Revista: Atlante. Cuadernos de Educación y Desarrollo
ISSN: 1989-4155


A INVESTIGAÇÃO E A TOTALIDADE CONCRETA: ENSINO MÉDIO INTEGRADO

Autores e infomación del artículo

Noemi Ferreira Felisberto*

UNILA., Brasil.

noemi.ferreira@unila.edu.br


Resumo:
Este artigo tem como objetivo refletir sobre a categoria totalidade buscando, a partir disso, compreender como se relacionar com o objeto de nossa pesquisa – a relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado – e qual o papel da consciência no ato de produção de conhecimento nessa perspectiva. Entendendo que a realidade é complexa e que ciência e as necessidades humanas estão intimamente relacionadas influenciando-se mutuamente é que se torna imperioso a busca da totalidade no processo de produção de conhecimento. Partindo da pesquisa bibliográfica, desenvolvemos reflexões sobre a totalidade, a relação sujeito-objeto e as implicações da consciência para elaboração do conhecimento. Verificamos que para estudo da relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado dentro da perspectiva da totalidade devemos considerar que o sistema educacional é resultado de um processo histórico de múltiplas determinações. Por isso, precisamos desconstruir e recompor realidade do ensino integrado buscando, pelas mediações, esclarecer as determinações e contradições que envolvem nosso objeto.

Palavras-chave: Totalidade; Ciência; Realidade Social;

Abstract:
This article has goal to reflect about the totality seeking to understand how to relate to the object of our research - the relation capital work in the Integrated High School- and what the role of consciousness in the act knowledge production from this perspective. Understanding that reality is complex and that science and human needs are closely related influencing each other is that it is imperative to search for wholeness about totality the knowledge production process. Starting from the literature, we have developed reflections on the whole, the subject-object relationship and the implications of consciousness to the creation of knowledge. We found that to studying the relation capital work in the Integrated High School from the perspective of totality we must consider that the educational system is the result of a historical process of multiple determinations. So we need to deconstruct and recompose reality of integrated education seeking, by mediation, in order to clarify the provisions and contradictions involving our object.

Keywords: Totality; Science; Social reality;


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Noemi Ferreira Felisberto (2018): “A investigação e a totalidade concreta: ensino médio integrado”, Revista Atlante: Cuadernos de Educación y Desarrollo (junio 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/atlante/2018/06/investigacao-medio-integrado.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/atlante1806investigacao-medio-integrado


  1. INTRODUÇÃO

A produção do conhecimento cientifico não é prerrogativa do homem contemporâneo, mas desenvolveu-se passando por rupturas e continuidades na tentativa de compreensão da natureza, do homem, do mundo.  Esse desenvolvimento é marcado pelas condições e necessidades materiais do momento onde os sujeitos estão inseridos - Andery (2012), Marx (1993), Lukács (1968), Kosik (2010).
Essa íntima relação entre a ciência e as necessidades humanas mostra-se evidente na atualidade, dado o densenvolvimento do conhecimento científico, do sistema societário que estamos inseridos e da própria sociedade, na qual os homens para suprir suas carências agem de forma prática utilitária, sem questioidntos e reflexões para além do aparente.
Diante de tal complexidade, é essencial que a pesquisa busque a essência e que qualquer análise no campo das ciências – sejam ciências sociais, ciências exatas, ciências humanas – considere a relação inseparável entre o conjuntural e o estrutural. Em outras palavras, impõe buscar a totalidade.  
Entendendo a totalidade, conforme expôs Kosik (2010), em que ela (a totalidade) não é todos os fatos, mas é a realidade como um todo estruturado, dialético, no qual ou do qual um fato 1 qualquer pode vir a ser racionalmente compreendido é que entendemos que a realidade educacional tem que ser analisada levando em conta que ela é resultado da ação dos seres humanos.
Ancorada nesta premissa, esta reflexão é uma tentativa de compreender a relação capital e trabalho no Ensino Médio Integrado no Instituto Federal do Paraná (IFPR) institucionalmente e por meio de parceria com Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) a partir de sua relação estrutural. De outra forma, bucamos pensar este objeto em sua historicidade e em sua totalidade.
Dessa forma, buscar-se-á examinar o objeto considerando as inter-relações e as mediações que o mesmo sofre. Por meio das categorias trabalho, ensino politécnico e formação humana, o estudo procurará sintetizar a realidade para além da visão fenomênica, buscando a visão do conjunto, da totalidade.
Partindo da pesquisa bibliográfica, este artigo desenvolverá reflexões sobre a categoria totalidade buscando entendê-la para, então, elaborar o conhecimento sobre nosso objeto dentro desta perspectiva.
Como desdobramento do entendimento da categoria totalidade, selecionamos, ainda, outras duas mediações para a compreensão da relação capital trabalho no ensino médio integrado que julgamos necessário para amplitude aqui proposta. São elas: a relação sujeito/objeto; o papel da consciência na construção do conhecimento.
As discussões estão fundamentadas em como autores kosik (2010) que propõe a construção do conhecimento a partir da destruição da pseudorealidade. Frigotto (2008, 2011) filósofo da educação que discorre sobre a interdisciplinaridade na perspectiva da totalidade e dispõe sobre a educação considerando a materialidade que está inserida. Já para o debate do estudo do ser temos Georg Lukács (1969). Com Leandro Konder (2008) temos o estudo da dialética, do trabalho, da totalidade e outros conceitos fundamentais para o marxismo. Para compreender a ciência numa perspectiva histórica embasamos em Andery (2012). Ciavatta (2007, 2011) concentra-se nas mediações históricas das categorias trabalho e educação. Freud (1950) dedica-se ao estudo do animismo, da magia e da onipotência do pensamento. Jantsch e Bianchetti (2011) discutem a interdisciplinaridade e a filosofia do sujeito.
O artigo está organizado da seguinte forma: inicialmente apresentamos o conceito de totalidade e as implicações para o tratamento do objeto relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado.
Em seguida, discorremos sobre a relação do sujeito com o objeto perpassando pelo protagonismo do objeto pelo sujeito, do sujeito sobre o objeto e pela concepção onde ambos estão no mesmo plano. Num terceiro momento, fazemos uma análise sobre o papel da consciência na construção do conhecimento.

  1.  A TOTALIDADE CONCRETA

Partindo da concepção materialista, a totalidade é mais do que a soma das partes, é uma visão de conjunto que permite ao sujeito enxergar o objeto presente como síntese de múltiplas determinações históricas.
Para Ciavatta (2007), a dialética da totalidade é uma teoria em que os seres humanos e objetos existem em situação de relação e nunca isolados. Para a autora, estudar um objeto nessa perspectiva “é concebê-lo na totalidade de relações que o determinam, sejam elas de nível econômico, social, cultural” (CIAVATTA, 2007: 24).
Frigotto (2008), retomando Kosik (1978), afirma que a totalidade concreta não é tudo e nem a busca do princípio fundador de tudo. Investigar dentro da concepção da totalidade concreta significa buscar explicitar, de um objeto delimitado, as múltiplas determinações e mediações que o constitui.
O autor explana, ainda, que delimitar o objeto para a investigação não é fragmentá-lo ou limitá-lo arbitrariamente, pois se o processo do conhecimento impõe a delimitação de determinado problema, temos que considerar as múltiplas determinações que o constitui (dimensão política; social; científica; antropológica, psíquicas, estéticas).
Assim, “se do ponto de vista da investigação podemos delimitar uma destas dimensões não podemos perder de vista que para que sua compreensão seja adequada é preciso analisá-la na sua necessária relação com as demais dimensões” (FRIGOTTO, 2008: 45).
Konder (2008) pondera que a investigação na visão da totalidade não pretende esgotar toda a realidade a que se refere, pois pode existir algo que escape a síntese do pesquisador. Isso, todavia, salienta o autor, não dispensa o esforço de elaborar conhecimento considerando a visão de conjunto que permite ao homem descobir a estrutura significativa da realidade com que se defronta.
A partir dessas considerações, vemos que o objeto problematizado – a relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado a Educação Profissional na perspectiva convencional e permeado pelos princípios pedagógicos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) –  sofre as mediações da relação capital trabalho que refletem no âmbito educacional e na luta dos sujeitos Sem Terra por uma educação que busca a transformação social.
A realidade concreta de que partirmos é a do Ensino Médio Integrado à educação profissional no Brasil e suas mediações na estrutura econômica produtiva, bem como as lutas de sujeitos pela indissociabilidade entre trabalho técnico e trabalho intelectual e pela formação de omnilateral do ser humano nesta modalidade de ensino.
Todavia, concordamos com Kosik (2010) que preceitua que para uma discussão científica temos que penetrar na essência do objeto, uma vez que a realidade não se apresenta imediatamente ao sujeito pesquisador, pois como homens, agimos objetivamente sobre a natureza para suprir nossas necessidades. Para o autor:

No trato prático-utilitário com as coisas – em que a realidade se revela como mundo dos meios, fins, instrumentos, exigências e esforços para satisfazer estas – o indivíduo cria duas próprias representações das coisas e elabora todo um sistema correlativo de noções que capta e fixa o aspecto fenomênico da realidade. (KOSIK, 2010:10).

Nesse cenário, experimentamos uma atividade prática utilitária por meio da qual criamos nossas próprias representações das coisas, gerando a pseudorealidade.  Por isso a necessidade de investigação com base na própria realidade, buscando os movimentos que a compõe, a fim de compreender o que está obscuro, confuso ou omitido para chegar ao conceito do todo, agora abarcando suas múltiplas relações, a totalidade.
Kosik (2010) enfatiza que a construção do conhecimento deve, necessariamente, partir da desconstrução da pseudorealidade. Para isso, temos que, dialeticamente, apontar de onde provêm os fenômenos, como os mesmos são constituídos e quais suas (inter) dependências. Dessa forma, o pesquisador consegue separar o fenômeno da essência e o secundário do essencial para a constituição do conhecimento.
Essa separação é o que diferencia a práxis revolucionária/ciência da práxis utilitária e é nessa perspectiva que procuraremos desvendar como ocorre o conflito capital trabalho dentro do Ensino Médio Integrado na escola convencional e na escola onde o Ensino Médio Integrado é balizado pelos princípios pedagógicos do MST.
Isso demanda reconhecer as contradições internas da educação profissional em uma sociedade de classes na qual dominantes e dominados buscam interesses divergentes. Nesse sentido, o próprio sistema escolar é mediado por contradições, uma vez que a classe dominante, por sua força hegemônica, tenta - e por vezes consegue - articulá-lo de forma a atender seus interesses, desvinculando-o do caráter educativo e histórico.
Todavia, educadores e, principalmente, a classe trabalhadora organizada em movimentos coletivos confrontam a lógica do capital, lutam para transformação da ordem social vigente, por justiça social. Para o MST a educação é um instrumento fundamental para a continuidade da luta pela terra que possibilita trabalhar, produzir e viver digidnte2 .
Nesse sentido, educação é um processo de formação da pessoa humana, por meio da qual as pessoas se inserem na sociedade transformando-se e transformando tal sociedade. Por isso, a educação “está sempre ligada com um determinado projeto político e com uma concepção de mundo” (MST, 2005: 161)
Dessa forma, as contradições refletem na política educacional e, mais notadamente, na modalidade educação profissional – seja ela integrada ou não – que serve ao capital na medida em que busca formar mão de obra para o mercado, separa o ensino da vida, do saber construído historicamente, e conserva as estruturas capitalistas; e nas lutas dos trabalhadores que buscam uma educação profissional que possibilite a emancipação política, social e cultural dos sujeitos.
Por isso, para investigar dentro na perspectiva da totalidade temos que reconhecer como as características: produtividade, mercantilização da produção humana, a empregabilidade, concorrência, permeiam o ensino profissional. Demanda, também, reflexão sobre a polissemia da categoria trabalho, sua gênese, e a vinculação com a educação profissional tanto do ponto de vista do capital como na perspectiva de o trabalho ser um ato necessário a todo ser humano, ou seja, ontológica.
Dessa forma, buscaremos fazer uma análise não limitada da relação capital trabalho no ensino profissional integrado. Procuraremos compreender os nexos internos entre este objeto e as categorias trabalho, ensino politécnico e formação humana, de forma que a investigação vá para além da aparência e alcance a essência dos acontecimentos. 
Por consequência, empenharemos por interpretar nosso objeto dentro da realidade, explicando-a a partir do próprio real, mediante o desenvolvimento e a ilustração das suas fases. Partiremos do abstrato ao concreto por meio do movimento do pensamento no pensamento.
Kosik (2010) explica que esta progressão do abstrato ao concreto, move-se no plano abstrato, onde ocorre a negação da imediaticidade, da evidência e da concreticidade sensível. Portanto, a ascensão do abstrato ao concreto é um movimento que consiste na superação da abstratividade. Por isso,

O ponto de partida do exame deve ser formalmente identico ao resultado [...] mas o sentido do exame está no fato de que seu movimento em espiral ele chega a um resultado que não era conhecido no ponto de partida e que, portanto, dada a identidade formal do ponto de partida e do resultado, o pensamento, ao conluir seu movimento, chega a algo diverso  - pelo seu conteúdo – daquilo que tinha partido. (Kosik, 2010: 29)

Assumimos, assim, o caráter dialético do todo e das partes, admitido, a unidade das contradições e a dialética do fenômeno e da essência; da lei e da casualidade, do todo e da parte, da essência e dos aspectos fenomênicos (Kosik, 2010), pois são justamente os elementos contraditórios que formam uma totalidade.

  1. A RELAÇÃO SUJEITO-OBJETO

Pensar a relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado obriga-nos a posicionar. Nossa opção em relação a escolha do objeto já traz em si uma opção de escolha do sujeito pesquisador, uma intencionalidade de ação na realidade educacional presente, um elemento político que é a responsabilidade enquanto educador com uma formação onilateral do educando.
Trabalhamos dentro da perspectiva que o pesquisador não é neutro, mas condicionado pela realidade e materialidade na qual está inserido: um contexto no qual as políticas sociais são influenciadas por princípios capitalistas neoliberais, povoado por desigualdades e exclusões sociais em que “a educação não é mais direito social subjetivo, mas um serviço mercantil” (FRIGOTTO, 2011: 240).
Por conseguinte, a relação sujeito objeto vem marcada pelas concepções e condições de classe do pesquisador. Nesse sentido, afirma Frigotto (2008) que não tem como produzir conhecimento neutro, uma vez que o investigador busca apreender relações que estão marcadas na materialidade social de uma sociedade cindida em classes sociais antagônicas na qual o sujeito que investiga faz parte do objeto de estudo.
Ciavatta (2009) citando Schaff (1978) apresenta as seguintes formas de conceber a relação sujeito objeto: a) o sujeito que conhece; b) ao objeto do conhecimento; c) o conhecimento como produto do processo cognitivo, que é uma interação específica do sujeito que conhece com o objeto a ser conhecido.
Na concepção sujeito que conhece o objeto, o protagonista é o objeto enquanto o pesquisador é passivo, contemplativo e receptivo. Essa vertente se aproxima do pensamento plantonista e idealista do conhecimento onde “o verdadeiro saber era contemplativo, um saber que não criava objetos, que apenas determinava parâmetros e critérios a serem atingidos” (Andery, 2012: 68).
Platão separa corpo fugidio da alma eterna, o permanente do efêmero. Para ele só se alcança o estágio do conhecimento verdadeiro o pesquisador que se desliga do mundo sensível e ascende ao mundo inteligível, por meio das ideias. “O filósofo era aquele que conhecia contemplativamente o real” (Andery, 2012: 76). Ancorado nessa relação sujeito objeto, o julgamento, a análise só é considerada verdadeira quando sua formulação está conforme o objeto.  
Diferentemente da primeira, a concepção aportada na relação o sujeito que conhece objeto o protagonismo é do investigador. O pesquisador tem papel ativo e exclusivo no processo de produção do conhecimento. A totalidade é considerada como um atributo do investigador e só ele pode atingi-la.  Esse posicioidnto desconsidera as condições objetivas em que está inserido o objeto.
Nesta relação, é privilegiada a ação do sujeito sobre o objeto, ou seja, o investigador é absoluto na construção do conhecimento e do pensamento. Isto é a filosofia do sujeito. Jantsch e Bianchetti (2011) discorrem que

Uma das consequências desta compreensão do processo de conhecimento é avaliar de forma moralizada esse processo, destacando-se, então, a polaridade bem x mal. Além disso, o bem e o mal no mundo do conhecimento são lidos a partir da redução voluntarista (ato de vontade) do sujeito que conhece ou que constrói conhecimentos (JANTSCH E BIANCHETTI, 2011: 19-20).

A filosofia do sujeito determina a realidade e está correlacionado com a onipotência do pensamento. São formas de pensamento que se aproxima do animismo. Freud (1950) define o animismo como um sistema de pensamento que permite apreender todo o universo como uma unidade isolada de um ponto de vista único.
No animismo o sujeito começa fazer ou procurar possibilidades para interferir ou controlar a realidade. Para Freud (1950) “o princípio que dirige a magia, a técnica da modalidade animista de pensamento, é o princípio da ‘onipotência do pensamento’” (Freud, 1950: 58).
Para este autor “a técnica do animismo, da magia, revela, da maneira mais clara e inequívoca, uma intenção de impor as leis que regem a vida mental às coisas reais” (Freud, 1950: 61). Logo, a pesquisa dentro dessa óptica é marcada pela transcendência da consciência, é a transferência do psíquico do pesquisador para o objeto.
Para nossa pesquisa sobre a relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado, estamos aportados na relação sujeito-objeto que tem o conhecimento como produto do processo cognitivo. Esta concepção da ênfase na relação entre sujeito-objeto que Marx (1993), na primavera de 1845, em “Teses de Feuerbach” coloca em evidência criticando a apreensão do conhecimento só a partir do objeto ou da intuição. Na primeira tese o filósofo pontua que

A principal insuficiência de todo o materialismo até aos nossos dias - o de Feuerbach incluído - é que as coisas [der Gegenstand], a realidade, o mundo sensível são tomados apenas sobre a forma do objecto4 [des Objekts] ou da contemplação [Anschauung]; mas não como atividade sensível humana5 , práxis, não subjectivamente. Por isso aconteceu que o lado activo foi desenvolvido, em oposição ao materialismo, pelo idealismo - mas apenas abstractamente, pois que o idealismo naturalmente não conhece a actividade sensível, real, como tal. Feuerbach quer objectos [Objekte] sensíveis realmente distintos dos objectos do pensamento; mas não toma a própria actividade humana como atividade objectiva [gegenständliche Tätigkeit]. (MARX e ENGELS, 1993: 125)

A partir desse posicioidnto, consideramos que é fundamental uma interação dialética do pesquisador com o objeto. Para isso, não podemos nos afastar do mundo, da realidade. O real é imprescindível para o conhecimento dentro da totalidade concreta, é por ela que podemos fugir do idealismo e da simples contemplação.
Nesse sentido, concordamos com Ciavatta (2009) que ao agir e ao conhecer, o homem se aperfeiçoa a partir das relações do homem com a natureza e com todos os seres que a ela pertencem, com outros homens e consigo mesmo.  Nessa concepção, o conhecimento é um processo complexo, que introduz a noção de totalidade social que envolve o pesquisador.
Tal sujeito faz “parte de uma totalidade de relações econômicas, políticas, culturais etc., fundamentalmente sociais, construídas no ato do homem de produzir e reproduzir a vida e de se relacionar nessa produção. É o que Marx chama de concreto real.” (CIAVATTA, 2009: 59)
A terceira tese de Marx sobre Feuerbach critica o materialismo vulgar quando considera que seres humanos são produtos das circunstâncias e da educação, ressaltando, a atividade dialética de que as circunstâncias também são transformadas precisamente pelos seres humanos e que o próprio educador precisa ser educado.
É a visão da realidade não fixa, de movimento que compõe a realidade no qual “os elementos vida social-consciência, base econômica-superestrutura interagem entre si.[...]. A práxis consiste, portanto, em atividade do homem que conscientemente transforma o mundo.” (VIEIRA, 1996: 33-34).
Esta abordagem “implica a constituição do objeto e a compreensão do mesmo, aceitando-se, com isso, a tensão entre o sujeito pensante e as condições objetivas (materialidade) para o pensamento” (JANTSCH E BIANCHETTI, 2011: 20).
Nesse sentido, o pesquisador não é o ser registrador que contempla passivamente o objeto. Ele é um sujeito que tem papel ativo, mas que tem seus limites e é condicionado pelas condições materiais que o rodeiam. Compreendemos que “a ação humana não é apenas biologicamente determinada, mas se dá principalmente pela incoporração da experiências e conhecimentos produzidos e transmitidos de geração a geração” (ANDERY, 2012: 10).
Em outras palavras, “as ideias, como um dos produtos da existência humana, sofrem as mesmas determinações” (ANDERY, 2012: 12) e, por consequência, a produção do conhecimento é um processo que está intimamente ligado a materialidade social do sujeito investigador e, por isso, sofre as deteminações históricas de seu tempo e espaço.

  1. O papel da consciência na construção do conhecimento

Partindo do entendimento que a relação sujeito-objeto não é neutra, se não parte do seu agir, compreendemos que a “consciência humana é ‘reflexo’ e ao mesmo tempo ‘projeção’; registra e constrói, toma nota e planeja, reflete e antecipa, é ao mesmo tempo receptiva e ativa”  (KOSIK, 2010: 26).  
Esta compreensão está baseada na teoria materialista do conhecimento que capta o caráter ambíguo da consciência que, de acordo com Kosik (2010), escapa tanto ao positivismo quanto ao idealismo.
Mauro Iasi (1999) fala da consciência como um processo que desenvolve dialeticamente, “onde cada momento traz em si os elementos de sua superação, onde as formas já incluem contradições que ao amadurecerem remetem a consciência para novas contradições, de maneira que o movimento se expressa num processo que contem saltos e recuos.” (IASI, 1999: 13)
Nesse sentido, Kosik (2010) discorre que na produção do conhecimento a consciência humana deve ser considerada tanto no seu aspecto teórico-predicativo como no ante predicativo. No primeiro, o conhecimento é explícito, justificado, racional e teórico, enquanto que segundo ele é totalmente intuitivo. Para o autor, a consciência é constituída da unidade dessas duas formas: práxis objetiva e apropriação prático-espiritual do mundo que se interpenetram e influencia reciprocamente.  
Entendemos, assim, que a consciência é a objetividade tornada subjetiva. Dito de outra forma, a exterioridade compõe a consciência do sujeito, a interioridade, por isso ela é condicionada à materialidade.
Nesse sentido, a produção do conhecimento na perspectiva da totalidade tem que ter relação com a materialidade, e, por isso, como pesquisadores temos que compreender os elementos da materialidade que determinam nossa consciência.
Lukács (1968) afirma “que a consciência reflete a realidade e, sobre essa base, torna possível intervir nessa realidade para modificá-la, quer dizer que a consciência tem um real poder no plano do ser” (LUKÁCS, 1968: 3).  O autor continua a discussão apresentando o papel da consciência para Hegel e em Marx.
Para Hegel, a manifestação da consciência se dá na própria consciência, o homem aparece como criador de si mesmo. Dentro dessa concepção a consciência está pronta e a história vai fazer ela surgir em algum momento. Logo, a realidade externa se objetiva na consciência que está fora do ser. Assim, para Hegel a manifestação da consciência humana esta no produto, pois a realidade interna se espelha na externa.
Para Marx a consciência é um processo histórico do movimento do real. A ontologia marxiana busca a universalidade pelo trabalho que é produto da própria história. Quanto mais o sujeito trabalha mais ele transforma a realidade. O trabalho forma qualitativamente todas as coisas e o desenvolvimento da consciência é também produto do trabalho.
Lukács (1968), baseado em Marx, discorre que o trabalho possibilita ao indivíduo ir além da fixação dos seres vivos na competição biológica com seu mundo ambiente. E a consciência é fundamental nesse processo, uma vez que “ela deixa de ser mero epifenômeno da reprodução biológica: o produto, diz Marx, é um resultado que no início do processo existia ‘já na representação do trabalhador’ isto é de modo ideal” (LUKÁCS, 1968: 4). Assim,

Em primeiro lugar, o ser em seu conjunto é visto como um processo histórico; em segundo, as categorias não são tidas como enunciados sobre algo que é ou que se torna, mas sim como formas moventes e movidas da própria matéria [...] Marx entendia a consciência como um processo tardio do desenvolvimento material. (LUKÁCS, 1968:  2-3).

Nesse sentido, a consciência é determinada ao mesmo tempo determina, por isso a consciência não é absoluta. Enquanto que no hegelianismo: o espírito (reino da consciência) determina a realidade – a consciência precisa da história porque ela é a manifestação da história – no marxismo: a matéria e o espírito nascem a partir do desenvolvimento da própria matéria. A história perpassa os dois elementos: espírito e a história. O desenvolvimento é um produto histórico, porém não é isolado porque também é produtor.
Seguindo esta lógica, compreendemos que nem pesquisador nem objeto são autônomos. Assim, para uma investigação que busca pesquisar dentro da concepção da totalidade concreta o eixo é, justamente, a materialidade, onde a realidade é concebida como uma mediação.
Dessa forma, reconhecemos que, enquanto investigadora, não temos autonomia plena na investigação do real. Apesar de existir certo “protagonismo” do pesquisador para realizar o movimento da desconstrução, da representação fixa do objeto, da pseudorealidade, estamos cientes do perigo da arbitrariedade subjetiva grosseira, de colocar no objeto características inexistentes.
Por isso, a necessidade de pensar a relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado como um presente que é a síntese de múltiplas determinações da história. É um posicioidnto que considera a realidade educacional resultado da ação dos seres humanos interligados ao mundo do trabalho, ao sistema de produção, ao sistema político, aos movimentos sociais.
Assim, a historicidade vai possibilitar o mergulho no objeto. Isto é pensar o objeto em sua totalidade. Nesse sentido, as mediações são fundamentais, pois é por meio delas que compreenderemos as leis que regem a relação estabelecida no curso de agroecologia Integrado ao Ensino Médio no IFPR tanto no contexto convencional como no influenciado pelos princípios pedagógicos do MST.

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das reflexões realizadas, compreendemos que para se estudar a relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado na perspectiva da totalidade concreta, devemos considerar que tal objeto está diretamente relacionado com o sujeito pesquisador, dada as relações materiais que determinam ambos.
Entendemos que, apesar da delimitação do objeto, devemos buscar as múltiplas relações que o constitui para descobir a estrutura significativa da realidade do Ensino Médio  Integrado, de modo a fugir do imediato, do aparente e penetrar na essência. Para isso, devemos passar pelas mediações da relação capital trabalho que refletem na política de Educação Profissional.
Assim, durante esse processo, partiremos do pensamento abstrato para o concreto fazendo o movimento de modo a superar a abstratividade, a imediaticidade, tendo como premissa que existe uma a relação dialética entre sujeito pesquisador e o objeto a ser pesquisado.
Esse entendimento permite: a) a superação da ideia que a ciência é resultado da contemplação e do idealismo platonista, onde o conhecimento para ser verdadeiro deve estar desligado do mundo material e ser tal qual objeto pesquisado; b) o sobrepujamento da filosofia do sujeito onde o investigador é absoluto no processo de produção do conhecimento e, por conseguinte, trazendo para a pesquisa formas do pensamento que se aproximam do anismismo.
Concluímos, assim, que para esta pesquisa alcançar a perspectiva da totalidade, devemos partir da realidade onde o pesquisador e o objeto sofre as determinações históricas das relações econômicas, culturais, políticas, biológicas.
Desta feita, depreendemos que conhecimento científico é condicionado pela materialidade que os sujeitos estão inseridos e, portanto, não é neutro, uma vez que, nossa consciência reflete a realidade ao mesmo tempo busca modifica-la.
Isso porque enquanto educador e pesquisador devemos lutar por uma educação na perspectiva da escola unitária arrazoada por Gramsci (2001), onde a cultura geral, humanista, formativa, equilibra de modo justo o desenvolvimento das capacidades de trabalhar manualmente e o desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual. Em outras palavras, uma educação que esteja sedimentada na necessidade maior de possibilitar a emancipação política, social e cultural dos educandos.
Consequentemente, reconhecemos que, como pesquisadora, não somos autônoma nem neutra. Ao contrário, sabemos que nossa produção está intimamente ligada a materialidade e, portanto, sofre as determinações históricas de nosso tempo e espaço. Eis aí a necessidade de  compreender que a realidade do Ensino Médio Integrado não se dá de maneira superficial e fragmentada, mas, conforme Kosik (2010), ela deve ser vista na perspectiva histórica, dialética e concreta, para além do imediatismo.
Portanto, para estudo da relação capital trabalho no Ensino Médio Integrado dentro da perspectiva da totalidade devemos considerar que o sistema educacional é resultado da ação do homem e que está interligado ao sistema social, ao mundo do trabalho, ao sistema político e às lutas de classe.
Em suma, compreendemos que para o desenvolvimento dessa pesquisa na perspectiva da totalidade, devemos partir do real e do pressuposto que o início deve ser igual ao resultado, porém um resultado que não era conhecido, pois a partir do concreto pensado é que chegaremos a algo diferente do ponto de origem e poderemos, dentro de nossos limites, lutar por um sistema educacional que atente para formação omnilateral do sujeito.  

  1. REFERÊNCIAS BIBLIGRÁFICAS

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MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA (MST). Princípios da educação no MST. In Caderno de Educação, n. 13, Ago. 2005.

VIEIRA, Antonio Rufino. A filosofia marxiana uma análise das teses de Marx sobre Feuerbach. In: Princí­pios: Revista de Filosofia. Natal, v.3, n.4, 1996.

*Técnica em Assuntos Educacionais na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). Licenciada em Letras Português-Espanhol pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Mestre em Sociedade, Cultura e Fronteira, UNIOESTE. Doutoranda em Ciências Sociais e Humanidades (UNIOESTE).
1 Karel Kosik (2010) explica ainda que o fato pode ser: uma classe de fatos ou conjunto de fatos.
2 Texto de apresentação do MST disponível em http://www.mst.org.br/quem-somos/#full-text acessado em 12/01/2016.
3 O Vieira (1996) retomando bloch, traz uma análise sobre as 11 Teses sobre Feuerbach publicadas em 1847, dividindo-as em quatro grupos a partir da temática. No primeiro grupo estão as teses um, três e cinco que são relativas à teoria do conhecimento. “Nestas teses Marx supera as epistemologias do idealismo e do materialismo anterior, inclusive de Feuerbach, as quais se fundam na contemplação ou no ativismo” (VIEIRA, 1996, p. 28). Dessa forma, a teoria do conhecimento de Marx é fundada no campo da práxis.
4 Grifos do autor
5 Grifos do autor

Recibido: 30/04/2018 Aceptado: 08/06/2018 Publicado: Junio de 2018

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