ómeno turístico existe, sobretudo, desde a Idade Clássica. Como fazem notar Silva e Kemp (2008:2, citando Ignarra, 2003), “o fenômeno turístico está relacionado com as viagens, a visita a um local diverso do da residência das pessoas. Assim, em termos históricos, ele teve início quando o homem deixou de ser sedentário e passou a viajar, principalmente motivado pela necessidade de comércio com outros povos. É aceitável, portanto, admitir que o turismo de negócios antecedeu o de lazer. (...) Era também econômica a motivação para grandes viagens exploratórias dos povos antigos, que buscavam conhecer novas terras para sua ocupação e posterior exploração. Dessa maneira, o turismo de aventura data de milênios antes de Cristo”.
Porém, o aumento significativo das práticas turísticas resulta, nos anos 50/60 (século XX), do crescimento económico, da evolução e melhoria das condições de vida das populações, do progresso registado no domínio dos meios de transporte e, de certa forma, da diminuição dos custos das viagens, que impulsionaram a expansão do turismo. A própria “separação, cada vez maior, entre tempo de trabalho e tempo livre e simultaneamente a institucionalização das férias pagas” contribuíram decisivamente para que um número cada vez maior de pessoas viaje (Cravidão e Cunha, 1991:205). Todos os fatores referidos anteriormente, em associação com outros, criaram condições favoráveis a uma massificação do turismo, sendo os destinos de “sol e praia” aqueles que foram, maioritariamente, alvo dessa procura massificada. Como refere Cavaco (2006:327), o “conceito de turismo de massa é aliás um conceito novo, que surge nos anos 50 e 60. A dinâmica do mercado de turismo tende a tocar o conjunto da sociedade solvente, sem distinção de classe (…)”.
É, assim, neste contexto de crescimento exponencial do turismo vivido desde meados do século passado, que surge a necessidade de o definir e de caracterizar este fenómeno. A Organização Mundial do Turismo apresenta uma das muitas definições de turismo, apontando o turismo como, “um fenómeno social, cultural e económico que envolve o movimento de pessoas para países ou locais fora de seu ambiente habitual para fins pessoais ou de negócios/profissional. Essas pessoas são chamadas de visitantes (que podem ser turistas ou excursionistas; residentes ou não residentes) e o turismo diz respeito às suas atividades” (OMT, 2007).
Numa outra versão complementar, a mesma organização, salienta que “o turismo tem um impacto sobre a economia, o ambiente natural, e o ambiente construído, a população local nos lugares visitados e os próprios visitantes. Devido a esses vários impactos, a gama e variedade de insumos necessários para se produzir os bens e serviços adquiridos pelos visitantes e atores envolvidos ou afetados pelo turismo é necessário adotar uma abordagem holística para a gestão, desenvolvimento, e supervisão do turismo. Esta abordagem é altamente recomendada, com vista à formulação e implementação de políticas de turismo nacionais e locais, bem como os acordos internacionais e outros processos no domínio do turismo” (Assis e Lima; 2014:291, citando OMT, 2013).
A massificação do turismo e o número elevado de turistas a eleger o destino “sol e praia”, conduziu no início dos anos 80, a novas tendências, numa fase em que o turista se sobrepõe às tendências da oferta, sendo que “o comportamento da procura é menos racional e menos previsível” (Cavaco, 2006:341). Desde então, “o factor qualidade é extremamente importante e é, de certa forma, imperante, isto porque, o consumidor é muito mais selectivo do que no turismo de massa; é também mais consciente e mais exigente; nesta fase são os produtos que se adaptam aos gostos dos turistas/consumidores e não os turistas que se subordinam aos produtos” (Cunha, 1997:20).
É um turista muito mais exigente e rigoroso, e que considera fundamental a satisfação das suas necessidades.
Contrariando a massificação
1 , este novo conceito de turismo oferece cultura, tradição, património material e imaterial, “um tratamento personalizado caseiro, artesanal, familiar, hospitaleiro, que inclui comida da avó, pães artesanais, cerveja e vinho caseiros, casa restauradas, tecidos naturais, ciclismo” (Rodrigues, 2006:250), que remete para um passado distante, onde o ritmo alucinante das grandes metrópoles não existia.
Além da nova exigência e da melhoria da qualidade dos produtos e serviços oferecidos ao turista, nas últimas décadas, têm surgido as preocupações ambientais, pela influência do debate crescente em torno das alterações climáticas, do aquecimento global, do consumo excessivo de recursos naturais não renováveis. Neste contexto, em oposição ao perfil do turista padrão (Fennel & Dowling, 2003), emerge um “novo turista” (Poon, 1993) que seleciona o seu destino de férias com base em critérios ambientais e sociais.
Surgem, desta forma, novos conceitos de turismo, e uma nova segmentação turística, sendo esta entendida como uma forma de organizar o turismo nos domínios do planeamento, gestão e mercado, estabelecidos a partir dos elementos da oferta e também das características e variáveis da procura.
No quadro de desenvolvimento das práticas sustentáveis de turismo, nos últimos anos, tem surgido um domínio muito particular, em crescimento, e com cada vez mais adeptos, o ecoturismo, numa oposição clara às ofertas
standard do turismo convencional, a que é preciso acrescentar o desenvolvimento do paradigma ecológico e ainda a comercialização do “eco” e da “natureza”, assumidos, assim, como bens de consumo.
A literatura científica da especialidade revela um conjunto significativo de definições, quer de âmbito académico, quer de escopo institucional, que refletem significados diversos bem como interesses e objetivos próprios, embora seja evidente que “o ecoturismo representa uma procura pelas viagens à natureza com objectivo de se informar a respeito dos ecossistemas visitados e dos aspectos culturais das comunidades locais, proporcionando, ao mesmo tempo, oportunidades económicas que colaboram para a conservação e a preservação do meio ambiente” (Souza, 2006:51-52).
Vejamos alguns exemplos.
Weaver (2005) utiliza três critérios para classificar um produto de ecoturismo, a saber: “(1) ser baseado na natureza; (2) estar focado na promoção de oportunidades de aprendizagem; e (3) ser gerido de forma a maximizar os resultados sobre a sustentabilidade ambiental e sociocultural, onde se inclui os benefícios para as comunidades autóctones. Ainda, segundo Weaver (2005), a definição de ecoturismo aviva a importância de o associar às atrações culturais. A oportunidade de aprender e de experimentar é o critério que melhor diferencia o ecoturismo de outros produtos turísticos baseados na natureza, todos eles fundamentados no ambiente natural mas com motivações tão díspares como, por exemplo, o relaxamento, o prazer e a procura de emoções fortes” (Freitas, 2012:14).
Para Fennel (2008:24), o “ecoturismo
2 é uma forma sustentável, não-invasiva de turismo baseado na natureza que se concentra principalmente na aprendizagem sobre a natureza e que é eticamente gerido para ter um reduzido impacto e localmente orientado (controle, benefícios e escala). Normalmente ocorre em áreas naturais e deve contribuir para a conservação dessas áreas”.
O seu crescimento é “consequência da insatisfação com as formas convencionais de turismo que ignoraram, num sentido geral, elementos sociais e ecológicos dos destinos a favor de abordagens mais antropocêntricas e centradas nos produtos de turismo” (Fennel, 2008:17).
Ainda de acordo com Fennel (2008:22), “a Declaração de Quebec (UNEP/WTO 2002), a penúltima reunião no âmbito do Ano Internacional do Ecoturismo (2002), sugeriu que cinco critérios distintos devem ser usados para definir ecoturismo, ou seja: produto baseado na natureza, mínimo impacto ambiental, educação ambiental, contribuição para a conservação e a contribuição para a comunidade”.
De igual modo, Wearing & Neil (2009) advogam que o ecoturismo não é só uma atividade mas uma “filosofia” e pode-se constituir um modelo para o desenvolvimento sustentável, na medida em que coloca os recursos naturais e culturais no centro do planeamento e desenvolvimento, e reconhecem tratar-se de um conceito complexo e muitas vezes contraditório.
Nas palavras destes autores, o ecoturismo evoluiu para um tipo de viagem de especialidade, incorporando uma matriz diversificada de atividades e tipos de turismo, desde a observação de aves, fotografia, mergulho,
trekking, até à regeneração de ecossistemas danificados. “Fundamentalmente, o ecoturismo envolve viagens para áreas naturais relativamente não perturbadas ou protegidas, promovendo a compreensão, valorização e conservação da flora, geologia, fauna e ecossistemas dessas áreas” (Wearing & Neil, 2009:XIII).
Na sua versão mais recente, a Sociedade Internacional de Ecoturismo, considera que o ecoturismo é definido como “viagem responsável para áreas naturais que preserva o ambiente, sustenta o bem-estar da população local e envolve interpretação e educação. A educação deve incluir os funcionários e os hóspedes” (TIES, 2015).
“Na impossibilidade de definir ecoturismo de forma global, utilizável e abrangente, conforme sublinhado, Björk (2007) identificou quatro dimensões comuns às várias definições: (1) características da área - que aspeto tem a área visitada, (2) comportamento dos turistas - o que os turistas fazem, (3) o objeto em foco - em que tipo de recurso está o turista interessado e (4) os resultados - os efeitos do comportamento dos ecoturistas” (Freitas, 2012:17).
A aprendizagem (como resultado de uma motivação ou necessidade educacional) é um aspeto fundamental da experiência do ecoturismo, a par do seu contributo para a conservação/sustentabilidade de áreas com valores ecoculturais relevantes
3, e da geração de benefícios para as comunidades locais.
Portanto, a natureza, a educação/aprendizagem e a sustentabilidade materializam os pilares do ecoturismo (Freitas, 2012). Contudo, as fronteiras permanecem ténues com outras expressões turísticas como, por exemplo, turismo de natureza, turismo de vida selvagem, turismo de aventura e turismo cultural, o que advém do conjunto diversificado de atividades que decorrem em áreas naturais, da motivação dos turistas em participar dessas atividades e das atitudes dos turistas em relação ao suporte territorial que os acolhe (o qual se destaca pela singularidade dos seus recursos ecoculturais, e que pode estar vinculado a algum estatuto de proteção nacional e/ou internacional).