar o ensino superior, firmando os anseios da elite, obtendo uma grande quantia de trabalhadores com ensino técnico o qual os salários eram baixos, de acordo com os conhecimentos repassados nas instituições de ensino.    

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante o período tecnocrático civil e militar, muitas mudanças ocorreram em diversas áreas: política, educacional, social e outras. Em todas houve dominação dos militares, em prol da burguesia industrial e às classes dominantes nacional e internacional, ou seja, a elite e uma exclusão da classe popular. Os militares instauraram um regime autoritário e ditatorial, referindo-se a uma forma de dominação do setor da sociedade política, o qual resultou no Estado Militar. Um governo que criou suas próprias leis para atender seus interesses.
Assim, a política educacional do período militar, abriu as portas para os investimentos estrangeiros, no qual necessitariam reorganizar a forma de ensino vigente no país, introduzindo técnicas norte-americanas, por meio dos acordos MEC-Usaid, inicialmente foram realizados estudos e produzidos relatórios para entender a situação do ensino brasileiro, para então propor projetos que atendessem as necessidades observadas Durante a vigência desses acordos foram realizadas reformas educacionais, porém utilizadas apenas para amenizar a situação precária do sistema de ensino.
A reforma 5692/71, tratada nesse artigo, aponta que todas as modificações realizadas na melhoria da educação, como foram utilizadas para as classes subalternas, introduzindo um ensino focado no aluno para ser trabalhador, anexando ao ensino médio o ensino técnico, capaz de formar o aluno para uma profissão, e contribuir com a sociedade com a sua mão de obra qualificada. Dessa maneira os trabalhadores teriam uma educação técnica para atender a elite e suas indústrias nacionais e internacionais, não precisando de uma formação mais específica, tirando o foco de uma educação contínua, e direcionando para uma educação básica para atender apenas ao mercado de trabalho, aos anseios das políticas de Estado e grupos privilegiados.
Os acordos MEC-Usaid, e as reformas educacionais, colaboraram com o ensino brasileiro, porém foram utilizados por meio da elite, para uma formação que atendesse ao mercado de trabalho, sem precisar investir em salários, pois todos teriam a oportunidade ao ensino fornecido pelo ensino público.

5. REFERÊNCIAS

Arapiraca, José Oliveira. A USAID e a educação brasileira, um estudo a partir de uma abordagem crítica do capital humano. 1979. 300 f. Dissertação de Mestrado - Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro. 1979.
BRASIL. Lei no 5.692, de 11 de agosto de 1971. Disponívelem:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-5692-11-agosto-1971-357752-publicacaooriginal-1-pl.html>
Acesso em: 07 de novembro de 2018.
CHIAVENATO, Júlio José. O golpe de 64 e a ditadura militar. 1ª ed. São Paulo: Editora Moderna, 1994.
CUNHA, Luiz Antonio. Educação e Desenvolvimento Social no Brasil. 9ª ed. RJ: São Alves, 1991.

FON, Antonio Carlos. Tortura, a história da repressão política no Brasil. São Paulo: Global, 1979.

GERMANO, José Willington.  Estado militar e educação no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1994.

GERMANO, José Willington.  Estado militar e educação no Brasil. 5ª ed. São Paulo, Cortez, 2011.

GURGEL, José Alfredo Amaral. Segurança e Democracia: “Uma reflexão política sobre a doutrina da Escola Superior de Guerra”. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, J. Olympio, 1975. 

HELLER, Milton. Resistência democrática: a repressão no Paraná. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.

INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. Brasília, 1982.

ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil (1930-1973). 8ª ed. Petrópolis: Vozes, 1986.

SHIROMA, Eneida Oto. Política educacional. Rio de Janeiro: DP&A editora. 2002. p. 7-43.

WANDERLEY, Luis  Eduardo W. Educação popular e processo de democratização. São Paulo: brasiliense, 1980.

*(autora responsável pela correspondência) Pedagoga Afiliação Institucional: Especialização em Educação, Universidade Estadual do Oeste do Paraná campus Cascavel, Brasil Endereço eletrônico: municakn@hotmail.com Endereço Postal: Rua Sargento Abdiel Ribeiro dos Santos, 318. Jardim Padovani 85803-350 – Cascavel, PR – Brasil. Dados curriculares: Graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (2018). Atualmente aluna do Curso de Pós Graduação na Universidade Estadual do Oeste do Paraná, professora de educação Infantil. Endereço para acessar este Currículo: http://lattes.cnpq.br/6235149789072849
** Doutora em Educação Afiliação Institucional: Colegiado de Filosofia, Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual do Oeste do Paraná campus Toledo, Brasil Endereço eletrônico: anakarinebraggio@hotmail.com Endereço Postal: Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Centro de Ciências Humanas e Sociais. Rua da Faculdade, 645 – Colegiado de Filosofia Jardim La Salle 85903-000 – Toledo, PR – Brasil Dados curriculares: Possui graduação em Tecnologia em Estética e Cosmetologia pela Universidade Paranaense campus Cascavel (2008), graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (2010), mestrado em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (2013) e doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Maringá (2017). Atualmente é professora temporária do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, onde atua nos cursos de licenciatura em Filosofia, Ciências Sociais e Química. Endereço para acessar este Currículo: http://lattes.cnpq.br/1712426299672608
1 Classes subalternas: aquelas que vivem uma condição de exploração e de dominação no capitalismo, sob múltiplas formas. (WANDERLEY, 1980, p. 63).
2 A lei 1.802, de 5 de janeiro de 1953, tratava as infrações contra a segurança externas eram processadas e decididas pela justiça Militar; as demais; isto é, a grande maioria, eram da competência da justiça  comum, integrada por juízes e tribunais civis. Durante o regime autoritário a partir de 1964, houve profunda modificação. O Ato Institucional n.º 2, de 27 de outubro de 1965, deferiu à Justiça Militar a competência para conhecer de todos os ilícitos contra a segurança nacional. (HELLER, 1988, p. 39)
3 Subversivo: segundo a Doutrina de Segurança Nacional, os inimigos do estado ou subversivos são quaisquer elementos que possam criar obstáculos a política nacional, tanto na área de desenvolvimento, quanto na de segurança (GURGEL, 1975, p.79).
4 As outras reformas educacionais foram: Benjamim Constant (1890); Amaro Cavalcanti (1892); Epitácio Pessoa (1901); Rivadávia Corréa (1911); Carlos Maximiliano (1915); João Luiz Alves (1925); Francisco Campos (1931); Gustavo Capanema (1942); LDB (Lei de Diretrizes e Bases-1961). (GERMANO, 2011, p. 159).
5 Mobral foi criado pela Lei nº 5.370, de 15-12-67, e iniciou suas atividades, regularmente em setembro de 1970. Seu objetivo prioritário era a alfabetização da população urbana analfabeta de 15 a 35 anos (CUNHA, 1991, p. 255).

Recibido: 01/03/2019 Aceptado: 13/03/2019 Publicado: Marzo de 2019

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