Revista: Turydes Revista Turismo y Desarrollo. ISSN 1988-5261


TURISMO COOPERATIVO:
Discussão conceitual e análise qualitativa da cooperativa inter-étnica Cooptur - Cooperativa Paranaense de Turismo

Autores e infomación del artículo

Joélcio G. Soares*

Cicilian L. Löwen Sahr**

Universidade Federal do Paraná, Brasil

joelciosoares@yahoo.com.br

Resumo: O objetivo deste estudo é apresentar uma discussão conceitual sobre turismo cooperativo, uma vez que o termo vem sendo usado de maneira incoerente em diversos estudos da área, na maioria das vezes se referindo a formas de turismo que não apresentam processos cooperativos ou associativos, requisitos mínimos desta tipologia. Aliado a discussão conceitual apresenta-se um exemplo de desenvolvimento turístico cooperativo, organizado por comunidades étnicas situadas na região dos Campos Gerais do Paraná (Brasil). A partir do ano de 2004 estas comunidades se integraram e formaram a Cooptur – Cooperativa Paranaense de Turismo, a qual tem como objetivo organizar a oferta turística e auxiliar na promoção do turismo, tanto intracomunidade como intercomunidades. Esta pesquisa se caracterizou como qualitativa, e teve como procedimentos metodológicos: a) pesquisa bibliográfica com vistas a estruturar a discussão sobre turismo cooperativo; b) pesquisa bibliográfica e documental para levantar dados sobre a Cooptur; c) entrevistas em profundidade nas comunidades étnicas para compreender como é desenvolvido o turismo cooperativo, suas características e resultados alcançados.

Palavras chave: Turismo Cooperativo, Comunidades Étnicas, Cooperativa de Turismo, Paraná.

COOPERATIVE TOURISM:
Conceptual discussion and qualitative analysis of the interethnic cooperative Cooptur -Parana Cooperative of Tourism

Abstract: The article is a contribution to discuss the concept of cooperative tourism, considering that such a terminology appears very diverse in different studies areas. Mostly, it refers to forms of tourism that usually are not perceived as cooperative or associative processes, which should be a minimal requirement for such a terminology. Aligned to this epistemological discussion, it presents a study on cooperative tourism development organized among ethnic communities in the Campos Gerais Region of Paraná, Southern Brazil. Since 2004, these communities have congregated in Cooptur (Parana Cooperative of Tourism), a cooperative created to offer tourism infrastructure and further its promotion, both on an intra- as well inter-communitarian level. The research is qualitative-oriented and includes the following methodological procedures: a) bibliographical research on the debate on cooperative tourism b) bibliographical and documental research on Cooptur data; c) in depth interviews in ethnic communities to understand how cooperative tourism has been developed, what are its characteristics and its outcome.

Key words: Cooperative Tourism; Ethnic Communities; Tourism Cooperative; Paraná

TURISMO COOPERATIVO
Discusión conceptual y análisis cualitativa de la cooperativa inter-étnica Cooptur - Cooperativa Paranaense de Turismo

Resumen: El objetivo de este estudio es presentar una discusión conceptual sobre turismo cooperativo, ya que la terminologia ha sido utilizada de forma incoherente en diversos estudios acerca del tema, en la maioria de las situaciones haciendo referencia a tipologías de turismo que no presentan procesos cooperativos o asociativos. Juntamente a la discusión conceptual es presentado un ejemplo de desarrollo turístico cooperativo, organizado por comunidades étnicas ubicadas en la región de los Campos Gerais del Estado de Paraná (Brasil). Desde el año 2004 estas comunidades han se integrado y creado la Cooptur - Cooperativa Paranaense de Turismo, que tiene como objetivo organizar la oferta turística y ayudar en la promoción del turismo en estas comunidades. Esta investigación se caracteriza como cualitativo, y tuve como procedimientos metodológicos: a) la investigación bibliográfica con el fin de estructurar un debate sobre el turismo cooperativo; b) la investigación bibliográfica y documental para llevantar informaciones sobre la Cooptur; c) entrevistas en profundidad en las comunidades étnicas para entender cómo se ha desarrollado el turismo cooperativo, sus características y resultados.

Palavras Clave: Turismo Cooperativo; Comunidades Étnicas; Cooperativa de Turismo; Paraná.



Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Joélcio G. Soares y Cicilian L. Löwen Sahr (2016): “Turismo cooperativo: Discussão conceitual e análise qualitativa da cooperativa inter-étnica Cooptur - Cooperativa Paranaense de Turismo”, Revista Turydes: Turismo y Desarrollo, n. 20 (junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/turydes/20/cooperativa.html


1. INTRODUÇÃO

Os primeiros movimentos voltados ao desenvolvimento de atividades referentes ao turismo envolvendo organizações cooperativas no Brasil ocorreram na década de 1980. A primeira cooperativa de turismo constituída foi a Coopertur – Cooperativa de Transporte Turístico e Locações e Serviços do Estado de Pernambuco LTDA, em 1988, com o intuito de atuar no ramo de transportes na cidade de Recife-PE. Pouco depois, em 1989, é organizada a Coobrastur – Cooperativa Brasileira de Lazer e Turismo LTDA, com matriz em Porto Alegre-RS, tendo representantes em vários estados do país, atuando como agência de turismo. Nove anos mais tarde, em 1998 seria criada a Cooperativa de Turismo Alternativo, na comunidade de Prainha do Canto Verde, litoral do Ceará, atuando como agência de receptivo (Barroco, 2008).
Em 1999 surge a Coopentur – Cooperativa de Entretenimento e Turismo LTDA, a partir da iniciativa de um grupo de alunos do curso de turismo do então Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco – CEFET-PE. A cooperativa foi organizada a partir de uma necessidade que os alunos tinham de possuir um órgão representativo para atuar no ramo de eventos, que na época era bastante aquecido no estado, tendo em vista defender seus direitos já que havia certa exploração por parte das empresas que os contratavam como free-lance (Machado, 2008).
Já no ano de 2000 é criada a Coodestur – Cooperativa de Formação e Desenvolvimento Turístico, que passa a atuar no mercado turístico, não ofertando produtos turísticos, já que seu objetivo era prestar assessoria a empresas e pessoas que tivessem interesse em desenvolver atividades no ramo do turismo. Com sede em Porto Alegre-RS, esta foi organizada com a finalidade de desenvolver pesquisas, ministrar cursos e formular projetos turísticos, tendo atuação mais eminente no Sul do Brasil (Barroco, 2008).
Ao analisar as atividades das cooperativas supracitadas, observa-se que elas apresentam um viés mais voltado a venda de um determinado serviço, como o de transporte, que poderia se caracterizar como uma cooperativa de tal ramo; agência de receptivo ou de turismo, que não se enquadraria em nenhum dos ramos da OCB; ou ainda com prestação de serviços de apoio em eventos, e também com trabalho de consultoria, cursos e pesquisas; ou seja, nenhuma das cooperativas emergiu em uma comunidade ou região com o objetivo organizar a oferta turística endógena, fomentando ações para organização de um produto turístico. Sendo assim, estas cooperativas quando da sua constituição levaram em seu nome a sigla turismo, porém, sua atuação tem mais um cunho empresarial em uma área específica e não no turismo e seus diversos setores.
Ao se tratar das atividades que envolvem o cooperativismo no Brasil, a OCB – Organização das Cooperativas Brasileiras é o órgão hegemônico. Ao se buscar informações sobre as ações desenvolvidas por tal instituição no que concerne ao turismo, levantou-se que ela passa a tratar com mais atenção ações que envolvem a atividade turística e o cooperativismo somente a partir do ano 2000, quando inclui enquanto um dos ramos do cooperativismo brasileiro o de turismo e lazer. De acordo com Gawlak (2007) este ramo passa a ser composto por “[...] cooperativas que prestam serviços turísticos, artísticos, de entretenimento, de esportes e de hotelaria, ou atendem direta e prioritariamente o seu quadro social nessas áreas. Seu objetivo é criar um fluxo e refluxo permanente de turistas dentro do Sistema Cooperativo” (Gawlak, 2007: 40).
Como se observa na descrição de Gawlak (2007), este ramo seria constituído por cooperativas que tem como objetivo a prestação de serviços que envolvam atividades turísticas e de lazer. O ponto central desta iniciativa seria a promoção de fluxo e refluxo de pessoas dentro do Sistema Cooperativista, ou seja, promover visitações técnicas entre cooperativas de produção/consumo e outras.
Após a instituição por parte da OCB deste novo ramo de cooperativismo, o Sescoop – Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo, entidade que possui ligação direta com a OCB, passou a desenvolver o Programa de Turismo Rural Cooperativo – PTRC, que envolvia o turismo, cooperativismo e associativismo. O Sescoop, ao observar o turismo rural como uma possível atividade para agregar renda complementar em comunidades rurais que apresentassem potencialidades turísticas, “[...] decidiu investir na implementação de um modelo de turismo rural que se caracterizasse pela organização social de seus empreendedores, sob a orientação e supervisão de suas Unidades Estaduais” (Sescoop, 2002: 5-6).
Um dos objetivos centrais de tal programa era fomentar a criação de cooperativas e/ou associações, após capacitar os futuros empreendedores e organizar atrativos e facilidades nas comunidades, como hotéis, restaurantes, cafés e lojas de artesanato. Primeiro organizavam-se as comunidades e/ou região e empreendimentos, para posteriormente criar uma cooperativa ou associação na qual todos poderiam participar, e assim, ter uma instituição gerenciando e fomentando o desenvolvimento turístico, com base numa oferta endógena e particular devido aos traços socioculturais locais/regionais.
Observa-se que as ações do PTRC contrariariam a lógica daquelas empreendidas pelas “cooperativas de turismo” criadas até o ano de 2000, as quais tinham um foco diverso da organização endógena de comunidades e de um turismo cooperativo local e/ou regional, priorizando seu foco na organização empresarial e no lucro a partir de atividades econômicas isoladas.
Sendo assim, o PTRC se apresenta como um marco ao se tratar do turismo cooperativo no Brasil, justamente pela forma apregoada para organização das comunidades e de seus atores locais. A partir das ações do programa a comunidade poderia observar suas possibilidades e, através da ação coletiva dos seus membros, estruturar instituições cooperativas ou associativas visando à organização local, e por meio do trabalho em grupo se fortalecer perante o mercado.
Apesar de tratar sobre este termo - turismo cooperativo / turismo rural cooperativo - o documento que apresenta o PTRC não traz nenhum conceito do que seria tal tipo de turismo. Além disso, através da busca em periódicos da área de turismo, assim como em bancos de dissertações e teses, não se encontrou definição, conceito ou características que envolvessem este tipo de turismo. Há casos como os apresentados por Barbosa (2008) e Santos (2013) – dissertações de mestrado – que levam no título “turismo rural cooperativo” (2008) e “turismo cooperativo” (2013), porém, não é apresentado o que se entende por estes termos, nem por parte dos autores e nem a partir de outros estudiosos que servem de base para fundamentação teórica de tais estudos. Outro trabalho que emprega o termo “turismo cooperativo” é o de Barroco (2008), entretanto, também não apresenta um detalhamento sobre o mesmo. Tais estudos se pautam na organização de cooperativas de turismo.
A OCB (2015: s/p.) faz menção ao termo “turismo cooperativo” na sua página na internet quando trata do ramo de turismo e lazer. De acordo com a instituição o turismo cooperativo “visa organizar as comunidades para disponibilizar o seu potencial turístico, hospedando os turistas e prestando-lhes toda ordem de serviços”. Observa-se que não é uma conceituação do que seria o turismo cooperativo, mas brevemente um dos seus possíveis objetivos.
Apreende-se que, mesmo sem apresentação de um conceito, a denominação turismo cooperativo vem sendo usada de diversas formas, principalmente para se referir a comunidades, empreendimentos e/ou grupos de empresas que atuam em algum ramo da atividade turística, estando ligados de alguma forma a uma instituição cooperativa/associativa.
No entanto, como surgem estas formas de desenvolvimento turístico que em alguns momentos remetem a esta forma de turismo denominado cooperativo? Onde este conceito teria sua gênese?
Com base nestes questionamentos este trabalho tem como objetivo apresentar uma reflexão teórico-conceitual sobre turismo cooperativo, apreendendo sobre a sua abrangência e características. Além disso, é apresentada uma análise qualitativa sobre os resultados apresentados pela Cooptur-Cooperativa Paranaense de Turismo, única instituição oriunda do PTRC, fundada em 2004, que atua, principalmente, em comunidades étnicas situadas na região dos Campos Gerais do Paraná (Figura 1). 

Quanto a estrutura do estudo, primeiramente são apresentados os procedimentos metodológicos da pesquisa. Em seguida ocorre a discussão conceitual sobre turismo cooperativo. Seguindo com o trabalho tem-se a apresentação do exemplo da Cooptur – enquanto instituição que desenvolve ações que versam sobre esta tipologia de turismo – além de uma descrição e análise das ações e resultados alcançados pelas comunidades étnicas que a integram, finalizando o artigo com as considerações finais e referências.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa desenvolvida caracteriza-se como “qualitativa” (Veal, 2011: 149) envolvendo enfoques exploratórios e descritivos. Exploratórios, pelo fato de buscar a partir do levantamento e exploração de bibliografia pertinente, e também por meio de entrevistas, respostas para os questionamentos apresentados nos objetivos da pesquisa; e descritivos, uma vez que os dados e inferências levantadas a partir da exploração, foram descritos sinalizando para as características do fenômeno pesquisado (May, 2004).
Para seu desenvolvimento esta pesquisa foi dividida em três etapas: Na primeira ocorreu a pesquisa bibliográfica a partir de livros e artigos que tratassem sobre temas relevantes para pesquisa, tais como: a) turismo cooperativo; b) turismo e cooperativismo/associativismo; c) turismo de base comunitária; d) Cooperativas de turismo; e e) políticas públicas envolvendo o turismo cooperativo. O intuito deste procedimento foi levantar dados sobre as temáticas para estruturar uma discussão teórica e embasar o trabalho conceitualmente.
Na segunda etapa ocorreu a pesquisa bibliográfica e documental, com objetivo de levantar dados qualitativos sobre a Cooptur, envolvendo sua gênese, características, ações e resultados.
Na terceira etapa ocorreram as “entrevistas em profundidade” (Veal, 2011, p. 271) - com base em roteiro de perguntas pré-determinadas - com membros das comunidades étnicas. Foram entrevistados cinco lideranças envolvendo o turismo das comunidades, sendo estes: um de Carambeí-PR, dois de  Castrolanda no município de Castro-PR, e dois de Witmarsum, situada no município de Palmeira-PR. As entrevistas efetuadas duraram entre duas e três horas, possibilitando o levantamento de uma gama de dados, sobre o desenvolvimento do turismo cooperativo nas comunidades, os resultados intracomunidade e intercomunidade, e o papel da  Cooptur – Cooperativa Paranaense de Turismo, instituição organizada pelas comunidades para gerenciar/organizar a atividade.
A partir da análise qualitativa (Veal, 2011) e cruzamento dos dados levantados nas etapas citadas, foi possível alcançar os objetivos propostos pela pesquisa. Os resultados são apresentados nas seções que seguem, primeiramente a partir da discussão conceitual que é finalizada com uma proposta de conceituação para o turismo cooperativo, e, posteriormente, com apresentação do exemplo de turismo cooperativo a partir da Cooptur, com suas ações nas comunidades e os resultados alcançados.

3. TURISMO COOPERATIVO: DISCUSSÃO CONCEITUAL
Esta seção tem o intuito de discutir sobre a lacuna existente quanto à caracterização do que se entende por turismo cooperativo, sobre suas formas e abrangência, já que, como salientado na introdução deste estudo, diversos estudos que levam muitas vezes no título esta sigla, não apresentam de forma um conceito e/ou peculiaridades sobre tal tipologia. Partindo dessa premissa foi efetuada uma busca na literatura sobre conceitos de turismo que envolvesse comunidades e que tratasse de elementos tais como participação, cooperação, associativismo e desenvolvimento endógeno.
A partir dessa literatura levantada – a qual constitui a discussão desta seção – pôde-se observar a presença de tais elementos quando se trata das “[...] práticas do turismo de base comunitária, também conhecidas como ‘turismo comunitário’, ‘solidário’, entre outras denominações” (Silva, Ramiro & Teixeira, 2009:362), como a de “turismo regional de base comunitária” (Mielke, 2009: 17), ou ainda “turismo responsável” (Reverté & Guix, 2013: 140; Gascón, 2013: 189).
Segundo Gascón (2013: 184) a gênese destas tipologias de turismo supracitadas estaria ligada ao desenvolvimento do que ele denomina como “viagens de ONG”, as quais levavam a princípio o nome de “turismo solidário”. Ao estudar sobre esta tipologia de turismo, o autor toma como recorte o caso espanhol, porém, a abordagem por ele desenvolvida sobre o tema acaba abrangendo a Europa e as Américas. A perspectiva tomada por Gascón (2013) divide o desenvolvimento da atividade em três recortes temporais, tendo início na década de 1980, seguindo nas de 1990 e 2000. 
Ao discorrer sobre os primeiros passos do que hoje se considera por turismo de base comunitária – TBC, Gascón (2013: 184) toma viagens e ações que eram desenvolvidas pelo que ele denomina de “brigadas solidárias”. Tais brigadas eram organizadas por "[...] partidos políticos de esquerda e associações de solidariedade ligadas a lutas revolucionárias que estavam se dando na América Central; especialmente com a então recente vitoriosa revolução sandinista na Nicarágua, e também com os processos insurrecionais da Guatemala e El Salvador. Igualmente o conflito sahariano gerou um movimento de solidariedade que propiciou viagens de apoio político aos acampamentos de refugiados em Amada de Tinduf (Argélia)"
As viagens envolviam grupos de voluntários que se deslocavam com objetivo de desenvolver alguma ação no local visitado, tais como a construção de infraestrutura para ser utilizada pelos membros das comunidades, como escolas, estradas e/ou ainda para trabalho em campanhas educativas. Neste período de vivência e trabalho “o ativismo também dava tempo ao ócio” já que havia um interesse por parte dos ativistas por conhecer o local onde estava se dando determinada ação, através da prática de “um turismo alternativo”. Apesar disso, a motivação central da viagem era, “para as entidades organizadoras, claramente político, quando não explicitamente revolucionário” (Gascón, 2013: 185-186). Esses seriam os movimentos e ações que ocorreriam na década de 1980, se apresentando como a gênese de uma nova forma de turismo.
A partir da década de 1990, o turismo solidário toma um novo foco – mesmo ainda ocorrendo viagens com as mesmas motivações da década anterior – passando a ser “[...] uma ferramenta de sensibilização e de fortalecimento de organizações não-governamentais para o desenvolvimento – ONGD”, tendo em vista os trabalhos desenvolvidos “por países do norte sobre os problemas e a pobreza existentes em países do sul” (Gascón, 2013: 186). Neste momento, a viagem deixa de apresentar objetivos voltados somente ao apoio de movimentos revolucionários, sendo o foco voltado, também, para ações de voluntariado, em vista o fortalecimento e reconhecimento das ONGD.
Já nos anos 2000, o turismo solidário passa a ser visto como ferramenta para cooperação internacional, já que “com o tempo se observou que tais viagens também geravam ingressos econômicos para as organizações, comunidades, grupos de interesse ou pessoas do sul que recebiam os turistas e gerenciavam os espaços turísticos” (Gascón, 2013: 187). Neste sentido, o turismo solidário passa a ser visto também como uma das formas de beneficiar as populações anfitriãs, enquanto fonte de ingresso de divisas, passando a ser denominado de várias formas, como: turismo responsável, turismo comunitário e/ou ainda turismo de base comunitária.
Essa forma de organização para o turismo – devido às proporções tomadas nos anos 2000 – passa a ser observada pelo mercado, que vê possibilidades de ganho tendo em vista a formatação de roteiros e pacotes de turismo solidário/responsável. Gascón (2013) apresenta um trecho do texto de um dos primeiros guias de viagem que foi formatado pela ONG Britânica Turism Concern envolvendo viagens solidárias e alternativas. A descrição, de certa forma, apresenta resumidamente a gênese e desenvolvimento das tipologias de turismo citadas no parágrafo anterior, assim como dispõe sobre seus objetivos. O guia salienta que: "Desde o final dos anos de 1980 apareceram na Europa e na América do Norte organizações que tem como finalidade desenvolver formas de turismo alternativo. Ao mesmo tempo que crescia o número de organizações que formulavam e desenvolviam as condições de um ‘comércio justo’, se iniciava um novo conceito de turismo que não possui um nome definitivo e consensual, que é conhecido como turismo ‘responsável’, ‘comunitário’, ‘ético’ ou ‘solidário’. Todas estas fórmulas pretendem situar em primeiro plano as populações locais como pessoas com as quais estamos preocupados e não como um mero telão de fundo pitoresco envolvendo a experiência de nossas férias, e fazer do turismo uma forma de aproximação e de troca de experiências enriquecedora deixando de lado as diferenças e preconceitos" (Turism Concern, 2005, como citado emGascón, 2013: 188).
Toda essa mobilização que se desenvolve na década de 2000, com um discurso de mercado voltado às comunidades e seu desenvolvimento, constituiu as bases para “a consolidação de modalidades turísticas caracterizadas pelas suas formas de gestão ligadas às populações locais” dentre as quais “o turismo rural comunitário é possivelmente o caso mais exemplar” (Gascón, 2013: 192). Ainda é importante salientar, que, além de consolidar modalidades turísticas que possuíam formas de organização e desenvolvimento endógeno, os caminhos tomados pelo turismo solidário/responsável/comunitário acabaram por envolver estruturas de gerenciamento da atividade, que antes não tinham sido vistas com uma atenção particular, concernentes ao cooperativismo e associativismo.
Apesar de o turismo passar a ser considerado recentemente como uma atividade econômica passível de ser trabalhada por meio de processos de cooperação, e mesmo estando distante de alcançar a conjuntura apresentada por outros ramos do cooperativismo - tais como o agropecuário, o de consumo ou crédito -, pode-se afirmar que o desenvolvimento da atividade turística via o cooperativismo vem tendo êxito, favorecendo comunidades e regiões, sendo que as ações desenvolvidas normalmente acabam por caracterizar formas de turismo de base comunitária ou o turismo rural comunitário (Gascón, 2013; Soares, 2013; Holm, 2015). 
De acordo com Gascón e Pérez (2013: 9) “[...] É indiscutível que o turismo rural comunitário, entendido como um tipo de turismo de pequena escala, estabelecido em zonas rurais e no qual a população local, através de suas estruturas organizativas, exerce um papel significativo em seu controle e gestão”, e que este “[...] é o instrumento mais difundido de cooperação para o desenvolvimento em turismo.
Ao tratar da “relação do turismo com processos de cooperação”, Gascón e Pérez (2013: 9) afirmam que “os modelos de organização da atividade gerados a partir deste relacionamento” se referem àqueles desenvolvidos no “denominado turismo responsável” ou ainda no “turismo rural comunitário (turismo comunitário) e turismo solidário”. Sendo assim, “[...] é bastante comum considerar, quando se fala de cooperação em turismo, que esta forma de organização se refere a projetos de desenvolvimento que envolvem a dimensão local” (Gascón & Pérez, 2013: 11), ou seja, àquela da comunidade/região.
A partir desta discussão, observa-se que o TBC possui uma ligação direta com as formas de desenvolvimento turístico que envolvem elementos oriundos de processos de solidariedade, participação e ajuda mútua, que estão intimamente ligados à ação coletivas e/ou cooperativas. Neste sentido, cabe entender quais são as dimensões e características do TBC, tendo-o como base para alcançar um entendimento e, por fim uma, proposição de conceito de turismo cooperativo.
De acordo com Silva et al (2009: 362), as formas de estruturação, organização e oferta do produto turístico apreendidas como TBC, apresentam “[...] elementos comuns como a busca da construção de um modelo alternativo de desenvolvimento turístico baseado na autogestão, no associativismo e/ou cooperativismo, na valorização da cultura local” tendo como um de seus elemento principais “[...] o protagonismo das comunidades locais, visando à apropriação, por parte destas, dos benefícios advindos do desenvolvimento do setor" (Silva et al, 2009: 362).
Na citação constam alguns elementos centrais que envolvem o TBC, tais como a autogestão, que se refere ao processo endógeno de organização e gerenciamento do turismo pela comunidade; associativismo e/ou cooperativismo se configurando como doutrinas a serem seguidas pensando no desenvolvimento de ações e na organização de instituições; além da valorização da cultura local e do protagonismo das comunidades, ou seja, é desenvolver o turismo da comunidade a partir do que se possui, buscando apresentar um produto local com características intrínsecas àquele contexto.
Maldonado (2009) ao tratar do TBC apresenta elementos que corroboram com a conceituação de Silva et al (2009).Para o autor, esta tipologia de turismo se configura como “[...] toda forma de organização sustentada na propriedade e na autogestão sustentável dos recursos patrimoniais comunitários, de acordo com as práticas de cooperação e equidade no trabalho e na distribuição dos benefícios gerados" (Maldonado, 2009: 31). Novamente observa-se a autogestão e a cooperação como diretrizes, além da distribuição de benefícios oriundos da ação coletiva desenvolvida pela comunidade quando do seu desenvolvimento turístico comunitário.
Um fato que deve ser considerado ao se tratar de formas de desenvolvimento turístico, é que independente do modelo de atividade que seja estruturado, ele pode trazer tanto benefícios como malefícios para a comunidade, dependendo da forma que ocorra sua organização e planejamento envolvendo um determinado espaço. Partindo desta premissa, Irving (2009: 111) salienta que o turismo enquanto atividade econômica “[...] interfere na dinâmica sócio-ambiental de qualquer destino”, e que sendo assim, “[...] o turismo de base comunitária só poderá ser desenvolvido se os protagonistas deste destino forem sujeitos e não objetos do processo”, ou seja, se os rumos da atividade forem organizados e administrados pelos membros das comunidades, onde o sentido de comunitário seja visto numa perspectiva do “[...] sentido de comum, de coletivo”.
Neste sentido, observa-se que o TBC por meio de suas diretrizes, pode assegurar “[...] a participação das pessoas das comunidades” por meio de um “planejamento descentralizado e associativo” sendo encarado também como “[...] um processo de descoberta, quando a comunidade discute o que quer e o que pode fazer para o desenvolvimento das pessoas e do lugar” (Coriolano, 2009: 284-285).
Ao observar os apontamentos dos autores envolvidos nesta discussão sobre o TBC, apreende-se que o ponto central que diferencia este tipo de turismo é justamente seu caráter de forma de organização, planejamento e desenvolvimento da atividade. Não há como enquadrá-lo enquanto uma segmentação no sentido mercadológico – fato similar se comparado com o turismo cooperativo – pois diversas segmentações podem estar incluídas no processo de organização do turismo de base comunitária numa determinada comunidade ou região.
Outro viés é sobre as formas de organização comunitária, via autogestão, assegurando e dando poder aos membros da comunidade enquanto atores do desenvolvimento da atividade, lhes possibilitando a participação a partir de instituições centrais, sejam associativas ou cooperativas. Como salienta Irving (1999: 141), o TBC possibilita a descoberta de “[...] novas formas de construção da realidade baseadas no saber compartilhado, na experiência coletiva, no poder da participação”.
Desta feita, o TBC pode ser visto como uma forma de organização da atividade que, “[...] em tese, favorece a coesão e o laço social e o sentido coletivo de vida em sociedade, e que por esta via, promove a qualidade de vida, o sentido de inclusão, a valorização da cultura local e o sentimento de pertencimento” (Irving, 2009: 111).
Sendo assim, este “turismo, organizado pela cooperação e sinergia entre os atores sociais, produz um valor social agregado intangível” representado pela identidade local e/ ou regional, além de se apresentar como “[...] uma oportunidade de fortalecer as relações entre as pessoas que moram e convivem em uma determinada região”, sendo um veículo de integração regional (Mielke, 2009: 20-21).
A partir dos desdobramentos do conceito e características do TBC, pode-se propor uma conceituação para o turismo cooperativo, refletindo sobre o desenvolvimento do turismo em uma comunidade ou região a partir de iniciativas locais, sem interferência institucional e gerencial externa partindo do poder interno da comunidade de gerir seu próprio desenvolvimento turístico.
Assim, o turismo cooperativo pode ser entendido como prática de organização turística que se desenvolve tendo como instituição central uma cooperativa ou associação, que envolve os interessados no desenvolvimento turístico de uma comunidade ou região, para formatação de um produto endógeno e com características inerentes ao contexto sociocultural e espacial, por meio da autogestão, da ajuda mútua, assegurando a participação dos interessados na promoção do turismo na escala local e/ou regional. Por ser uma forma de organização da atividade, não sendo entendida aqui como uma segmentação no sentido mercadológico, qualquer tipologia que tenha conotação ao mercado pode ser incluída no processo de desenvolvimento turístico cooperativo.
Este entendimento tem uma escala de abrangência que envolve o recorte espacial da comunidade ou de uma região, partindo do potencial endógeno que estes espaços podem apresentar para o turismo. A ideia central parte da premissa de agregar empreendimentos e atrativos visando à formação de um produto turístico. Não se trata, portanto, de atuar em um setor específico da atividade turística, como no caso das cooperativas citadas na introdução deste estudo, que atuavam/atuam em eventos, receptivo ou até como empresa de consultoria, isso não pode ser considerado turismo cooperativo, mas sim uma atividade de prestação de serviços à determinado setor do turismo via uma organização cooperativa com determinada conotação.
Após esta discussão acerca do desenvolvimento de ações que envolveram o turismo e o cooperativismo no Brasil, e de buscar apreender o que seria o turismo cooperativo propondo uma possível conceituação, passa-se agora a apresentação do desenvolvimento do turismo cooperativo em comunidades étnicas situadas na região dos Campos Gerais do Paraná, a partir da Cooptur – Cooperativa Paranaense de Turismo, exemplo que se enquadra na ideia aqui defendida do que seria o turismo cooperativo.

4. O TURISMO COOPERATIVO A PARTIR  DO EXEMPLO DA COOPTUR - COOPERATIVA PARANAENSE DE TURISMO

Após a discussão conceitual sobre turismo cooperativo, passa-se a tratar da Cooptur, considerada a primeira cooperativa de turismo do Brasil. Primeiramente apresenta-se como se deu a criação da Cooptur, sua base conceitual e seu vínculo com o Programa de Turismo Rural Cooperativo - PTRC. Num segundo momento são apresentadas as escalas de cooperação local e regional, tendo em vista as ações desenvolvidas e os resultados intracomunidade e intercomunidades.

4.1 A base conceitual da proposta da Cooptur

A criação da Cooptur está ligada ao desenvolvimento das ações do PTRC no estado do Paraná.  Tal programa foi organizado pelo Sescoop a partir da problemática concernente as dificuldades pelas quais passavam as comunidades rurais de pequeno é médio porte no início dos anos 2000. Como é salientado no documento do PTRC, tais comunidades “[...] estão [estavam] dependendo cada vez mais de agregação de renda externa para a sua viabilização econômica” (Sescoop, 2002: 5).
A partir desta situação apresentada, o Sescoop passa a buscar formas para gerar renda complementar, com vistas a melhorar a situação socioeconômica daqueles que vivem no meio rural.
No início dos anos 2000, o turismo rural já era realidade nas regiões Sul e Sudeste do país, se colocando como atividade promissora. No entanto, nos casos de sucesso, os empreendedores normalmente estavam organizados a partir de uma base local, possuindo “formas de resolução de problemas comuns”, assim como, “meios para organização da oferta turística local”. Esta estrutura de base para o turismo possibilitava que todos angariassem benefícios com a atividade (Sescoop, 2002: 13-15).
Neste sentido o Sescoop desenvolve o PTRC, levando em conta aspectos inerentes a base local, com um programa que teria como escala de aplicação e desenvolvimento pequenas comunidades rurais que apresentassem recursos com possibilidades de serem utilizados via atividade turística. Partindo destas premissas, o objetivo geral do programa se referia a “[...] promover o desenvolvimento de áreas rurais de municípios brasileiros, por meio da implantação de um modelo de gestão e de organização social e da ampliação da oferta turística nestas áreas visando agregar valor à atividade rural e melhorar a qualidade de vida das populações” (Sescoop, 2002: 7-8).
O desenvolvimento das ações derivadas do PTRC se deu em doze municípios-pólo pertencentes a dez estados brasileiros, sendo estes: Minas Gerais, Pernambuco, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Distrito Federal e Alagoas (Paraná Cooperativo, 2002). Como cada estado possuía uma unidade do Sescoop, isso facilitou a aplicação do programa. Contudo, devido à escala de abrangência, se fizeram necessárias algumas parcerias, sendo a principal delas fechada com o então Ministério do Esporte e Turismo, por meio do Convênio 298/2001, que apresentava como objetivo viabilizar a implantação do PTRC nos estados brasileiros (Mielke, Gandara & Serra, 2008).
Os trabalhos do programa no estado do Paraná se iniciaram na Colônia Menonita de Witmarsum, situada no município de Palmeira. Cabe salientar que nesta foi aplicado um projeto piloto no início do ano de 2003. Com o sucesso em Witmarsum, o trabalho teve continuidade em outras comunidades de imigrantes, envolvendo suas cooperativas, sendo estas: Batavo, de Carambei; Castrolanda, de Castro; Capal, de Arapoti; Camp, de Prudentópolis; e Agrária, de Guarapuava. Através dos cursos, palestras e treinamentos, os interessados em organizar empreendimentos de turismo rural de todas essas comunidades, passaram a falar a “mesma língua” no que se refere à atividade. A partir disso, os membros das seis organizações cooperativas agropecuárias começaram a se preparar para a criação de uma cooperativa que tivesse como foco a atividade turística, que como salientado, era um dos propósitos finais do programa (Entre Rios, 2010).
O programa foi desenvolvido durante todo o ano de 2003, sendo finalizado em meados de 2004. Neste mesmo ano, no mês de outubro, as lideranças das comunidades passaram a discutir como seria organizada a cooperativa, quais seus objetivos e seus serviços. Esta foi uma das primeiras discussões onde foi apresentado um estudo de viabilidade de implantação da entidade, envolvendo diversos fatores, sendo que, o resultado da análise foi positivo, ou seja, haviam potencialidades a serem desenvolvidas via uma cooperativa de turismo que integrasse as comunidades de imigrantes objetos do PTRC (Sescoop, 2004).
Após diversas discussões e reuniões, foi criada no dia 17 de dezembro de 2004 a Cooptur – Cooperativa Paranaense de Turismo, “[...] que seria conhecida como a primeira cooperativa de turismo do Brasil, [...] cujos segmentos de turismo comercializados seriam os de Turismo Rural e Turismo de Aventura” (Mielke, Gandara e Serra, 2008: s/p). A formação se deu através da integração das seis cooperativas das comunidades que passaram pelo programa e que por fim iriam constituir a Rota dos Imigrantes (Setti, 2011).
Como pode se observar na Figura 2, a Rota dos Imigrantes seria dividida entre a Rota Eslavo Germânica – Comunidades de Entre Rios (Alemães Suábios), Prudentópolis (Ucranianos) e Witmarsum (Alemães Menonitas) – e Rota Holandesa – Comunidades de Carambei, Castrolanda e Arapoti (Holandeses) (Sescoop, 2004).

O objetivo central da Cooptur era “estruturar e promover o turismo, onde os visitantes entrariam em contato com a cultura, a culinária, o artesanato, o trabalho e as paisagens onde vivem os imigrantes e descendentes de holandeses, ucranianos e alemães” (Setti, 2011: 235). Como a ação final do PTRC era a criação de uma organização cooperativa ou associativa de turismo, o contexto das comunidades ajudou bastante, por estas apresentarem já previamente uma “cultura da cooperação” (Vignati, 2008: 121; Stock & Fernández, 2010: 249).
Quanto às ações do PTRC, pode-se afirmar que estas foram pertinentes ao abordar a escala da comunidade e suas particularidades, já que “a comunidade local tem um papel essencial no desenvolvimento turístico”, sendo “[...] uma das suas estruturas centrais” (Vignati, 2008: 14). Também a articulação entre estas contribuiu, sobremaneira, para o sucesso do programa.
No que se refere à Cooptur, ela vai se apresentar como a primeira cooperativa brasileira que “[...] opera em todos os ramos da cadeia de valor da atividade turística, enquanto que outras cooperativas operam exclusivamente em um ramo específica da atividade (hotelaria, agências de viagens, transporte, consultoria)” (Stock & Fernández, 2010: 245).
Pode-se considerar a Cooptur como um exemplo emblemático ao se pensar na organização de novas cooperativas de turismo. Trabalhando e fomentando atividades envolvendo as comunidades e/ou a regiões e tendo presente os diversos empreendimentos de uma cadeia produtiva de turismo, torna-se possível gerir o turismo com uma visão integral, e não parcial, como se observa nas atividades e ações da maioria das cooperativas de turismo existentes e já discutidas aqui neste estudo.
Esta forma de atuação da Cooptur varia em abrangência, tendo a comunidade e seus empreendimentos como escala local, e a articulação entre as diferentes comunidades, como escala regional. Neste sentido, a subseção que segue trata de apresentar tais escalas e os resultados para o desenvolvimento do turismo alcançados.

4.2 As escalas de cooperação: o local e o regional e seus resultados
Antes de se tratar propriamente das escalas de cooperação e dos resultados oriundos destas, cabe apresentar uma breve situação sobre o contexto inicial dos trabalhos da Cooptur, seus momentos de dificuldades, bem como os caminhos tomados com vistas a melhorar tanto a atuação da cooperativa, como, por consequência, os números referentes à demanda de visitas às comunidades e aos empreendimentos dos cooperados.
No momento em que a Cooptur foi criada, tinha-se como objetivo organizar em cada comunidade objeto do PTRC uma oferta turística que viesse de encontro às características da cultura local, a partir da história, da vivência dos imigrantes e dos seus usos e costumes. Após cada comunidade possuir um produto, a integração regional se faria possível a partir de rotas criadas para unir os elementos de cada local.
Apesar de todas as comunidades se organizarem neste sentido, os resultados esperados não foram alcançados, pois a demanda que passou a visitar tais espaços foi muito abaixo da esperada quando do planejamento e implantação das ações. Esta situação negativa fez os gestores da cooperativa repensarem sobre os objetivos desta e as tipologias de turismo e de produtos turísticos que deveriam ser comercializados.
Até por volta do ano de 2007, tanto a escala local quanto a regional não tinham alcançado, de forma evidente, seus objetivos. Na realidade, cada comunidade permanecia trabalhando com seus empreendimentos, porém, de forma isolada, sem uma integração propriamente dita, a qual dependia da atuação da Cooptur. Essa situação se colocava uma vez que havia dependência da demanda advinda de municípios próximos, como Curitiba e Ponta Grossa, que era pequena. Ou seja, havia necessidade de organizar algo no sentido de não depender somente de visitantes oriundos destes locais.
Foi partindo desse ponto, que a Cooptur passou a alcançar resultados mais positivos. No momento que se tomou a intercooperação, ou seja, a cooperação entre cooperativas enquanto uma de suas práticas centrais - trabalhando também em conjunto com cooperativas agropecuárias, de crédito, de produção e de saúde – que a atividade deslanchou. Cooperativas, tanto situadas no estado do Paraná, como em Santa Catarina, São Paulo e outros estados, passaram a ser vistas como demanda potencial de visitantes. Assim, o mote passou a ser o trabalho com o turismo atraindo cooperados destas cooperativas para visitar e conhecer as cooperativas dos Campos Gerais filiadas a Cooptur.
Esta nova visão envolvendo a intercooperação foi o que fez com que a Cooptur continuasse seus trabalhos e acabasse influenciando - de maneira positiva - no desenvolvimento do turismo intracomunidade, com a venda do produto de cada local, e intercomunidade, pela organização e diversificação de roteiros turísticos e de suas tipologias, não sendo somente voltados aos atrativos étnicos, mas também a outros ramos, como o turismo de aventura nas áreas naturais das comunidades, e o técnico científico envolvendo o know-how das cooperativas.
De toda forma, o caráter étnico das comunidades não foi deixado de ser utilizado enquanto parte do produto turístico, passando a ser um atrativo agregado envolvendo as visitas, representado principalmente por meio da gastronomia típica.
Neste sentido, a ideia da intercooperação fez com que a Cooptur passasse a trabalhar, também, como agência/operadora, buscando grupos para visitarem as cooperativas dos Campos Gerais, e ao mesmo tempo, promovendo ações no sentido de fazer com que grupos destas cooperativas visitadas fossem também a demanda de cooperativas de outras regiões. O intercambio entre cooperativas, via fluxo e refluxo de visitantes, foi o objetivo apregoado pela OCB quando da inclusão do turismo e lazer enquanto ramo do cooperativismo.
A partir destas mudanças, a atuação da Cooptur passou a ser mais eminente, apresentando diversos resultados, que podem ser analisados tendo em vista a escala das comunidades (intracomunidade), bem como a escala regional (intercomunidades).
No âmbito das comunidades a Cooptur teve e tem um papel importante no sentido de ajudar na formatação e organização de empreendimentos, e no gerenciamento da qualidade dos produtos dos cooperados, seja ele um hotel, restaurante, café, ou um equipamento de entretenimento. Como se observa nos Boletins trimestrais da cooperativa que são enviados aos cooperados, a Cooptur aplicou questionários aos grupos de visitantes, levantando pontos fortes e fracos dos locais visitados. A partir da análise destes questionários era repassado um feedback para os empreendimentos no sentido de melhorar seus produtos quanto a qualidade, atendimento, dentre outras variáveis (Cooptur, 2008).
A atuação da Cooptur como organismo que pensa na qualificação constante dos cooperados também é algo que gera frutos nas comunidades. Uma das práticas centrais do cooperativismo, sendo um dos seus princípios, é a educação cooperativa e, neste caso específico, o desenvolvimento de capacitação sobre turismo. Isso faz com que os cooperados se mantenham atualizados sobre tendências do mercado, revendo seus produtos, melhorando a qualidade, e assim, atendendo melhor os clientes.
Além disso, a agregação de novos conhecimentos possibilita a criação de novos produtos em outras linhas da atividade turística, como no ramo de entretenimento, já que, se apresenta como uma forma de manter os visitantes mais tempo nas comunidades, fazendo mais que uma refeição, possibilitando até a geração de um pernoite. Isso possibilita que toda a cadeia produtiva do turismo da comunidade passe a ser mais utilizada, e, ainda, mais diversificada.
Observa-se, assim, que a Cooptur apresenta-se como uma base para os empreendimentos das comunidades, enquanto “instituição robusta com princípios de organização bem estruturados” (Soares & Löwen Sahr 2014: s/p.) e também um órgão consultivo dentro da sua escala de atuação.
Tendo em vista essas ações apresentadas, que geram resultados diretamente na organização das comunidades e de seus empreendimentos, pode-se afirmar que o resultado maior dos trabalhos da Cooptur concerne a demanda que é buscada e agenciada pela cooperativa e enviada para visitar as comunidades para se utilizar dos empreendimentos cooperados. Ou seja, a cooperativa acaba por se apresentar como um elemento central, com a finalidade de organizar os grupos de visitantes/turistas para se deslocarem até as comunidades, já que sem estes não haveria turismo e/ou atividades inerentes ao turismo, pois deles os empreendimentos dependem para se manterem atuantes.
É certo que nem toda demanda que visita estes locais chega via ações da Cooptur, no entanto, é parte significativa e independe de períodos de alta ou baixa temporada. A sazonalidade não atinge as ações da Cooptur como atinge outros produtos, como de sol e praia, por exemplo, uma vez que o principal atrativo tem sido a visitação técnica nas cooperativas de cada comunidade.
No que se refere aos resultados envolvendo a escala regional – intercomunidades, a atuação da Cooptur na organização de roteiros se apresenta como seu principal feito. Após o desenvolvimento de ações com os resultados envolvendo a escala da comunidade, a cooperativa tem em mãos uma série de empreendimentos com produtos diversos, assim como as cooperativas locais para formatar o produto turístico em forma de roteiro promovendo a integração regional.
Os roteiros são divididos entre: a) Rotas culturais com a Rota Holandesa e a Rota Eslavo Germânica; e b) Roteiros de Ecoturismo e Turismo de Aventura desenvolvido nas áreas naturais das comunidades. Tem-se ainda os produtos referentes à imersão em cooperativismo, que podem ser desenvolvidos em mais de uma comunidade, e também, os treinamentos vivenciais em cooperação (Cooptur, 2015).
Outro resultado do trabalho da entidade é o intercâmbio que ocorre de informações entre cooperados de comunidades distintas, como a troca de experiências sobre os setores de atuação no turismo. Isso se apresenta como uma forma de intercooperação entre empreendimentos. Esse processo de intercâmbio ultrapassa a escala das comunidades diretamente envolvidas, uma vez que o processo de intercooperação desenvolvido via Cooptur envolve, como já salientado, cooperativas de diversos estados do país, que vem até as comunidades dos Campos Gerais conhecer as experiências e formas de desenvolver o cooperativismo, e através de uma via de mão dupla, também acabam recebendo os cooperados em suas instituições, exercitando o processo de intercooperação, com a troca de informações e conhecimentos.
Ao observar os trabalhos desenvolvidos pela Cooptur, seja no âmbito local e regional, pode-se apreender que há possibilidade de o turismo ser desenvolvido via organizações associativas/cooperativas mesmo quando envolve diretamente empreendimentos de iniciativa privada. O caso das comunidades étnicas observado na região dos Campos Gerais ilustra de forma concreta esta possibilidade, já que nele a ação coletiva e o cooperativismo, unindo empresas individuais e privadas presentes em várias comunidades, apresenta bons resultados, fazendo com que a atividade turística cresça e se apresente cada vez mais atrativa para os empreendedores e as comunidades, tornando a região cada vez mais conhecida dentro da cadeia produtiva do turismo.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atividade turística pode apresentar contornos diversos em suas formas de desenvolvimento, envolvendo empresas privadas, o poder público e também iniciativas locais/comunitárias. Contudo, na maioria dos casos observam-se organizações privadas trabalhando isoladamente, num regime de concorrência ferrenho, sem buscar parcerias com outros empreendimentos.
Um dos objetivos deste estudo foi justamente discutir sobre formas de desenvolvimento turístico que envolvem processo cooperativos e associativos, que vão contra a lógica do trabalho desenvolvido isoladamente, buscando compreender/apresentar um conceito de turismo cooperativo. Observou-se que sua gênese está ligada a diversas tipologias de turismo que vão se preocupar com o desenvolvimento local, enfocando o poder e ao mesmo tempo as fragilidades das comunidades anfitriãs.
Assim, o turismo cooperativo, a partir deste estudo, pode ser entendido como iniciativas que envolvem propriamente uma integração que sinalize para processos cooperativos, diferente das formas de cooperativas organizadas anteriormente a PTRC, as quais apresentavam foco em uma atividade econômica específica, levando a sigla “cooperativa de turismo”, porém, se constituindo em empreendimentos isolados com atuação em uma atividade particular.
O turismo cooperativo, assim como as cooperativas de turismo, devem apresentar processos integrativos, envolvendo os diversos elementos da cadeia produtiva do turismo, e, se possível, desenvolver-se enfocando comunidades, as quais se apresentarão como o elemento central e diferencial no que se refere a atrativos, pois, seus contextos local e sociocultural tem papel de relevo neste processo. Após o trabalho em comunidades, o processo de desenvolvimento turístico regional por meio de cooperativas passa a ser possível, apresentando-se como alternativa de relevo, pensando na agregação de renda às suas atividades tradicionais de comunidades/regiões.
Como pôde se apreender, nas comunidades étnicas da Região dos Campos Gerais, se tem estas características aqui defendidas ao tratar do turismo cooperativo. Nestas a ação coletiva e o cooperativismo, unindo empresas individuais e privadas presentes em várias comunidades, apresenta bons resultados, fazendo com que a atividade turística cresça e se apresente cada vez mais atrativa para os empreendedores envolvidos.
Porém, esse desenvolvimento turístico não ocorre ao acaso, há ações e condições contextuais que devem ser consideradas.
Como uma das ações pode-se citar a implementação do Programa de Turismo Rural Cooperativo que traz uma nova concepção de organização de empreendimentos para o desenvolvimento do turismo, buscando desmistificar a ideia de que empreendimentos privados estão sempre fadados a desenvolver atividades isolados e envoltos em um processo de concorrência com seus pares.
Já no que concerne às condições contextuais, há que se considerar que as comunidades atingidas pelo programa também tem um papel importante no desenvolvimento deste turismo cooperativo local/regional. Estas comunidades com suas cooperativas de produção apresentaram (e apresentam) uma forma de organização peculiar, envolvendo os trabalhos em grupo e os processos de cooperação, ou seja, um contexto propício para o desenvolvimento de ações coletivas voltadas ao turismo.
Esta pesquisa tem apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes (Bolsa de doutorado), e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq (Financiamento de projeto de pesquisa).

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* Mestre em Gestão do Território pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (Uepg), Ponta Grossa - Brasil e Bacharel em Turismo pela Universidade Estadual do Centro-Oeste, (Unicentro), Irati - Brasil.

** Doutora em Geografia Humana pela Eberhard Karls Universität Tübingen, Alemanha. Mestre em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, (Unesp) São Paulo -Brasil. Bacharelado e Licenciatura em Geografia pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, (Uepg), Ponta Grossa - Brasil.


Recibido: 18/05/2016 Aceptado: 20/06/2016 Publicado: Junio de 2016

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