Revista: Atlante. Cuadernos de Educación y Desarrollo
ISSN: 1989-4155


FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES DE LÍNGUA INGLESA EM TERRITÓRIO TRANSFRONTEIRIÇO: PLANEJAMENTO LINGUÍSTICO PARA PROMOÇÃO DE LÍNGUAS E RESPEITO À ALTERIDADE

Autores e infomación del artículo

Miriam Regina Giongo Kuerten*

Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Brasil

miriamgiongo@hotmail.com.


RESUMO:
Este trabalho apresenta uma proposta de formação continuada para professores de língua inglesa na cidade de Foz do Iguaçu com discussões acerca da área de conhecimento Política Linguística e planejamento linguístico, além de reflexões em torno da diversidade linguística inerente às salas de aulas deste contexto, também se propõe algumas atividades que considerem a alteridade em ambiente sociolinguístico transfronteiriço. Justifica-se pelo caráter multi/plurilíngue da cidade que é localizada na tríplice fronteira Brasil, Paraguai e Argentina e tem o objetivo de auxiliar os professores de línguas inglesa a iniciar práticas de ensino de língua inglesa que não invizibilizem as línguas faladas pelos alunos.
Palavras-chave: formação, fronteira, política linguística, promoção, línguas.

ABSTRACT
This work presents a proposal for continuing education for English language teachers in the city of Foz do Iguaçu with discussions about the area of knowledge Linguistic Policy and linguistic planning, as well as reflections on the linguistic diversity inherent in classrooms in this context. It proposes some activities that consider otherness in a cross-border sociolinguistic environment. It is justified by the multi/ plurilingual character of the city that is located in the triple border Brazil, Paraguay and Argentina and aims to help English language teachers to initiate English-language teaching practices that do not invigorate the languages spoken by the students.
Keywords: formation, frontier, linguistic policy, promotion, languages.

RESUMEM
Este trabajo presenta una propuesta de formación continuada para profesores de lengua inglesa en la ciudad de Foz do Iguaçu con discusiones acerca del área de conocimiento Política Lingüística y planificación lingüística, además de reflexiones en torno a la diversidad lingüística inherente a las aulas de este contexto, propone algunas actividades que consideren la alteridad en ambiente sociolingüístico transfronterizo. Se justifica por el carácter multi / plurilingüe de la ciudad que está ubicada en la triple frontera Brasil, Paraguay y Argentina y tiene el objetivo de auxiliar a los profesores de lenguas inglesa a iniciar prácticas de enseñanza de lengua inglesa que no invizibilisen las lenguas habladas por los alumnos.
Palabras clave: formación, frontera, política lingüística, promoción, lenguas.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Miriam Regina Giongo Kuerten (2018): “Formação continuada para professores de língua inglesa em território transfronteiriço: planejamento linguístico para promoção de línguas e respeito à alteridade”, Revista Atlante: Cuadernos de Educación y Desarrollo (junio 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/atlante/2018/06/formacao-professores-linguas.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/atlante1806formacao-professores-linguas


INTRODUÇÃO
Com cerca de trinta vezes mais línguas do que países no mundo, plurilinguismo é uma realidade e faz da língua objeto de estudos interdisciplinares. Desde a abordagem estruturalista de Saussure a língua tem sido estudada em seus vários aspectos em outras correntes linguísticas que refletem sobre seu caráter social (CALVET, 2002)
Política Linguística; disciplina que surgiu em meados do século XX associada ao plurilinguismo e sua gestão; relaciona-se à prática política de cunho interdisciplinar abarcando áreas para além da linguística, também a antropologia, sociologia, história, direito e economia que conjuntamente analisam situações inerentes a contextos socilinguisticos diversos a fim de encontrar soluções através de planejamento de corpus e planejamento de status. “A política linguística é inseparável de sua aplicação” (CALVET, 2007, p. 12) e “o planejamento é a aplicação de uma política linguística” (CALVET, 2007, p. 15).
Este trabalho pretende trazer reflexão sobre o caráter multi/plurilíngue de Foz do Iguaçu no oeste paranaense que demanda dos professores de línguas estrangeiras; com recorte para os professores de língua inglesa; habilidades não somente linguísticas, mas também de Política e planejamento linguístico de status (CALVET, 2007) para poder ensinar uma outra língua sem desconsiderar o aluno e todo o conhecimento intrínseco a sua língua.
A natureza das regras que definem o status e o prestígio das línguas não é neutra/científica, mas política, uma vez que os processos de designação e de circulação das línguas instauram e conservam hierarquias, refletem/constroem desigualdades linguísticas e sociais, aproximam ou distanciam grupos, favorecem certas comunidades linguísticas em detrimento de outras, instauram práticas legitimadoras de certas línguas e de apagamento de outras, etc. (SEVERO, 2013, p. 457)

Na primeira seção definiremos o território que motivou o desenvolvimento deste trabalho, na segunda seção trataremos dos campos Política Linguística e Planejamento Linguístico de status, para então, na terceira seção sugerirmos um programa de formação continuada para professores de língua inglesa, cujo status é naturalmente elevado em vista da sua presença no mundo todo; com sugestões de atividades que promovam equiparação no peso das línguas contidas neste território à língua inglesa.

  1. FOZ DO IGUAÇU MULTI/PLURINGUE E (FALTA DE) FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DE LÍNGUA ESTRANGEIRA: “PROBLEMA”

Foz do Iguaçu, cidade no oeste do Paraná  e ao sul do país, está situada na tríplice fronteira Brasil, Ciudad del Est no Paraguai e Puerto Iguazu Argentina, tem sua fronteira marcada geograficamente pelos rios Iguaçu e Paraná cujas pontes da Amizade e da Fraternidade ligam os países vizinhos à cidade que está inserida em um contexto de diversidade linguística por conta do afluxo permanente de imigrantes não somente destes países, mas também de outras nacionalidades que somam cerca 70 de acordo com o relatório do SINCRE: Sistema Nacional de Cadastro e Registro de Estrangeiros. (OLIVEIRA, 2012)
É comum deparar-se com outras línguas na fronteira, para além do espanhol e o guarani do Paraguai e Argentina, também se tem o coreano, libanês, árabe, chinês, japonês entre as diversas línguas alóctones. A cidade que atrai pessoas de muitos lugares do mundo, anteriormente as atraía especialmente pelas oportunidades de negócios no Paraguai e também na Usina Hidrelétrica de Itaipu.  Estas famílias vieram, estabeleceram-se na cidade e fizeram-se um pouco iguaçuenses, promovendo o contato entre línguas alóctones em territórios compartilhados, como por exemplo as escolas, que se tornam ambientes sociolinguísticos complexos em que a diversidade linguística nem sempre é respeitada, é mais comumente invisibilizada e entendida como justificativa para a dificuldade no ensino-aprendizado.
Apesar do multi/plurilinguismo inegável na cidade, as escolas das redes pública e privada ofertam apenas as línguas inglesa e espanhola como língua estrangeira, consoante à sugestão da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) nos artigos 26 e 35:

Artigo 26. § 5o  No currículo do ensino fundamental, a partir do sexto ano, será ofertada a língua inglesa. (Redação dada pela Lei nº 13.415, de 2017)

Artigo 35. § 4o  Os currículos do ensino médio incluirão, obrigatoriamente, o estudo da língua inglesa e poderão ofertar outras línguas estrangeiras, em caráter optativo, preferencialmente o espanhol, de acordo com a disponibilidade de oferta, locais e horários definidos pelos sistemas de ensino. (Incluído pela Lei nº 13.415, de 2017)

Não há oferta de outras línguas nas escolas da cidade, comumente os alunos falantes de línguas alóctones são coibidos de falarem suas línguas maternas nas escolas, a experiência que têm de suas línguas é desconsiderada e influenciam no ensino-aprendizado da língua estrangeira sendo ofertada. A pronúncia diferente, sotaque, transferências que fazem da língua materna são considerados um problema.
Ao assumir que a diversidade linguística constitui um “problema” para o desenvolvimento das comunidades humanas, a Política Linguística estaria legitimando, cientificamente, a ideologia do monolinguismo. Os críticos argumentavam que a diversidade linguística não pode e não deve ser definida como um “problema” na medida em que as comunidades minoritárias devem ter o direito de utilizar e cultivar suas línguas maternas sem sofrer nenhum tipo de constrangimento.(RIBEIRO DA SILVA, 2013, p. 297)

Contudo o “problema” no ensino aprendizado se constitui para além do multi/plurilinguismo da cidade, o “problema” pode estar na formação do professor de língua estrangeira que é invariavelmente acoplada ao da língua portuguesa, deixando pouco espaço para discussão aprofundada de questões intrínsecas à sociedade moderna e fluida em que multi/plurilinguismo são a regra, não a exceção.
Ribeiro-Berger (2015, p. 72) define sucintamente os termos multilinguismo e plurilinguismo:  “multilinguismo está para a sociedade, assim como o termo plurilinguismo está para os indivíduos”. Em Foz do Iguaçu, embora não se tenha um mapeamento linguístico dos alunos nas escolas, multi/plurilinguismo é uma ponte com obstáculos decorrentes do despreparo dos professores para fazer das aulas de língua estrangeira um recurso para promoção das línguas contidas neste contexto, e assim, garantir que sejam entendidos, não subjugados pelas transferências que fazem naturalmente da sua língua materna para a língua que estão aprendendo na escola.
O professor de língua estrangeira em Foz do Iguaçu precisa ser consciente da importância que cada língua tem, a língua que o aluno fala carrega toda sua história, valores e ao ensinar a língua inglesa o professor pode promover reflexões acerca da importância das línguas faladas pelos alunos. O português, árabe, japonês, chinês ou o guarani não são menores ou menos importantes do que as línguas inglesa ou espanhola, por exemplo, são diferentes.
Quando em sua formação o professor não refletiu sobre diversidade linguística e políticas linguísticas ele pode perpetuar o pouco sucesso que se tem hoje quanto às línguas estrangeiras na escola regular. Os baixos resultados podem ser decorrentes da carga horária insuficiente para aprender outra língua, professores com baixo nível linguístico e falta de habilidade em gerenciar contextos heterogêneos linguisticamente. Ribeiro- Berger (2015, p. 81) propõe que se pense em outras formas de se ver a diversidade:
... pensar outras formas de encarar a presença e o lugar das línguas nas escolas e outras formas de encarar o bi/multi/plurilinguismo, de modo que deixem de ser tidos como um problema para os processos de ensino-aprendizagem e possam ser encarados como potencialidade para a construção de sociedades plurais.

Aproveitar as habilidades que têm os multi/plurilíngues é oportunidade de conscientizar os alunos quanto à importância de cada língua o que traria benefícios a longo prazo também já que conscientes e tendo tido um encontro agradável e reflexivo com outras línguas podem futuramente decidir-se aprofundar em uma ou várias delas, além de terem aprendido algo crucial: respeitar a alteridade.
Tendo discutido a questão que faz de Foz do Iguaçu, um ambiente sociolinguístico complexo, não pela multiplicidade de línguas, mas pela (falta de) formação dos professores, refletiremos na próxima seção sobre o campo interdisciplinar do saber que é de cunho social e se debruça sobre a gestão de línguas.

  1. POLÍTICA LINGUÍSTICA E PLANEJAMENTO LÍNGUISTICO

 Os conceitos surgiram na década de sessenta quando publicações nesses campos foram prolíferas justificadas pela descolonização de países africanos e asiáticos e buscava-se resolver os problemas referentes às línguas faladas naquelas nações. (CALVET, 2007). O objetivo do planejamento linguístico, conceito que aparece pela primeira vez nos estudos de Haugen entre 1959 e 1966, “não é necessariamente gerar um código uniforme: ele pode visar à diversidade ou a uniformidade, à mudança ou a estabilidade”. (CALVET, 2007, p.24).
Segundo Calvet o planejamento linguístico pode intencionar intervenções na forma da língua (criação de uma escrita, equipar a língua lexicalmente dando-lhe vocabulário próprio, neologia, padronização) chamado de planejamento de corpus ou em situações de plurilinguismo podem interessar-se em equiparar o estatuto das línguas contidas denominado planejamento de status.
As abordagens podem ser in vivo e in vitro. Gestão in vivo referindo-se às ações tomadas instintivamente pelas comunidades que resolvem seus problemas de comunicação, é o produto da prática, já a gestão in vitro em que linguistas, especialistas em línguas as analisam, estudam-nas, levantam hipóteses, avaliam-nas, escolhem e aplicam-nas, “o planejamento linguístico, de certa forma, imita o curso natural da evolução das línguas”. (CALVET, 2007, p. 86).
Mesmo a globalização não sendo mais um questão nova, a diversidade linguística se configura ainda como um problema para as nações e cabe ao linguista propor, com base em parâmetros científicos, soluções para os “problemas” dessas comunidades e/ou nações. (RIBEIRO DA SILVA, 2011, p. 293). No que se refere a questão “problema linguístico”, há críticas quanto a caracterização da diversidade como um problema a ser resolvido e questiona-se quem define o que é um “problema” linguístico, como uma situação passa a configurar um “problema”, para quem ela é um “problema”, em que medida um planejamento linguístico não resulta em conflitos linguísticos e étnicos. (RIBEIRO DA SILVA, 2011, p. 297). 
Para Ruiz (1984, tradução nossa) a heterogeneidade linguística poderia ser configurada como: um problema, um direito, ou recurso. Como um problema quando é um obstáculo para a comunicação, como um direito estando ligado a participação cívica efetiva além de estar intimamente ligado aos direitos humanos, manutenção das línguas minoritárias que evocam questões culturais e como um recurso, tal abordagem sanaria os problemas relativos ao binômio língua como problema e língua como um direito, já que nesta “orientation” propõe-se o reconhecimento de status de línguas minoritárias e ressaltar a importância de um planejamento linguístico de cooperação que culmine no desenvolvimento de habilidades em línguas.
Desta forma, nos restringiremos ao planejamento de status por conta do caráter multi/plurilíngue dos alunos de Foz do Iguaçu, como uma tentativa de alcançar melhores resultados não somente linguisticamente, mas para se promover o respeito à alteridade, conhecimento e envolvimento com outras línguas.

  1. FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORS DE LÍNGUA INGLESA NA TRÍPLICE FRONTEIRA: CONSTRUINDO PONTES

Política linguística e planejamento linguístico para o contexto sociolinguístico na tríplice fronteira é uma questão demonstra uma certa urgência. Pensar em ações que reverberem positivamente na sociedade multi/plurilíngue iguaçuense pode ajudar professores a serem mais conscientes linguisticamente, consequentemente suas aulas refletirão tal atitude motivando os alunos a compartilhar sem vergonha das línguas que falam que são imbuídas de história, identidade, cultura e que enriquecerão as aulas de língua inglesa por ter uma função social: respeito e promoção da alteridade.
Primeiramente, é preciso entender que não é intenção diminuir a importância da língua inglesa, até porque sua importância é inquestionável globalmente, desde a segunda Guerra Mundial o inglês não para de progredir.
O inglês goza de uma posição dominante nos setores da pesquisa científica, da comunicação, da imagética, da cultura de massa. Ele dispõe de um quase-monopólio no setor da inovação tecnológica...Tudo ocorre como se “pensar em inglês” se tornasse necessário para entender o mundo. (LE BRETON, 2005, p.23)

Entretanto, segundo Raffestin (1993, p. 98), “não temos critérios para afirmar que qualquer idioma humano é intrinsicamente superior a qualquer outro”, mesmo assim, no espaço escolar, alunos que falam outras línguas como língua materna são submetidos a situações que os colocam em desvantagem, já que a pouca aptidão com o portuguêsos impossibilita de comunicarem-se com exatidão o que pode gerar exclusão, estranheza e inibição do aluno imigrante. Ainda segundo o autor, conflitos linguísticos “são aqueles em que um grupo procura privar um outro do uso de sua língua; são aqueles nos quais se tenta substituir uma identidade linguística por outra e, como consequência, substituir uma cultura por outra”. (RAFFESTIN, 1993, p. 111)
Os professores de língua inglesa não podem continuar alheios às questões relativas a diversidade linguística, principalmente em se tratando de uma fronteira que é de mobilidade intensa e em que o contato com outras línguas é comum. Para Calvet (2002, p.114) as pessoas são sempre “mais ou menos plurilíngues”. Propomos reflexão sobre temas que são inerentes a contextos fronteiriços: multi/plurilinguismo, diversidade linguística, conscientização linguística.  Propomos também atividades cujo intuito seja o de amparar o professor no início da tarefa rumo à uma sociedade de mais respeito e em que todas as línguas são valorizadas.
Os temas relacionados são importantes em qualquer contexto considerando que há no mundo cerca de 30 vezes mais línguas do que países. Um levantamento do IPOL realizado em 2008, diz que há no Brasil 219 línguas indígenas e cerca de 50 alóctones (OLIVEIRA e ALTENHOFEN, 2011). Mesmo com tanta diversidade linguística no nosso país, os principais documentos relativos à educação advogados pelo governo brasileiro referentes à educação básica praticamente não abordam tais temas, aponta a Broch (2014).  Partimos para uma breve reflexão sobre os temas propostos.

  1. Multi/plurilinguismo, diversidade linguística, conscientização linguística – teoria da prática na fronteira

Houveram políticas ao longo da história do nosso país que foram proibitivas quanto ao uso de línguas estrangeiras com punições severas como prisões, por exemplo. Não se buscou promover a diversidade linguística sempre presente no país. Indo contra um dos direitos humanos promulgado pelas Nações Unidas na Declaração Universal dos direitos humanos publicada em 1953, o direito à educação em língua materna, tão pouco houve preocupação em promover a diversidade linguística e cultural do país. A língua materna sendo majoritariamente invizibilisada ou entendida como um déficit (RUIZ, 1984,tradução nossa).
Na constituição de 1988 o país esboçou preocupação com as línguas alóctones e ainda que não tenha movido nenhuma política para promoção delas, ao menos não as proibia. Em 1996  a UNESCO promulga na Declaração Universal sobre a diversidade linguísticos  nos artigos terceiro e  quinto respectivamente que:
Esta Declaração considera como direitos individuais inalienáveis que devem ser exercidos em todas as situações os seguintes... o direito ao uso da língua em privado e em público;

... Toda pessoa deve, assim, poder expressar-se, criar e difundir suas obras na língua que deseje e, em particular, na sua língua materna; toda pessoa tem direito a uma educação e uma formação de qualidade que respeite plenamente sua identidade cultural; toda pessoa deve poder participar na vida cultural que escolha e exercer suas próprias práticas culturais, dentro dos limites que impõe o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais.

Neste sentido, o primeiro passo é entender que é direito do aluno comunicar-se em sua própria língua, haverá situações em que ele só conseguirá fazer na língua materna, ou utilizará de interferências dela para comunicar algo na língua alvo, neste caso a língua inglesa. As interferências podem ser de ordem lexical; quando pode haver uso de um falso cognato; fônica, ou sintática; quando a estrutura de uma frase pode ser dita de uma forma que faz sentido na língua materna. Estas interferências podem ser percebidas em situações de multi/plurilinguismo.
Conforme sintetiza Ribeiro-Berger (2015) e já mencionado anteriormente, o termo “multilíngue” refere-se à coexistência de diferentes línguas em dada sociedade ou espaço, evidente em Foz do Iguaçu onde percebemos a todo tempo placas nas ruas e comércios, há territorialidades de etnias facilmente reconhecidos e em que brasileiros podem até passar por estrangeiros. Ribeiro-Berger também define o termo “plurilíngue” que se remete ao uso de várias línguas por um indivíduo, também recorrente na cidade transfronteiriça.
O multilinguismo passa a ser considerado como potencialidade, “[...] as línguas passaram a ocupar um novo lugar na sociedade. [...] Uma língua não basta mais. Não se postula mais, como política de Estado, que a população de um país permaneça ou se torne monolíngue.” (OLIVEIRA, 2010, p.22).

Há alunos que falam uma língua com o pai, outra com a mãe e outra na escola, por exemplo, parece exagero, mas é só a realidade multi/plurilinguística de Foz do Iguaçu. Em conversa com alguns alunos por curiosidade perguntei que língua falava em casa, a aluna me respondeu: “Meu pai é coreano, quase não fala português, minha mãe é paraguaia, falo espanhol com ela”.
Calvet (2002, p. 35) enfatiza que o “plurilinguismo faz com que as línguas estejam em constante contato. O lugar desses contatos pode ser o indivíduo (bilingue, ou em situação de aquisição) ou a comunidade.” Para a aluna citada, o multi/plurilinguismo é o mais normal. Por que não pode ser assim para os outros alunos também já que todos vivem em um contexto de diversidade linguística intensa?
Temos que ter claro que ao ensinar uma língua estrangeira não estamos fazendo com que nosso aluno adquira a cultura do outro, mas sim saiba que um povo se comporta de uma forma e outro se comporta de outra forma. Mas que com isso nossa cultura não deixa de ser superior ou inferior à outra. E que muitas vezes é confundido com a situação econômica do país da língua a qual estamos ensinando. E no caso da língua inglesa a maioria dos países que falam esse idioma são economicamente dominantes como os Estados Unidos, Inglaterra, Canadá , Austrália e Nova Zelândia e isso acaba gerando na maioria um sentimento de inferioridade e assim passando a considerar a cultura do outro melhor do que a própria. (FERREIRA, 2000, p. 122)

Em face da grande diversidade linguística neste território, faz-se necessário que os professores pensem suas aulas de língua inglesa com olhar de quem auxilia o aluno “a dominar a língua estrangeira, em vez de ser dominado por ela ” (RAJAGOPALAN, 2005, P. 154). As aulas de língua inglesa podem ser oportunidade de discussão e atividades em torno das línguas contidas na sala de aula almejando a promoção destas línguas através de atitudes positivas em relação a elas.
Com efeito, existe todo um conjunto de atitudes, de sentimentos dos falantes para com suas línguas, para com as variedades de línguas e para com aqueles que as utilizam, que torna superficial a analise da língua como simples instrumento. Pode-se amar ou não um martelo, sem que isso mude em nada o modo de pregar um prego, enquanto as atitudes linguísticas exercem influencias sobre o comportamento linguístico. (CALVET, 2002, p. 65)

Na próxima subseção trataremos de sugestões que podem ser utilizadas por professores de língua inglesa nas escolas de Foz do Iguaçu para promoção de atitudes positivas em relação à língua do outro, à alteridade.

  1. Planejamento linguístico em ação – Promoção das línguas contidas na minha sala de aula

A primeira ação para promoção das línguas contidas no espaço escolar é o mapeamento linguístico, cujo papel será o de se depreender informações importantes da realidade que o professor tem. O mapeamento linguístico é definido por Broch (2014, p. 139) como “ uma estratégia para auxiliar no planejamento linguístico da escola”.
Através entrevistas ou pesquisas se descobrirá quais línguas são faladas pelos alunos, ou com quais tem contato, qual fala com a mãe e qual com o pai, qual usa em atividades recreativas, qual estuda em curso livre ou qual gostaria de estudar, enfim, pode-se ter acesso a informações que garantirão ao professor segurança e dados para ensinar respeitando a pluralidade da sala de aula em questão.
...se percebe a importância da escola de trazer as línguas para dentro da sala de aula, despertando no aluno uma consciência linguística que não fica restrita aos muros da escola, mas que se torna parte das práticas sociais e culturais deste indivíduo. (BROCH, 2014, p. 108)

Com o diagnóstico em mãos, termo emprestado da medicina e utilizado por Seiffert (2014, 86) que visa “compreenderalguma problemática relacionada a uma situação de contato linguístico com a finalidade de propor algum tipo de intervenção, ou seja, diagnósticos são politicamente orientados”, chega a hora de propor atividades práticas que despertem o interesse e principalmente o respeito pela língua do outro. Listaremos algumas opções pensadas para promover atitudes positivas quanto às línguas:

  1. Pode-se propor rodas de conversas em que os alunos serão incentivados a falar sobre suas experiências linguísticas, compartilhando com a turma os dados levantados no mapeamento linguístico, os alunos podem contar suas experiências em língua inglesa, ou parcialmente em língua inglesa usando a língua materna quando precisarem;
  2. A fim de demonstrar aos alunos que as línguas “conversam”, pode-se propor uma atividade em que os alunos farão listas de palavras que são cognatas em relação à língua inglesa. Buscarão nas línguas faladas pelos colegas, ou pelos pais falam que outras línguas. Posteriormente, em sala, os alunos podem elaborar cartazes ilustrando as semelhanças entre as línguas. Da mesma forma pode-se propor uma pesquisa acerca de falsos cognatos;
  3. Para diminuir o medo e insegurança quanto às línguas, pode-se selecionar um texto em uma

língua que não é falada por nenhum dos alunos e pedir que o leiam e contem o que conseguiram entender considerando os possíveis cognatos;

  1. Pode-se promover aulas em que os alunos apresentarão dados geográficos, econômicos, culturais, históricos, gastronômicos dos países dos quais vieram ou que seus pais tenham vindo;
  2. Há um termo da língua francesa que é utilizado em inglês também, faux pas, que são comportamentos considerados normais em alguns países ou regiões e estranhos em outros. Os alunos podem elaborar peças de teatro em que falarão suas línguas e em que ilustraram um faux pas;
  3. Dia 21 de fevereiro é o dia internacional da Língua Materna, excelente oportunidade para promover um evento em que os pais são convidados para participar de uma atividade também, pode-se ter apresentações em várias línguas: leituras de poemas, canções, trava línguas, discursos.

Estas são apenas algumas atividades propostas a fim de iniciar os trabalhos rumo a um ensino de língua inglesa que considere o ambiente sociolinguístico diverso na tríplice fronteira e que não podem ser desenvolvidas apenas como em um evento, mas deve se tornar uma prática plural, consciente da diversidade linguística da cidade e em respeito à sociedade, dando status às línguas dos outros, não somente à língua inglesa.
CONSIDERAÇÕES
Considerando relevância de se ter professores preparados para um trabalho que não invisibilize a multi/pluralidade linguística na cidade de Foz do Iguaçu, discutir Política linguística, planejamento e diversidade linguística é um início, evoca respeito à alteridade e leva à promoção das línguas dos outros. Quantos dos problemas na sociedade são frutos da intolerância?
O ensino-aprendizagem de língua inglesa nas escolas de Foz do Iguaçu pode servir tanto mais se políticas linguísticas forem pensadas ponderando sobre o multi/plurilinguismo a fim de reverter o quadro atual em que alunos que falam outras línguas são constantemente desmotivados a falarem suas línguas já que são vistas como menos prestigiosas e quase sempre como obstáculo. Talvez tão importante quanto saber seja respeitar e entender a diversidade linguística. Certamente, um ensino de língua inglesa que considere e promova outras línguas tem mais impacto na sociedade.
As formações continuadas são ferramentas importantes para professores de todas as áreas, mas os de língua estrangeira elas são cruciais. A formação inicial dos professores de línguas estrangeiras é em cursos de licenciatura dupla, em que não há carga horária suficiente e discussão suficiente para um preparo adequado do professor, além disso, a característica cada vez mais fluida da sociedade moderna, exige que os profissionais busquem informação continuadamente. Esta proposta de formação pode ser realizada em uma manhã de estudos ou pode se estender por alguns encontros, quanto mais se pesquisa sobre o assunto, mais se tem a acrescentar e mais pontes se ligam entre o ensino da língua inglesa e o respeito à alteridade.

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*Mestranda do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Sociedade, Cultura e Fronteiras. Linha de pesquisa: Trabalho, Política e Sociedade da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. miriamgiongo@hotmail.com

Recibido: 16/04/2018 Aceptado: 21/06/2018 Publicado: Junio de 2018

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