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Keynesianas
Mario Gómez Olivares

 

 

A Teoria Geral de  J. M. Keynes revisitada

 

3.         Os agregados macroeconómicos de uma economia monetária

           

O desenvolvimento de uma nova teoria implica começar por uma série de questões terminológicas. As questões terminológicas permitem precisar o próprio objecto de estudo e  desenvolver os aspectos negligenciados pelas teoria anteriores, é por ahí que se avança ou recua na elaboração da teoria. Algumas dessas categorias macroeconómicas assumen novos conteúdos outras são elaboradas pela primeira vez e por completo.

 

3.1.     A oferta agregada e procura agregada

 

O estado da técnica, o nível dos salários, a importância das quantidades de meios de produção e de mão de obra não empregue e as condições da concurrência nos mercados, determinam as condições de oferta para os produtores individuais e no seu conjunto. Pelo que, se a técnica, os recursos e o custo dos factores por unidade de emprego são dados, o montante deste para a firma e a indústria no seu conjunto, dependem do produto que os empresários esperam receber pela sua produção, dado que os empresários esforçam-se por fixar o volume da ocupação no nível em que a diferênçaia entre o valor do produto e os custos dos fac­tores é máximo. Nos encontramos de maneira muito clara e sem dúvidas no curto prazo[1].

O preço de oferta global da produção resultante do volume de emprego é a expectativa dos resultados que se espera obter e que fará com que sejam cobertos os custos desse emprego. Desde o ponto de vista do empresário chama-se o produto do emprego ao nível de rendimento global que resulta de um volume dado desse[2].

As decisões dos empresários, que proporcionam os rendimentos aos produtores individuais, os que pela sua vez decidem sobre como empregar esses rendimentos, determinam as condições de procura. O nível de emprego não depende do nível pre-existente dos rendimentos mas das decisões de investir e das estimativas actuais dos montantes de consumo correntes e futuros. Este carácter antecipado e estimativo das decisões unido ao carácter probabilístico das previsões dos agentes sobre o futuro representa uma novidade teórica fundamental da nova teoria da procura efectiva. Se en Walras as categorias têm um carácter ideal, em Keynes têm un carácter antecipado.

2.2.     A procura efectiva

 

Designando por Z o preço de oferta global da produção que depende de N homens empregados, a relação Z = F(N) representa a função de oferta global. Sendo D o montante do produto que os empresários esperam receber pelo emprego de N homens, a relação D = f(N) representa a função de procura global. Se D é maior que Z existirão condições para que os empresários ampliem a produção e o emprego, existe o estímulo para que N cresca para além do nível actual, mesmo em situação de concorrência pelos factores, até o ponto em que Z = D. O volume de ocupação está determinado pela intersecção de Z e D, quando Z(FN) = Df(N), correspondente ao ponto em que as expectativas de lucro do empresário são máximas: “ The value of D at the point of the aggregate demand func­tions, where it is intersect by the aggregate supply func­tion, will be called the effective demand”[3].

A procura efectiva em vez de ter um valor de equilíbrio único, tem uma escala infinita de valores todos igualmente admisíveis, pelo que o volume do emprego fica indeterminado, excepto no caso em que a desutilidade do trabalho marque um límite superior, não sempre um aumento de Z tem um aumento correspondente em D. A existência deste equilíbrio múltiple é uma novidade teórica que se depreende do carácter antecipado das decisões dos empresários.

Se a um aumento de Z correspondesse um aumento em D, os empresários levariam a produção e o emprego até o ponto em que Z se torna inelástica, quando um aumento na procura efectiva não é acompanhada com um crescimento da produção e o emprego não há  pleno emprego[4]. Não existe uma  lei de Say  que relacione a procura global com a oferta global, pelo que: “there is a vital­ly important chapter of economic theory which remains to be written and without which all discussions concerning the volume of aggregate employment are futile[5]”.

2.3.     o emprego, a economia monetária, e o entesouramento.

 

Dada a propensão ao consumo da comunidade, o nível de equilíbrio do emprego[6], depende exclusivamente da quantidade de investi­mento corrente, a qual pela sua vez depende do incentivo ao investimento, que depende da eficiência marginal do capital em relação ao complexo de taxas de juro dos empréstimos de vários prazos e riscos.

Sendo assim, dada a propensão ao consumo e a taxa de novo investimento, não existirá que um nível de emprego compatível com o equilíbrio, um outro equilíbrio producirá uma desigualdade entre o preço da oferta global da produção no seu conjunto e o preço da sua procura global. Este nível não pode ser maior que o nível de pleno emprego, o salário não pode ser inferior à desutilidade do trabalho; não existe razão para esperar que seja igual ao pleno emprego.

A procura efectiva de pleno emprego é um caso especial que se realiza apenas quando a propensão marginal ao consumo e o incentivo ao investimento se encon­tram numa relação mutua particular,  óptima, como pressupõem os clássicos: “ it can only exist when, by accident or design, current investment provides an amount of demand just equal to excess of the aggregate supply price of the output resulting from full employment over what the community will choose to spend on consumption when it is fully employed”[7].

O sistéma  económico pode encontrar-se num equilíbrio estável com o emprego inferior a pleno emprego, não significando necessariamente emprego total da força de trabalho[8]. Isto é, ao nivél dado pela intersecção da função de procura global e a função de oferta global, que não corresponde ao pleno emprego excepto no pressuposto, que defende a teoria neo-clássica, que existem forças capazes de fazer com que o investimento D2 cresca o suficiente de modo a que a poupança Z- D1 seja igual a zero.

Se a propensão ao consumo e a taxa de novo investimento se traduzem por uma insuficiência da procura efectiva, o volume de emprego reduzir-se-á,  permanecendo a um nível inferior à oferta de mão-de-obra potencial disponível ao salário real actual, e o salário real de equilíbrio será maior que a desutilidade marginal do nível de equilíbrio do emprego. Uma insuficiência de procura efectiva travará o processo de produção, conquanto o produto marginal da mão-de-obra exceda ainda em valor à desutilidade marginal  do emprego.

O facto de uma comunidade possuir uma riqueza considerável leva-la-á aumentar a poupança, debilitando a propensão ao consumo. Desse modo as oportunidades de novos investimentos tornam-se menores, a menos que a taxa de juro desça o suficientemente rápido a fim de amplificar o incentivo a investir.

A propensão ao consumo e a taxa de novo investimento determinam o volume de emprego, ao qual se encontra associado um nível determinado de salários reais, e não ao inverso, como supõe a teoria neo-clássica. Se o volume de emprego é determinado pela procura efectiva, então não é fixado pela desutilidade marginal, medida em salários reais, excepto no caso em que a oferta disponível de mão-de-obra para uma dada magnitude de salários reais indique um nivél máximo ao emprego[9].

Encarando deste modo os factos e reflectindo as consequências das conclusões  teóricas de Keynes, as causas do desemprego estão dependentes das flutuações na procura efectiva, a qual, por sua vez, varia conforme as modificações na propensão ao consumo, a eficiência marginal do capital, e a taxa de juro[10].

O facto de se não verificar a lei de Say obriga a um reflexão que seguirá duas direcções. Em primeiro lugar, implicará esclarecer como se utiliza o rendimento em consumo e poupança. Em segundo lugar, desafia encontrar uma explicação para o dispéndio do revenue para além do consumo e do investimento, o que acontece somente numa economia  monetária, onde o rendimento pode ser entesourado.

A ideia de entesouramento ocupa efectivamente um lugar central na reflexão de Keynes sobre as funções do dinheiro e a determinação da taxa de juro, problemas teóricos associa­dos ao comportamento de determinados agentes. A teoria de Keynes reflecte a tentativa de dar conta da mudança compor­tamental de um grupo social que, na época da concorrência pura e perfeita, assegurava- aceitando como convencional­mente ajustada a taxa de juro vigente- a acumulação necessária aos investimentos[11]. Numa economia monetária a moeda deve ter, por definição, o poder de ser detida na qualidade de reserva de riqueza, mas se é assim o rendimento pode ser entesourado e a procxura pode revelar-se insuficiente para igualar à oferta a um nível que permita a plena utilização das forças produtivas. Nesse caso poderia constituir um limite para o aumento da oferta permitiendo assim a existência do desemprego involuntário.

Para Keynes a procura efectiva é o ponto da curva de procura global que intersecta a curva de oferta global determinando o nível de emprego que os empresários desejam fornecer. A insuficiência de procura efectiva gera o desemprego, pelo que a construção do modelo de Keynes concentra-se em primeiro lugar nos factores que induzem as flutuações da procura agregada.


 

[1] Keynes assumindo que os empresários são agentes maximizadores, a diferência da teoria clássica, pressupõe que as decisões de investimento  em emprego, dependem das expectativas de receitas, i.e., não apenas dos preços de procura como das quantidades procuradas.

[2] O rendimento é considerado como o custo dos factores plus lucros. Não preci­samos debruçarmos com detalhe nas questões terminológicas porquanto nas ´Michaelmas Term Lectures` de 1934-35, Keynes as produziu detalhadamente. Este preço de oferta, esclarece Keynes, é diferente do preço de oferta de uma unidade de produto e exclui-se o custo de uso por motivos que esclarece no capítulo 6 da Teoria Geral. Ver J.M. Keynes , " The General Theory", CWJMK , vol. VII, p. 24, roda pé 2 e 3.

[3] J.M. Keynes , " The General Theory", CWJMK , vol. VII, p. 25.

[4] Com este conceito Keynes ataca novamente e em definitivo a lei de Say, porquanto se a lei querer dizer que F(N) e f(N) são iguais para todos            os valores de N, para qualquer valor de output e de emprego; a um crescimento de Z corresponde um aumento em N, de modo que D cresce conforme Z cresce, o que implica dizer que o preço da procura( o valor das vendas) se ajusta por si própria ao preço de oferta( o valor das recei­tas das vendas), de modo que para qualquer valor de N, o valor de D adquere um valor igual ao Z correspondente a N.

[5] Idem, p. 26.

[6] O nível ao qual os empresários não têm incentivo nem para ampliar ou restringir o emprego.

[7] Idem, p. 28.

[8] Keynes reforça a ideia de que a estabilidade dos salários é sem dúvida uma contribuição para o equilíbrio, na medida em que a função de consumo se assume como estável O resumo desta teoria, abrevia Keynes em oito pontos:

1. Para a técnica, os recursos e os custos dados, o rendimento, monetário o real, depende do volume da ocupação( hipotése de curto prazo).

2. Designamos por D1 a relação entre o rendimento da comunidade e o que se pode esperar que se gaste em consumo, que dependerá das características socio-psicológicas da população (propensão ao consumo). Quer dizer C= F(Y)=> Y= F(N).

 3. N, volume de trabalho, depende de D, que é a soma de D1 e D2; onde D1 já foi definido e D2 é a soma dedicada a novos inves­timentos. D = D1+ D2 é a procura efectiva.

 4.   D1+ D2 = D = Y(N), onde Y é a oferta global e como D1 é função de N, escrevemos D1= (N) pelo que da diferenca entre Y - obtemos D2, um resultado bastante útil.

 5.   Em equilíbrio, o volume de emprego depende a) da função de oferta  Y, b) da propensão ao consumo e c) do volume do investimento D2.

 6.  Para cada valor de N existe uma correspondente produtividade marginal  do trabalho nas indústrias de bens de consumo,  que determina o salário real. Deste modo, a verificação do ponto 5) fica sujeito à condição de que N não pode exceder daquele valor que reduz o salário real até o igualar á desutilidade marginal da mão-de-obra. Modifica-se assim a hipotése de que os salários nominais são constantes, pois torna-se incompatível quando existem modificações em D.

7.  Na teoria clássica, de acordo com a qual D = Y(N) para todos os valores de N, o volume de emprego está em equilíbrio indiferente (Keynes utiliza o termo " neutral equilibrium") sempre que N seja menor que o máximo, que será o caso em que a concorrência dos empresários o elevará ao máximo, atingin­do-se assim um equilíbrio estável.

8.  Se o emprego aumenta, D1 também o fará, mas em menor gráu; se o rendimento sobe, o consumo elevar-se-á mas em menor gráu. A chave da teoria encontra-se nessa lei psicológica, porque a partir dela se induz que quanto maior o emprego, maior será a diferença entre o preço de oferta global (Z) da produção que lhe corresponde e a sua procura (D1) que os empresários esperam recuperar com os gastos dos consumi­dores. Portanto, se a propensão ao consumo não mudar, o emprego não pode aumentar, a menos que D2 aumente de  modo a colmatar a diferença entre Z e D1.

[9] Keynes não rejeita completamente a hipótese de que a desutilidade marginal contribua para a  determinação do volume de emprego, só o reduz a um caso particular.

[10] Convém reter o facto de que Keynes nega qualquer determinação a priori do equilíbrio, a sua redução a catego­ria metafísica pressuposta na aceitação da equação de Pigou x + y = Q. O seu raciocínio visa procurar demonstrar o carácter particular da hipotése neo-clássica de que os  empresários  investirão até ao ponto em que o salário seja igual à produtividade marginal do trabalho, a fim que o gap entre rendimento e consumo, com a hipótese conjugada de rendimentos constantes ou decrescentes, seja compensada suficientemente pelo investimento. Veja-se o apéndice ao capítulo 19 da Teoria Geral.

[11] Se alguém deveria ser responsabi­lizado pela situação de desemprego e subemprego dos recursos humanos, são aqueles cujas conductas deveriam assegurar a acumulação necessária aos investimentos, cumprindo a promessa implícita nas convenções do século XIX.De resto, o próprio Keynes observou que durante o  século XIX, o desenvolvimento da população e das invenções, a cultura de novas terras, o estado  de confiança e as guerras entre as nações teriam sido suficientes, se consideradas conjuntamente com a propensão ao consumo, para permitir uma curva de eficiência marginal do capital de modo a permitir um nível de emprego suficiente compatível com uma taxa  de juro bastante alta, a fim de resultar psicologicamente aceitável aos detentores da riqueza.