Revista académica de economía
con
el Número Internacional Normalizado de
Publicaciones Seriadas ISSN
1696-8352
Benilson Borinelli (CV)
benilson@uel.br
Dayanne Marciane Gonçalves (CV)
dayannemarciane@gmail.com
Ivan de Souza Dutra (CV)
idutra@usp.br
Luis Miguel Luzio dos Santos (CV)
idutra@usp.br
Thayla Emanuelle da Silva Ferreira (CV)
thayla_emanuelle@hotmail.com
Universidade Estadual de Londrina
RESUMO
A incubagem de empreendimentos pode ser entendida como um processo com temporalidade definida, de caráter formativo e recíproco entre a organização incubadora, e grupos e/ou cooperativas incubadas, que ao seu final visa às suas autonomias. Neste artigo, analisam-se os avanços e os limites da política pública de Economia Solidária, dando especial atenção ao processo de incubagem de empreendimentos do Programa Municipal de Economia Solidária de Londrina (PMES-LDA), no Paraná, Brasil. A metodologia do trabalho está classificada como estudo de caso, sendo que os dados foram coletados em documentos oficiais, periódicos, observação direta e entrevistas com representantes de empreendimentos incubados, bem como integrantes da equipe desse programa. Constatou-se que o programa está caracterizado com o processo de incubagem, apesar de não seguir os moldes de incubadoras tradicionais de cooperativas. Além disso, atendeu número grande de empreendimentos. No entanto, ainda necessita de melhor normalização, bem como divulgação e reconhecimento do processo de incubagem, e também de quadro qualificado para assessoria econômica e de gestão, de parcerias mais consistentes, o que tem resultado num baixo grau de formalização e de sustentabilidade econômica dos empreendimentos. Apesar dos avanços institucionais evidenciados, aponta-se o não equacionamento do dilema entre o assistencialismo improdutivo e a emancipação dos empreendimentos, o que poderá comprometer a avaliação não só da efetividade da política pública de Economia Solidária, mas o potencial utópico e alternativo que ela representa.
Palavras-Chave: Economia Solidária, Programa Municipal de Economia Solidária, Incubagem de Empreendimentos
ABSTRACT
The enterprise incubation can be understood as a process with defined time of formative and reciprocal character among the incubator organization, and groups and-or cooperatives that incubated, that ultimately serves the purpose to its autonomies. In this article, the progresses and the limits of the public policies of Solidarity Economy are analyzed, giving special attention to the incubation process of enterprises of the Municipal Program of Solidarity Economy of Londrina (PMES-LDA), state of Paraná, in Brazil. Using the case study methodology, the data were collected in official documents, newspapers, direct observation and interviews with representatives of incubated enterprises, as well as of the team of that program. It was verified that the program is characterized with the incubation process, in spite of not following the molds of traditional incubators of cooperatives. Besides, it assisted big number of enterprises. However, it still needs better normalization as well as exposure and recognition of the incubation process, qualified persons for the management and economic consulting, more reliable partnerships, because it has result in a low economical sustainability of the enterprises. In another perspective it is observed that in spite of the evidenced institutional progresses, the not resolution of the dilemma is pointed between the unproductive assistance and the emancipation of the enterprises, what can weaken the effectiveness of the public politics of Solidary Economy, as well as its utopian and alternative potential.
KEY WORDS: Solidarity Economy, Municipal Program Solidarity Economy, Enterprises Incubator.
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Borinelli, Marciane Gonçalves, de Souza Dutra , Luzio dos Santos y da Silva Ferreira : "Avanços e limites da política pública de economia solidária: um estudo do processo de incubagem de empreendimentos do programa municipal de economia solidária de Londrina – Paraná", en Observatorio de la Economía Latinoamericana, Número 167, 2012. Texto completo en http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/
1. Introdução
As transformações do sistema capitalista, nas últimas décadas, caracterizaram-se por grandes mudanças tecnológicas, a financeirização da economia, a concentração de riqueza, todos contribuindo fortemente para o desemprego estrutural de um grande contingente de trabalhadores. Diante da dificuldade em conseguir espaço no mercado de trabalho convencional, desempregados ou subempregados criaram, desde os 1980, alternativas autônomas de geração de trabalho e renda, dando origem a práticas variadas dentro do universo da Economia Solidária.
As iniciativas de Economia Solidária desdobram-se em organizações de produção comunitária, comércio solidário, financiamento solidário, clubes de troca ou sistemas locais de emprego e comércio, economia de comunhão, consumo crítico, entre muitas outras modalidades econômicas adotadas por pessoas que, por algum motivo, encontram-se fora do mercado de trabalho tradicional. Essas iniciativas surgem da mobilização dos próprios trabalhadores desempregados ou subempregados que, muitas vezes, são organizados através da iniciativa de organizações não-governamentais, igrejas, governos e grupos de solidariedade internacional, além de incubadoras que se propõem a fomentar e apoiar estas iniciativas.
Uma consequência desse processo foi a institucionalização de políticas públicas de Economia Solidária (PPES) no Brasil, com o objetivo de oferecer subsídio e fomento às propostas de Economia Solidária. O marco do processo foi a criação, em 2003, da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), a qual teve como atribuições desenvolver ações efetivas de promoção e difusão das iniciativas de Economia Solidária, apoiando diferentes iniciativas dos governos estaduais e municipais em todo o Brasil. A partir disso, verificou-se no país o surgimento de inúmeras iniciativas de governos municipais e estaduais no sentido de criar espaços de incentivo e apoio a empreendimentos locais de Economia Solidária .
Entre as iniciativas municipais, destaca-se a cidade de Londrina, no Estado do Paraná, que criou, em 2005, o Programa Municipal de Economia Solidária (PMES), com a finalidade de atender grupos de geração de trabalho e renda nas áreas de artesanato, alimentação, material de limpeza e reciclagem de lixo. Considerando que o processo de incubagem de empreendimentos é um dos mais importantes instrumentos de promoção da Economia Solidária e da PPES, o presente estudo analisa os avanços e os limites desse processo no PMES de Londrina. Com isso, lançando mão de uma pesquisa de estudo de caso, o artigo pretende contribuir para melhor compreensão da recente experiência da PPES no Brasil, fomentando novos estudos e práticas no campo e a reflexão crítica sobre as possibilidades e os limites do papel do Estado na promoção da Economia Solidária.
Num primeiro momento, apresenta-se a Economia Solidária como Política Pública, com base em sua origem e desenvolvimento no Brasil, apontando os avanços e limites dessa política. Em seguida, analisa-se criticamente o PMES de Londrina, descrevendo sua origem, funcionamento e seus avanços e desafios, com ênfase nos desafios do modelo de incubagem de empreendimentos de Economia Solidária adotado.
2. Economia Solidária como Política Pública
As contradições e iniquidades da sociedade atual baseiam-se na manutenção de um número expressivo da população apartado do mercado de consumo e das garantias mínimas de dignidade e bem-estar. Assim, a Economia Solidária surge como um movimento em torno da mobilização popular pela busca de justiça social e econômica. Alternativamente, essa nova economia procura desenvolver e apoiar iniciativas autônomas num formato cooperativo e autogestionário, visando ao desenvolvimento sustentável e à inclusão social como bem maior. (SACHS, 2009).
A empresa solidária é a base da Economia Solidária seja ela cooperativa de produção, cooperativa de comercialização, cooperativa de consumo ou cooperativa de crédito. O que a impulsiona é a possibilidade de, conjuntamente às pessoas, conseguir driblar as condições adversas do mercado competitivo, pautada em um sistema de ganhos em escala que permitam reduzir substancialmente os custos, através de exploração de nichos de mercado, ou ainda como fornecedoras do poder público entre outras modalidades de viabilização (SINGER 2002).
O conceito e os objetivos que balizam a Economia Solidária encontram-se intimamente imbricados com os ideais de emancipação, os quais, por sua vez, se apóiam na busca por atingir-se a maioridade de consciência, com autonomia de conhecimento e de percepção da realidade independentemente de imposições ou influências externas apresentadas como naturais. Cattani (2003, p.130) define emancipação como “o processo ideológico e histórico de libertação de comunidades políticas ou grupos sociais, da dependência, da tutela e da dominação nas esferas econômicas, sociais e culturais.”. Esse conceito apresenta múltiplos contornos e é potencializado quando é analisado num contexto mais amplo da vida social, entendendo-se uma sociedade como emancipada quando “a lei maior é o bem comum, objetivo e universalizante [...] é o inverso do pensamento elitista que afirma continuamente a incapacidade congênita do povo de ter iniciativas autônomas e de manifestar e defender seus próprios interesses” (CATTANI, 2003 p.130).
Diferentes autores, tais como Sousa Santos (2002), Singer (2002) e Cattani (2003), vêm fazendo um esforço no sentido de estudar o fenômeno da Economia Solidária como potencial mecanismo de emancipação social. Estes modelos organizacionais ousam ao abandonarem a lógica tradicional, apoiada na subserviência, na hierarquia vertical e no despotismo econômico, substituindo-a por uma estrutura organizacional sustentável, amparada em bases democráticas participativas e na solidariedade como elemento essencial para a construção de uma nova sociabilidade.
De acordo com Schwengber (2005, p. 5), no Brasil, a Economia Solidária e as políticas públicas de fomento a esse setor: “não são um universo separado do restante da sociedade brasileira, da sua cultura política, do seu contexto socioeconômico, das suas conquistas e das suas contradições, da sua institucionalidade”. São as experiências e a trama conceitual que se formam em torno da Economia Solidária, que permeiam os princípios organizadores das intenções e objetivos dos gestores públicos, as quais viram referência social que pautam a conjuntura na maneira de formular questões com certa regularidade, bem como a maneira de formulá-las, expandindo-se, e ganhando espaço institucional. Assim, as experiências “vão ganhando visibilidade como iniciativa social e que atravessam espaços institucionais, constituindo objeto da análise e densidade como fenômeno associado às políticas públicas de Economia Solidária” (ARAÚJO; SILVA, 2005, p. 31).
Representando um projeto democrático, a Economia Solidária deve ser vista como uma instituição insurgente (WILLIANS, 1979) e, portanto, em oposição à lógica geral do Estado brasileiro e de suas políticas públicas que, a rigor, encontram-se comprometidas com o modelo econômico de mercado (OFFE, 1986) e com a reprodução de racionalidades privatizantes (SHWENGBER, 2005). Assim, a consolidação da Economia Solidária como movimento e política pública encontra-se em um campo de disputas e de oposição constantes, processo que se expressa nas concepções de política pública de Economia Solidária (PPES) existentes no país.
Para Shwengber (2005), com base em pesquisas de campo no Nordeste e Sudeste do país, diante da dificuldade de inclusão de uma lógica diferenciada na sociedade brasileira, há duas concepções de PPES. A primeira seria a utilitarista, a qual insiste na importância da qualificação profissional, sendo próxima a uma concepção de empreendedorismo e, ainda, muito focada na dinâmica de mercado, buscando a acomodação dessa economia informal nos marcos institucionais regulatórios da economia de mercado. A segunda concepção, chamada pelas autoras de solidarista (ou comunitarista), amplia essa primeira, pretendendo responder a estratégias territoriais de desenvolvimento em torno do fomento de outra dinâmica econômica (princípios de valores da Economia Solidária), baseada na construção e fortalecimento de cadeias sócio-produtivas locais, integradas ao tecido de relações social, político e cultural do lugar, interligando as esferas do Estado, sociedade civil e os mercados por meio da autonomia, afastando-se do cunho compensatório.
Numa perspectiva semelhante, França (2006) diferencia duas políticas de geração de trabalho e renda, que podem ser vistas como complementares. A primeira concepção, insercional-competitiva, é aquela que insiste na importância da qualificação profissional, mas não a considera como suficiente em si mesma. Estas são pensadas e elaboradas em função de acompanhamento das tendências de mercado e para seguir a demanda real de qualificação, visam também à organização dos trabalhadores que se encontram na informalidade. A segunda concepção, sustentável-solidária, por sua vez, trabalha para a construção de estratégias territoriais de desenvolvimento em outra dinâmica econômica, ou seja, a construção de circuitos sócio-produtivos locais integrados ao tecido das relações sociais, políticas e culturais do lugar onde o grupo está inserido.
Outra contribuição importante para avaliar a concepção de PPES, é dada por Pochmann (2004) com o termo assistencialismo improdutivo. Para o autor, esse seria o caso, quando se verificam medidas instrumentais à Economia Solidária como compensatórias e incapazes de oferecer alternativas ocupacionais diante da crise do desenvolvimento capitalista no Brasil. Isso demonstra a insuficiência da política governamental em “oferecer saídas emancipatórias às angústias do conjunto dos excluídos”. (POCHMANN, 2004, p.30). Nesse caso, o papel do Estado acaba se confundindo com o ciclo político eleitoral, atuando de forma compensatória e incompleta, sem apontar para a geração de saídas emancipatórias.
Essas concepções demonstram que a PPES está sujeita a várias interpretações e projetos estratégicos, segundo os atores e a correlação de forças que determinam a sua criação e implementação no âmbito do Estado.
Desde os anos 1980, considerando a grave problemática do desemprego no Brasil e as contradições socioeconômicas nas últimas décadas, o poder público vem sofrendo pressões para tornar-se agente mais proativo e efetivo no enfrentamento das questões sociais. Além disso, a lógica de mercado tradicional vem dando sinais de incapacidade para equalizar avanços econômicos com benefícios sociais generalizados, o que cria um espaço propício à experimentação e à busca de novos modelos organizacionais que se pretendem inclusivos e sustentáveis econômico, social e ambientalmente.
Entre os principais objetivos da PPES pode-se destacar: a erradicação da pobreza, a melhoria nas condições de trabalho e o fortalecimento da participação social e política dos trabalhadores da Economia Solidária. Para alcançar estes objetivos foram criados instrumentos como: a formação dos trabalhadores; a incubagem dos empreendimentos; o fomento das atividades desenvolvidas e a luta por um marco legal e regulatório para a Economia Solidária .
2.1 Avanços e Limites da PPES
A Política Pública de Economia Solidária é recente, razão pela qual ainda está em construção e em processo de implantação no país. Para se identificar os seus principais avanços e limites, é apresentado, a seguir, um referencial formado a partir da consulta a livros, relatórios institucionais e trabalhos acadêmicos.
Uma das mais importantes referências sobre os avanços e limites da PPES no Brasil é o Relatório Final de Avaliação das Políticas Públicas de Economia Solidária, realizado em 2005 pelo SENAES, em parceria com pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); Universidade de Brasília (UnB); Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Rede de Gestores. O objetivo principal deste estudo era conhecer profundamente as ações em Economia Solidária no Brasil, bem como avaliar a construção desta nova política nos municípios brasileiros.
O Relatório (2005) destaca quatro avanços, seguidos de quatro desafios das PPES no Brasil: i) a sensibilização dos atores políticos; ii) a organização da sociedade civil; iii) a criação das Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares e; iv) as articulações intra-governamentais. Como desafios destacam-se: i) a partidarização das ações da Economia Solidária; ii) a redemocratização das relações entre Estado e sociedade; iii) o tempo para desincubagem e; iv) a fragilidade das parcerias.
Segundo o Relatório (2005), a sensibilização do dirigente municipal ao tema possibilitou o empreendimento de ações em Economia Solidária. No entanto, atrelado a esta sensibilização encontra-se o desafio da despolitização das ações da Economia Solidária. Desta forma, as ações foram realizadas de “cima para baixo”, o que fez com que os movimentos sociais participassem pouco desta implantação.
A adoção destas ações por parte dos dirigentes é fundamental na promoção e desenvolvimento das iniciativas de Economia Solidária, por outro lado esta articulação pode gerar dependência da opção/partidarização política dos dirigentes, podendo sofrer ruptura quando ocorrer a troca de governo. Para que isso não ocorra, é necessário que a sociedade civil apodere-se destas conquistas e passe a pressionar o Governo para garantir a permanência dos programas públicos de apoio à Economia Solidária.
Passos importantes estão sendo dados em todos os municípios pesquisados para que a articulação entre sociedade civil e Estado aconteçam de forma a se evitar uma verticalização excessiva das políticas. Um exemplo disso é a constituição de Centros Públicos e a presença de gestores públicos oriundos do próprio campo da economia popular e solidária. Um problema verificado é a dificuldade em encontrar grupos organizados, mobilizados e politizados, o que faz com que, via de regra, haja uma indução externa em relação à organização dos grupos sociais como primeiro passo para o seu desenvolvimento (RELATÓRIO, 2005).
O Relatório (2005) salienta a importância das parcerias estabelecidas entre Programas de Economia Solidária com Instituições e organizações da Sociedade Civil, uma vez que foi por meio da proximidade com Universidades que surgiram as Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCP). Essas parcerias são a principal alavanca de apoio na disseminação da Economia Solidária e do conhecimento sobre autogestão para dentro e fora das Universidades, além de estimular o desenvolvimento de outras tecnologias específicas e estratégias apropriadas aos empreendimentos populares. Entretanto, este acompanhamento tornou-se um desafio para as PPES (Políticas Públicas de Economia Solidária); primeiro porque esta não sabe ao certo o momento adequado para a desincubagem dos empreendimentos e segundo por não saber como transferir toda a tecnologia desenvolvida em parceria com os alunos e professores para o empreendimento sem comprometer a vida do mesmo. Em geral, as Incubadoras de Tecnologia de Cooperativas Populares (ITCPs) ainda não sabem o momento adequado para desincubar os empreendimentos, criando uma relação de co-dependência entre as incubadoras e os empreendimentos.
O outro desafio está ligado à parceria que se estabelece com as Universidades, em sua maior parte, através de projetos de extensão, que contam com recursos humanos e contratos temporários. O fato é que os professores, alunos e outros profissionais envolvidos nestas parcerias não compartilham da mesma realidade do empreendimento, o que compromete a continuidade das ações. Outra grande dificuldade está em retirar destes parceiros a imagem que os trabalhadores projetam de que eles são detentores de saberes técnicos e políticos superiores, o que gera dependência e subserviência que pode imobilizar a autonomia e emancipação dos grupos de Economia Solidária (RELATÓRIO, 2005).
França (2006) identifica como avanço das PPES a espontaneidade dos empreendimentos e é graças a esta criatividade encontrada nos empreendimentos, juntamente com a mobilização popular em torno dos projetos, que até hoje vários núcleos de trabalho perduram, apesar de todas as adversidades. Contrapondo esta característica positiva das PPES, o autor destaca a existência de baixa institucionalização da temática na estrutura pública brasileira. Ou seja, para ser Economia Solidária é preciso a união de todas as esferas do setor público, para que sejam alcançados não só os objetivos econômicos, mas também os sociais, educacionais, etc.
Nishimura (2005), ao descrever o processo da implantação no PMES no município de Londrina, identifica como principal avanço das PPES o crescente interesse do Estado em propor a Economia Solidária como alternativa de enfrentamento aos altos índices de desemprego encontrados no país. Entretanto, este avanço traz consigo uma dificuldade, que é a baixa adesão do Poder Público na esfera estatal à Economia Solidária como Política Pública, criando um descompasso entre os esforços federais, estaduais e municipais, reduzindo a efetivação das políticas. Outros dois limites, de acordo com a autora, são a ausência de profissionais familiarizados com o tema para a formação da equipe técnica responsável pelo acompanhamento dos empreendimentos e a falta de estratégias para a difusão do conceito e das práticas da Economia Solidária, tanto para os próprios empreendimentos quanto para toda a sociedade.
Cruz (2007), ao estudar as potencialidades e desafios dos empreendimentos solidários em Londrina, salienta que o principal limite dos empreendimentos da Economia Solidária é a ausência de estratégias de inserção no mercado que garantam a informação, conscientização e promoção das práticas desta economia, bem como de seus produtos/serviços. Logo, o desconhecimento por parte da população em geral, das particularidades nas quais se fundamenta a Economia Solidária, com seus valores e princípios, reduz a potencialidade de alcance dos produtos e serviços provenientes dos empreendimentos de Londrina.
Prochet (2009) identifica ainda como limite à PPES a falta de formalização dos grupos de geração de trabalho e renda, o que reduz enormemente a capacidade de se integrarem ao mercado de consumo formal e, por consequência, de avançarem para patamares mais elevados de desenvolvimento. A autora alerta, também, para o fato de que propor políticas públicas favoráveis à ampliação dos empreendimentos da Economia Solidária não basta, é necessária a elaboração de estratégias de enfrentamento das relações de trabalho e o fortalecimento da capacitação de gestão de cada trabalhador.
Por fim, é importante registrar que grande parte dos desafios impostos a PPES encontra-se enraizado na natureza dos empreendimentos de Economia Solidária. Em geral, esses empreendimentos devem desenvolver-se competindo em um terreno capitalista adverso e em condições muito inferiores de operação. O que Gaiger (2007) chama de debilidade estrutural dos empreendimentos de Economia Solidária caracteriza-se nas precárias condições de vida, na baixa formação escolar e profissional, nas dificuldades de capitalização dos empreendimentos, na baixa capacidade de gestão, na dificuldade de comercialização e de garantia de direitos trabalhistas básicos aos seus membros. As debilidades estruturaisafetam o reconhecimento dos empreendimentos pelo mercado, reduzindo, assim, sua capacidade de gerar excedentes que garantam autonomia econômica, retribuições aos trabalhadores, coesão e qualificação do quadro de sócios. (GAIGER, 2007) A PPES surgiu em decorrência e deve lidar com esse quadro de problemas, da resposta ao qual dependerá a vitalidade e legitimidade não só dessa política, mas do próprio projeto da Economia Solidária.
Do exposto acima, optou-se em usar como categorias centrais de análise da incubagem de empreendimentos de Economia Solidária realizada pelo PMES de Londrina: o processo de incubagem; as parcerias; a capacidade do quadro técnico; e grau de formalização e dependências dos empreendimentos.
3. Metodologia
O processo de incubagem é percebido neste trabalho como um fenômeno social, político e técnico complexo e sujeito a diversas interpretações e intervenções dos atores mais diretamente envolvidos. Assim, a abordagem qualitativa se apresenta como a mais indicada para a sua investigação, especificamente uma análise exploratório-descritiva com a adoção do procedimento de estudo de caso.
O estudo de caso, segundo Merrian (1998), pode ser uma descrição bem delimitada de um fenômeno, instituição, programa, grupo de pessoa ou pessoa, porém trabalhado de modo holístico e intensivo. Nesse aspecto, a autora destaca que o(s) pesquisador(es) tem (têm) mais preocupação em compreender os processos sociais num contexto, do que as inter-relações das variáveis. Dessa maneira, o estudo de caso justifica-se como a melhor escolha para o objetivo desta pesquisa, uma vez que busca explorar processos e comportamentos no entorno da Economia Solidária como política pública municipal brasileira, algo que tem pouca compreensão.
Os dados foram coletados entre Julho e Novembro de 2009, em documentos oficiais (estatuto e relatórios do CEPS), observação direta e entrevistas semi-estruturadas com os envolvidos no processo de incubagem do Programa Municipal de Economia Solidária. Para avaliar o processo de incubagem do referido Programa, foram entrevistados a Coordenadora do PMES de Londrina e a Gerente de Inclusão Produtiva do Município do Programa; um professor da Universidade Estadual de Londrina e integrante do PROSOL – Projeto de Apoio à Rede de Comercialização de Produtos da Socioeconomia – projeto que presta assessoria ao Programa Municipal; um Assessor Técnico do Estado do Paraná, da UNISOLBRASIL - Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários; e três representantes de empreendimentos econômicos assessorados pelo Programa Municipal de Economia Solidária, denominados de grupos A, B e C. Nas entrevistas, procurou-se explorar as categorias expostas na literatura específica, destacadamente: o processo de incubagem; as parcerias; a capacidade do quadro técnico; e grau de formalização e dependências dos empreendimentos.
Na análise dos dados, utizou-se a técnica de análise de conteúdo, quando se procurou confrontar os dados das entrevistas, da observação direta e dos documentos com contribuições da literatura para identificar os limites e os avanços do processo de incubagem, bem como discutir a concepção de PPES predominante no PMES de Londrina.
4. O Programa Municipal de Economia Solidária de Londrina
Desde 2002, com o I Encontro de Economia Solidária em Londrina, discutia-se a participação do poder público municipal no apoio a esse novo campo de ação. A origem da política pública de Economia Solidária em Londrina deu-se nos trabalhos e articulações com o Programa Federal Fome Zero, que possuía quatro eixos de atuação: 1) Ações de Combate à Fome; 2) Abastecimento Alimentar; 3) Renda Mínima; e 4) Geração de Renda e Capacitação Profissional. Contudo, medidas mais efetivas da Política Pública de Economia Solidária em Londrina surgiram em 2005 com a criação do Programa Municipal de Economia Solidária e o Centro Público de Economia Solidária, na gestão do petista Nedson Micheletti.
Em Londrina, desde o seu início, a política pública municipal de Economia Solidária foi concebida, modelada segundo a perspectiva da política de assistência social, ficando o PMES vinculado à estrutura
administrativa da Secretaria Municipal de Assistência Social.
Londrina foi um dos primeiros municípios a articular e implantar a Política Pública de Economia Solidária e a montar um Centro Público de Economia Solidária (CPES), financiado pela SENAES, o qual é referência para todo o país. Este espaço destina-se à informação, capacitação e atendimento aos empreendimentos, além de servir de ponto de comercialização dos produtos desenvolvidos pelos grupos incubados. Além do Centro Público, a comercialização dos produtos desenvolvidos pelos grupos incubados também são ofertados nas feiras de Economia Solidária e Geração de Renda – FEISOL, e outras feiras descentralizadas promovidas pelo PMES (NISHIMURA, 2005).
Os 42 grupos incubados pelo Programa atuam nas áreas de alimentação, artesanato, reciclados (papel, tecido), confecção e prestação de serviços. Reúnem beneficiados pela assistência social, indígenas, contemplados pelo programa bolsa família, desempregados, agricultores familiares (público-alvo da assistência social etc). Em agosto de 2008, foi aprovada pela Câmara Municipal de Londrina a Lei Municipal número 10.523, que reconhece e legaliza o Programa Municipal de Economia Solidária. Em seus capítulos são abordados os objetivos do programa; a estrutura organizacional; os projetos; os princípios, os objetivos, os beneficiários, os recursos e o crédito das PPES municipal; refere-se, ainda, ao Centro Público de Economia Solidária e à participação e controle social.
4.1 O Processo de Incubagem do PMES de Londrina
O PMES não é intitulado como incubadora, embora apresente características de uma, já que organiza e capacita grupos de geração de trabalho e renda pautados nos princípios da Economia Solidária e Cooperativismo, contando com uma equipe técnica para assessorar os empreendimentos, como ocorre nas incubadoras convencionais.
Para Kruppa e Sanchez (2002, p.11):
A incubagem é entendida como um processo com temporalidade definida, de caráter permanente, realizado mediante o estabelecimento de compromissos recíprocos entre Incubadora e grupos/cooperativas incubadas, visando à autonomia destes no final do processo. Tendo como ponto de partida a realidade e as demandas dos grupos apoiados, com forte caráter formativo.
Todo o processo de incubagem é composto por diferentes e progressivas etapas. Sendo que estas têm um prazo determinado para o fim da assessoria. Vale ressaltar que o estabelecimento de um prazo determinado para o fim da incubagem não visa ao seu rápido encerramento, mas sim à autonomia dos grupos incubados, ou seja, busca desenvolver e formalizar as organizações assessoradas de forma que elas possam caminhar por si mesmas de forma independente.
A SENAES não determina um modelo de incubagem, já que existem diferentes modelos, como os promovidos por organizações do terceiro setor, por universidades, ou pelo próprio poder público. No caso especifico de Londrina, foram inicialmente pesquisados modelos de incubagem de três incubadoras de universidades: Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE; Universidade Federal de Alagoas – UFAL; e Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. E também de uma iniciativa do poder público, o PRODIOTES - Programa de Desenvolvimento de Incubadoras Públicas Tecnológicas de Empreendimentos Econômicos Solidários.
Dentre essas incubadoras, a que descreve com maior clareza todas suas etapas, inclusive define o prazo para a desincubagem dos empreendimentos, é a incubadora da UFRJ. A sua metodologia de incubagem compreende quatro etapas: 1) Organização do grupo; 2) Cursos de treinamento/qualificação profissional; 3) Legalização da cooperativa e; 4) Acompanhamento do grupo. A Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP) da UFRJ é a única que incluiu, em sua metodologia, a questão da educação formal, pois a maior parte dos trabalhadores que entra na incubadora possui baixa escolaridade, o que tende a dificultar o desenvolvimento das atividades e, principalmente, a autonomia destes empreendimentos. O tempo para a desincubagem dos empreendimentos incubados pela UFRJ é de três anos e meio.
Segundo a Coordenadora do PMES de Londrina (Entrevista, 10/11/2009), o Programa difere de uma incubadora tradicional, uma vez que esta tem apenas o objetivo de incubar empreendimentos, enquanto o Programa possui outros objetivos que vão além da simples incubagem. O Programa realiza oficinas de sensibilização em Economia Solidária e destas oficinas surgem os grupos, diferentemente das incubadoras tradicionais, nas quais, em geral, os grupos já chegam formados.
O PMES não realiza um processo de seleção, assim como as incubadoras. De acordo com a Coordenadora, todos os trabalhadores e trabalhadoras de uma determinada região da cidade são convidados a participar das oficinas de sensibilização. Essas oficinas são realizadas pelos Centros de Referência de Assistência Social - CRAS, sendo que a adesão é livre e voluntária. Assim, a seleção ocorre a partir do interesse e da vontade de cada um em aderir ao Programa.
Quanto ao critério utilizado para incubarem os empreendimentos, o Programa segue os critérios estabelecidos pela Lei Municipal de Economia Solidária, que define como público-alvo todas as pessoas que recebam benefícios ou estejam incluídos em algum serviço da política pública de assistência social. Sendo assim, são alvos do programa trabalhadores desempregados e/ou indígenas; beneficiários dos serviços de saúde mental e trabalhadores da agricultura familiar (LEI MUNICIPAL 10.523/2008, art. 8).
Ao avaliar a primeira etapa do processo de incubagem, a coordenadora do PMES de Londrina identifica como limites o desconhecimento, em geral, do que vem a ser Economia Solidária e a necessidade de se trabalhar este conceito e seus princípios fundamentais, uma vez que estes norteiam as atividades. (Entrevista, 10/11/2009) Com relação ao tempo despendido nesta etapa, ela acredita que depende da capacidade de cada empreendimento em se apropriar do que aprendeu durante as oficinas de formação, ressaltando que o aprendizado é diário e vivenciado na prática.
A segunda etapa do processo de incubagem é caracterizada pela viabilidade econômica e contém as seguintes tarefas: define-se a atividade produtiva que será desenvolvida; apresentam-se ferramentas administrativas e de gestão; são realizadas as melhorias necessárias nos produtos; são definidas as políticas e estratégias de comercialização; é elaborado o plano de negócios e calculada a renda justa para cada trabalhador. A escolha da atividade que será desempenhada pelo grupo é feita de acordo com as experiências, conhecimentos e habilidades de cada trabalhador. Além disso, realizam uma pesquisa de mercado na localidade em que estão se inserindo, procurando identificar uma demanda e analisando a capacidade de comercialização naquela região. Quanto à adoção das ferramentas administrativas, a entrevistada acredita que estes conhecimentos são incentivados desde o inicio da atividade, mas há dificuldade em compreender a importância de tantos controles formais, o que faz com que esta atividade possa demandar um tempo considerável para ser apropriada pelos grupos. (Coordenadora do Programa, entrevista, 10/11/2009)
A terceira e última etapa do processo de incubagem é a desincubagem. Ou seja, o momento em que se verifica que o grupo apoderou-se dos conhecimentos necessários para se desenvolver autonomamente, de forma democrática. Nesse sentido, o PMES havia estabelecido um prazo de 2 (dois) anos para que o grupo tivesse concluído todas as etapas descritas anteriormente e pudesse desincubar-se. Porém, a coordenadora acredita que o estabelecimento de prazos rígidos pode fazer com que se desincubem dos grupos ainda frágeis, perdendo todo o trabalho referente ao processo de desenvolvimento conquistado até esse momento. (Entrevista, 10/11/2009). Esta posição assemelha-se ao da incubadora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), que também relativiza os prazos de desincubagem de acordo com a apropriação do conhecimento.
Vale ressaltar que a classificação da Política Pública depende da forma como o responsável a vê e a executa. Um olhar referente apenas à inclusão social, definida como utilitarista (SHWENGBER, 2005), não garante a sustentabilidade dos empreendimentos por não considerar a escassez do recurso público e o mercado. Enquanto a visão ideal é a solidariedade, que percebe o mercado e o Estado apenas como subsidiários de suas dinâmicas (ARAÚJO; SILVA, 2005).
4.2 PMES de Londrina: Avanços e Limites
Os integrantes do grupo B identificaram como avanço a criação do Centro Público de Economia Solidária, referência na área, e o surgimento de novos empreendimentos. Também destacam o Centro Público de Economia Solidária como um avanço, assim como já haver uma Legislação Municipal específica.
Quanto aos avanços do processo de incubagem desenvolvido pelo PMES de Londrina, grande parte dos entrevistados citou a formalização dos empreendimentos, através da criação da Coopersol, como uma das principais conquistas. Os grupos A, B e C, juntamente com mais seis grupos, participam da cooperativa. Trata-se da primeira cooperativa de empreendimentos solidários formalizada pelo Programa e também é a primeira do município. No entanto, algumas dúvidas despontam como a capacidade de autonomia da Coopersol, a dificuldade em desenvolver-se em três segmentos distintos de atuação, artesanato, confecção e alimentação e, ainda, a capacidade de integrar mais grupos ao longo do tempo, gerando trabalho e renda dignos e de forma sustentável.
Para o professor da Universidade Estadual de Londrina (Entrevista, 14/11/2009), os avanços são válidos e relevantes, porém acredita que os problemas na operacionalização da PPES relativizam e restringem esses avanços. Reforçando este posicionamento, os grupos A, B e C apontaram que a principal limitação deles é a comercialização. Segundo o exposto por um integrante do grupo C, se fossem elaboradas outras estratégias para a comercialização, o grupo teria mais recursos e dependeria menos do Programa Municipal de Economia Solidária: “O problema está na comercialização. Se a gente tiver um espaço bom para comercializar, venderíamos melhor e não precisaríamos do Programa. Vender no bairro é difícil, porque as pessoas compram fiado, ai não pagam e o grupo leva prejuízo” (Entrevista, 18/11/ 2009).
Os integrantes dos grupos B e C avaliaram que a informalidade dos empreendimentos é uma barreira que se reflete na comercialização e no desenvolvimento dos próprios grupos. A falta de nota fiscal limita a capacidade de comercialização, principalmente, para empresas que certamente poderiam ser consumidores de grandes volumes alavancando todo o processo. Esta barreira vai ao encontro do limite identificado por Cruz (2008), a qual evidencia a falta de uma política de comercialização propícia à ampliação do mercado ao consumidor dos produtos da Economia Solidária. O professor da UEL acrescenta ainda que se essas deficiências não forem sanadas, as iniciativas de Economia Solidária tornar-se-ão meras políticas assistenciais compensatórias, desvirtuando-se a essência da própria Economia Solidária. Essa discussão será retomada mais adiante.
Contudo, embora o limite da comercialização seja o mais evidente no comprometimento desses empreendimentos, Borinelli, Santos e Pitaguari (2010) chamam a atenção para o fato de que tal limite, muitas vezes, acontece por falta de um planejamento da produção atrelado a uma estratégia mercadológica mais elaborada.
A disponibilização de recursos para os empreendimentos assessorados é de suma importância, tendo em vista que as atividades só conseguem viabilizar-se, de início, através de apoio financeiro. Entretanto, de acordo com o grupo C, os trabalhadores não desejam tornarem-se dependentes do Programa e, mais uma vez, ressaltam que o principal limitador para a autonomia dos grupos é a ausência de desenvolvimento da comercialização. Com relação à autonomia dos empreendimentos, o professor da UEL argumenta que:
Precisa-se urgentemente de um maior debate em torno das verdadeiras vocações e possibilidades para a Economia Solidária. Não acredito que a solução esteja em enfrentar mercados muito concorridos, mas antes encontrar vias que reduzam e facilite o caminho destas organizações. Um exemplo que acredito é uma mudança na lei para que estas iniciativas possam participar de licitações e parcerias com o poder público com vantagens sobre as empresas capitalistas, uma outra é passarem a atender mercados locais específicos (Entrevista, 14/11/2009).
Logo, de fato, no que tange à conquista da autonomia dos empreendimentos, dois limites destacam-se: o primeiro diz respeito à escolha da atividade e comercialização e o segundo é a apropriação dos empreendimentos por parte dos trabalhadores.
Assim, a escolha da atividade a ser desenvolvida pelo empreendimento é crucial para o seu sucesso ou fracasso. Os produtos da Economia Solidária necessitam ser diferenciados num mercado de elevada concorrência, o que impõe um esforço adicional em pesquisa e desenvolvimento para criar vantagens sustentáveis ao longo do tempo. No entanto, há certa dificuldade diante das limitações de formação que caracterizam a realidade dos grupos. Considerando estas dificuldades intrínsecas à realidade dos empreendimentos de Economia Solidária em geral, o professor da UEL (Entrevista,14/11/2009) defende que uma das saídas poderá ser a mudança da Lei de Licitação, em que os empreendimentos econômicos solidários tenham preferência sobre os demais, ou pelo menos possam trabalhar com um sistema de cotas para produtos destas iniciativas. Esse posicionamento converge com a crítica à tendência de transferir para o trabalhador toda a responsabilidade pelo desemprego e pobreza (BARBOSA, 2007), quando a sua exclusão faz parte de um problema estrutural alimentado ao longo da história e que, por isso, é uma injustiça transferir essa responsabilidade para os grupos de Economia Solidária.
A dificuldade em desenvolver autonomia nos grupos também é percebida como um ponto crítico, levando-se em conta a baixa apropriação de todo o processo de trabalho e gestão pelos trabalhadores. Diante deste cenário, o Programa Municipal de Economia Solidária, segundo o professor da UEL (Entrevista, 14/11/2009) e os integrantes do Grupo A (Entrevista, 16/11/2009), necessita desmistificar o mercado, a comercialização e a gestão. Os entrevistados identificaram limites quanto à formação profissional dos técnicos que acompanham os empreendimentos incubados. Segundo o professor, faltam profissionais da área de gestão: “Definitivamente faltam administradores para dar apoio, essa é a área por excelência da administração, vemos um campo imenso de carências e de problemas que são o escopo de atuação da administração e que hoje é dominado de forma absoluta pelos assistentes sociais” (Entrevista, 14/11/2009).
Também, os integrantes do grupo A acreditam que a falta de formação específica dos técnicos que assessoram os grupos atrapalha o aprendizado dos trabalhadores e as parcerias ficam comprometidas:
Nenhum dos técnicos tem essa capacitação de contabilidade, gestão. Porque, por exemplo, os estagiários vieram verificar se nós tínhamos aprendido a fazer os cálculos de custo de produção, esse trabalho deveria ter sido feito nas bases. Se tivesse um profissional em cada área, ensinando esses grupos nas suas bases, ensinando todas as trabalhadoras a fazer o calculo. Esse deve ser o melhor caminho para ter o equilíbrio e que tenha realmente grupos formados (Grupo A, entrevista, 16/11/2009).
A gerente de Inclusão Produtiva do Programa, por sua vez, não identifica problema algum em relação à formação profissional dos técnicos do Programa Municipal de Economia Solidária. Segundo ela, não é função dos técnicos do Programa possuir conhecimentos específicos, mas sim conhecimentos acerca do que é Economia Solidária e dos princípios que a caracterizam. Esta abordagem é expressa em Araújo e Silva (2005), quando alerta que em alguns casos se preconiza primeiramente a formação ideológica dos empreendimentos e apenas em um segundo momento a questão econômica de cada atividade.
De acordo com a gerente de Inclusão Produtiva do Programa, quando os empreendimentos demandam necessidades específicas, o Programa busca parcerias com instituições de ensino superior, com outras secretarias do governo municipal ou, ainda, com outras instituições que têm proximidade com o tema:
Na questão de conhecimentos específicos, buscam-se as parcerias. Porque não teria como ter um profissional para atender todos os grupos. É humanamente impossível. Imagine como ficaria o ultimo grupo a ser visitado? Nas parcerias se tem várias pessoas o que possibilita a pulverização do trabalho entre os grupos. É claro que na perspectiva da qualidade do trabalho ou atingir as metas pode ser prejudicado (Entrevista, 19/11/2009).
Entretanto, como a própria entrevistada relatou, o trabalho realizado pelos parceiros nem sempre atinge os resultados esperados, tanto pelo acúmulo de tarefas a executar como pelo tempo reduzido das parcerias. Nem sempre os projetos possuem profissionais especializados em determinadas áreas carentes e, assim, os problemas tendem a se acumular ou serem tratados fragmentadamente. Essa condição, tende a tornar mais difícil a implementação de metas gerenciais e de capacitação nos termos das parcerias, aumentando a frustração e reduzindo as expectativas em relação a esse recurso.
O professor da UEL (Entrevista, 14/11/2009) acredita que o campo da Economia Solidária ainda é pouco estudado e que para o meio acadêmico são necessárias constantes adaptações dos conceitos tradicionais de gestão para a Economia Solidária. Não existe uma metodologia apropriada para a transferência de tecnologia e conhecimento dos parceiros para os empreendimentos, o que pode gerar sérios problemas. Esta perspectiva alinha-se com a imagem transmitida pelo Relatório (2005), em que os parceiros são os “detentores do saber” e não transmitem, de forma eficaz, os conteúdos necessários para a manutenção da atividade produtiva.
O assessor técnico do Estado do Paraná da UNISOL e o professor da UEL acreditam ser necessário criar instrumentos formais para a avaliação de cada etapa do processo de incubagem. Segundo eles, a estipulação de prazos é difícil, tendo em vista que cada empreendimento possui uma dinâmica, porém o Programa necessita ter metas a serem perseguidas, formalizadas e, acima de tudo, apresentar resultados de todo o trabalho realizado, considerando que são recursos públicos que estão sendo alocados no Programa.
Entretanto, o resultado do estudo realizado com várias iniciativas de Economia Solidária no país e publicado no Relatório Final de Avaliação das Políticas Públicas de Economia Solidária (2005) revelou que a falta de definição de prazos para a desincubagem dos empreendimentos pode criar uma relação de co-dependência entre a incubadora, neste caso, o PMES e os empreendimentos econômicos solidários.
Tomando as contribuições da literatura específica sobre a situação da PPES no Brasil, percebe-se que a experiência de Londrina vem enfrentando vários obstáculos já constatados em outros locais, dentre os quais se destacam: a predominância de uma perspectiva assistencial em detrimento da efetividade econômica dos empreendimentos; o amadorismo quanto à gestão estratégica e econômica, do planejamento de mercados e produtos; e, como consequência, o baixo grau de autonomia social e econômica dos empreendimentos incubados. A falta de maior objetividade das ações de incubagem realizadas pelo Programa faz com que os empreendimentos continuem na informalidade. Em seu estudo do CPES de Londrina, Prochet (2009) defende que a autonomia dos trabalhadores consiste no fato de se formalizarem como cooperativa para que acessem as linhas de financiamento oficiais não provenientes da assistência social.
Percebe-se a predominância de uma tendência de concepção de PPES sustentável-solidária (FRANÇA, 2006) em Londrina, dada a ênfase na dimensão ideológica da Economia Solidária e na preocupação em ampliar a noção de economia em suas atividades, atrelando-as às questões políticas, sociais, culturais e ambientais do contexto local e regional. Contudo, ainda é frágil o seu caráter de construção e fortalecimento de cadeias sócio-produtivas locais que garantam maior autonomia dos grupos e menor dependência de medidas de cunho compensatório, assinalado por Schwengber (2005) em sua concepção solidarista (ou comunitarista) de PPES.
Assim, o caso analisado aproxima-se de um assistencialismo improdutivo (POCHMAN, 2004), sugerindo o desafio crítico para PPES dado na relação entre o assistencialismo e a emancipação dos empreendimentos. O caráter tendencialmente assistencial confunde o processo de incubagem com outros programas de transferência de renda ou de terapia ocupacional. Percebe-se a existência de uma engrenagem de autoalimentação, em que uma estrutura foi montada com a sedutora bandeira de promover ações emancipatórias através do fomento e apoio a empreendimentos solidários, mas o que ainda se presencia são a perpetuação das condições de vida deste público e a dependência extrema em relação ao poder público municipal.
Essa vocação assistencial na orientação do processo de incubagem fica evidente na própria constituição do corpo diretivo do programa municipal de Economia Solidária, em que as ações estratégicas, e mesmo operacionais, são predominantemente definidas por profissionais do setor de assistência social, o que tende a comprometer o desenvolvimento de iniciativas com viabilidade mercadológica e efetividade de gestão, ingredientes essenciais para a autonomia dos empreendimentos. É evidente que não se trata apenas de um problema de corporativismo profissional, já que os conhecimentos de gestão econômica e administrativa podem ser dominados por pessoas de diferentes formações -, mas também de uma estratégia institucional - que combina elementos ideológicos, corporativos e organizacionais – em resposta à debilidade estrutural dos empreendimentos (GAIGER, 2007). A ênfase na assistência pode ser vista como uma forma de confrontar o modelo de Economia Solidária dominante no Brasil, no qual, segundo Barbosa (2007), procura-se transferir os problemas sociais para a esfera privada, transferindo aos pobres e excluídos a tarefa heróica de se tornarem empreendedores de sucesso, simplesmente porque estão unidos. O dilema entre um assistencialismo improdutivo e a maior efetividade econômica dos empreendimentos deve ser problematizado e repensado sob o risco de comprometer a PPES e o projeto da Economia Solidária.
Em épocas de democracia de baixa intensidade e de desestatização da regulação social em favor do mercado (SANTOS, 2007), as conquistas da Economia Solidária em termos de disputa de espaço na estrutura do Estado e por recursos públicos não devem ser minimizadas ou desperdiçadas. Essas conquistas são históricas, mas não definitivas. Ainda se percorre um caminho incerto e às vezes arriscado, o que exige muita atenção crítica, criatividade, compromisso e competência. (SANTOS; BORINELLI, 2010)
Em outras frentes, o PPES em Londrina conquistou, apesar de pouco tempo de existência, importantes avanços na sua institucionalização, como o caso da criação do Centro Público de Economia Solidária e a promulgação da Legislação Municipal específica. Essas e outras ações do CPES têm sido determinantes para dar visibilidade e disseminar a Economia Solidária na cidade e região de Londrina, contribuindo, como afirma Cunha (2007), para a politização da sociedade civil e a democratização do Estado e a redefinição das relações entre Estado e sociedade. E, ainda, para a politização das relações de produção e consumo.
5. Considerações Finais
O presente estudo objetivou analisar os avanços e os limites da política pública de Economia Solidária, dando especial atenção ao processo de incubagem de empreendimentos do PMES de Londrina - Paraná. Embora a PPES de Londrina tenha garantido importantes avanços para a institucionalização dessa política pública na cidade, como a criação de uma cooperativa de produção, a criação do Centro Público de Economia Solidária, a promulgação da Legislação Municipal, o atendimento de um grande número de empreendimentos, o processo de incubagem analisado possui vários limites, dos quais se destacam a baixa normalização e publicização do processo de incubagem, a falta de quadro qualificado para assessoria econômica e de gestão e de parcerias mais consistentes. A consequência mais direta desse quadro é o baixo grau de formalização e de sustentabilidade econômica dos empreendimentos incubados.
Como decorrência de condições de extrema precariedade que afligem boa parte dos integrantes dos grupos que compõem a Economia Solidária em Londrina, assiste-se a um esforço por parte do PPES em dar assistência básica aos membros dos empreendimentos, até que estes possam desenvolver-se autonomamente. Porém, o que se nota é a dificuldade de superação deste estágio inicial e o alcance da almejada eficácia econômica. Percebe-se um impasse de difícil solução entre ações de assistência que garantam o mínimo de dignidade e, ao mesmo tempo, criem condições para a emancipação socioeconômica. Novas pesquisas poderiam aprofundar a compreensão de tal questão e sua manifestação em termos operacionais no processo de incubagem. Ainda, estudos comparativos poderiam demonstrar como outras experiências similares estão equacionando o mesmo problema.
Há que se entender o propósito da emancipação, que fundamenta boa parte dos esforços da Economia Solidária, como um conceito complexo e multifacetado que envolve elementos que não se podem resumir a indicadores econômicos. Nesse sentido, ressaltam-se alguns sinais de avanços importantes dos participantes da Economia Solidária de Londrina, como o desenvolvimento das relações sociais, melhora da auto-estima, além de uma capacidade de leitura mais rica e consciente da realidade. Todavia, não se deve cair na tentação de entender esses avanços como suficientes ou substitutivos da insustentabilidade econômica e da incapacidade em gerar renda suficiente para dar dignidade e autonomia aos integrantes dos grupos da Economia Solidária apoiados pelo CEPES.
A maior parte dos desafios pessoais e institucionais encontrados é constituída de embates não apenas tecnológicos, mercadológicos ou corporativos, mas políticos e ideológicos. Como seria de esperar, são embates inevitáveis para um projeto contra-hegemônico como se pretende a ES, em sua busca por um modelo econômico social e ambientalmente alternativo. De qualquer forma, essa busca dá-se hoje em um terreno relativamente aberto à criatividade, à inovação e à determinação na construção de novos saberes, tecnologias e formas de organização social e produtiva, que promovam a emancipação na Economia Solidária.
A criação da Copersol, incubada pelo CPES, e as sistemáticas discussões e avaliações com os atores envolvidos no processo de incubagem mostram que também existe um trabalho contínuo de reflexão e crítica no sentido de avançar em práticas e formas de organização já trilhadas por outras experiências de Economia Solidária. Isso indica que as fragilidades e escolhas do caso analisado podem fazer parte da própria dinâmica de amadurecimento institucional do programa, o que inevitavelmente deve levar a uma análise crítica do contexto institucional que deu origem e move a trajetória dessa política pública. O futuro do programa passa pela resposta à seguinte questão: até que ponto a PPES, a intervenção estatal na Economia Solidária, poderá legitimar-se com ações, em grande medida, assistenciais de grande teor simbólico, mas de baixo impacto social e econômico? A médio e longo prazo, a não equação do dilema entre o assistencialismo improdutivo e a emancipação dos empreendimentos poderá comprometer a avaliação não só da efetividade da política pública de Economia Solidária, mas o potencial utópico e alternativo que ela representa.
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