Revista: Atlante. Cuadernos de Educación y Desarrollo
ISSN: 1989-4155


DISCUTINDO AS RELAÇÕES DE GÊNERO E ÉTNICO-RACIAIS POR MEIO DOS CONTOS DE FADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Autores e infomación del artículo

Alessandra Lopes de Oliveira Castelini*

Denise Regina Quaresma da Silva**

UNICENTRO/PR, Brasil

alessandralopes@ufpi.edu.br


RESUMO
Este trabalho tem como objetivo discutir as relações de gênero e étnico-racial presente nos contos de fadas apresentados na Educação Infantil – Cinderela e A Princesa e o Sapo (Walt Disney) - e a importância do papel dos educadores na desmistificação do racismo e sexismo naturalizados nessas obras, que acabam contribuindo para a reprodução das desigualdades na sociedade. A comunicação oral e as narrativas apresentam um papel fundamental na Educação Infantil, em que as crianças comunicam-se por meio do corpo e oralmente, necessitando assim do exercício dessa habilidade com o intuito de ampliar o seu repertório.  Metodologicamente, este estudo é de natureza bibliográfica, de caráter qualitativo e embasa-se em Bauman (2005); Butler (2007); Cavaleiro (2000); Dias (1997); Fischer (2001); Louro (1997); Rosemberg (1996); Scott (1995), dentre outros, ancorando-se na revisão de literatura e na análise documental da legislação pós LDB/96, trazendo reflexões teóricas dos conceitos de relações de gênero, étnico-racial e interdisciplinaridade na formação de docentes ampliando as discussões a respeito do tema. A literatura infantil é um espaço plural, aglutinador de várias leituras e análises, local privilegiado de produção e reprodução simbólica de sentidos e, desse modo, fonte que pode colaborar para a enunciação ou para o apagamento, para a valorização ou subalternidade das identidades. Conclui-se que a implementação das referidas leis e as reflexões sobre os discursos racistas e sexistas presentes nas obras literárias infantis mencionadas significam uma ruptura profunda com um tipo de postura pedagógica que não reconhece as diferenças e a diversidade resultantes no processo de formação inicial, gerando dificuldades em desenvolver práticas educativas e utilização de materiais, tornando-se essencial a formação de professores no trabalho conjunto para a desmistificação do tema.

Palavras-Chave: Gênero; Estudos Étnico-Raciais; Educação Infantil; Contos de Fadas; Formação de Professores.

Abstract
This paper aims to discuss the gender and ethnic-racial relationships present in the fairy tales presented in Early Childhood Education - Cinderella and The Princess and the Frog (Walt Disney) - and the importance of the role of educators in the demystification of naturalized racism and sexism in these works, which end up contributing to the reproduction of inequalities in society. Oral communication and narratives play a fundamental role in Infant Education, in which children communicate through the body and orally, thus requiring the exercise of this ability in order to expand their repertoire. Methodologically, this study is of a bibliographic nature, of a qualitative nature and is based on Bauman (2005); Butler (2007); Cavalleiro (2000); Dias (1997); Fischer (2001); Louro (1997); Rosemberg (1996); Scott (1995), among others, anchored in literature review and documentary analysis of legislation post LDB / 96, bringing theoretical reflections of the concepts of gender, ethno-racial and interdisciplinarity relations in teacher education, expanding discussions of the theme. Children's literature is a plural space, agglutinative of various readings and analyzes, a privileged place of production and symbolic reproduction of meanings and, thus, a source that can collaborate for enunciation or erasure, for the valorization or subalternity of identities. It is concluded that the implementation of these laws and the reflections on the racist and sexist discourses present in children's literary works mean a profound rupture with a type of pedagogical stance that does not recognize the differences and diversity resulting in the initial formation process, generating difficulties in developing educational practices and use of materials, making it essential to train teachers in working together to demystify the theme.

Keywords: Gender; Ethnic-Racial Studies; Child education; Fairy tale; Teacher training.

Resumen
Este trabajo tiene como objetivo discutir las relaciones de género y étnico-racial presente en los cuentos de hadas presentados en la Educación Infantil - Cenicienta y La Princesa y el Sapo (Walt Disney) - y la importancia del papel de los educadores en la desmistificación del racismo y sexismo naturalizados en esas obras, que acaban contribuyendo a la reproducción de las desigualdades en la sociedad. La comunicación oral y las narrativas presentan un papel fundamental en la educación infantil, en la que los niños se comunican por medio del cuerpo y oralmente, necesitando así el ejercicio de esa habilidad con el propósito de ampliar su repertorio. Metodológicamente, este estudio es de naturaleza bibliográfica, de carácter cualitativo y se basa en Bauman (2005); Butler (2007); Caballero (2000); Días (1997); Fischer (2001); (1997); Rosemberg (1996); (1995), entre otros, anclándose en la revisión de literatura y en el análisis documental de la legislación post LDB / 96, trayendo reflexiones teóricas de los conceptos de relaciones de género, étnico-racial e interdisciplinariedad en la formación de docentes ampliando las discusiones al respecto del tema. La literatura infantil es un espacio plural, aglutinador de varias lecturas y análisis, lugar privilegiado de producción y reproducción simbólica de sentidos y, de ese modo, fuente que puede colaborar para la enunciación o para el borrado, para la valorización o subalternidad de las identidades. Se concluye que la implementación de dichas leyes y las reflexiones sobre los discursos racistas y sexistas presentes en las obras literarias infantiles significan una ruptura profunda con un tipo de postura pedagógica que no reconoce las diferencias y la diversidad resultantes en el proceso de formación inicial, generando dificultades en desarrollar prácticas educativas y utilización de materiales, tornándose esencial la formación de profesores en el trabajo conjunto para la desmitificación del tema.

Palabras clave: Género; Estudios Étnico-Raciales; Educación Infantil; Cuentos de hadas; Formación de profesores.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Alessandra Lopes de Oliveira Castelini y Denise Regina Quaresma da Silva (2018): “Discutindo as relações de gênero e étnico-raciais por meio dos contos de fadas na educação infantil”, Revista Atlante: Cuadernos de Educación y Desarrollo (mayo 2018). En línea:
https://www.eumed.net/rev/atlante/2018/05/educacao-infantil-brasil.html
//hdl.handle.net/20.500.11763/atlante1805educacao-infantil-brasil


1. Palavras Iniciais
A comunicação oral e as narrativas apresentam um papel fundamental na Educação Infantil, em que as crianças comunicam-se por meio do corpo e oralmente, necessitando assim do exercício dessa habilidade com o intuito de ampliar o seu repertório. Durante séculos a oralidade apresentou-se como a única forma de transmissão de cultura e conhecimentos.  O ato de contar histórias é algo que nos remete ao início da existência humana, pois ao refletir que a atividade de contar histórias nasceu junto com a necessidade de comunicar aos outros alguma experiência que poderia ter significado para todos.
A humanidade tem necessidade de se comunicar e, portanto, de contar histórias. Compartilhar experiências tem significação para todo o grupo. “É comum que os povos se orgulhem de suas histórias, tradições, mitos e lendas, pois são expressões de sua cultura e devem ser preservadas” (JOVINO, 2006).
Ao refletir sobre o surgimento da literatura infantil podemos observar que se constituiu como gênero literário durante o século XVII, época em que as mudanças na estrutura da sociedade desencadearam repercussões no âmbito artístico. A arte, incluindo-se aí a literatura, não poderia ficar imune às transformações sociais.
Mas, a história da literatura infantil (com suas histórias e contos) tem relativamente poucos capítulos. Começa a delinear-se no início do século XVIII, quando a criança passa a ser considerada um ser diferente do adulto, apresentando necessidades e características próprias, pelo que deveria distanciar-se dos mais velhos e receber uma educação diferenciada, que a preparasse para a vida adulta.
Atualmente, temos os estudos sobre a História Social da Infância que contribui para a compreensão desse universo imerso de sonhos, fantasia, desejos, descobertas, medos, angústias, condições sociais etc. Estudos nos remetem a séculos de história ao perceber que
Antes da constituição deste modelo familiar burguês, inexistia uma consideração especial para com a infância. Essa faixa etária não era percebida como um tempo diferente, nem o mundo da criança como espaço separado. Pequenos e grandes compartilhavam dos mesmos eventos, porém nenhum laço amoroso especial os aproximava. A nova valorização da infância gerou maior união familiar, mais igualmente os meios de controle do desenvolvimento intelectual da criança, manipulação de suas emoções. Literatura infantil e escola, inventada a primeira e reformada a segunda, são convocadas para cumprir esta missão (ZILBERMAN, 1978, p. 15).

Ao refletir sobre o surgimento da literatura e dos contos de fadas, tal como o conhecemos hoje, conforme Couto (2009), estes surgem na França, fim do século XVII, sob iniciativa de Charles Perrault (1628-1703).
Aqui se faz importante ressaltar que ele não criou as narrativas dos contos, mas as editou para que estas se adequassem às audiências da corte do rei Luís XIV (1638-1715). Estes contos foram organizados como narrativas folclóricas contadas pelos camponeses, governantas e serventes. Apesar do distanciamento da camada popular e do desprezo pela sua cultura, a nobreza conhecia tais contos/histórias por meio do inevitável contato com o comércio ou pela presença das governantas e outros serviçais em suas residências.
No século XVIII, mais especificamente na Alemanha, os irmãos Grimm publicam seus contos, recorrendo à mesma fonte original que Perrault: o folclore celta, europeu, oriental, que circulava tanto na França quanto na Alemanha.
O projeto de compilação dos contos populares alemães por parte dos irmãos Grimm visava à preservação do folclore popular, o qual se via ameaçado pelo processo de industrialização e urbanização. Estes realizaram uma série de revisões e alterações da obra, polindo-a de modo a apagar suas possíveis qualidades rudes. Os irmãos Grimm, nas suas produções, voltaram-se para as crianças, transformando seus contos em leitura para a hora de dormir e algo observável nesse processo foi que nessas obras já se omitem os detalhes eróticos que antes apareciam.
Conforme Zilberman (2005) no final do século XIX, o surgimento dos primeiros livros infantis veio para atender às solicitações, indiretamente formuladas, de um determinado grupo social emergente, uma classe média urbana em ascensão. Surge então, neste período, um novo mercado reivindicando escritores para atendê-lo. Porém, a ausência de uma tradição na produção literária infantil os faz buscar, como alternativa, a tradução de obras estrangeiras direcionadas aos adultos e que foram adaptadas às crianças.
Atualmente, falar sobre os contos de fadas é quase o mesmo que falar em literatura para as crianças. Mas, não foi sempre assim. Por volta dos séculos XVII e XVIII, esta forma  era considerada como conteúdos violentos e impróprios, haviam correntes de intelectuais que defendiam a ideia de que os contos de fadas prejudicavam a educação das crianças.
Somente no século XX é que a literatura infantil chegou ao Brasil. De acordo com Lajolo e Zilberman (1999), surgiu em resposta à consolidação de um projeto moderno para o país, e que se manteve sob influência da Europa, tomando para si contos infantis da tradição popular de lá originados.
Alguns até hoje são conhecidos como: As aventuras de João e Maria, A Bela Adormecida, Cinderela, Chapeuzinho Vermelho dentre outros. Estes eram contados por adultos, até que homens como Charles Perrault (1628-1703) na França, Jacob (1785-1863) Wilhelm (1786-1859) Grimm, na Alemanha, transcreveram essas obras e publicaram, visando ao público infantil. (ZILBERMAN, 2005, p.08).

Entretanto, um ponto significativo e que serve de ligação das crianças com os contos de fadas é a exemplaridade. Nas referidas histórias havia a intenção de transmitir determinados valores ou padrões sociais a ser respeitados pela comunidade.
Por esta razão, até hoje se vê o conto de fadas mais como material pedagógico do que como uma arte literária. Entre os valores transmitidos nesses contos de fadas está a noção de pertencimento socialsentimento de adesão a princípios e visões de mundo comuns, que faz com que as pessoas sintam-se participantes de um espaço/tempo, ocupando o seu lugar de destaque na sociedade.
As narrativas apresentadas nos contos de fadas, possibilitam ao leitor – nesse caso, destacamos a inserção desse gênero textual a partir da Educação Infantil, ou seja, com crianças pequenas transferindo-as para um mundo imaginário, repassando valores morais como modelos de conduta e reflexões sobre atos de bondade e maldade provocando sentimentos num enredo envolvido em conflitos, superações e expectativas.
Os contos de fadas, geralmente oferecem informações sobre as relações existentes em diferentes sociedades e períodos históricos, ressaltando as relações de poder, constituições familiares, o senso de moralidade e as expectativas referentes às atitudes de cada personagem, como a bondade da princesa, a maldade da bruxa, a inocência das crianças (no caso de João e Maria), a beleza de Cinderela, a vaidade do príncipe, entre outros.
Nessa perspectiva, este trabalho tem como objetivo discutir as relações de gênero e étnico-racial presente nos contos de fadas apresentados desde a Educação Infantil, pois compreendemos que no enredo desses clássicos infantis estão subsidiadas questões referentes à supremacia do masculino sobre o feminino – presente nos atos de subordinação dos papéis femininos e da questão étnico-racial ao impor um padrão de beleza baseado na estereotipia dos personagens em destaque.
Dessa forma, este trabalho de natureza bibliográfica, de caráter qualitativo, foi realizado, com base em autores que discutem e pesquisam as relações de gênero e étnico-raciais na infância, como: Bauman (2005); Butler (2007); Cavaleiro (2000); Dias (1997); Fischer (2001); Louro (1997); Rosemberg (1996); Scott (1995), dentre outros.
Em primeiro momento escrevemos sobre a etapa da Educação Infantil como espaço para contação de histórias e a importância dos contos de fadas. Posteriormente abordamos as relações de gênero existentes nos contos de fadas os quais estabelecem estereótipos que são reproduzidos e incorporados pela sociedade.
Mais adiante, no ítem quatro, refletimos sobre as questões étnico-raciais as quais tem sido um desafio para os professores da educação básica na possibilidade de construção coletiva da valorização da diversidade, contribuindo para a construção da identidade étnica positiva, com respeito às diferenças. Já no ítem cinco, abordamos os estereótipos de gênero e étnico-racial presentes nos contos de fadas – Cinderela e Tiana, realizando uma análise dessas personagens e de como são caracterizadas como princesas, observando que existe uma naturalização e reprodução das desigualdades de gênero e étnico-racial intensificando o papel social e a hierárquica da sociedade reproduzindo expressões de racismo e sexismo por meio dessas histórias.
Ao finalizar, propomos uma reflexão sobre a importância do papel do professor frente a essas demandas atuais, da necessária abordagem das temáticas de gênero e étnico-raciais desde a Educação Infantil.
Por acreditar que essa discussão faz-se pertinente na formação inicial dos professores que irão atuar nas turmas de Educação Infantil e que utilizarão esses contos de fadas como recurso pedagógico nas rotinas infantis, consideramos que é necessária a discussão e desmistificação desse tema, observando as situações de racismo e sexismo que frequentemente são naturalizadas nessas obras, contribuindo dessa forma para a manutenção das desigualdades na sociedade. Este trabalho pauta-se nas reflexões e experiências vivenciadas em sala de aula pelas autoras como professoras da formação inicial e continuada de docentes, além de pesquisas e estudos já realizados sobre a temática.

2. O Espaço da Contação de Histórias na Educação Infantil
É possível afirmar que na etapa que compreende a Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental, a contação de histórias e a literatura faz-se presente nas práticas educativas desenvolvidas nos contextos escolares e não escolares, pois é por meio dela que a criança desperta e exercita o imaginário e aprende com o contato oral das histórias infantis a descobrir/compreender o mundo.
A este tipo de literatura – contos de fadas -  voltada para o público infantil, também é considerada indispensável na etapa da alfabetização, na qual as crianças estão vivendo a fase de aquisição de leitura e escrita. De acordo com Aguiar:
Os contos de fadas mantêm uma estrutura fixa. Partem de um problema vinculado à realidade (como estado de penúria, carência afetiva, conflito entre mãe e filhos), que desequilibra a tranquilidade inicial. O desenvolvimento uma busca de soluções, no plano da fantasia, com a introdução de elementos mágicos. A restauração da ordem acontece no desfecho da narrativa, quando há uma volta ao real. Valendo-se desta estrutura, os autores, de um lado, demonstram que aceitam o potencial imaginativo infantil e, de outro, transmitir à criança a ideia de que ela não pode viver indefinidamente no mundo da fantasia, sendo necessário assumir o real, no momento certo" (AGUIAR,1990, p,36)

Assim, concordamos com o autor ao abordar que o conto de fadas, é um meio pelo qual o respectivo leitor aprende a desenvolver a criatividade, o senso crítico, a perceber por meio de determinadas situações, os valores moralizantes, além de remeter a determinados princípios culturais como referência na sua formação. Com isso, percebe-se que o leitor é induzido a internalizar personagens tidos como modelos, impondo papeis e atitudes principalmente de submissão feminina, que tradicionalmente são aceitos como padrões normativos e que também podem estar se referindo a apenas uma determinada etnia como padrão aceitável.
Ao refletir desta forma, observa-se que estes enredos remetem o/a leitor/a há compreensão da hierarquização social a partir dessa criação de estereótipos e sujeição de papeis para com determinados personagens nas narrativas, pois a literatura infantil é, antes de tudo, literatura, ou melhor, é arte: fenômenos de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida, através da palavra. (COELHO, 2000, p.9)
Nessa assertiva, apontamos que:
O livro infanto-juvenil ensina e ensina muito. A sua postura aberta e declaradamente didática se faz sentir na temática escolhida, na estrutura narrativa, na própria transmissão de princípios morais e de outras informações, ou ainda na eleição de personagens modelares. (ROSEMBERG, 1985, p.59).

Ao refletir sobre as práticas desenvolvidas na Educação Infantil, em estudos anteriores, junto ao grupo de pesquisa Nutepp/UFPI 1, e ao ministrar disciplina de Didática da Educação Infantil e Estágio Supervisionado em Educação Infantil, junto ao curso de Pedagogia, constatamos que as crianças pequenas gostam muito de ouvir histórias, sejam elas lidas ou contadas e há necessidade de efetivar um espaço para contação de histórias.
Por esse motivo, os espaços educativos dispõem da necessidade de inclusão de momentos para contação de histórias como atividades permanentes/rotineiras nas quais as histórias para os pequenos sejam lidas e outras vezes contadas, implementando diferentes gêneros textuais e metodologias com recursos didáticos contribuindo nesse processo.
Quando se propõe momentos de leitura para as crianças, mostramos a elas um pouco do mundo. O olhar de um/a autor/a, o modo como ele/a pensa, seus sentimentos, sua sensibilidade, a história que desejou contar, expor, refletir naquele momento. Ao ler, o/a docente oferece às crianças a possibilidade de fruição de um texto bem escrito, de apreciação de belas imagens nas ilustrações, o contato com a linguagem escrita e a oportunidade de se identificar com os personagens, refletir sobre aspectos de sua vida, de seu cotidiano, de sentimentos e pensamentos.
Embora pareçam ser a mesma coisa, as narrativas envolvem aprendizagens:
[...] as aprendizagens envolvidas nestas duas situações são diferentes. Quando lê uma história para as crianças, o professor atua como um modelo de leitor, fala sobre a escolha do livro, o título, o nome do autor, do ilustrador etc. Ao ouvir uma história lida, a criança entra em contato com a linguagem escrita, que possui características próprias: é imutável – o texto é sempre o mesmo, não importa quem lê –, apresenta construções muitas vezes diferentes das que se usa para falar, como a linguagem poética, as rimas, o próprio encadeamento das palavras cuidadosamente escolhidas pelo escritor. (BRASIL, CEERT, 2012, p.40)

Discutimos na formação de professores/as a importância de utilizarmos algumas estratégias para  ler e contar histórias para bebês e crianças pois  nesse momento, além da escolha de livros com ótimas ilustrações, texto bem escrito e divertido, faz-se necessária a escolha de materiais diferenciados que chamem a atenção das crianças referente a faixa etária, com as repetições que são peculiares ao gosto dos pequenos, oportunizando um momento de aprendizagem significativa ao seu pleno desenvolvimento.
Acadêmicos/as que estão nos cursos de Pedagogia, por exemplo, são incentivados/as a utilizar a contação de histórias nos momentos de estágio supervisionado, permitindo uma reflexão desde o planejamento dessas histórias/contos, dos recursos pedagógicos utilizados e dos valores que serão repassados a partir de determinada história, provocando problematizações sobre este momento de forma crítica.

3. As relações de Gênero nos contos de Fadas
Percebe-se que historicamente as relações sociais são construídas a partir de características que determinam o que é próprio do sexo masculino e feminino, representando distintamente os papéis do homem e da mulher nestes contextos, no qual os homens são os dominadores, fortes, não choram e são preparados psicologicamente para ser mantenedores da família. Já as mulheres, representadas como o sexo frágil, delicadas, emotivas, associadas às funções maternas e domésticas, calcadas na submissão.
Observa-se que estes fenômenos, denominados – estereótipos – estão presentes na sociedade e influenciam diretamente as crianças desde o nascimento, obrigando-as e habituando-as a conviver com modelos e padrões previamente estabelecidos pelo meio cultural, provocando determinismos para ambos os sexos, brincadeiras de meninos, brincadeiras de meninas, roupas de meninos, roupas de meninas, cores para meninos e para meninas, brinquedos para meninos e para meninas – construindo padronizações que sugere determinismos  biológicos.
Nessa perspectiva, ao conceituar gênero, Louro (1997, p.77) refere-se ao modo como as diferenças sexuais são compreendidas numa dada sociedade, num determinado grupo, em determinado contexto, ou seja, o conceito de gênero é construído socialmente e historicamente.
Diante do exposto, Butler (2007), tece uma crítica à concepção dualista que opõe sexo/gênero, ao afirmar que ser homem ou ser mulher configura-se como uma construção cultural, resultante de normas que sustentam as práticas sociais e operam sobre nossos corpos de modo potente e incisivo.
Diante do exposto, e dos binarismos que se apresentam nas questões de gênero, pretende-se problematizar os discursos apresentados nos contos de fadas que corroboram para o papel da mulher em condições de submissão.
Já para Scott (1995), em relação à gênero:
[...] eu me refiro ao discurso sobre a diferença dos sexos. Ele não remete apenas a ideias, mas também a instituições, a estruturas, a práticas cotidianas e a rituais, ou seja, a tudo aquilo que constitui as relações sociais. O discurso é um instrumento de organização do mundo, mesmo se ele não é anterior à organização social da diferença sexual. Ele não reflete a realidade biológica primária, mas ele constrói o sentido desta realidade. A diferença sexual não é a causa originária a partir da qual a organização social poderia ter derivado; ela é mais uma estrutura social movediça que deve ser ela mesma analisada em seus diferentes contextos históricos (SCOTT, 1995, p. 15).

            Desse modo, percebe-se que a divisão binária entre o que constitui o feminino e o masculino são traçados pela sociedade, a qual estabelecem estereótipos que são reproduzidos e posteriormente incorporados. É por isso que devemos refletir sobre os processos de aprendizagens das crianças e seu desenvolvimento integral, visto que estas absorvem informações do contexto em que vivem, pois, no processo de autoconhecimento e do conhecimento do outro, são expostas a variados discursos, por meio de diferentes mecanismos, entre eles, os contos de fadas.
Nas turmas de Educação Infantil, os brinquedos e as brincadeiras são primordiais no trabalho com a temática de gênero, visto que ao brincar a criança aprende, desenvolve a imaginação, a criatividade possibilitando a construção da identidade de gênero, como elucida Felipe (2008), precisamos problematizar e desconstruir o sexismo, a heteronormatividade e outros tipos de preconceitos (2008, p.6).
São nestes espaços também que as crianças partilham suas culturas e aprendem simultaneamente com os demais. Para Faria (2006) é neste espaço da sociedade que vivemos as mais distintas relações de poder: gênero, classe, idade e étnicas. Portanto, ao refletir sobre a qualidade na oferta de educação nesses espaços, implica abordar as relações de gênero desde a Educação Infantil.
4. Refletindo a Questão Étnico-Racial
As discussões a respeito de etnia na sala de aula ainda é um tema de muitas discussões e às vezes apresenta-se como motivo de insegurança para muitos professores principalmente na Educação Infantil, visto que muitos acreditam que nesta etapa a discriminação e o preconceito não fazem parte do cotidiano das crianças. Existe um discurso que permeia esse território, onde sempre houve a ideia de felicidade, de cordialidade, onde na verdade, sabemos que não é isso que ocorre.
Nos estudos que tratam das relações raciais na infância (ROSEMBERG, 1996, CAVALLEIRO, 1998; DIAS, 1997, 2007; OLIVEIRA, 2004, SILVA, 2007, TRINIDAD, 2011; entre outras) nos dão subsídios necessários para afirmarmos que existem muitas situações de discriminação e preconceito que envolvem crianças desde a Educação Infantil. A inserção dos elementos referentes ao cumprimento das Leis Federais n° 10.639/03 e 11.645/08 que tornam obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, bem como das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Africana e Afro-Brasileira (2004),  têm sido um desafio para os educadores da educação básica, que apresentam grande dificuldade em desenvolver práticas educativas, desmistificando o tema e tornando positiva e real a participação dos alunos na história nacional, além de promover a educação para as relações étnico-raciais.
É no contexto da sala de aula da educação com crianças, que a literatura infantil, tem muito a contribuir para a questão da diversidade e da promoção da igualdade entre todos, pois nos últimos anos houve um aumento de obras publicadas cujo tema principal é a diferença.
Assim, essas obras enquanto pedagogias culturais, atuam diretamente nas escolas, produzindo sujeitos a partir de suas narrativas.
É no cotidiano da Educação Infantil que, facilmente percebemos a partir deste contexto, que os contos utilizados em sala de aula em sua maioria são de cultura predominantemente branca, como destaca alguns estudos da Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão onde ressalta
Principalmente com relação aos contos, sempre se enfatizam aqueles da tradição europeia, como Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel e outros. Não trazemos para a cultura escolar e para a cultura infantil os contos africanos, indígenas, latino-americano, orientais. Para uma educação que respeite a diversidade, é fundamental contemplar a riqueza cultural de outros povos. (MEC/SECAD, 2006, p.171)

Após analisar algumas obras e aprofundar os estudos sobre os Contos de fadas e a construção do imaginário na Educação Infantil, observamos que diversos autores como Bettelheim (1980), Franz (1981), Fromm (1973), Warner (1999) e Propp (2002), têm se debruçado sobre a temática dos contos de fadas, os quais apresentam-se sempre articulados a um discurso pedagógico, buscando governar a infância, vinculados a uma concepção moral.
Isso se dá como forma de refletir que é nesta fase da infância que o respeito, à diferença racial e o próprio ato de vislumbrar seu valor histórico também são construídos.
Ao oportunizar o estudo e apresentar histórias, contos, que contemplem personagens negros/as ao valorizar a literatura africana e afro-brasileira para as crianças desde a Educação Infantil, podemos  retratar a realidade histórica de um povo advindo da África com sua riqueza cultural e naturalizada brasileira a partir da relação com outras culturas, tornando essa, como parte de uma identidade própria brasileira, a qual irá contribuir para formação de aportes necessários a construção da sua identidade.
Este olhar sobre a identidade negra é algo que deve ser construído desde as séries iniciais, mais especificamente desde a Educação Infantil, com o intuito de desenvolver uma geração mais consciente de suas origens culturais, religiosa, social, etc.
Neste sentido, ao negar a diversidade e os aspectos relacionados a cultura da comunidade nas ações pedagógicas, Cavalleiro (2001, p.93) adverte que:
Dessa forma, o padrão branco torna-se sinônimo de pureza artística, nobreza estética, majestade moral, sabedoria científica, a ideia da razão. A paz, o belo, o bom, o justo e o verdadeiro são brancos. A violência, a feiura, a injustiça, as contendas são negras. Ao branco atribui-se a cultura confundida como ilustração. Ao negro atribui-se a cultura difundida como exotismo e/ou primitividade.

É no espaço escolar que, em sua maioria, inicia a construção da subjetividade das crianças negras, e neste, ocorrem os seus primeiros contatos com preconceitos, estigmas e racismo. A desigualdade racial nas escolas e instituições de educação infantil é uma realidade marcante no histórico brasileiro e o que é oferecido nestes espaços, sejam da infraestrutura ao pessoal, é uma realidade marcada por lacunas que ferem os direitos dessas crianças de ter um espaço de socialização que lhes permita uma convivência entre iguais e diferentes e suas formas de pertencimento.
Ao considerar
[...] a diversidade etnicorracial, sabemos que existe uma concentração maior de crianças negras em instituições como creches comunitárias e filantrópicas. Portanto, não podemos desconsiderar que a desigualdade racial no sistema educacional apontada em várias pesquisas está presente na Educação Infantil, considerando-se o acesso a essas ofertas de atendimentos, a qualidade do trabalho realizado, as condições de trabalho dos (as) profissionais que ali atuam principalmente a sua formação. (MEC/SECAD, 2006 p. 35)

Neste caso, a criança negra quando negada essa possibilidade de construção coletiva e de valorização da diversidade, esta encontra dificuldades em se identificar com o seu grupo de pertencimento racial, uma vez que afirmar-se como negro em nossa sociedade, que se apresenta de forma preconceituosa, machista, sexista e excludente é incorporar-se a estereótipos negativos.
A abundância de estereótipos negativos sobre os negros, conforme Cavaleiro (2000) permitem que as crianças negras neguem sua identidade racial e busquem cada vez mais aproximar-se das características que as aproximam do branco.

5. Os estereótipos de Gênero e Étnico-Racial das princesas Cinderela e Tiana
            No século XX, o estadunidense Walt Disney fez a adaptação para o cinema de várias histórias dos irmãos Grimm e de Charles Perrault. Entre essas histórias destacaremos os contos de fadas: Cinderela que foi lançado em 1950, e Tiana, protagonista do filme A Princesa e o Sapo, lançado em 2009.
O conto de fadas – Cinderela, é um dos mais difundidos e populares contos infantis, o qual narra a história de uma linda jovem branca, loira, magra e órfã que é acometida de inúmeras crueldades da madrasta e de suas filhas que invejam a beleza da moça. Vive numa situação de servidão, com roupas rasgadas, responsável pelos serviços domésticos, mas é gentil e resignada, até que surge a oportunidade de mudar de vida ao ser convidada para o baile de gala do príncipe no palácio real. Depois de muitos contratempos e maldades da madrasta e com ajuda de uma fada madrinha, que lhe deu vestido novo, sapatos de cristal e carruagem, Cinderela consegue ter um final feliz ao lado do seu príncipe.
O conto de fadas – A Princesa e o Sapo – narra a história de Tiana - que é uma garota pobre, negra que vive na cidade de Nova Orleans, o berço do jazz na década de 1920, e que enfrentou muitas situações perversas. Seu maior sonho é ter um restaurante e para isso, segue os conselhos do pai e trabalha incansavelmente para conseguir seus objetivos. Quando aparece um príncipe, foi transformado em sapo por um mago e Tiana ao beijar o príncipe transformou-se em uma rã. Os dois vivem uma aventura juntos na busca pelo antídoto para quebrar o feitiço. Ao final ela se casa com o príncipe e consegue ter o seu restaurante.
Para a análise desses dois contos de fadas, que fazem parte do contexto infantil, é possível perceber que em Cinderela os modelos femininos estão bem representados ao observar as características evidenciadas: submissa, passiva, dócil, prendada, conformada com a situação de humilhação advinda da madrasta e de suas filhas. Ainda, percebe-se que Cinderela fica na espera que forças mágicas e exteriores lhe auxiliem e guiem até o príncipe – representado na história como homem bonito, forte e seguro que simbolizava salvação, felicidade e libertação.
Neste conto de fadas, fica evidente que o modelo a ser seguido é o de Cinderela e que a sua felicidade reside no casamento – com o príncipe encantado. Ainda, muitas crianças adquirem um reconhecimento com a personagem e desejam ser como Cinderela – sua branquitude é apresentada como sinônimo de beleza e nobreza. Para Mendes (2000, p.45) “Em Cinderela permanecem vivos os ideais da sociedade patriarcal: a criança e a mulher devem ser submissas, o poder deve ser divino e masculino”.
No caso de Tiana, o fato dessa protagonista tornar-se e permanecer como rã ao longo de muitos minutos no filme, impede que as crianças adquiram um reconhecimento com a personagem. Tiana é a primeira princesa negra da franquia Disney Princesas e a segunda princesa americana após Pocahontas. Na história, Tiana sempre está preocupada com os trabalhos, dentre eles como empregada doméstica em uma casa de família branca e rica denotando a hierarquia racial, busca poupar dinheiro para conseguir realizar o seu sonho, sem ligar muito para romances. Mesmo após casar-se com o príncipe e tornar-se princesa, Tiana continua tendo que trabalhar no restaurante, visto que o príncipe encontrava-se falido financeiramente.
Convém destacar que nas histórias de Walt Disney, há uma condição de trabalho imposta às princesas aqui abordadas – desempenham tarefas domésticas, na qual Pachá (2013) faz crítica ao ressaltar que trata-se de apologia à subalternidade da mulher, a qual, reproduz o papel que a mulher deve desempenhar na sociedade.
Para Buena (2012), no cinema e na literatura, a imagem da princesa está relacionada a beleza e glamour, o que exerce grande fascínio nas crianças e podem influenciar em sua formação. Observa-se que em ambas as histórias a figura do príncipe é essencial, assegurando o estereotipo que a mulher só poderá ser feliz se tiver como companheiro um príncipe que a salve. (PACHÁ, 2013)
Nesse sentido, foi possível analisar que nos contos de fadas Cinderela e A Princesa e o Sapo existe uma naturalização e reprodução das desigualdades de gênero e étnico racial, intensificando o papel social e hierárquico da sociedade, reproduzindo expressões de racismo e sexismo.
Portanto, reiteramos aqui a importância dos profissionais da educação, na utilização desses contos de fadas – sabe-se da importância desse gênero textual nos contextos educativos – no sentido de problematizar essas questões aqui abordadas junto às crianças de forma crítica, explicando às crianças as questões de gênero, machismo, racismo, preconceitos e outras situações negativas que possam aparecer nessas histórias.

6. Considerações Finais
Ao apresentar os Contos de fadas para as crianças, num primeiro momento nas turmas de Educação Infantil, muitas das vezes o professor não está atento a importância da reflexão das relações de gênero, padrões de beleza que são explícitos nessas obras, geralmente eurocêntrico e a posição social dos personagens que são apresentados no enredo, nem mesmo as quais foram as condições para a escolha dos personagens.
A fada, a princesa, a mocinha são sempre protótipos da raça ariana: cabelos longos e louros, olhos azuis, corpo esbelto, altura média, roupa imaculada etc. O mocinho e o príncipe são altos, corpulentos, fortes, elegantes, bem barbeados, sempre com o aspecto de quem acabou de sair do banho, mesmo depois de ter cavalgado dias a fio e enfrentado mil perigos de toda espécie e qualidade. (ABRAMOVICH, 1989 p.12).

Nessa perspectiva, nos convém refletir sobre a formação inicial e continuada de docentes, aqueles que vão atuar na primeira etapa da educação básica, e também nas outras modalidades, além da forma de desenvolver e contribuir com a construção da afirmação da identidade de gênero e racial desde a educação infantil.
Ao refletir sobre as diferentes ressignificações da nossa história e da cultura, percebe-se a necessidade de reflexão nos espaços formativos, visto que fomos formados pela lógica do racismo ambíguo, sob a égide da branquidade normativa, construído através do mito da democracia racial, isso sem contar com as múltiplas vozes que nos compõem como a do colonizador, que permanecesse inclusive na produção da literatura infantil e a qual necessitam ser repensadas e urgentemente adequadas. (SILVA; ROSEMBERG 2008, p.104).
Convém oportunizar aos futuros docentes o acesso e o estudo dos documentos oficiais, como as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2009), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), assim como documentos orientadores, no caso, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEIs) - 1998, Parâmetros Curriculares Nacionais (1996) – Temas Transversais - além de outros documentos e experiências que tratam das questões de gênero e igualdade racial na educação Infantil, como atitudes fundamentais para a construção de práticas pedagógicas que estejam preocupadas com o pleno desenvolvimento da criança e que considerem o reconhecimento  do pertencimento de gênero e étnico racial como questões importante para a construção da identidade. Ao estimular o compromisso desses profissionais da área com a educação de qualidade e igualitária podemos construir novas práticas que venham a promover a igualdade racial nessa etapa.
Por meio desse estudo, considera-se que a ausência de discussões sobre essa temática na escola, e no caso, na educação infantil que contempla os centros de educação infantil e instituições, sejam públicas ou privadas,  desencadeiam problemas crescentes de violência moral, física, social e tantas outras, já que não é incentivado o desenvolvimento por uma cultura de aceitação de si, como parte de um grupo de valor, sem rotulações de quem seja inferior ou superior, melhor ou pior, mas, propor o fazer-se educar numa perspectiva de construção do indivíduo como um ser igual, independente de etnias, raças, crenças, valores, etc.
Ao propor tais ações, não podemos esquecer que se tratam de um compromisso institucionalizado, em que a sociedade deve despertar em seu papel de cobrar e se fazer cumprir essa prática democrática e emancipatória principalmente no ambiente escolar, e que seja iniciado desde os primeiros anos de institucionalização.
Diante disso, outro ponto importante ao observar diz respeito a importância entre a  união dos sistemas de ensino, as instituições de apoio e desenvolvimento da cultura, como os Núcleos de Estudos Afro-brasileiros, as Universidades,  a formação contínua desses professores que atuam na educação básica, contemplando desde a Educação Infantil.
Faz-se pertinente enfatizar que a inserção da literatura africana e afro-brasileira possibilita a construção também de valores morais e ensinamentos que propiciam as crianças construírem afirmativamente sua identidade racial, conhecendo elementos sobre seus ancestrais que lhes forneçam a valorização e o orgulho do seu pertencimento racial, diferindo da perspectiva escravocrata ou abolicionista que erroneamente  é enfocada nas escolas, desenvolvendo dessa maneira, a autoestima e autoconceito elevados nestas crianças.
Histórias que podem parecer apenas um detalhe do cotidiano da educação infantil, mas são reveladores de uma prática que talvez possa prejudicar o processo de socialização de crianças negras, imprimindo-lhes estigmas indeléveis. (CAVALLEIRO, 2005 p.17).

É nessa perspectiva que os elementos da literatura africana e afro-brasileira podem ser utilizada como uma proposta didática eficaz na Educação Infantil, ao possibilitar a construção afirmativa da identidade racial, uma vez que os mesmos discutem aspectos culturais e históricos do continente africano e do Brasil e fomentam o pensar criticamente sobre a diversidade de realidades que permeiam nosso cotidiano.
A partir desse estudos, compreendemos que o trabalho sistemático e contextualizado com a literatura africana e afro-brasileira permite a algumas crianças negras enxergar beleza no seu pertencimento racial, na sua pele e nos seus cabelos, contribuindo assim com a formação afirmativa da identidade das mesmas.
Neste sentido os contos e histórias aqui mencionados propõem uma reflexão ao partir do pressuposto que as narrativas, os personagens e até as próprias ilustrações apresentadas nos livros de histórias, dos contos de fadas e da literatura apresentada nessa etapa da educação, muitas das vezes, produzem ou reproduzem formas simbólicas que muitas vezes hierarquizam as relações de gênero e étnico racial, pois colocam  brancos de um lado, negros(as) e indígenas de outro, ainda em que não operam para a emancipação ou para o respeito à diferença.

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* Mestre em Educação pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO/PR). Docente do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Piauí (UFPI/CSHNB). E-mail: alessandralopes@ufpi.edu.br
** Pós Doutora em estudos de Gênero pela UCES ( Argentina), Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Docente do Programa de Pós Graduação em Diversidade Cultural e Inclusão Social da Universidade Feevale/RS e do PPG em Educação da Universidade La Salle-Canoas/RS. E-mail: denisequaresma@feevale.br
1 Núcleo de Estudos e Pesquisas em Teorias e Práticas Pedagógicas – Universidade Federal do Piauí – Campus Senador Helvídio Nunes de Barros.

Recibido: 06/05/2018 Aceptado: 23/05/2018 Publicado: Mayo de 2018

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