Eduardo Duarte do Nascimento*
Ricardo Ricci Uvinha **
Universidade de São Paulo, Brasil
eduardo.edn@usp.brResumo: Este estudo tem como objetivo analisar a utilização do Guia Turismo Acessível, um programa do Ministério do Turismo para Pessoas com Deficiência (PcDs), na cidade de São Paulo, localidade apontada por possuir qualidade em sua acessibilidade. Trata-se de uma pesquisa exploratória, predominantemente qualitativa, desenvolvida por meio de método de revisão bibliográfica e análise documental. Para tanto, foram estabelecidas como categorias teóricas os conceitos sobre Pessoas com Deficiência, o segmento do turismo para Pessoas com Deficiência bem como o Programa Turismo Acessível. Os resultados identificam que parece haver pouca adesão ao programa Guia Turismo Acessível no que tange a avaliação das estruturas utilizadas pelos usuários, assim como há dificuldade do programa em gerenciar seus dados, cabendo aprofundamento nos estudos no que concerne ao grau de divulgação dos locais, análise do nível de utilização dos estabelecimentos e as percepções dos usuários acerca da qualidade relacionada aos requisitos de acessibilidade.
Palavras Chave: Turismo, Pessoa com Deficiência, Acessibilidade, Programa Turismo Acessível, Cidade de São Paulo.
PROGRAM ACCESSIBLE TOURISM IN THE CITY OF SÃO PAULO: REFLECTIONS AND POSSIBILITIES.
Abstract: This study aims to analyze the use of Accessible Tourism Guide, a program of the Government of Brazil for Persons with Disabilities, in the city of São Paulo, demonstrated in an investigation as a place with quality in approachability. This is an exploratory, predominantly qualitative research, developed by the method of literature review and analysis of documents. Therefore, were established the concepts and theoretical categories of people with disabilities, the tourism industry and for people with disabilities Accessible Tourism program. The results identify that there seems little adherence to the Accessible Tourism Guide concerning the rating of the structures used by the users and for the difficult program to manage their data’s, which requires further study about the extent of propagation of the places by the parties that manage, analyze the level of utilization rate of the facilities and user perceptions on quality in relation to accessibility requirements.
Keywords: Tourism; Person with Disability – Accessibility - Accessible Tourism Program – City of São Paulo.
PROGRAMA DE TURISMO ACCESIBLE EN LA CIUDAD DE SÃO PAULO: REFLEXIONES Y POSIBILIDADES.
Resumen: Este estudio tiene como objetivo analizar el uso de la Guía de Turismo Accesible del Gobierno de Brasil para las Personas con Discapacidad, en la ciudad de São Paulo, demostrado en una investigación como un lugar con calidad en su accesibilidad. Se trata de una investigación exploratoria, predominantemente cualitativa, desarrollado por el método de revisión de la literatura y por análisis de documentos. Así, se establecieron como categorías teóricas los conceptos de las personas con discapacidad, la industria del turismo para personas con discapacidad y el programa Turismo Accesible. Los resultados identifican que parece que hay poca adherencia a la Guía de Turismo Accesible en cuanto a la evaluación de las estructuras utilizadas por los usuarios, así como para el programa difícil de manejar sus datos, que requiere mayores estudios acerca del grado de divulgación de los sitios por las partes que gestionan, analizar el nivel de utilización de los establecimientos y de las percepciones de los usuarios sobre la calidad en relación con los requisitos de accesibilidad.
Palabras clave; Turismo - Persona con Discapacidad – Accesibilidad - Programa de Turismo Accesible – Ciudad de São Paulo.
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Eduardo Duarte do Nascimento y Ricardo Ricci Uvinha (2016): Programa turismo acessível na cidade de São Paulo: reflexões e possibilidades, Revista Turydes: Turismo y Desarrollo, n. 20 (junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/turydes/20/acessibilidade.html
Na atualidade, segundo dados estatísticos, uma considerável parcela da população mundial possui algum tipo de deficiência e mobilidade reduzida. Este montante tende-se a se estender diante do número crescente de pessoas que entrarão em fase de envelhecimento. Por outro lado é conhecido que distintamente de alguns anos atrás, hoje as Pessoas com Deficiência – PcD estão mais autônomas e atuantes no cenário socioeconômico. Por intermédio de legislações específicas as Pessoas com Deficiência, adquirem maior acessibilidade em estruturas com acesso a produtos e serviços.
As atividades de turismo despontam como opção de inclusão à PcD. No cenário brasileiro o Ministério do Turismo elabora ações e projetos de inclusão para Pessoas com Deficiência tendo como destaque o Programa Turismo Acessível, com sua ferramenta denominada Guia Turismo Acessível, que objetiva o mapeamento, estímulo e fiscalização do turismo acessível (Brasil, 2015a).
Com base nesta perspectiva, há necessidade compreender o histórico acerca das Pessoas com Deficiência e mobilidade reduzida, contemplando as narrativas as quais referem-se à conquista de direitos conforme apontado nos estudos sobre PcD no Brasil que são representados principalmente por Silva (1986), Sassaki (2003a; 2003b), Figueira (2008), Amiralian et al (2000), assim como recomendações propostas pela Organização das Nações Unidas (ONU) (Un 2007; Un 2012; Un 2013), legislações e projetos brasileiros (Brasil 2011; Brasil 2014; Brasil 2015a; Brasil 2015b; Brasil 2015c) e na literatura estrangeira representados por Adams, Bell e Griffin (2007), Gold e Gold (2007) e Liddiard (2015).
Num segundo momento, procura-se entender os conhecimentos que abarcam as atividades turísticas, tendo como base as pesquisas de Trigo (2013), Panosso Netto (2010), Lohmann e Panosso Netto (2012), Krippendorf (2001), bem como a prática do turismo para Pessoas com Deficiência, com Silva e Boia (2006), Faria e Motta (2012), Deville, Jesus e Cruz (2011).
Assim posto, o presente tem como objetivo analisar a utilização do Guia Turismo Acessível, programa do Ministério do Turismo para as Pessoas com Deficiência, na cidade de São Paulo.
O homem, desde sua existência, está passível a nascer com algum mal incapacitante e redutor de sua mobilidade ou desenvolvê-lo ao longo de sua vida de forma temporária ou permanente. Anormalidades corporais ou intelectuais, patologias graves, mutilações de órgãos, malformações congênitas, envelhecimento e, na contemporaneidade, a obesidade, além de outros males, acompanham a raça humana desde tempos primórdios, no ambiente hostil o qual habitavam, ou com as adversidades do mundo moderno atual (Silva, 1986).
A população de deficientes no mundo supera a um bilhão de pessoas, representando cerca de 15% da população, sendo previsto o aumento nestes números devido ao acréscimo de pessoas em fase de envelhecimento (WHO, 2015). No Brasil, de acordo com o último censo realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há uma grande soma de Pessoas com Deficiência e Mobilidade Reduzida, sendo que a deficiência em maior número é a visual 18%, seguido pela motora com 7%, a auditiva 5,1% e por último a deficiência mental e intelectual com 1,4%. Este número tende a aumentar ao longo dos anos, uma vez que quantidade de pessoas em fase de envelhecimento tende a crescer nos próximos anos (Brasil, 2012a).
O Instituto Benjamin Constant, tradicional instituição de cuidados a PcD no Brasil, define que são Pessoas com Deficiência quando as mesmas apresentam diminuições ou perdas de suas estruturas corporais ou funcionalidades anatômicas, fisiológicas, intelectual por um período de tempo ou definitivamente e que sejam insuficientes para realizar atividades que podem ser consideradas normais para o ser humano (Brasil, 2005).
No Estatuto da Pessoa com Deficiência, criado pela Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, é apresentado o conceito de PcD:
Art.2 Considera-se Pessoa com Deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Brasil, 2015c, s/p).
Em estudo voltado para a área da saúde, Amarilian et al.(2000) demonstram que a deficiência pode gerar uma incapacidade ou redução de atuação do indivíduo, causando com isso, alguma desvantagem ao realizar determinadas atividades consideradas normais a outra pessoa. Os autores apresentam uma tabela com os conceitos sobre o significado das deficiências e suas diferenças:
Historicamente, e independente do déficit apresentado, a Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida foi constantemente vista de forma distinta perante aos demais indivíduos. Adams, Bell e Griffin (2007) traçam uma perspectiva histórica sobre a PcD no mundo ao longo do tempo, evidenciando que a tal população era em determinada época tratada como pecadora, possuída pelo demônio, sendo esta torturada, queimada ou deixada para morrer. Não muito distante historicamente, foram consideradas raças indignas, desfortunadas, inferiores em sua genética que não deveriam se proliferar sendo então proibidas de sair em público, assim como esterilizadas para não se reproduzirem tornando-se segregadas e institucionalizadas. Somente após a década de 1970, ainda de acordo com os autores, as PcDs passaram a ter alguns direitos conquistados de forma compassada e, na atualidade, passam a gozar de prerrogativas civis, com uma vida relativamente independente, assegurada pelo acesso a garantias e espaços.
No contexto histórico mundial, houve uma tênue movimentação em prol dos deficientes, como a criação da primeira escola para surdos na Inglaterra em 1760, a inserção do sistema de Braille, acesso a universidades americanas no final dos anos 1800, a prestação de assistência obrigatória à velhice, cegos e crianças com deficiência em 1935, a criação de centros de reabilitação para PcD na década de 1940. Consecutivamente, em meados da década de 1970 e conduzindo até os dias atuais, desenvolve-se significativos progressos com a finalidade da preservação dos direitos e independência das PcD na sociedade (Adams, Bell e Griffin, 2007).
Na conquista de espaços de visibilidade, alguns avanços nessa seara ocorreram com a participação das PcD em eventos desportivos, como o Clube de Esportes para Surdos em Berlim, os Jogos Mundiais para Surdos de 1924 na França e dos Jogos Internacionais de Stoke Mondeville, que foi precursor para a participação das PcD nos jogos olímpicos (Gold; Gold, 2007).
As Olimpíadas dos Deficientes foram realizadas em Roma, no ano de 1960, com um número modesto de países participantes, modalidades e competidores. Porém, no decorrer dos anos, este quadro evolui para uma grande soma de participantes até os dias atuais. Estes eventos tem importante contribuição para destaque e inserção da PcD na coletividade (Freitas; Cidade, 2002). Cabe acrescentar que a Olimpíada dos Deficientes posteriormente teve seu nome alterado para Paraolímpicas e, atualmente, para Paralimpíadas. A última alteração se deu a pedido do Comitê Olímpico Internacional para aproximação do termo com alguns países de língua portuguesa que já o empregam, sendo utilizado amplamente na preparação para tal megaevento esportivo na cidade do Rio de Janeiro em 2016 (Brasil, 2012b).
A Organização das Nações Unidas é sabidamente uma relevante instituição para o fomento de ações que valorizam o ser humano. Com a Declaração dos Direitos Humanos em 1948 amplia-se o olhar para as PcD. Todavia, inicialmente, estes movimentos ocorriam de forma inibida, com ações apenas direcionadas a reabilitação, com ausência de cobranças por legislações específicas. A sinalização de avanços ocorreu, efetivamente, com a Declaração dos Direitos das Pessoas com Deficiência que alertava sobre a necessidade do respeito aos direitos de forma igualitária, independente de sua condição física ou intelectual (UN, 2012).
No campo das conquistas para as PcD, a instituição projeta o ano de 1981 como sendo o Ano Internacional das Pessoas com Deficiência, com o propósito de orientação e conscientização dos governos, empresas e sociedade sobre o papel da PcD na sociedade. Desde então, há uma constante movimentação pelas Nações Unidas através de assembleias, conferências e simpósios com a intenção de promover medidas capazes de dar acessibilidade, autonomia e inclusão às PcD no contexto sócio econômico (UN, 2012).
No campo dos estudos sobre a deficiência, desde a década de 1970 há uma relevante produção de material de pesquisas sobre esta temática com o objetivo de criar políticas sociais para diminuir a exclusão das PcD. Tal produção se sobressai especificamente à área da saúde, promovendo uma discussão transversal com outros campos como lazer, emprego, habitação, cidadania, entre outros. (Shakespeare, 2005).
Com relação ao Brasil, a PcD possuía a condição de afastamento da sociedade dado pelo preconceito e pela ausência de estruturas pertinentes a sua integração no meio social. Figueira (2008), Sassaki (2003a; 2003b) e Silva (1986) estão entre os principais autores que abordam a temática sobre a deficiência com o olhar voltado ao processo histórico das conquistas obtidas em prol da PcD na contemporaneidade.
Sassaki (2003b) destaca uma miríade de atribuições, muitas vezes preconceituosas, atribuídas ao PcD no Brasil, onde comumente se aludia em senso comum a tal população a denominação de “ceguinhos”, “inválidos”, “incapacitados” e “defeituosos”. Num segundo momento, o autor relaciona outros conceitos atribuídos à PcD, principalmente após os anos 1980, como o termo “pessoa portadora de necessidades especiais”, “portadora de deficiência”, “pessoas especiais”, “pessoas com direitos especiais”. De acordo com o autor, as constantes mudanças de nomenclatura, no decorrer do tempo, correspondem aos valores sociais praticados pela sociedade no período correspondente.
Na atualidade, o termo utilizado é Pessoa com Deficiência, sem especificação da deficiência, ou seja, não limita a um determinado tipo. Além deste novo conceito não esconder ou disfarçar a deficiência, chama a atenção para as diversidades de deficiências existentes, servindo como parâmetro para a elaboração de ações que dê garantias de inclusão.
Cabe ressaltar que o termo PcD foi acatado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, realizada no ano de 2007 em Nova Iorque com participação de 192 países, elaborando com isso, o primeiro tratado visando a proteção dos direitos das PcD no mundo. Em seguida, foi reconhecido pela legislação brasileira através do Decreto Legislativo Nº 186 de 2008 (Brasil, 2011).
Desta forma, o órgão CONADE, que tinha como denominação de sua sigla Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, passa a ser intitulado de Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Brasil, 2011). A argumentação gira em torno de que o indivíduo não é portador de uma deficiência e sim que esta faz parte de sua vida, uma vez que a palavra portadora faz alusão que a pessoa transporta a deficiência e que em qualquer momento pode deixar de conduzi-la como se fosse um elemento removível (Sassaki, 2003b).
Em relação às conquistas das PcD no Brasil, as leis elaboradas começaram a vigorar a partir de meados do século XX, assegurando direitos até então não existentes. Estas leis estabeleceram direitos básicos ao PcD, tais como a codificação em Braille para acesso a leitura de pessoas cegas, direito a pensão, gratuidade em determinados tipos de transporte público, prioridade no atendimento, aquisição de veículo de transporte adaptado, entre outros (Brasil, 2015c).
Dentre as políticas em prol da inserção da PcD no contexto socioeconômico e cultural no que refere a acessibilidade, há a promulgação da Lei nº 8.213/91 e atualmente a Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, que estabelece cota para contratação de deficientes em empresas na porcentagem de 2% a 5%, dependendo do número total de funcionários do empreendimento. Tal medida permite uma maior autonomia do PcD, uma vez que o mesmo passa a atuar em duas formas na sociedade: com a sociabilização entre pessoas através do trabalho e por possuir maior liberdade financeira através dos rendimentos oriundos dos seus salários (Brasil, 2015c).
Apesar do avanço da legislação, conquista de direitos e maior inclusão social em diversas esferas como lazer, trabalho e cidadania, há por outro lado ainda o preconceito e o desrespeito das políticas públicas conquistadas no cotidiano das PcD (Liddiard, 2015).
Partindo da conquista de direitos adquiridos pelas PcD, há dois movimentos que podem transformar a realidade do deficiente. De um lado, o indivíduo que possui percepção sobre as diversas possibilidades de inserção social mesmo com sua deficiência por meio da acessibilidade; e, por outro lado, uma gama de serviços a serem oferecidos a este público que podem ser usufruídos.
Faria e Motta (2012) discorrem sobre a PcD como nova consumidora de produtos e serviços, abordando sobre a forma invisível que as empresas consideravam as pessoas deficientes para o consumo até certo tempo atrás. Porém, há um discreto despertar acerca desta temática, tornando válido, do ponto de vista financeiro, acreditar no público deficiente como potencial de consumo no mercado atual.
Para que a PcD possa ter uma participação de forma inclusiva na sociedade, há a indispensabilidade de estruturas acessíveis, livres de barreiras ou impedimentos para o deslocamento e inserção no locais. A acessibilidade deve ser preparada para qualquer individuo, porém para a PcD deve ser imprescindível, para que a mesma se sinta acolhida nos diversos espaços. Na ONU se descreve a acessibilidade da seguinte forma:
A melhor definição de acessibilidade é a oferta ou flexibilização de locais para acolher cada usuário de acordo com suas necessidades. Quando se tratar de pessoas com deficiência, refere-se qualquer local, espaço, serviço ou produto, seja ele físico ou virtual para que seja fácil de, chegar, entrar, sair, ser de fácil interação, compreensão e utilizável por pessoas com deficiências variadas[...] Acessibilidade no contexto das Nações Unidas não é somente um direito inerente as pessoas com deficiência, mas um meio de assegurar que as pessoas com deficiência poderão gozar de todos os seus direitos e liberdades fundamentais e ter poder de participar plenamente na sociedade em condições de igualdade com todos os outros (UN, 2013, p.3, trad.nossa).
Fundamentando-se sobre a relevância da acessibilidade no processo de inclusão da PcD na coletividade, foram elaboradas legislações com a finalidade de conceber infraestruturas que venham a atender as necessidades de acesso a todas as pessoas, independentemente de sua deficiência.
Apoiado em ações internacionais promovidas pela ONU e por instituições voltadas às PcD, elaboraram-se conceitos voltados à acessibilidade das pessoas. A Convenção de Pessoas com Deficiência em Nova Iorque, por exemplo, reafirmou os princípios fundamentais enunciados na Declaração dos Direitos Humanos e concebeu um protocolo com diretrizes para que os governos possam implementar legislações voltadas a melhoria de vida das PcD, com a finalidade da promoção, proteção e a garantia dos direitos dos mesmos (UN, 2007). Neste protocolo, são delineados temas como respeito, igualdade de oportunidades, não discriminação, participação de forma plena e acessibilidade das PcD. Para as Nações Unidas, a acessibilidade é parte fundamental em possibilitar ao deficiente uma vida plena e inclusa no seu meio social de convívio:
A fim de possibilitar às pessoas com deficiência viver de forma independente e participar plenamente de todos os aspectos da vida, os Estados Partes tomarão as medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e comunicação, inclusive aos sistemas e tecnologias da informação e comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso público, tanto na zona urbana como na rural. Essas medidas, que incluirão a identificação e a eliminação de obstáculos e barreiras (UN, 2007, s/p, trad. nossa).
Como entendimento do tema acessibilidade, no Brasil, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (a Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015), no seu artigo 3º, define acessibilidade da seguinte forma:
Acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida (Brasil, 2015c, s/p).
Para que um espaço seja considerado acessível, este deve atender as normas de adaptação do recinto para que se possam receber deficientes. Estas regras são estabelecidas através da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT, que por meio da NBR 9050:2015 padroniza a acessibilidade aos espaços, edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos.
A padronização estabelece critérios e parâmetros para construção, reforma ou adaptação de estruturas e equipamentos urbanos e rurais, para acesso de todos e principalmente Pessoas com Deficiência e mobilidade reduzida. Esta padronização aponta para alguns princípios determinantes para idealização dos espaços de forma que eles possam atender aos critérios contidos nas normas da ABNT (2015) conforme exposto a seguir:
Considera-se como Tecnologia Assistiva a gama de recursos e serviços desenvolvidos com a finalidade na reabilitação, independência, autonomia e liberdade por meio de desenhos de produtos, com interferência visual e estética mínima, porém que garantam uma melhoria na qualidade de vida da PcD (Galvão Filho, 2009).
Não obstante ao cenário descrito, ações em prol da acessibilidade para a PcD se desenvolvem nas estruturas de turismo convertendo os aparelhos turísticos em locais preparados para receber as PcD, fato que será melhor explorado a seguir.
A locomoção entre localidades é uma característica que acompanha o ser humano durante sua existência, quer seja por necessidade de conquistas, fugas ou a busca pelo novo, pelo desconhecido. No que tange ao conceito de turismo, se abordam as movimentações de pessoas que tiveram início desde os primórdios históricos, através de viagens em busca de admiração ao mundo e ao desconhecido com a emoção de ser aventurar na descoberta do novo, assim como o estreitamento das relações sociais entre as pessoas, o que continua sendo replicado nos dias atuais (Trigo, 2013).
Os princípios desejáveis que devem subsistir para uma boa experiência no turismo estão relacionados à igualdade entre as relações humanas; ao interesse do poder público na garantia dos direitos; ao respeito e à ética, envolvendo o profissional do turismo; a satisfação pessoal na busca pelo prazer e, finalmente, a vontade espontânea, em se realizar a atividade (Panosso Netto, 2010).
Lohmann e Panosso Netto (2012) expõem os fatores motivadores para uma viagem turística, em que se destacam a necessidade de descanso, a procura por conhecer distintos grupos de pessoas e culturas e um certo status que se produz pelo conhecimento dos mais diversos locais.
Sobre a disposição do ser humano em viajar, dados do Ministério do Turismo, em pesquisa realizada no mês de julho de 2015, identificaram que no Brasil 73,3% das pessoas entrevistadas almejavam fazer algum tipo de viagem no ano de 2015, um aumento de 3% em relação ao ano anterior. A tendência de acréscimo nas viagens nacionais, em detrimento às internacionais, são refletidas, entre outros, pela desvalorização do real no cenário econômico mundial no ano de 2015 (Brasil, 2015b).
Na contemporaneidade, fatores como facilidade de deslocamentos, ofertas constantes veiculadas pela mídia, aumento do poder aquisitivo, visita a amigos e parentes, auxiliam no seccionamento de grupos por interesse da prática do turismo constituindo uma certa segmentação da atividade turística. O segmento de turismo para PcD desponta como uma demanda, cada vez mais frequente, que busca experiências turísticas calcadas na oferta de acessibilidade e de inclusão (Panosso Netto; Ansarah, 2009).
Transportando estes conceitos do turismo mencionados para Pessoas com Deficiência ou mobilidade reduzida, há um entendimento de que os mesmos anseiam por produtos e serviços turísticos de inclusão, turismo acessível, adaptados ou de acessibilidade para seu usufruto que são as diversas formas que denominam o turismo para Pessoas com Deficiência no Brasil. A nomenclatura utilizada neste trabalho será o de turismo acessível, uma vez que esta é a termologia utilizada pelo Ministério do Turismo através do programa Turismo Acessível, objeto de estudo desta pesquisa.
A participação atual da PcD na atividade turística reporta-se aos diversos benefícios conquistados pelos mesmos que permitiram uma atuação por meio da inclusão em vários setores da sociedade, quer seja por intermédio da maior acessibilidade na redução das barreiras existentes em estruturas físicas e sociais ou pelo acesso a uma maior renda financeira fomentada em aposentadorias ou proventos quando exercendo atividade remunerada. Este cenário oportunizou à PcD uma atuação como consumidor de produtos e serviços até então distante de sua realidade.
Em se tratando do PcD como consumidor, uma pesquisa sobre o poder de compra de tal população nos Estados Unidos da América identifica que investir em empreendimentos voltados a oferta de produto para este grupo é notavelmente rentável, uma vez que se trata de um público com aspiração para adquirir produtos. No entanto, também se identifica um despreparo naquele país nas estruturas de oferta de bens e serviços adaptados. Os dados ainda reforçam um crescente desejo das PcD em viajar e frequentar restaurantes em sua atividade de lazer nos próximos anos (USA, 2005).
Corroborando tais dados, Westcott se refere à documento temático ao turismo publicado pela Comunidade Europeia em que se retrata que acessibilidade não se resume somente à oferta de equipamentos como cadeira de rodas, mas sim à facilidade que qualquer indivíduo tem de adentrar e utilizar os locais públicos e privados com autonomia e independência. Isto significaria que as PcD, entre elas as pessoas com deficiência física, poderiam transitar com autossuficiência nos mais diversos espaços. Num segundo momento, o documento faz menção à necessidade de investimentos de forma diversificada neste campo, pois são inúmeras as necessidades peculiares à acessibilidade, dependendo do tipo e grau de deficiência para tornar o turismo praticável às PcD. A autora conclui que este é, definitivamente, um nicho de mercado em ascensão pois os clientes seriam fiéis aos locais que fornecem uma boa acessibilidade (Westcott, 2004).
No cenário de produtos e serviços para PcD, o mercado de turismo surge como uma proposta de atender a tais “especiais” consumidores. A segmentação de turismo para PcD, denominado de turismo adaptado ou turismo de acessibilidade, busca estabelecer a acessibilidade no turismo e promover a inserção social para um determinado grupo da sociedade. Esta tipologia de turismo foca as pessoas com incapacidade definitiva ou transitiva como cegos, surdos, cadeirantes, entre outros (Devile; Jesus; Cruz, 2011).
Krippendorf (2001) propõe que a atividade turística precisa ser mais humanizada, respeitando o indivíduo, assim como atendendo-o em todas as esferas sociais com espaços e equipes treinadas que sejam capazes de se adaptarem às necessidades das pessoas. Tais recomendações orientam os indivíduos para uma experiência turística de melhor qualidade e que pode, evidentemente, ser transportada para o contexto da atividade turística voltada para a PcD, dado o conjunto de recursos que tal população requer quando numa atividade de turismo.
Para Silva e Boia (2006) há a necessidade de oferta de uma atividade turística de forma inclusiva, que venha a atender de forma mais ampla as minorias, (incluindo as PcD), normalmente afastadas desta prática, desenvencilhando-se de um turismo com enfoque puramente econômico.
O turismo para a PcD no mundo se desenvolve especialmente pelo avanço de ações promovidas pela ONU. Por intermédio de suas campanhas voltadas aos direitos do PcD, concebeu-se o apropriado alicerce para que sua agência, a Organização Mundial do Turismo (OMT), implementasse uma série de resoluções e recomendações. Entre elas, destaca-se a intitulada “Criando Oportunidades de Turismo para Pessoas com Deficiência” nos anos 1990; a “Recomendações sobre o Turismo Acessível para Todos”, de 2005; a “Declaração sobre a Otimização das Viagens de Turismo”, de 2009; o “Relatório sobre o Comitê Mundial de Ética do Turismo: Turismo Acessível para Todos”, de 2011; o “Relatório sobre o Comitê Mundial de Ética do Turismo: Recomendações sobre Turismo Acessível”, de 2013, entre outros relevantes documentos temáticos (UNWTO, 2014).
A tipologia de turismo para a PcD e de mobilidade reduzida também tem sido referenciada nos conceitos expressos no segmento de Turismo Social, este que tem como base a oferta de viagens mais acessíveis para um número maior de pessoas e inserindo o indivíduo na atividade turística de forma plena, democrática e inclusiva promovendo a qualidade de vida de forma coletiva e sem discriminação (Falcão, 2006).
O governo brasileiro, acompanhando o processo de desenvolvimento do turismo acessível e amparado pela Constituição de 1998 que estabelece garantias à PcD, concebeu alicerce para que, na Lei Geral do Turismo de 2008 em seu artigo 6º, parágrafo V, se contemplasse a inclusão da atividade turística para tal população:
A incorporação de segmentos especiais de demanda ao mercado interno, em especial os idosos, os jovens e as pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, pelo incentivo a programas de descontos e facilitação de deslocamentos, hospedagem e fruição dos produtos turísticos em geral e campanhas institucionais de promoção (Brasil, 2014, s/p).
No Brasil, verifica-se que o turismo para PcD, seja ele denominado como “turismo adaptado”, “turismo de inclusão” ou “turismo de acessibilidade”, ainda se apresenta de forma tímida e com escassas opções de sua prática. Para ilustrar este conceito, uma pesquisa realizada para conhecer o perfil do turista com deficiência foi realizada pelo Ministério do Turismo em 2013, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre, por intermédio de entrevistas apresentadas na tabela a seguir:
A mencionada pesquisa identifica a existência de um grupo de pessoas que, semelhante a outros segmentos do turismo, buscam a integração no meio social por meio da atividade turística, tendo como proposta o turismo como uma prática em que não haja a separação do coletivo. Procura-se priorizar, dessa forma, a inclusão pela atividade turística, utilizando-se de locais devidamente preparados para receber a PcD. Estes dados mostram uma realidade distinta do passado onde as viagens de PcD eram geralmente organizadas por meio de excursões de pequenas distâncias, voltadas somente à grupos de pessoas geralmente com o mesmo tipo de deficiência (Sassaki, 2003a).
Defende-se aqui que o Estado possui um papel fundamental para o fomento da atividade turística para a PcD por meio de legislações que refletem em resultados práticos para o desenvolvimento de atividades turísticas para tal segmento no Brasil. Com base na Lei Geral do Turismo de 2008 e no Plano Nacional do Turismo, 2007- 2010 e 2013-2016, entende-se que houve um aprimoramento da atividade turística para tal população em âmbito nacional, criando grupos de pesquisa e ações oriundas de órgãos públicos e sociedade civil influenciando por uma oferta turística que venha a beneficiar a viagem para a PcD. Neste âmbito, se circunscreve, por exemplo, o programa Turismo Acessível desenvolvido pelo governo federal, iniciativa que será analisada a seguir (Brasil, 2013).
Acompanhando uma tendência mundial na contemporaneidade de participação e inclusão das PcD na atividade turística foi elaborado, pelo Ministério do Turismo em 2012, o programa Turismo Acessível, com metas bianuais.
O programa possui seis eixos de atuação rumo ao desenvolvimento do turismo para PcD sendo: a) o estudo e estímulo de novas pesquisas norteadoras para projetos de instituições públicas e privadas; b) a melhoria da qualidade dos serviços oferecidos no turismo no que tange a acessibilidade como capacitação de pessoas e aumento de produtos e serviços voltados à PcD; c) informações turísticas sobre atrativos, utilizando-se de mídia e tecnologia; d) apoio às obras de infraestruturas, orientando-as para a acessibilidade; e) comercialização dos destinos adaptados no Brasil e internacionalmente; e, f) incentivo de empregabilidade para a PcD no campo do turismo. O programa busca, com estas ações, beneficiar as atividades turísticas para a PcD assim como todos os atores direta ou indiretamente envolvidos (Brasil, 2014).
No que concerne aos setores envolvidos no programa Turismo Acessível, é possível identificar o envolvimento de órgãos públicos (como Ministério do Turismo, órgãos estaduais e municipais) e entidades sem fins lucrativos, sendo esperado destes uma atuação na implementação, no acompanhamento e na legislação do programa bem como na formação de parcerias com instituições voltadas a PcD.
Em se tratando da iniciativa privada, a mesma se ampara na legislação disponível para tornar seu estabelecimento acessível e com qualidade nos serviços e produtos oferecidos. Cabe ao turista, deficiente ou não, um papel não menos importante como o de divulgar, fiscalizar e denunciar ações que vão ao encontro com as diretrizes do plano.
É esperada também do turista uma efetiva participação no desenvolvimento do programa, por meio de avaliações constantes sobre os estabelecimentos cadastrados com estruturas e/ou recursos acessíveis. Tal avaliação pode ser realizada tanto por sítio específico na internet www.turismoacessivel.com.br como por aplicativo a ser utilizado em telefones celulares (Brasil, 2013).
Como orientação dos procedimentos para a participação do programa Turismo Acessível, há vasto material abrangendo a legislação pertinente, assim como as diretrizes orientadoras para que os locais sejam acessíveis, adaptados ou adequados à acessibilidade para atividades voltadas a hospedagem, alimentação, eventos e lazer, museus e atrativos históricos, parques e zoológicos, praias, compras e serviços turísticos (Brasil, 2014).
Em relação à operação do programa, há a formulação de um guia online, denominado Guia Turismo Acessível, de modo que tanto o administrador do atrativo como seus usuários podem elaborar um banco de dados com as características do local no que tange aos recursos voltados à acessibilidade. O responsável pelo estabelecimento realiza o cadastro por meio da internet informando o conjunto de recursos disponíveis para a garantia da acessibilidade para as mais diversas deficiências. Recebe, a partir de então, material de propaganda e sinalização especifica para cada deficiência na qual o local possui os recursos correspondentes (Brasil, 2015a)
Já para o usuário, após o seu cadastro pessoal no sitio de internet, visualizam-se opções para o local a qual deseja avaliar através dos seguintes denominadores: cidade, tipo de estabelecimento ou atrativo turístico. Selecionada a instalação que será avaliada, é necessário responder as perguntas sobre a disponibilidade de recursos pertinentes para cada deficiência: física, motora, visual, auditiva e de mobilidade reduzida, indicadas por meio de símbolo internacional de facilidades voltadas para cada deficiência. No total são 48 perguntas, sendo 28 para recursos de acessibilidade física, 26 para recursos de acessibilidade visual, 09 para recursos de acessibilidade auditiva e 15 para recursos de pessoas com mobilidade reduzida. Como opções de respostas há: SIM, o local tem o recurso; NÃO, o local não tem o recurso; ou, PULAR a pergunta, sendo esta última resposta não computada na contagem de pontos. Para processamento dos dados, o cálculo é realizado utilizando somente as respostas positivas e negativas mencionadas. O número de respostas SIM deve ser superior ao NÃO para que o estabelecimento seja positivado no recurso em análise. Se o total de NÃO for maior que SIM, o local não possui o recurso que foi analisado (negativado). Se for um resultado ZERO, o recurso fica em branco (Brasil, 2015a).
Ainda no programa Guia Acessível de Turismo é possível atribuir uma nota ao local de 0 a 10 pontos. Estas notas são realizadas de acordo com as avaliações positivas (SIM) dos usuários e diz respeito à quantidade de recursos oferecidos pelo estabelecimento em relação ao que a legislação recomenda que o local ofereça aos seus utilizadores, calculada a partir da seguinte fórmula: Nota = total existente / total possível x 10. Exemplificando: um local oferece 12 recursos e a legislação pede que este local tenha 22 recursos, realizando o cálculo: 12 / 22 x 10= o local teria nota 6 em relação aos recursos de acessibilidade. Segundo seus gestores, o programa de acessibilidade ao turismo possui como premissa mapear, calcular a eficácia, motivar gestores e turistas sobre acessibilidade além e fiscalizar os locais ligados à atividade turística, de modo que seja utilizado como guia de consulta (Brasil, 2015a).
Em relação aos procedimentos metodológicos, trata-se de uma pesquisa predominantemente qualitativa, valendo-se de levantamento bibliográfico utilizando como descritores: Pessoa com Deficiência, Turismo, Turismo Acessível. Combinou-se o levantamento bibliográfico com uma análise documental do programa brasileiro intitulado Turismo Acessível.
Veal (2011) destaca que a técnica de levantamento bibliográfico é considerada uma etapa fundamental para a pesquisa uma vez que aprofunda conhecimentos sobre determinado tema a ser abordado através de dados já existentes. Tais dados seriam assim avaliados, organizados, selecionados e comparados enquanto se transporta conhecimentos para a pesquisa procurando não se distanciar do tema.
Já a análise documental possui elevada importância uma vez que permite a averiguação sobre um vasto número de informações dispostas em diversas fontes de buscas, porém estas informações necessitam ser triadas pela sua qualidade e aplicabilidade com o propósito da investigação (Laville; Dionne, 1999). Neste âmbito, a busca de informações para a analise documental foram realizadas por meio de acesso ao sítio na internet do Guia Programa Turismo Acessível (Brasil, 2015a), sendo realizado um cadastro para que se pudesse ter amplo acesso a todas as informações.
Na página da internet, no campo “explore locais adaptados”, foi inserido o nome da cidade a qual seria pesquisada. No campo “tipo de estabelecimento ou atração turística” (hospedagem, alimentação, eventos e lazer, museus e atrativos históricos, parques e zoológicos, praias, compras e serviços turísticos) foram realizadas inserções separadamente para que se tivesse acesso às informações individualizadas de cada atrativo. Foram selecionados todos os tipos de deficiências disponíveis para obter os dados referentes ao total de lugares cadastrados e para averiguar o total de locais avaliados na cidade pesquisada.
Na verificação dos locais avaliados pelos recursos da deficiência (auditiva, físico motora, visual e mobilidade reduzida) foram selecionados os itens pertinentes para cada recurso individualmente e realizada a pesquisa. Um ponto a ser ressaltado é que o campo total dos locais avaliados não exprime necessariamente a somatória da avaliação dos recursos oferecidos uma vez que os mesmos podem ser repetidos na mesma avaliação.
Sabidamente, na cidade de São Paulo, desenvolve-se uma gama de opções de turismo voltado a negócios, entretenimento e cultura. Segundo dados do website Visite São Paulo, se desenvolve um evento a cada 6 minutos e a cidade recebeu 15,08 milhões de turistas em 2014. A prefeitura dispõe de um website com mapas e informações sobre o turismo de acessibilidade na metrópole com oferta de museus, cinemas, centros culturais, teatros, casas de espetáculos e bibliotecas. Além disso, a cidade foi apontada em pesquisa realizada sobre o perfil do turista deficiente como a segunda com maior qualidade de acessibilidade pelos entrevistados (São Paulo, 2014).
Com base nestes fatos, foi realizada uma investigação dos dados sobre turismo para a PcD na cidade de São Paulo por meio do programa Guia Turismo Acessível, conforme disposto na tabela 4:
A tabela disposta acima apresenta os números que envolvem a utilização do programa Guia Turismo Acessível do Ministério do Turismo. Foram encontrados 310 estabelecimentos cadastrados no município de São Paulo, sendo que destes 10 estabelecimentos foram avaliados pelos usuários.
Sobre o item “Mapeamento dos atrativos turísticos para PcD”, durante a pesquisa foram verificados que estão cadastradas na cidade de São Paulo 12 praias, achado que se mostrou um tanto contraditório uma vez que a cidade não possui tal opção de atrativo. Outro ponto relevante refere-se a locais cadastrados como estabelecimentos ou atrações turísticas com recursos para a PcD, mas possuem endereços incompletos ou com entendimento confuso denotando ser um endereço residencial dada referência a número de apartamento.
Dentre os cadastrados, verificou-se que não se obedece muitas vezes aos critérios de acordo com tipo de estabelecimento ou atrativo turístico, uma vez que há uma grande diversidade de estabelecimentos intitulados como local de jardinagem, oficinas de automóveis, templos religiosos, cafeterias, padarias, estacionamentos, entre outros. O mesmo ocorre com outras modalidades de estabelecimentos ou atrativos.
Ao analisar o contexto do que se tem produzido acerca das pessoas com deficiência, é possível identificar um momento de transição cujo existe uma busca por inclusão, tendo como coadjuvante ações voltadas à acessibilidade. Este processo resulta numa maior autonomia que oportuniza garantias financeiras, possibilitando o reconhecimento das PcD como consumidores de produtos e serviços destacando os voltados à atividade turística.
Como verificado, a acessibilidade tem papel fundamental na inclusão de pessoas com deficiência na atividade de turismo. Em relação a São Paulo, os dados sugerem que a cidade estaria posicionada em segundo lugar em relação às cidades que possuem melhores condições de acessibilidade, evidenciado pela oferta de atrativos turísticos e estabelecimentos acessíveis disponibilizado pela prefeitura da cidade. No entanto, no que tange ao item “mapeamento dos atrativos turísticos e estabelecimentos com oferta de recursos para pessoas com deficiência”, o guia online do programa do governo federal demonstra incapacidade em gerenciar o cadastro dos locais, uma vez que há estabelecimentos cadastrados que não condizem com as atrações de turismo da cidade ou não são considerados locais de acesso público. Tal situação, a nosso ver, favorece a pouca adesão pelas PcD, levando à dificuldade no reconhecimento de instituições cadastradas pelos gestores e/ou avaliadas pelos usuários do programa.
Os dados abordados nesta pesquisa podem ser utilizados como apoio para questionamentos pertinentes sobre a eficiência das políticas públicas brasileiras voltadas a PcD no campo do turismo, com ênfase na preocupação sobre a qualidade das estruturas acessíveis concebidas na cidade para tal população.
Por se tratar de uma pesquisa com base em dados secundários, há necessidade de aprofundamento de estudos sobre o grau de divulgação dos locais pelas partes gestoras, analisando o nível de utilização dos estabelecimentos e as percepções de qualidade dos usuários em termos de acessibilidade.
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** Professor Livre-docente do Programa de Pós-Graduação em Turismo da Universidade de São Paulo. Líder do Grupo Interdisciplinar de Estudos do Lazer GIEL/USP. Contato: uvinha@usp.br
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