OLHARES SOBRE O ESTADO DO TOCANTINS: ECONOMIA, SOCIEDADE E MEIO AMBIENTE
Yolanda Vieira De Abreu (editora)
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Atualmente, as dezoito aldeias Krahô estão associadas à "Kapey - União das Aldeias Indígenas Krahô". Por sua vez, as aldeias Rio Vermelho, Bacuri e Aldeia Nova fazem parte da Wytycati, uma associação à qual estão afiliadas também aldeias de outros povos Timbira: Apinayé, Krinkati, Pykobjê e Apanyekra. A sede da Kapey (Ka = pátio; pey = bom, bonito) está situada num local denominado Centro, próximo da aldeia de Água Branca, dentro da TI Kraolândia. A dificuldade de acesso ao local das reuniões, menos para aqueles líderes cujas aldeias estão mais próximas do Centro, também denominado Kapey, foi um dos determinantes para a compra, em 1998, de uma casa em Itacajá, cidade vizinha à Terra Indígena, dela apenas separada pelo rio Manoel Alves Pequeno. Nos fundos da casa, que é chamada de escritório pelos índios, os Krahô pretendem construir uma espécie de abrigo para os estudantes índios que estejam morando na cidade. Possuem também um terreno que chamam de Chácara, nos arredores da cidade de Alto Lindo, município vizinho ao de Itacajá. Os dirigentes da Kapey têm a intenção de construir neste terreno uma casa de hóspedes, onde os Krahô que estiverem em Itacajá ou Alto Lindo possam usar para pouso. A casa e o terreno foram comprados com o dinheiro proveniente do prêmio recebido pelos Krahô do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), pelo projeto de preservação de sementes de uma das variedades de milho, cujo cultivo e uso em rituais os Krahô já haviam abandonado. Com o dinheiro do prêmio os Krahô também equiparam o escritório com um microcomputador, telefone e antena parabólica. A Wytycati tem o seu nome inspirado numa instituição Timbira: chama-se wyty a menina ou menino associado respectivamente às mulheres ou aos homens de uma aldeia, e em cuja casa eles podem entrar livremente, principalmente durante os rituais, e que geralmente serve de ponto final das corridas de toras; cati significa "grande". Em suma, a Associação seria uma grande casa onde todos podem entrar. Ela tem sua sede junto à cidade de Carolina, no Maranhão. Conta com o apoio do Centro de Trabalho Indigenista (CTI), que colabora na formação de professores indígenas. A Wytycati também está relacionada, junto com algumas associações de produtores rurais do sul do Maranhão e norte do Tocantins, a um projeto que tem por objetivo explorar economicamente os recursos do cerrado, dando-lhe ao mesmo tempo proteção. Os participantes do projeto trabalham na coleta de frutos do cerrado (caju, juçara, bacuri, buriti, cajá, e futuramente araçá, murici, mangaba e bacaba), cujas polpas são extraídas, congeladas e embaladas em Carolina, sendo distribuídas sob a marca FrutaSã. O mesmo projeto promove a formação de viveiros de mudas das fruteiras nativas, destinadas ao adensamento do cerrado. Na aldeia de Pedra Branca, uma ONG, denominada ESAMACITO, desenvolve, com ajuda da Embaixada da Alemanha, um projeto de construção de barragem de pequeno porte para criação de peixes da região, com o objetivo de aumentar a oferta de alimentos. Com ajuda da Embaixada Britânica, a mesma ONG promoveu a construção em Pedra Branca de uma escola, com o nome Caxêkwôi (assim se chamava a mulher-estrela que, segundo o mito, mostrou as plantas que os Krahô deveriam cultivar). A escola recebeu microscópio, telescópio, televisão, videocassete e uma videoteca. Estes aparelhos são alimentados por energia solar, captada através de célula fotoelétrica acoplada a uma bateria. Cerca de seis escolas funcionam junto às aldeias, mantidas pelo governo do Estado do Tocantins.(ISA, 2002).ficos do projeto encaminhado a
5.1 Projeto de revitalização das práticas medicinais do povo Krahô.
Como resultado de um processo aberto pelo Ministério Público Federal (P.A. 1.36.000.000551/2002-35) contra a UNIFESP, pelo contrato de uso dos conhecimentos tradicionais do povo Khahô, realizado com a associação Wytycati, os Krahô elaboraram um Plano de revitalização de suas práticas medicinais, que foi proposto a UNIFESP, como condição para a continuidade da cooperação entre eles. As atividades propostas foram elaboradas pelos próprios Krahô, fruto de diversas discussões presente há vários anos em suas assembléias. Este plano, ou "Projeto Wayaká", inclui a criação de dois "Pólos Indígena de Saúde", cada qual situado em uma área da terra Indígena Krahôlandia. Como esta terra está situada em dois municípios (Itacajá e Goiatins), cada um destes pólos irá atender às demandas de saúde das aldeias, localizadas na área de abrangência destes municípios. Quatro construções comporão a estrutura física de cada um destes pólos: a primeira corresponderá a uma construção destinada à cozinha/refeitório/dormitório dos wayakás e a segunda será uma instalação da Farmácia Verde Krahô, contendo ainda um viveiro medicinal. As outras duas construções corresponderão, respectivamente, a uma casa destinada aos pacientes indígenas e outra destinada ao tratamento de pessoas não-indígenas interessadas em uma assistência terapêutica de tal natureza. O projeto ainda prevê consultorias antropológicas para os procedimentos de articulação entre o sistema de saúde oferecido pelo Governo e o proposto no projeto. Para as questões de cultivo e plantio medicinal, o projeto prevê consultorias para a área ambiental e ainda uma assessoria para as questões de contabilidade. Estes profissionais deverão ser indicados pelo próprio projeto (PRTO/MPF, 2003). Pretende-se, com esse projeto, possibilitar incentivos aos Krahô para utilizarem seu próprio sistema médico a partir de um programa destinado ao pagamento de serviço dos curandeiros Krahô (Wayakás). Estimular o trabalho dos raizeiros Krahô para que, em um segundo momento possa disponibilizar medicamentos fitoterápicos nos postos de saúde já existentes em suas aldeias.
5.2. Contexto da Proposta encaminhada pela Kapey
Os Krahô possuem um sistema de cura médico-espiritual onde a figura central é representada pela categoria social Wayaká (pajés). Cada wayaká adquire seus conhecimentos e propriedades curativas através de contato com entidades não-humanas, sobretudo animais como o peixe, veado e outros. Esta experiência é a mesma vivenciada em tempos imemoriais pelo personagem mítico Türkren: o primeiro Wayaká Krahô. Os wayakás devem cumprir um rigoroso número de restrições alimentares para o bom desempenho de seus procedimentos terapêuticos. Isto fica nitidamente evidenciado nos casos de picada de cobra, onde estes ''resguardos" são bastante árduos. Todo este quadro cria um panorama singular característico do sistema médico tradicional Krahô, que singulariza toda iniciativa de desenvolvimento de um projeto de estímulo à continuidade de seus próprios métodos curativos, contribuindo para a continuidade e valorização de seus conhecimentos tradicionais relativos à utilização de plantas medicinais. De acordo com seus padrões socioculturais, todo processo curativo é acompanhado de formas de pagamento e/ou retribuição por este serviço. No passado os wayakás solicitavam determinados bens aos enfermos e seus familiares, como produtos oriundos dos plantios nas roças, panelas e artesanatos. Com o aumento do contato com segmentos da sociedade nacional e o surgimento de novas demandas, estes passaram a solicitar outros tipos de produtos, sobretudo industrializados. Tais bens vão desde espingardas para caça até cabeças de gado nos casos mais graves. A situação encontrada entre os Krahô exige a obtenção de recursos financeiros por parte das pessoas e famílias para garantirem suas próprias necessidades de subsistência. A diminuição da caça em determinadas regiões da terra indígena; a pobreza material do solo arenoso presente na área; os equívocos passados do projeto de incentivo à monocultura do arroz em sistemas de roças coletivas, algo inexistente e alienígena à cultura deste povo, são alguns dos elementos que criam um difícil quadro de subsistência de diversas famílias Krahô. Esta dificuldade está intimamente relacionada com os conflitos entre as famílias e os wayakás, tendo em vista as dificuldades destas famílias em atender às demandas exigidas pelos wayakás para o tratamento dos doentes. Pela impossibilidade de atender às demandas dos wayakás, diversas famílias estão tendo que renegar a utilização de seu próprio sistema médico para serem atendidas pelos órgãos governamentais, principalmente porque o atendimento nestas instâncias não necessita de nenhum gasto por parte do doente e de seus familiares. Este fato, aliado a óbitos ocorridos nos locais de assistência de Araguaína-TO, está estimulando uma situação conflituosa internamente no povo Krahô. Os conflitos foram acentuados com o processo de inserção da assistência médica oferecida pelos órgãos governamentais e, atualmente, executada por uma entidade não governamental (FASAM). Iniciado em décadas anteriores e com uma postura paternalista, este processo foi gradativamente minando aspectos do sistema médico indígena Krahô. O objetivo central do projeto é, portanto, minimizar este processo cobrindo as solicitações dos wayakás, através do envolvimento e participação ativa das organizações indígenas representativas do povo indígena Krahô.