Observatorio de la Economía Latinoamericana

 


Revista académica de economía
con el Número Internacional Normalizado de
Publicaciones Seriadas  ISSN 1696-8352

ECONOMÍA DO BRASIL

 

ÁREAS DE RISCO EM MANAUS: INVENTÁRIO PRELIMINAR
 

Denise Rodrigues Cruz
Karla R. Mendes Cassiano
Reinaldo Corrêa Costa

mendes.karla1@gmail.com



 

Introdução

O presente trabalho pautou-se em mapear as ocorrências registradas pela Defesa Civil Municipal (SEMDEC), nos anos de 2005 a 2008, com a finalidade de identificar as áreas mais afetadas por eventos adversos (alagação e deslizamento). Para tanto, foram utilizadas a base cartográfica Google Earth e QGIS. Uma das principais dificuldades foi a localização precisa dos eventos, pois as bases cartográficas disponíveis não estão atualizadas de acordo com a realidade dos logradouros e topônimos de Manaus. Outro fato é a repetição de nome de ruas em um mesmo bairro, dificultando a localização do evento, para este primeiro estudo do gênero em Manaus. O sítio urbano de Manaus localiza-se à margem esquerda do Rio Negro próximo à confluência com o Rio Amazonas (maior rio do planeta, 6.840 km) e está assentado sobre terrenos datados do Terciário/Quaternário, formação Alter do Chão. Além disso, assenta-se sobre a porção ribeirinha de um sistema de colinas tabuliformes, pertencentes a uma vasta seção de um tabuleiro de sedimentos terciários.
 

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Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Rodrigues Cruz, Mendes Cassiano y Corrêa Costa: "Áreas de Risco em Manaus: Inventário preliminar" en Observatorio de la Economía Latinoamericana, Número 123, 2009. Texto completo en http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/



Bases de Reflexão e Procedimentos

1. Bacia Hidrográfica e a Urbanização

As bacias hidrográficas modificadas pela urbanidade são componentes de um geossistema diferenciado onde atuam tanto lógicas sociais, políticas, culturais e econômicas quanto o regime hídrico e processos hidrogeomorfológicos. A bacia é um espaço natural que tem sua circulação e drenagem para um leito maior que recebe águas de seus afluentes (e cada com uma dinâmica) e sua delimitação é em muitos casos pelo divisor de águas (divortium aquarium). O relevo e o clima contribuem para a formação de uma bacia, e a cobertura (vegetal ou construções) do solo afetam a circulação das águas que escoam para o canal principal. A bacia possui características bioclimáticas, águas subterrâneas (freático), fitogeográficas e hidrogeomorfológicas, como ecodinâmicas que intercorrelacionam formando uma paisagem que o ser humano herda da natureza e a utilizam conforme sua formação social e/ou necessidades conjunturais. As confluências das águas um fluxo maior que por sua vez chega a um rio maior, oceano ou lago (naturais ou artificiais) e formando deltas de diferentes ordens de grandeza (não raro de diferentes funções estratégicas para as sociedades) e de formatos diferenciados e compósitos de um palimpsesto que forma a história natural regional.

A bacia hidrográfica é uma bacia de drenagem em que há uma espacialidade natural, com paisagens e características próprias. A bacia hidrográfica, isto é, um conjunto ou rede de rios que linearmente passam por diferentes pontos do espaço, por sistemas ecológicos localizados e distintos. Por isso a bacia é um geossistema, e cada curso fluvial da bacia é constituído historicamente por uma conexão ecodinâmica dos diversos elementos da natureza que compõem tal lugar no espaço, isto é, geótopo, geofácie e o geossistema; estes são de grande valia para os diferentes modos de vida e formações territoriais de cada sociedade que pode ou não subsumir a bacia conforme suas relações sociais de produção. A bacia hidrográfica em meio urbano é um espaço geográfico por excelência, pois nele fatores sociais e naturais interatuam e cada bacia é uma unidade do urbano com realidades sócioespaciais diferenciadas, por isso também é econômica, política, social e natural. E não raro com uma natureza que desagrada às pessoas, como microorganismos e insetos que transmitem doenças, odor desagradável que é oriundo de processos poluidores, isto porque muitos fluxos fluviais são considerados como cloacas públicas, não raro sem infra-estrutura e serviços em que os setores pobres da sociedade constituem os lugares destas moradias; quando a bacia tem salubridade são espaços de moradia de classes média e alta ou ainda, são espaços públicos de lazer dessas duas classes.

No ambiente urbano a bacia é uma unidade territorial de administração em que atuam diferentes classes, grupos e categorias sociais, cada um com uma lógica própria e muitas vezes opósitas a outras, mas em todos há o valor do solo urbano como elemento constituinte da lógica das paisagens. Planos de administração, gestão, infra-estrutura, saúde pública, circulação e moradias estão no conjunto de preocupações de quem pensa uma bacia no meio urbano, assim a formação social e o geossistema são elementos paradigmáticos e epistemológicos para pensar e atuar nas bacias hidrográficas.

Pensar o urbano com bacias hidrográficas como elemento da paisagem exige um esforço de relacionar os fatos que compõem o espaço total da bacia, assim a previsão de impactos à diferentes escalas de tempos futuros é necessária (AB’SABER, 1994). A previsão de impactos é um elemento analítico e metodológico, mas sua concretização precisa da participação democrática da sociedade no contexto de como atuar, de como será a gestão da bacia, visto que há territorialidades distintas na dinâmica do mundo urbano. A bacia é dinâmica na sua existência, mas sem o caráter tautológico ou meramente construtivista, é uma realidade que compõe o cenário das cidades, do ponto de vista cultural, social e econômico, pois nela está envolvido o uso social da água ou a morte social dos rios (LEONEL,1998).

O pensamento da sociedade é múltiplo em relação aos procedimentos ideológicos, comportamentos sociais e concepções de mundo e de qual a forma de pensar e atuar na bacia. Na lógica da economia de mercado em que todo espaço é e pode vir a ser mercadoria, é uma visão capitalista de gestão e isso visa o lucro baseado pelo crescimento econômico (que não raro entende a natureza como recurso natural ou almoxarifado, degradando-a, pois é vista como diferencial competitivo espacial para o lucro de determinadas classes ou grupos sociais).

A bacia hidrográfica é um elemento ecodinâmico na história em movimento (cotidiano da sociedade) é um elemento para compreensão de como se originam áreas de risco criadas pela sociedade, mas com componentes da natureza. Fluxos de matéria e energia ocorrem nas bacias que também foram tornados elementos do metabolismo urbano que contribui para a formação de espaços geossistêmicos que foram territorializados de diferentes formas e com temporalidades próprias constituindo paisagens.

A bacia é sempre plural, se a realidade é plural as formas de análise também devem ser. A bacia hidrográfica no meio urbano é um espaço que transcende ao espaço da bacia hidrográfica natural, pois sendo parte do metabolismo urbano está sujeita a obras públicas, construções, alteração das margens e outros próprios do tempo social, da história social e não natural, mas ainda guarda em sua existência forças da natureza como a influência das chuvas, do freático, entre outros. Muitas vezes a sociedade que degrada cria planos de renovar processos naturais. Porque pensar as bacias para entender áreas de risco, alguns pontos de abordagem:

- a bacia está toda no circuito urbano, da foz à nascente com semelhanças no processo de alteração e muitas vezes sobre o mesmo poder administrativo (poder municipal);

- o metabolismo urbano impõe diferentes tipos de usos no tempo histórico e social, seja de lazer ou cloaca pública, valorização do solo urbano, fonte de água e alimentos, entre outros;

- diferentes classes sócioespaciais se territorializam na bacia o que a difere espacialmente com zonas ou áreas com maior, menor ou sem nenhuma infra-estrutura e serviços de escoamento, de equipamentos urbanos, entre outros;

- o transecto da bacia por sítios urbanos geomorfológicos e de unidades geológicas e climáticas que compõe uma unidade espacial ecodinâmica, um recorte ao quadro natural do espaço total sujeito à erosividade, erodibilidade, enchentes e alagações;

- uma infinidade de dinâmicas em que o geossistema, o território e a paisagem ocorrem na espacialidade da bacia, com peculiaridades e fatos que não são próprios de classes sociais como as enchentes que alagam as margens construídas. O espaço geográfico é um elemento contraditório, síntese e plural das relações sociedade/natureza, não raro de subsunção da natureza pela sociedade. A infra-estrutura é um elemento basal para o entendimento de uma bacia hidrográfica urbanizada e sua concretude histórica no estudo das áreas de risco.

2. Formações territoriais e moradia

As formações sociais historicamente têm uma característica de moradia, conforme suas classes sociais e instituições. Morar é um elemento básico do espaço, do território e das paisagens. As relações sociais de foro doméstico, privado e íntimo ocorrem primordialmente no lugar da moradia, incluso é uma das primeiras bases de socialização da criança. Conforme as relações sociais, as características das moradias são diferenciadas espacialmente; essa diferença pode inclusive ser uma segregação espacial, pois em alguns espaços há infra-estrutura e serviços e em outros não, diversificando a paisagem da cidade mostrando as desigualdades da sociedade.

Para se ter uma moradia é preciso pagar, quem não tem condições de pagá-la (um valor alto ou baixo), procura estratégias de conseguir sua moradia e basicamente o preço da mercadoria (terreno/casa) varia conforme a infra-estrutura, os serviços coletivos existentes na área, a localização, entre outros. O valor do solo urbano adquiriu uma dinâmica de gerar lucro (alto ou baixo), conforme o sujeito social que explora o solo, que apesar de ser um espaço herdado da natureza foi apropriado por alguma classe social e transformado em mercadoria, isto é, propriedade de alguém pelas relações sociais existentes. A propriedade da terra também é uma relação social que é um elemento dos espaços territorializados. A terra, como herança natural, não é criada pelo trabalho social, o valor da terra é um processo social e muitas vezes seu valor é maior do que aquilo que está construído nela, por isso se demole a construção para fazer outra, mas a terra continua. A terra é substância (agricultura) ou suporte (construção) e matéria-prima (olarias e terras para aterros). O valor da terra não é pela sua formação (que é da natureza e não da sociedade) e sim pela sua potencialidade (mercadoria, gerar lucros, entre outros), conforme a infra-estrutura e serviços que a caracterizam e a diferenciam no espaço.

É potencialidade porque é um capital que valoriza, mas contraditoriamente essa valorização não é com base na produção de uma atividade geradora, transformadora ou no trabalho que agrega valor, é com base no tempo social, ou seja, a especulação que valoriza a terra; pelo monopólio da terra, o dono da terra tem a terra e é seu território, que pode vendê-la, imobilizar capital, territorializar capital, por isso é uma mercadoria. Ao ser metamorfoseada pelo capital em mercadoria, isto significa que para cada poder de compra de uma classe social se tem uma terra com valor a imagem e semelhança da classe social de seu proprietário ou da relação social da qual fazem parte.

A localização no espaço de cada terra (propriedade) é única, por isso há um monopólio do lugar que foi territorializado. O preço da terra depende da localização. O contexto histórico social que faz com que uma localização se valorize depende das dinâmicas peculiares de cada bairro, cidade, região, conjuntura, entre outros, com a presença dos aparelhos do Estado, de movimentos sociais pela moradia e pela presença de enchentes e deslizamentos de terras. A dinâmica da ocupação de espaços para moradias envolve não somente a especulação imobiliária como também a busca de espaços de moradia, em ambos a unidade territorial de moradia familiar é a necessidade principal, seja para satisfação das carências de moradia, seja para obtenção do lucro. No contexto da terra mercadoria há segregação da espacialidade urbana que une os que foram segregados. Processos históricos de ausência de políticas urbanas contribuíram para tal segregação velada, pontual e atemporal. O morador de “baixa renda” é aquele que vai morar em lugares insalubres ou com pouca infra-estrutura e serviços públicos. O morador de área de risco é urbano, mas o urbano muitas vezes não está onde ele mora, devido às relações sociais contraditórias, isso cria novas sociabilidades, novas economicidades, onde surgem estratégias de sobrevivência. Do morador da área de risco é cobrada higiene no local de moradia, pagar contas, entre outros; mas muitos não têm documento da terra, da propriedade e por isso investem na infra-estrutura interna da casa (geladeira, fogão, televisão, aparelhos de som, entre outros) pagas com “suaves” prestações e não na casa (porta, janela, telhado, piso, encanamento, rede elétrica, entre outros), pois temem investir em algo que não possam levar, caso sejam expulsos ou desapropriados por alguma política pública. Nesse caso a autoconstrução é uma estratégia de sobrevivência, mas a falta de infra-estrutura e serviços públicos são elementos que contribuem para formação das áreas de risco urbanas.

Na dinâmica do processo de urbanização de Manaus algumas práticas do poder público, como o planejamento urbano ou a regularização daquilo que existe, que é de ação dos moradores (movimentos sociais, especulação imobiliária), de diferentes sujeitos sociais (políticos, empresas imobiliárias, igreja, entre outros). As áreas de risco conformaram uma realidade social e não em obra da natureza. A questão das áreas de risco urbanas são elementos do pensar e planejar políticas públicas adequadas à dinâmica social urbana, portanto, são muito mais que obras de engenharia. Pensar o risco deve ser além do tecnicismo que quantifica o fato ou a mera mensuração. O entendimento e a resposta ao risco devem ser diferenciados, seja na óptica do poder público seja na óptica dos moradores envolvidos.

A questão do risco é um elemento que impacta a classe de “baixa renda” em sua existência física, pois faz parte do seu cenário cotidiano “a bacia e/ou o barrando”. O risco mais que uma questão tecnicista ou de obras é um elemento que está na realidade social da urbanidade. Uma enchente ou uma alagação pode derruir todo o histórico de trabalho e custo para aquisição de materiais para satisfação das necessidades de uma família, como geladeira, fogão, entre outros, como a própria casa. Para quem vive historicamente com privações, perder a casa e seu conteúdo é muito, é perder tudo que trabalhou arduamente para obter. Um agravante é se a área for interditada, com base em avaliações técnicas, para moradia, isso insere a busca de novos lugares para (re)construir espaços de moradia.

A dificuldade de encontrar espaços adequados à moradia e o histórico em enfrentar tal dificuldade, faz com que não se aceite o diagnostico técnico que indique a inadequação da área para moradias após o evento, principalmente porque em muitos casos não há alternativas condizentes com a realidade social, economia e desejos do morador; outro problema correlato surge quando é indicada a remoção pela probabilidade de ocorrer o evento, muitos vão argumentar que moram a muitos anos na área e que o evento de risco não vai acontecer, pois não aconteceu nada de real e/ou concreto, ainda que sejam corretas e honestas as preocupações com a previsão de impactos e de preservação da vida humana.

Isso porque na espacialidade o local virou (via relações sociais) lugar territorializado pelo grupo ou indivíduo, o que reforça o ideário de vínculo e de permanência na terra. Logo reivindicam obras para a superação e eliminação do risco e com isso rejeitam a mudança de lugar. Esse pertencimento ao lugar que lhe pertence é um elemento da participação política no contexto da construção social da área de risco; a natureza é subsumida pela sociedade a desigualdade torna-se mais evidente, é constrangedora para aquele que precisa perder sua privacidade e ficar em espaços públicos (escolas, ginásios, entre outros) como outros de igual situação. A necessidade de morar, de ter um espaço mínimo para as exigências e necessidades ainda que precário é um ato de sobrevivência na atual realidade social que desumaniza os espaços geográficos que são coisificados e perdem o conteúdo humano. Ser dono do seu espaço de moradia é melhor que pagar aluguel, pois na lógica da sociedade ser dono é estar na categoria de proprietário, isto é, ter direitos assegurados e uma das estratégias para isso é a ocupação de espaços públicos para constituírem suas casas, suas propriedades e disso utilizam diferentes formas de ajuda mútua e geralmente são membros de um movimento social.

O processo social de constituição de áreas de risco deve ser pensado a partir de cada sujeito social ou agente envolvido, do ponto de vista do morador, da defesa civil, do poder público, entre outros. Em nossa sociedade o que é área de risco para alguns é área de construção de moradias para outros devido às dificuldades de acesso à renda, às políticas públicas de habitação, e não se pode perder oportunidade de espaços para moradia, pois o sofrimento cotidiano é implacável e é um dos elementos de uma geografia humana sofrida.

Riscos Urbanos e Cultura de Riscos

O processo da dinâmica urbana inclui a formação social e o geossistema, que atuam em correlação com outros temas, como a cultura institucional, a política pública para os eventos de risco e o que significa a presença da natureza (rios, igarapés, vales, margens, chuvas, tipos de solo, entre outros) na lógica dos diferentes agentes do urbano, sejam moradores, construtores, poder público municipal ou estadual, entre outros.

Os eventos de risco não devem ser encarados como problema exclusivo do Corpo de Bombeiros ou da Defesa Civil, é um problema de toda a sociedade. Todos que vivem no mundo urbano são afetados direta ou indiretamente com os eventos, principalmente aqueles de excepcionalidade, como as chuvas de 2007. Os prejuízos materiais são grandes, os danos pessoais idem, ocorre uma piora na qualidade de vida das pessoas afetadas, ocorre desvalorização de terrenos, que por sua vez reflete no comércio local e no atendimento municipal e no serviço de transporte público de passageiros, enfim uma série de impactos de diferentes escalas de grandeza.

Pensar em eventos de risco é ter uma outra maneira de ver os problemas que a sociedade enfrenta, e um dos maiores desafios e mudar a cultura, o jeito de ver, pensar e agir no tema áreas de risco.

Riscos Urbanos

A cidade pela sua natureza, já é uma área de riscos, o simples fato da aglomeração já é um ambiente de riscos, propagação de vírus, acidentes de trânsito, entre outros. A cidade cresce e com ela a espacialidade dos riscos. As atividades se ligam umas às outras combinando riscos das mais diferentes atividades. As atividades industriais, os aterros sanitários (lixões), as condições sociais (áreas de pobreza, ausência de infra-estrutura, migrações). Isso evidencia que o risco é um fato social, que abrange um espaço total, logo são as relações sociais que instauram, ou não, a possibilidade de risco. Tratando-se de riscos urbanos não há acaso, é uma produção social, não raro do descaso do poder público responsável pelo ordenamento territorial urbano ou de políticas equivocadas.

Os riscos podem ser de origem “natural” (chuvas, enchentes deslizamentos,...), tecnológicas (incêndios, explosões, vazamentos tóxicos de gases e particulados,...) ou sociais (moradias em lugares inadequados, falta de infra-estrutura em construções, ausência de rede de esgoto,...) e muitas vezes no metabolismo urbano eles se misturam.

As respostas são variadas, desde a previsão de impactos, proteção de espaços e intervenção, entre outros, que implicam na ação e gerenciamento dos eventos de risco em áreas urbanas. Os tipos de ação variam segundo as condições do agente e segundo o espaço social, em razão do desenvolvimento e de como são as relações que o grupo tem com o espaço total, com o entorno. Exemplo disso são os bairros com altos índices de eventos de risco e de uma maneira simples buscam condições de se proteger dos eventos, levantando móveis para níveis que as enchentes não alcançam, reforçando construções, que em muitos casos não são eficazes com bem sabem os agentes que interferem nos locais, como o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil.

A idéia de risco é vista de diferentes formas, e isso tem por base a formação social e como ela interpreta os geossistemas. Isso perpassa as estruturas políticas e econômicas das sociedades e dos dirigentes do poder público. Em muitos casos os eventos de riscos (origem e impactos) são utilizados como instrumento de propaganda política eleitoreira, seja favorecendo a construção de condomínios (especulação urbana que gera desigualdade na infra-estrutura do espaço urbano, as redes de esgoto não são ampliadas) até a construção de casas populares sem infra-estrutura adequada de circulação de águas pluviais e fluviais, sobrecarregando a rede de esgoto que não é ampliada e não tem manutenção adequada).

Cultura de Riscos

A cultura de risco é um conjunto de práticas e ações (mentais ou realizadas) próprias da característica existencial de órgão responsável pelo tema e deve ser sempre aberto às modificações e processos sociais de seu campo de atuação, assim como do espaço urbano. Isso inclui a divulgação do tema na sociedade, deve ser uma preocupação social, devem estar na agenda de ações de políticos, partidos, governantes, administradores públicos, de setores privados da sociedade, enfim de todos.

Sendo uma preocupação coletiva, torna-se um tema de todos, inclusive de políticas públicas. As pessoas que vivem no meio rural sabem disso, como exemplo, os camponeses que sempre estão preocupados com o tempo meteorológico (chuva ou estiagem), nível dos rios (enchente ou seca), o preço dos produtos (risco econômico, de superprodução ou concorrência, entre outros). Isso marca a vida das pessoas, cria na história privada uma cultura de preocupação a respeito do tema, e isso na coletividade deixa de ser um problema privado para ser um problema da sociedade, de todos. Isso não ocorre na realidade urbana, pois, no campo é fonte do sustento direto, o solo é substancia para o sustento, precisa-se do solo, no urbano o solo é suporte (para casas, prédios, fábricas), isso quer dizer que se trabalha com o solo na agricultura e com rios na pesca, mas nas fábricas se trabalha acima dele, há uma separação que influencia diretamente a cultura de risco, pois o camponês, o agricultor, o índio não tem a mobilidade de mudar de endereço, como no caso urbano.

Na dinâmica urbana é preciso que os aparatos institucionais estejam com a cultura de risco em suas agendas oficiais, isso inclui campanhas em escolas e na sociedade civil organizada. Deve haver uma ligação com diversos elementos da sociedade, como os responsáveis pela limpeza de bueiros e esgotos (rede de drenagem), previsão e tempo, corpo e bombeiros, polícia, serviço de ambulância (SAMU), departamento de obras públicas, entre outros.

A existência de um corpo institucional próprio e exclusivo para riscos é um avanço na sociedade moderna preocupada com os eventos. Quanto mais ocorrem eventos de risco, mais caro fica o custo de vida das pessoas afetadas que precisam direcionar custos para a reconstrução, e geralmente não é com obras adequadas, há um gasto de dinheiro que aumenta a carestia, e contribui para a recriação de processos sócioespaciais de exclusão social. Com a presença de áreas de risco os especuladores ganham: no preço de materiais de construção civil; em políticas de urbanização eleitoreiras com má qualidade na obra; com investidas de imobiliárias para construção de condomínios fora do plano diretor ou do zoneamento urbano; entre outras.

A presença das áreas de risco é um ônus para os cofres públicos, que precisam redirecionar verbas para atender aos necessitados, esse atendimento deve ser aperfeiçoado. Se políticas públicas, inclusive de prevenção, forem feitas adequadamente, os problemas serão menores, assim como o valor dos gastos públicos, que devem atender a prevenção e ao fortalecimento e capacidade de ação e modernização das instituições responsáveis pelo atendimento, incluindo a sociedade vivente no mundo urbano manauara.

Deslizamentos em Manaus - 2005 a 2008

A partir das ocorrências concernentes aos eventos de deslizamentos da Secretaria Municipal de Defesa Civil (SEMDEC), relacionadas aos anos de 2005 a 2008, foi possível elaborar dezesseis mapas básicos para a cidade de Manaus. Este mapeamento destaca as áreas mais afetadas por tais eventos, sendo estas agrupadas em dois arcos: o norte/leste e o arco centro-oeste/sul, ambos abrangendo as respectivas zonas da cidade. A área central, ou seja, a zona centro-sul, praticamente não é afetada.

O arco norte/leste é composto pelos bairros Terra Nova, Novo Israel (antigo lixão de Manaus), Colônia Santo Antônio, Santa Etelvina, Cidade Nova, Jorge Teixeira, Tancredo Neves, São José Operário, Zumbi dos Palmares, Colônia Antônio Aleixo, Distrito Industrial e Armando Mendes.

Já o arco centro-oeste/sul é composto pelos bairros Redenção, Bairro da Paz, Alvorada, Dom Pedro, Lírio do Vale, Nova Esperança, Santo Agostinho, Compensa, Vila da Prata, São Jorge, Santo Antônio, Glória, São Raimundo, Presidente Vargas, Centro, Praça 14 de Janeiro, Cachoeirinha, Educandos, Raiz, Colônia Oliveira Machado, Morro da Liberdade, São Lázaro, Betânia, Crespo, São Francisco, Petrópolis e Mauazinho. A área central da cidade, onde estão localizados os bairros Parque 10, Flores, Coroado, Aleixo, Chapada, São Geraldo e Adrianópolis possui menores índices de ocorrências

Foram registradas pela SEMDEC 441 ocorrências de deslizamento em 2005. Para o ano de 2006 foram 276 ocorrências, em 2007, 639 (maior número de ocorrências registradas nos quatro anos estudados) e, em 2008, foram registradas 220 ocorrências (até o mês de junho), somando um total de 1.576 ocorrências de deslizamento. No ano de 2005 o arco norte/leste foi o mais afetado pelos deslizamentos, em especial os bairros Cidade Nova e Jorge Teixeira. Neste contexto destacam-se as ruas Bom Jardim (Novo Israel), Xingu (Cidade Nova), Londres (São José Operário) com cinco ocorrências e a Rua Andiroba, (Jorge Teixeira) e Beco Peñarol (Petrópolis) com seis ocorrências.

Em 2006 o número de ocorrências diminui para 276, no entanto a configuração das ocorrências permanece, ou seja, o arco norte/leste continua sendo o mais afetado. O máximo de ocorrências registradas numa mesma rua é quatro. Essas ruas são: Rua Carpina (Redenção) e Rua Autazes (Tancredo Neves).

Em 2007 foi registrado o maior número de ocorrências entre os quatro anos de ocorrências mapeadas, sendo que 386 (mais da metade das ocorrências do ano todo) registradas no mês de abril. Neste ano também houve um maior adensamento de ocorrências relacionadas ao arco norte/leste, em destaque na Rua 26 (Alfredo Nascimento, Cidade Nova) com oito ocorrências, Rua Paulo Nery (Cidade Nova) e Rua Curitiba (São José Operário) com sete ocorrências e, Rua 27 (Alfredo Nascimento, Cidade Nova), 16 de Agosto (Cidade Nova), Manoel Botelho (Cidade Nova) e Raimundo Saraiva (Cidade Nova) com cinco ocorrências. Até o mês de junho de 2008 foram registradas 220 ocorrências referentes a deslizamentos, das quais se destaca a Rua Jerusalém (Nossa Senhora de Fátima, Cidade Nova) e a Rua Oito (Alvorada I) e Beco Cruzeiro do Sul, com cinco ocorrências.

A maioria dos bairros mencionados foi originada por ocupações que, em seguida, foram efetivados como bairros pelo poder público municipal, recebendo alguns tipos de serviços impostos, no entanto continuam sendo lugares sem infra-estrutura adequada e são áreas sócioespaciais com baixo poder aquisitivo.

Alagações em Manaus: 2005 a 2008

O quadro geral das alagações em Manaus baseado nos dados de ocorrências da Defesa Civil Municipal – SEMDEC nos anos de 2005 a junho de 2008 demonstram que o ano de maior intensidade de chamadas foi o ano de 2007 e o de menor, 2006. Foram mapeadas 3.182 chamadas de alagação no período marcado, sendo 750 em 2005, 476 em 2006 e 1439 em 2007. O ano de 2008 possui 518 ocorrências atendidas somente nos quatro primeiros meses que corresponde aos mais chuvosos.

Os pontos marcados delinearam duas formas de arcos em torno da área central de Manaus, chamados de Arco Norte/Leste e Arco Centro-Oeste/Sul.

A área mais afetada pelas alagações no ano de 2005 corresponde ao Arco Norte/Leste e nas proximidades do Igarapé do Passarinho. Os locais com maior reincidência estão:

• Terra Nova, Parque Florestal

• Cidade Nova; Mundo Novo

• Monte das Oliveiras, loteamento Agnus Dei

• Jorge Teixeira, no Val Paraíso

No Arco Centro- Oeste/Sul os locais com reincidência de ocorrência estão na comunidade Bairro União no Parque Dez de Novembro.

A quantidade de ocorrências de alagação no período de janeiro a junho de 2008 (518) é maior para o mesmo período em 2005 e 2006, perdendo somente para 2007 que teve 1.154 ocorrências neste mesmo período. As ocorrências estão mais distribuídas. Tanto o Arco Norte/Leste quanto o Arco Centro- Oeste/Sul concentram suas ocorrências ao longo dos Igarapés que cortam os bairros. Quase não houve reincidência de ocorrência para o mesmo local, somente na comunidade Nossa Senhora de Fátima na Cidade Nova.

No Arco Centro-Oeste/Sul, o ponto de maior reincidência de alagação está na Av. Brasil, na Compensa. A Cachoeirinha nas proximidades do Igarapé Mestre Chico concentra maior parte das ocorrências da zona Sul.

O ano de 2006 de menor representatividade de ocorrências, as chamadas foram mais intensas no Arco Centro-Oeste/Sul, concentrando as reincidências de chamadas na Rua General Glicério que corta o Centro e Praça 14. As chamadas da Zona Oeste são encontradas ao longo do Igarapé do Franco. Na área Central, correspondente aos bairros, Parque Dez de Novembro, Aleixo e Coroado, praticamente não há ocorrências de alagação.

O trimestre chuvoso de 2007 foi o mais intenso de ocorrências e o mais noticiado pelos jornais locais. A área mais afetada foi o Arco Norte/Leste com reincidências de alagação na:

• Colônia Terra Nova,

• Comunidades Riacho Doce, Nossa Senhora de Fátima e Campo Dourado na Cidade Nova,

• Comunidades Cidade de Deus e Valparaíso no Jorge Teixeira.

• Comunidade da Sharp no Armando Mendes

Considerações finais

O objetivo deste inventário preliminar de áreas de risco foi de registrar e mapear os eventos de risco na cidade de Manaus de 2005 a 2008. As ocorrências são de episódios de alagação e deslizamento. A dinâmica das áreas de risco na sociedade urbana Manauara precisa ainda de estudos mais profundos tanto no sentido de entendimento quanto de previsão de impactos. Apesar de não termos um conjunto de dados de anos anteriores e termos somente de três anos e meio o que notamos é que há uma grande fragilidade no corpo urbano de Manaus, prova disso foi o evento de 2007 com prejuízos financeiros, tanto privados quanto públicos (valores ainda não calculados) e danos psicológicos aos moradores afetados. É preciso urgentemente a criação e implementação de um plano de zoneamento e ordenamento urbano que leve em consideração as áreas e seu graus de risco, incluindo a formação de espaços de preservação como elemento do metabolismo urbano (praças, preservação de margens de rios e igarapés, reforma e ampliação da rede de esgotos da cidade) assim como melhoria na coleta de lixo e uma campanha para maior participação dos cidadãos na preservação e relato de eventos às autoridades responsáveis.

Com este inventário preliminar, fundamentado basicamente pelos dados da SEMDEC, esperamos termos contribuído para ações de planejamento e prevenção aos eventos que causam prejuízos sociais, ambientais e econômicos na vida da sociedade manauara. O drama dos desabrigados e afetados neste inventário preliminar não foi analisado, mas essas pessoas devem estar em primeiro lugar no elenco de preocupações das áreas de risco.

Bibliografia

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COSTA, Reinaldo Corrêa et al. Igarapés de Manaus: ocupação, impactos e grau de risco. In: XV Encontro Nacional de Geógrafos. O espaço não pára por uma AGB em movimento. São Paulo, 2008. ISBN: 978-85-98598-61-1.

HERRMANN, Maria Lúcia de Paula (org). Atlas de Desastres Naturais do Estado de Santa Catarina. Florianópolis: IOESC, 2005.

LEONEL, Mauro. A morte social dos rios: conflito, natureza e cultura na Amazônia. São Paulo, SP: IAMA: Editora Perspectiva, 1998.


 

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