CAMINHOS DO JEQUITINHONHA: ANÁLISE DO PROJETO DE COMBATE Á POBREZA RURAL

Marcela de Oliveira Pessôa

2.5 – O SEDVAN/IDENE e o PCPR

Em 2003 foi criada a Secretaria de Estado Extraordinária para o Desenvolvimento dos Vales do Jequitinhonha, Mucuri e Norte de Minas – SEDVAN com a finalidade de operacionalizar políticas que visassem o desenvolvimento socioeconômico das mesorregiões que abrange. De acordo com informações fornecidas pela mesma:
A criação da secretaria fez com que Minas Gerais se tornasse uma referência nacional e internacional na geração, adequação e utilização de um modelo de Governança Social, com tecnologias sociais e metodologias emancipatórias eficazes na construção de desenvolvimento sustentável em comunidades de baixa renda e baixa escolaridade (Folheto Governo de Minas- Construindo um novo tempo, [s.d]).

A SEDVAN postula ainda que sua criação é um feito inédito, pois busca alternativas para uma região que convive “simultaneamente com a pobreza e muitas potencialidades naturais, culturais, sociais e econômicas” (IDENE, 2011). Reconhecendo o modo mal sucedido como se operou o desenvolvimento no Brasil, a instituição se julga consciente da necessidade de buscar novas estratégias que absorvam os conhecimentos locais e implementem “com eficiência, criatividade e permanente participação popular, projetos e programas que resultem em efetivos avanços para o bem estar da sociedade” (IDENE, 2011).
O órgão executor das políticas orientadas pela SEDVAN é o Instituto de Desenvolvimento dos Vales do Jequitinhonha, Mucuri e do Norte de Minas – IDENE, criado a partir da fusão entre a CODEVALE e a Superintendência de Desenvolvimento do Norte de Minas – SUDENOR pelo Decreto Estadual 14.171 de 2002.  O órgão, atualmente, mantém diretorias regionais nas suas diferentes mesorregiões de abrangência, contando com um escritório regional em cada microrregião.
No Vale do Jequitinhonha sua diretoria regional situa-se em Diamantina, Alto Jequitinhonha, e conta ainda com um escritório regional nos municípios de Araçuaí e Jequitinhonha, no Médio e Baixo Jequitinhonha, respectivamente. De acordo com o próprio IDENE, sua função é:
[…] planejar, coordenar, supervisionar, orientar e executar a formulação e a implantação de plano,  programa,  projeto  ou atividade, em consonância com os objetivos e interesses das regiões Norte e Nordeste  e articular formas de atuação com os demais órgãos e entidades  dos Poderes Executivos municipais, estadual e federal que  atuam  na região. Identificar e viabilizar o aporte de recursos para os investimentos necessários ao desenvolvimento das regiões  Norte  e Nordeste; promover  a  cooperação entre as entidades  públicas  e privadas,  nacionais ou internacionais, que  atuem  nas  áreas  de desenvolvimento   dessas  regiões,  apoiando   e acompanhando as respectivas iniciativas.
Articular-se com os organismos competentes, tendo em vista a fixação de critérios de concessão de estímulos fiscais e financeiros,  visando à atração de investimentos e à  indução do desenvolvimento empresarial das regiões Norte e Nordeste. […] (IDENE, 2011)

E por meio disto, o IDENE tem como objetivos:

  • Combater a pobreza rural e as desigualdades sociais;
  • Investir na formação do capital humano e social dos cidadãos da região;
  • Contribuir para a erradicação do analfabetismo;
  • Elaborar e implementar programas e projetos de desenvolvimento socioeconômico;
  • Promover processos de transformação das potencialidades regionais em produtos comercializáveis;
  • Contribuir na promoção e comercialização dos produtos desenvolvidos na região, gerando trabalho e renda;
  • Contribuir para melhoria do IDH na região, promovendo inclusão social e conquista da cidadania;
  • Criar mecanismos de atração de investimentos;
  • Criar Rede de Desenvolvimento Participativo Sustentável;
  • Propiciar a intersetorialidade do planejamento e da ação governamental;
  • Articular os atores sociais, estimulando-os à participação na comunidade e nas ações de promoção de desenvolvimento regional;
  • Firmar termos de cooperação com secretarias de Estado, Governo federal, Universidades, Fundações, Institutos, Associações e Prefeituras;
  • Sensibilizar a comunidade, mobilizar lideranças e capacitar os agentes envolvidos nos processos de transformação das potencialidades da região;
  • E proceder a avaliação de impacto da ação governamental nas regiões em que sedia.

Seus objetivos denotariam o compromisso em promover a maior articulação das políticas que a instituição gere ao movimento da sociedade, incorporando-a como elemento transformador da região a ser atendida. A crença na responsabilidade da instituição para estes fins se encontra explícita na opinião da diretora regional do IDENE no Vale do Jequitinhonha 1, que não apenas acredita que a instituição se faz colaboradora do desdobramento das potencialidades do Vale do Jequitinhonha, como prega a transparência e participação como elementos cruciais para que os recursos da instituição sejam bem empregados
O IDENE vem tentando atingir tais objetivos mediante quatorze programas2 que atualmente desenvolve em todo seu território de abrangência. Com diferentes níveis de complexidade, os programas visam abarcar as principais carências encontradas pela população jequitinhonhesa. Um dos programas de maior complexidade trata-se do PCPR, que passou a vigorar a partir do Decreto Estadual 44.097 de 2005, e visa financiar as comunidades em ações que lhes proporcionem melhorias na qualidade de vida por meio dos seguintes aspectos:
• Infraestrutura: barragens, poços tubulares, cisternas, eletrificação rural, construção/recuperação de estradas, pequenas pontes, armazéns comunitários etc.;
• [Sistemas] Produtivos: casas de farinha, mecanização agrícola, unidades de beneficiamento, piscicultura, apicultura, ovinocaprinocultura, oficina de confecções etc.;
• [Fins] Sociais: construção/reforma de escolas e postos de saúde, lavanderias comunitárias, centros sociais, melhorias habitacionais etc (IDENE, 2011).
Embora o PCPR seja uma ação do Estado de Minas Gerais administrada pelo IDENE, houve outras experiências de PCPR’s em outros Estados brasileiros (Governo do Estado do Rio Grande do Norte, 2002; KHAN e SILVA, 2005; MACÊDO et al 2011; SILVERA, 2009; PINHEIRO, sd), visto que se trata de um programa gerido mediante recursos que se apoiam nas células federativas, sociedade civil e Banco Mundial. Desta forma, foi possível ser introduzido em diferentes realidades, havendo, também, traços gerais a serem aproveitados das diferentes experiências. O PCPR mineiro se diferencia, inicialmente, por dizer respeito a única experiência em território fora das delimitações do Nordeste brasileiro, mas não é nenhuma excentricidade se consideradas as semelhanças socioeconômicas das áreas de abrangência do programa.
Até o fim desta pesquisa, a instituição declarava que o PCPR mineiro abrangia 188 municípios do semiárido mineiro, sendo 89 na mesorregião Norte de Minas, 52 no Vale do Jequitinhonha, 36 no Vale do Mucuri e 11 na região central; contando com uma “equipe multidisciplinar de 53 profissionais qualificados, atuando na Sede, em Belo Horizonte, e nos 08 escritórios regionais […] de maneira que cada escritório regional trabalhe, em média, com 24 municípios” (IDENE, 2011).  O PCPR tem como público alvo a população atingida pela seca, “comunidades dispersas e suas associações, prefeituras municipais, produtores rurais familiares, artesãos, pescadores, garimpeiros, assentados da reforma agrária, comunidades quilombolas, mulheres e jovens” (IDENE, 2011). Suas bases visam contemplar a participação social, dado que:
“[…] preconiza o desenvolvimento da capacidade dos atores locais de identificar e conhecer a sua realidade de forma participativa, analítica e crítica, construindo coletivamente um diagnóstico de sua situação e da comunidade na qual estão inseridos, com indicação de ações para a superação de entraves, por meio dos subprojetos e, de forma integrada com outras políticas públicas que venham a ser desenvolvidas no município” (IDENE, 2011).

Na prática, o PCPR prevê que os indivíduos que almejam ser contemplados se organizem como associação de acordo com o que está estabelecido no Código Civil3 , redijam um subprojeto de seu interesse que se enquadre n’alguma das categorias acima elencadas (de infraestrutura, de fim social ou produtivo) e, mediante seu representante, submeta-o à aprovação do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) de seu Município. Tais Conselhos, que são criados inicialmente para atender aos requisitos de alocação de recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), seriam compostos por pelo menos 50% de representantes dos agricultores familiares (ORTEGA, 2008) e estariam aptos a deliberar sobre qual comunidade deve ser atendida com o recurso financeiro do IDENE.
Com a aprovação, o subprojeto é encaminhado para o IDENE que faz análise da sua legitimidade, elegibilidade e viabilidade técnica e ambiental, e depois de aprovado o convênio entre IDENE e associação os recursos são repassados para a conta da entidade para dar início às obras ou afins.  Os critérios para definição do volume de recursos disponíveis para elaboração de projetos em cada município se articulam entre o IDH municipal e o número da população rural do mesmo: quanto menor o IDH municipal e maior a população rural, mais recursos serão destinados (IDENE, 2011). Além disto, cada subprojeto não pode ultrapassar o valor máximo de R$100 mil, sendo que até 8% pode ser gasto para contratar assistência técnica e acompanhamento, e a operação e manutenção ficam sob a responsabilidade das associações beneficiárias. (IDENE, 2011).
Desta forma, o PCPR espera atingir as expectativas de ser um projeto que vislumbre a participação social e correspondência à realidade, pois são os beneficiários que realizariam o diagnóstico de suas necessidades e o prognóstico sobre que atividade deve ser implementada para mudar sua realidade. Além disto, por serem os responsáveis por administrar o dinheiro, prestar contas e gerir o projeto, ficaria assegurada a transparência do empreendimento fomentado pelo PCPR. Estes são dois dos pressupostos deste novo início de fase da gestão das políticas públicas no Brasil. Outros pressupostos também são açambarcados como metas do PCPR, que visa reduzir a pobreza rural por meio de:

  • Melhoria na renda e bem estar da população rural;
  • Fomento do capital social;
  • Melhoria da governança local, em que a participação é estratégia de implementação dos investimentos;
  • E promoção de maior integração das políticas públicas junto aos CMDRS’s (IDENE, 2011)

Por suposto, se espera que o PCPR esteja promovendo a melhoria da qualidade de vida da população que abrange dentro deste marco que se pretende democrático-participativo a partir do local. Recentemente houve a reformulação de alguns critérios do PCPR em que ele fora dividido em duas etapas: PCPR I, que ocorrera entre 2006 e 2010, e PCPR II, que começou em 2010 e corresponde ao presente período. Com a conclusão da primeira fase do PCPR é possível verificar as consequências imediatas que os subprojetos proporcionaram.
Admitindo a crença de Kliksberg (1999) para quem o público beneficiado é fonte de sabedoria conquanto a suas próprias deficiências e urgências, bem como os juízes mais indicados a avaliar os efeitos reais de programas de políticas públicas, este estudo vai à campo com a finalidade de analisar em que medida o PCPR tem contribuído para promover o desenvolvimento socioeconômico do Vale do Jequitinhonha.
Os próximos capítulos elucidarão a realidade em que insere o PCPR, esclarecendo a metodologia utilizada na coleta de dados e em sua análise. Busca-se trazer a discussão sobre a proposta de mudanças nas políticas públicas do campo teórico para uma experiência concreta apontando, por meio desta pesquisa, como tem sido a performance do Projeto na promoção de um desenvolvimento socioeconômico que contemple participação democrática, qualidade de vida e ruptura com a diretriz tecnocrática.


1 Entrevista com a Sra.Margareth Durães em 25 de Agosto de 2010.

2 Seca e inclusão produtiva (Projeto estruturador); Projovem trabalhador; Turismo solidário; Cidadão nota dez; Artesanato em movimento; Sorriso no campo; Ovinos gerais; Fome zero – Leite pela vida; Cozinhas comunitárias; Cidadão.net; Apicultura e desenvolvimento; Cisternas no semi-árido mineiro; Combate à Pobreza Rural.

3 Mais especificamente o Título II, Capítulo II da Lei Federal 10.406 de 2002.

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