AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE EM COMUNIDADES RURAIS DA AMAZÔNIA:
UM ESTUDO DAS DIMENSÕES AMBIENTAIS NA COMUNIDADE DE BOM SOCORRO DO ZÉ AÇU NO MUNICÍPIO DE PARINTINS-AM/BRASIL
Hapolo Hibson de Souza Ferreira (CV)
apoloibson@outlook.com
Charlene Maria Muniz da Silva (CV)
charlenemds@yahoo.com
Francisco Alcicley Vasconcelos Andrade (CV)
falcicley@gmail.com
Universidade Federal do Amazonas
RESUMO
Este trabalho teve como objetivo principal compreender as dimensões da sustentabilidade ambiental na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu e quais as principais implicações nos modos de vida da população local, pois a comunidade vem apresentando mudanças socioeconômicas e espaciais nos últimos anos, refletindo nas implicações socioambientais que repercutem na reprodução do seu espaço. Esta pesquisa está pautada na reflexão sobre a questão do crescimento econômico versus sustentabilidade na Amazônia, mas especificamente na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu. O método utilizado para a análise dos dados foi o sistêmico e a coleta foi feita por meio de aplicação de formulários socioambientais, observação participante e entrevistas com os moradores da comunidade. Para tal, foi feito o levantamento dos problemas ambientais na comunidade, evidenciando a problemática dos resíduos sólidos que vem impactando diretamente essa localidade, pela falta de um local apropriado para a destinação dos mesmos, as pessoas queimam e/ ou jogam o lixo nos terrenos baldios e nos barrancos próximos ao lago do Zé Açu, colocando em risco a saúde dos mesmos. Dentre outros problemas, destaca-se a retirada da mata nativa na comunidade para que se possam fazer mais construções que acarreta na perda de um elemento importante na regulação do micro-clima local, principalmente pelo fato da temperatura ter aumentado devido à impermeabilização do solo pela introdução do calçamento nas ruas. Outra problemática está em torno do assoreamento do lago do Zé Açu que devido à retirada da vegetação ciliar, tanto para a extração de areia, como para criação de bovinos, está pondo em risco esse elemento importante na vida dessa comunidade. A relevância desta pesquisa está no fato de que as informações aqui levantadas, podem auxiliar na elaboração de uma agenda ambiental importante que deve ser discutida e levada em consideração pela municipalidade na elaboração e implementação de políticas públicas voltadas para esta área no tocante as questões socioambientais, pois esta comunidade está passando por um processo de transformação substancial em sua espacialidade, apresentando características da cidade, portanto, precisa-se de um planejamento que vislumbre a sustentabilidade, sendo que esta pesquisa pode levantar questões importantes que venham a dar subsídios para o planejamento público implementadas nesta comunidade.
Palavras- Chave: Desenvolvimento. Sustentabilidade. Amazônia.
ABSTRACT
This study aimed to understand the dimensions of environmental sustainability in the community of Good Help Ze Açu and what are the main implications for the livelihoods of the local population, because the community has shown spatial and socioeconomic changes in recent years , reflecting the social and environmental implications which impact the reproduction of your space . This research is guided reflection on the issue of economic growth versus sustainability in the Amazon, but specifically in the community of Good Help Ze Açu. The method used for data analysis was the systemic and collection was done through application of environmental forms, participant observation and interviews with community residents. To this end, a survey was made of the environmental problems in the community, highlighting the issue of solid waste that comes directly impacting this location, the lack of a suitable site for the disposal of the same, people burn and / or throw trash in vacant lots and in the ravines near the lake Ze Açu, endangering the health of ourselves. Among other problems, there is the removal of native vegetation in the community so they can make more buildings that causes the loss of an important element in the regulation of local micro-climate, mainly because the temperature has increased due to soil sealing by introduction of paving the streets. Another issue is around the silting of the lake Ze Açu that due to the removal of riparian vegetation, both for the extraction of sand, as for cattle, is endangering this important element in the life of this community. The relevance of this research lies in the fact that the information raised here, can assist in the preparation of an environmental agenda important that should be discussed and taken into consideration by the municipality in the development and implementation of public policies for this area regarding social and environmental issues , because this community is going through a process of substantial transformation in its spatiality , presenting characteristics of the city, therefore, one needs a plan that glimpse sustainability , and this research can raise important issues that may make allowances for public planning implemented in this community.
Keywords: Development. Sustainability. Amazon.
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INTRODUÇÃO
Sustentabilidade é um termo que vem sendo muito discutido ultimamente, tanto do ponto de vista de sua viabilidade, ou pela impossibilidade de colocá-la em prática devido à racionalidade capitalista em voga na sociedade. Os ambientalistas estão preocupados com a manutenção dos ecossistemas (resiliência), em relação ao uso abusivo dos recursos naturais, desmatamento, queimadas etc., porém, não apenas preocupados com essas agressões antrópicas, mas também com as agressões naturais como: furações, terremotos tsunamis etc. Os economistas apenas preocupados com o crescimento econômico deixando a preocupação com os recursos naturais de segundo plano. Entretanto, a noção de sustentabilidade está pautada pela percepção da finitude dos recursos naturais.
Nessa perspectiva fez se necessário um estudo das dimensões ambientais no município de Parintins, mas especificamente na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, zona rural do município, onde foram analisados os principais problemas ambientais encontrados na comunidade.
O principal objetivo deste trabalho foi compreender as dimensões da sustentabilidade ambiental na comunidade do Bom Socorro do Zé Açu e quais as principais implicações nos modos de vida da população local. Para tal, se fez necessário à coleta de dados por meio de aplicação de formulários socioambientais, observação participante e entrevistas com os moradores da comunidade. Foi estabelecido um comprometimento com os moradores da comunidade, pois os mesmos prestaram informações que fundamentam este trabalho e os mesmos clamam por qualquer iniciativa junto ao poder público municipal que venha a mitigar os danos ambientais que existe na mesma.
Este trabalho está assim dividido: o capítulo I, o desenvolvimento sustentável e suas contradições; procurou analisar as contradições do desenvolvimento sustentável, sendo que este está relacionado à problemática ambiental na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, pois muito dos problemas existentes na comunidade é decorrente tipicamente do avanço econômico/urbanização, contudo, isso implica na distribuição dos recursos naturais. Sobretudo, procurou também neste capítulo analisar as dimensões da sustentabilidade, evidenciando os principais fatores que determinam a especificidade de cada um, sendo, ambiental, social e econômico. E nesse sentido, existe um embate entre o sistema econômico e a preservação do meio ambiente, onde a economia sobressai-se sobre a manutenção dos ecossistemas.
O capítulo II, as dimensões ambientais na comunidade de bom socorro do Zé Açu, procurou evidenciar os principais problemas na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, não somente nesta, mas também no lago que banha a mesma, apresentando a problemática dos resíduos sólidos que vem impactando diretamente essa comunidade, pela falta de um local apropriado para a destinação dos mesmos, as pessoas queimam e/ ou jogam o lixo domestico em locais inadequados, colocando em risco a saúde dos mesmos. Dentre outros problemas analisados, destaca-se a retirada da mata nativa na comunidade para que se possam fazer mais construções que acarretando um considerável aumento na temperatura da comunidade, devido à impermeabilização do solo pela introdução do calçamento nas ruas. Outra problemática está em torno do assoreamento do lago do Zé Açu que devido à retirada da vegetação ciliar, tanto para a extração de areia, como para criação de bovinos, está pondo em risco esse elemento importante na vida dessa comunidade.
1- O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E SUAS CONTRADIÇÕES
O conceito de desenvolvimento sustentável foi criado a partir dos anos de 1980, com a necessidade de atender as resoluções da Conferência Mundial sobre meio Ambiente Humano, 1972 em Estocolmo.
Segundo Guimarães (1991), a Conferência de Estocolmo refletiu a preocupação, sobretudo dos países capitalistas com a vulnerabilidade dos ecossistemas e a finitude dos recursos naturais. Sua ênfase estava nos aspectos técnicos da contaminação provocada pela industrialização acelerada e principalmente pelos problemas ocasionados pela explosão demográfica.
O autor dar ênfase a elaboração da I Conferencia Mundial do Meio Ambiente, teve como preocupação o desenvolvimento dos países e a preservação dos recursos naturais, como uma tentativa de amenizar os possíveis impactos ambientais causados ao planeta na busca do crescimento econômico.
Nesse contexto, o relatório Brundland de 1987 põe em discussão internacional o desenvolvimento sustentável como paradigma ambiental a ser alcançado, um “desenvolvimento que é capaz de garantir as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras atenderem também às suas” (CMMAD, 1988).
Lima (1997) argumenta que o desenvolvimento sustentável é compreender os processos que levam à consciência do esgotamento do modelo de desenvolvimento, experimentado nas últimas décadas, e da necessidade de uma nova concepção. Assim, é importante lembrar, que atualmente o desenvolvimento sustentável está associado principalmente ao contexto da sociedade capitalista industrial e os impactos decorrentes de seu estilo de vida como o elevado consumo e desperdício de recursos, assim como a poluição dos ambientes tanto naturais como os antrópicos, e, além disso, as desigualdades sociais e injustiças que ocorrem nessa sociedade extremamente individualista e desigual.
O desenvolvimento sustentável apresenta uma reflexão sobre a ideia de que o modo de produção e consumo vigente nos dirige a uma catástrofe cada vez mais eminente. Brown (2003) ressalta que a economia está em conflito com os sistemas naturais do planeta, é uma evidência que vêm das informações cotidianas sobre o desaparecimento das zonas de pesca, a redução das florestas, a erosão do solo e o desaparecimento de espécies.
Cavalcanti (1994) afirma que a economia não pode ser vista como um sistema dissociado do mundo da natureza, pois não existe atividade humana sem água, fotossíntese ou ação microbiana no solo. Há autores como Morin (2007) que assegura que o desenvolvimento sustentável nada mais é que um discurso que tempera o desenvolvimento por meio da preocupação ecológica, mas sem questionar seus fundamentos, apresentando assim o outro lado do desenvolvimento sustentável, aquele que está por trás dos interesses dos grandes empreendimentos e potencias econômicas, que querem usar seus conceitos e princípios para se beneficiar e obter cada vez mais lucro, aumentando cada vez mais o abismo existente entre os grupos sociais.
Claramente, o desenvolvimento sustentável hoje em dia está se transformando em uma finalidade econômica de ampla aceitação, muito embora, seja acentuada a tendência da retórica. Essa discussão torna-se mais complexa quando nos referimos a Amazônia, Kitamura (1994, p. 211) comenta que:
Uma estratégia de desenvolvimento sustentável para a Amazônia tem como ponto principal a percepção do meio ambiente regional a partir dos interesses diretos das populações locais. Nesse contexto, em condições de pobreza que impera em grande parte na área rural e urbana da Amazônia, um conceito chave para abordar os problemas ambientais dessa região é o atendimento das necessidades básicas das populações.
Sabendo-se da situação socioeconômica daqueles que moram na Amazônia, fica difícil adaptar os princípios do desenvolvimento sustentável nessa região, isso depende muito de políticas voltadas para o desenvolvimento regional, não somente para este, mas também para as condições sociais vulneráveis em que muitos de seus habitantes vivem, tanto em relação a uma fonte de renda que venha a garantir uma saudável qualidade de vida, como na manutenção das características culturais de vários povos tradicionais que existe nessa região.
Contudo podemos analisar o desenvolvimento sustentável como uma forma de equalizar os problemas ambientais dentro da lógica do capitalismo. Ou seja, uma alternativa que emerge de fatores econômicos, porém, na conjuntura de um funcionamento capitalista.
As dimensões da sustentabilidade que normalmente são mais discutidas ficam no âmbito dos aspectos ambientais, sociais e econômicos. Neste ponto de vista vislumbra-se um modelo de produção e consumo que seja equilibrado, trata-se de produzir e consumir equilibradamente de forma que este padrão não sobreponha à capacidade da manutenção do ecossistema, porem autores como Leonardo Boff (2012) afirma que, dentro dos princípios capitalistas que vigora na sociedade, isso se torna contraditório, pois desenvolvimento e sustentabilidade obedecem a lógicas diferentes e se contrapõem em muitos aspectos.
Nesse contexto, Acselrad (2001) assegura que a noção de sustentabilidade remete à lógica das práticas, articulando-se a efeitos sociais desejados mais do que ao campo do conhecimento científico, onde conceitos analíticos são construídos para explicar o real.
Não se pode conceituar a sustentabilidade apenas por um fator que determina o crescimento e o desenvolvimento, mas sim ter uma visão geral da realidade por ela abarcada, desde a sociedade, comunidades, cultura, políticas e os ecossistemas do planeta, então é preciso que haja um moderado equilíbrio entre os fatores econômicos, sociais e ecológicos, Boff (2012) argumenta que é preciso alinhar as práticas humanas às potencialidades limitadas de cada bioma e às necessidades das presentes e das futuras gerações.
Stahel (1995) questiona a possibilidade de uma sustentabilidade no contexto do capitalismo. A ideia do autor é que a sustentabilidade impõe um modelo de desenvolvimento que praticamente é contra os princípios do capitalismo, então essa complexidade ambiental gera inúmeras discussões sociais e ecológicas.
Com toda essa análise e reflexão acerca da sustentabilidade em termos socioambientais, fica claro o embate pertinente que envolve essa complexidade, mas é evidente que dificilmente essa sustentabilidade conseguirá ser estabilizada como um modelo de vida, pois isso não depende apenas de políticas publicas, mas sim de um contexto geral entre as instâncias envolvidas, uma mudança de pensamento cultural numa sociedade que vive constantes mudanças.
Segundo Sachs (1984), recentemente críticos da problemática ambiental têm reconhecido que pobreza e ecologia são realidades interdependentes, que precisam ser compreendidas e abordadas de forma unificada, na procura de uma solução benéfica aos envolvidos no contexto da sustentabilidade, isto porque esses problemas agravam as condições de vida dos mais pobres, a pobreza destes impulsiona a uma exploração predatória dos recursos naturais.
Para Cavalcanti (1994) a possibilidade da construção de uma sustentabilidade deve levar em conta os princípios extraídos dos recentes avanços nos paradigmas e teorias científicas, uma vez que a insustentabilidade atual foi resultante, em grande parte, do conhecimento superado anterior, inadequado, de convivência com o meio ambiente.
Contudo, o autor comenta que os processos de insustentabilidade atual, fazem parte da exploração inadequada do meio ambiente, uma vez que uma possibilidade para a construção da sustentabilidade seria a utilização de modelos e teorias científicas em busca dos possíveis avanços no desenvolvimento sustentável.
Nesse sentido, Boff (2012) afirma ainda que é preciso reduzir o crescimento quantitativo para dar mais importância ao qualitativo, no sentido de preservar recursos que serão necessários às futuras gerações, exaltando sua preocupação no que difere ao crescimento desorganizado em que nos encontramos.
Entretanto, o autor expõe uma preocupação acerca do crescimento quantitativo acelerado, uma vez que é preciso dar mais importância à qualidade deste crescimento, preocupando-se com o fato da preservação dos recursos naturais, a fim de poupar das futuras gerações a falta desses elementos. O esquema abaixo (Fig.01) simplifica os principais elementos que compõe as dimensões da sustentabilidade.
Como mostrado na Fig. 01, a sustentabilidade está envolvida entre essas principais dimensões. As questões ambientais, sociais e econômicas buscam caminhos diferentes ao real conceito de sustentabilidade. No entanto, as dimensões da sustentabilidade mostram-se contraditórias, dificilmente irão encontrar-se equilibradas e voltadas à busca de único objetivo, pois as mesmas possuem especificidades diferentes que as individualizam.
1.2 – Crescimento Econômico e Meio Ambiente
O relatório Brundland ao conceituar o desenvolvimento sustentável como forma de garantir que ele atenda as necessidades do presente sem comprometer as gerações futuras, já deixa exposta a difícil tendência de conciliá-lo a desigualdades sociais ao crescimento econômico:
A humanidade é capaz de tornar o desenvolvimento sustentável – de garantir que ele atenda as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem também as suas. O conceito de desenvolvimento sustentável tem, é claro, limites – mas não limites absolutos, mas limitações impostas pelo estágio atual da tecnologia e da organização social, no tocante ao recursos ambientais, e pela capacidade da biosfera de absorver os efeitos da atividade humana. Mas tanto a tecnologia quanto a organização social podem ser geridas e aprimoradas a fim de proporcionar uma nova era de crescimento econômico. Para a comissão a pobreza já não é inevitável. A pobreza não é um mal em si mesma, mas para haver desenvolvimento sustentável é preciso atender as necessidades básicas de todos e dar a todos a oportunidade de realizar suas aspirações de uma vida melhor (CMMAD, 1988, p. 9-10).
Este trecho do relatório Brundland mostra-se contraditório a partir de uma análise socioeconômica, mesmo reconhecendo os problemas sociais como uma parte fundamental dos problemas ambientais, o discurso de desenvolvimento sustentável é sustentado pela ideia de um desenvolvimento baseado no crescimento econômico. Nesse contexto Alier (2011) ressalta que caberia aos pobres desenvolver-se para escapar da pobreza e, posteriormente, como subproduto desse processo, poder, quem sabe, adquirir o gosto e os meios necessários para melhorar o meio ambiente.
Nessa conjuntura Boff (2012) comenta que:
As causas reais da pobreza e a da degradação da natureza, vê se que resultam, não exclusivamente, mas principalmente, do tipo de desenvolvimento industrialista/capitalista praticado. Ele é que produz degradação, pois dilapidam a natureza em seus recursos e explora a força de trabalho, pagando baixos salários e gerando assim pobreza e exclusão social. (BOFF, 2012 p.46)
Segundo Alier (2011), existe um enfrentamento sem solução entre a expansão econômica e a conservação do meio ambiente, a ideia do autor está relacionada a conflitos ecológicos distributivos e os diversos discursos de valoração, onde o crescimento econômico e meio ambiente estarão sempre em um enfrentamento sem solução, pois não há crescimento econômico sem destruição da natureza
A partir dessa análise Alier (2011, p.58) ressalta ainda que:
O crescimento econômico induz a ampliação dos impactos ambientais e dos conflitos, muitas vezes fora da esfera de mercado. São abundantes os exemplos da incapacidade do sistema de preços em indicar impactos ambientais, ou (segundo K. W. Kapp) os exemplos de transferências bem-sucedidas dos custos sociais.
Lima (1997) argumenta que um dos focos privilegiados da crítica ao modelo de crescimento econômico dominante é a contradição existente entre uma proposta de desenvolvimento ilimitado a partir de uma base de recursos finita. Esta contradição básica tem sido analisada de diversas perspectivas, todas elas evidenciando a insustentabilidade da proposta em longo prazo.
Contudo, é difícil pensarmos em um crescimento econômico em repleta sintonia com a conservação do meio ambiente, visto que são dois pensamentos em busca de objetivos diferentes, entretanto ao analisarmos o aspecto social, é notória a importância da harmonia entre esses dois aspectos que apresentam a unificação de um modelo social de desenvolvimento sustentável em busca da sonhada sustentabilidade. Nesse contexto, Cavalcanti (1994), comenta que a noção de uma economia da sustentabilidade diz respeito ao fato de que as funções ecossistêmicas são parâmetros que não se podem modificar impunemente, necessitando de estabilidade diante de perturbações suscitadas pelas ações do homem.
Lima (1997) argumenta que, o relatório Brundland parte do pressuposto da possibilidade e da necessidade de conciliar crescimento econômico e conservação ambiental e divulga o conceito de desenvolvimento sustentável e um conjunto de premissas que desde então tem orientado os debates sobre desenvolvimento e questão ambiental.
Portanto, os parâmetros que envolvem os aspectos do desenvolvimento sustentável estão caminhando em caminhos opostos, sendo estes distribuídos em econômicos, ecológicos e sociais, buscando estes, beneficiamentos particulares, sabendo-se que há um entrelaçamento entre os mesmos. No entanto a sustentabilidade torna se uma utopia ecológica em busca de um desenvolvimento econômico/ambiental, numa sociedade onde a soberania capitalista é predominante.
2 – AS DIMENSÕES AMBIENTAIS NA COMUNIDADE DE BOM SOCORRO DO ZÉ AÇU
Analisar e compreender as dimensões dos problemas ambientais na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, evidenciando as principais implicações nos modos de vida da população local foi proeminente para a consolidação deste trabalho, pois a comunidade vem apresentando mudanças socioeconômicas e espaciais nos últimos anos, refletindo nas implicações socioambientais que repercutem na reprodução do seu espaço. Esta pesquisa está pautada na reflexão sobre a questão do crescimento econômico versus sustentabilidade na Amazônia, mas especificamente na comunidade de Bom Socorro – Lago do Zé Açu, município de Parintins-Am.
A população da Comunidade de Bom Socorro do Zé Açu está em torno de 1200 habitantes (um mil e duzentos), sendo que esta dividida em 230 (duzentos e trinta) famílias. O método utilizado para a análise dos dados foi o sistêmico e a coleta foi feita por meio de aplicação de formulários, observação participante e entrevistas com os moradores da comunidade. Para tal, foi feito o levantamento dos problemas ambientais na comunidade, evidenciando a problemática dos resíduos sólidos que vem impactando diretamente essa localidade, pela falta de um local apropriado para a destinação dos mesmos, as pessoas queimam e/ ou jogam o lixo nos terrenos baldios e nos barrancos próximos ao lago do Zé Açu, colocando em risco a saúde dos mesmos.
A comunidade de Bom Socorro possui aspectos detentores de uma “pequena cidadezinha” (figura 02), sua infraestrutura viária mostra-se diferenciada da maioria das comunidades rurais de Parintins, possuindo 7 (sete) ruas e 3 (três) travessas, sendo que nem todas estas ruas apresentam-se completamente calçadas, uma vez que é válido ressaltar a constante doação de terrenos na comunidade, que está fazendo com que a mesma esteja crescendo. A partir do desenvolvimento acelerado que a mesma apresentou (e ainda apresenta) nos últimos anos, problemas no âmbito ambiental surgiram na espacialidade deste local, problemas estes que apresentam características socioambientais, ou seja, não é apenas um problema ecológico, mas também social. Neste contexto Lima (1997) destaca a questão ambiental como um subproduto indesejável do progresso, mas perfeitamente ajustável dentro da ordem capitalista e que dispensa quaisquer mudanças mais profundas.
Ao analisarmos a figura 02, na qual mostra a parte frontal da comunidade de Bom Socorro, a ser banhado pelo lago do Zé Açu, é perceptível a presença de um grave problema socioambiental, pois as ruas da comunidade são calçadas, e apresentam certo declínio em seu terreno na parte da frente, sendo que a comunidade não possui serviço de coleta de lixo, e levando em consideração que é comum a presença de embalagens plásticas (militos, bolachas, bombons, entre outros) e também fezes de animais (cavalos, burros, cachorros e galinhas) na espacialidade das vias, todos esses resíduos são carregados no período de chuvas, para dentro do lago, uma vez que o Lago do Zé Açu é o único caminho das enxurradas, onde desembocarão todos esses dejetos.
Apesar das casas serem servidas com água do posto do SAAE, a parte da frente da comunidade é utilizado por muitas pessoas como área de recreação para se tomar banho (Figura 03), logo uma forma de obter algum tipo de doença decorrente ao lixo que é depositado nessa área.
Segundo o comunitário R.J.L.S, 39 anos.
(...) tem muitos animais solto, isso pode prejudicar daqui um tempo a nossa comunidade também, né? Cachorro, cavalo, galinha, pato, tão solto, né? Isso é prejudicial a nossa saúde também, agente vai tomar banho na “beira”, isso pode causar enfermidades no povo, né? (pesquisa de campo, 2013).
O comunitário comenta a preocupação com os animais soltos nas ruas da comunidade, pois sabe ele, que o lago seria o único receptor das fezes destes animais no período das chuvas, no entanto, esse problema mostra se presente no cotidiano desta comunidade.
A figura 04 mostra alguns comunitários fazendo um mutirão na frente da comunidade, pois é comum a presença de embalagens de produtos comestíveis neste local, sendo que se trata de uma área pública. Esta sendo uma das únicas áreas de lazer daquela comunidade no período noturno, servindo como local de passeio, reunião entre amigos e festas da comunidade. Conhecida entre os jovens da comunidade como “praça digital”, pois este local é uma das poucas áreas da comunidade que recebem o sinal das empresas telefônicas existentes na sede do município.
Nesse aspecto, fez-se necessário a indagação aos comunitários, se a mesma possui agente ambiental voluntário (gráfico 01), e constatou-se que a maioria dos entrevistados (85%), afirmaram a presença do agente ambiental na comunidade, mas ressaltaram que existe pouca atuação dos mesmos, 5% dos entrevistados desconhecem a existência deste fiscalizador do meio ambiente na comunidade.
A pouca atuação de um agente ambiental, tem reflexos negativos para a comunidade, pois uma política implantada pelo mesmo poderia ajudar na regulamentação do meio ambiente. Nesse sentido Viola (1992), avalia a atuação de grupos ambientalistas como, um grupo de pressão ou interesse, como um novo movimento social ou como um movimento histórico, que se constituem a partir de demandas no tema da proteção ambiental.
A comunidade de Bom Socorro do Zé Açu está passando por um contínuo processo de crescimento demográfico na sua espacialidade, talvez um dos motivos para que os moradores ainda não tenham tido uma reflexão acerca de um planejamento sobre a destinação dos resíduos sólidos produzidos pela mesma.
A um estudo realizado nesta comunidade, Costa (2012) constatou que a maioria das famílias queima o lixo doméstico, acarretando em problemas de saúde aos comunitários. Nesse sentido uma das responsáveis pelo centro de saúde da comunidade, a Srª I.G.S, 29 anos ressalta que:
(...) nós não temos o agente comunitário de endemias, que é que fica mais responsável pela questão do lixo acumulado nos quintais, e aí como agente começou a observar muitos casos de diarreia, o que ta acontecendo, qual é o caso de tanta diarreia? E aí nos começamos a intensificar mais essa orientação sobre a limpeza de quintais, a coleta do lixo. É um problema que agente escolheu pra trabalhar em cima e buscar soluções junto com escola, com a comunidade e com os ACS1 que a cobrança maior é encima deles que estão aí diariamente, né? O quê que agente observa, falta de orientação não é, não é porque a televisão taí, o rádio tá falando, todo mês agente faz visita orientando, então agente começou meio que ser mais rígido na orientação, só que aqui nós não temos a lixeira, então nós tivemos uma reunião com a coordenação da comunidade pra definir o quê que nós vamos fazer, qual a estratégia pra diminuir a quantidade de lixo jogado por aí. Aumentou o numero de pessoas, aumentou o consumo e concerteza a quantidade de lixo também. (pesquisa de campo, 2013).
Muito dos moradores despejam os resíduos sólidos a céu aberto em um terreno determinado pela comunidade (figura 05), isso ocorre, principalmente, porque não há coleta publica de lixo na comunidade. Isso é preocupante, pois o local não atende as necessidades ambientais exigidas para que se possa ter um equilíbrio socioambiental. Cabe ainda ressaltar, muitos dos moradores não jogam o lixo nessa área, mas sim nas proximidades, acarretando um descontrole na destinação dos resíduos sólidos.
Em detrimento dos impactos ambientais ocasionado pelo lixo na comunidade do Bom Socorro do Zé Açu, constatou-se que os moradores da comunidade estão sempre fazendo mutirões, onde o principal objetivo é amenizar a pré-dominância do lixo na comunidade, nesse sentido o Sr. C.M.N, 39 anos, diz que:
(...) o segundo impacto maior é a questão do lixo, o que fazer com o lixo? tá, muitos não sabem o que fazer, qual destino realmente se dá ao lixo? a comunidade tem uma área aqui cavada que é pra fazer o aterro pra se colocar o lixo, mas muitos deles num colocam nem no lugar certo, já foram feitas campanhas pra colocar o lixo lá no local, muitas pessoas foram pra lá, trabalharam, aí passou uma semana o lixo já tava de novo todo espalhado, até pela margem da estrada. Então a consciência do povo é que faz com quê muitas vezes, muitos só querem cobrar, mas muitas vezes não querem fazer presente nas hora dessas ações, é muito fácil dizer assim, “ah o fulano tem que fazer”, mas no fundo do meu quintal eu não cuido, aí eu já olho lá na frente o outro que tá fazendo, quer dizer, a educação vem primeiro de onde? Na minha casa que ta cheio de lixo, bom se eu não sei o que fazer com o lixo da minha casa, como é que eu vou cobrar da comunidade que tem que fazer isso, se eu não tou inserido nesse papel. (pesquisa de campo, 2013).
No depoimento, o Sr. C.M.N, mostra-se indignado com a falta de sensibilização de alguns comunitários que não tem a preocupação com a destinação correta do lixo da comunidade, sendo que, segundo ele, muitos comunitários preocupam-se apenas em cobrar ou exigir por uma comunidade limpa, mas não fazem nada pra resolver ou amenizar tal problema. Cabe ressaltar aqui, que segundo alguns moradores o problema do despejo de lixo nas margens das ruas de acesso a área determinada pela coordenação da comunidade para a destinação do lixo, se dá pelo fato das pessoas mandarem crianças realizarem o serviço de despejo dos resíduos na lixeira, sendo que devido a distancia da sede da comunidade (aprox. 01 km), muito dessas crianças vão jogando esses resíduos pelo meio do percurso.
Recentemente a comunidade sofreu um aumento considerável na sua quantidade total de famílias, em decorrência de melhorias na infraestrutura do sistema viário na localidade (calçamento das ruas, construção de praça, murro de contenção), melhorias no sistema de saúde, com a reforma e ampliação do centro de saúde e avanços na educação com a reforma e ampliação da escola da comunidade (esta que atende inúmeras comunidades pertencentes à região do Zé Açu), no entanto isso trouxe alguns problemas de cunho socioambiental para a comunidade de Bom Socorro do Zé Açu.
Em uma determinada área disponibilizada pela comunidade para a construção de novas residências, é preocupante o fato de que muito se foi desmatado para que houvesse a constituição do “bairro novo” 2 (figura 07), constituindo um desequilíbrio ambiental na comunidade, não apenas de cunho social, mas também ecológico, pois, sabe-se que neste local existiam uma diversificada e rica fauna, que conjuntamente com as espécies de arvores que ali se encontravam, foi destituída.
Cavalcanti (1994), afirma que é patente que o fato de se atribuir um valor monetário a bens não comerciais, notadamente a fauna, a flora, as amenidades, seja mesmo a vida humana, suscita violentas oposições de ordem ética e filosófica.
A partir da análise dos impactos no micro clima da comunidade causada pela expansão urbana da comunidade, é importante ressaltar o conflito entre o processo de urbanização espacial com o meio ambiente. Nesse contexto, Penna (2002, p. 01) comenta que: “A preocupação aqui apresentada, é vincular a problemática ambiental e urbana por intermédio das questões habitacionais, do crescimento urbano através da expansão das periferias”.
Constatou-se problemas socioambientais a partir da retirada da arborização para a construção de casas, fato este que ocorre com muita frequência na localidade, não somente por pessoas que moram nas comunidades adjacentes, como também pelos próprios moradores que por ali constituem famílias. A partir dessa conjuntura, foi questionado aos moradores se o aumento da temperatura na comunidade tem relação com a retirada da arborização para a construção de novas casas, e 90% dos entrevistados afirmaram que sim, pois reconhecem que a partir da constituição daquela área para a implantação do “bairro novo” houve consideráveis variações no aspecto climático, contribuindo para o aumento da temperatura, 10% afirmaram que não, como mostra o Gráfico 02.
Segundo Cavalcanti (1994) a intensificação de problemas socioambientais tem muitas resultados como:
Desde o ano de 2010 a comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, por meio do governo do Estado do Amazonas obteve a implantação da infraestrutura viária no aspecto de “calçamento”, no entanto ao se fazer uma análise (gráfico 03), pôde constatar que a maioria dos moradores (95%), afirmam que antes das ruas serem calçadas a temperatura era mais agradável, contrariando essa relação socioambiental tivemos apenas 5% dos entrevistados. Sendo que, ao serem questionados se os mesmos preferiam as ruas atuais (calçadas) ou as de antigamente (de piçarra 3) levando em consideração o aumento da temperatura, os mesmos disseram que preferem as ruas dos dias de hoje, pois, segundo alguns moradores, “as ruas ficaram mais bonitas”. Nesse contexto, nota-se a preferência dos moradores por uma boa infraestrutura nas ruas, deixando o conforto térmico ao segundo plano, pois segundo alguns moradores, antigamente devido às ruas serem piçarradas, em tempos chuvosos os mesmos ficavam impossibilitados em trafegar pelas mesmas, ou seja, melhorou bastante no fator infraestrutura, porém por outro lado, o aumento da temperatura é notório. Então percebe-se a preferência dos moradores pelas ruas calçadas, mesmo que para isso tenham que conviver com o desconforto térmico devido a impermeabilização das ruas.
A partir da analise sobre complexidade ambiental que na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, em detrimento da acelerada expansão urbana que a mesma se encontra, fez-se necessário saber a opinião dos moradores em relação aos problemas que pôde-se constatar naquela localidade, para tanto ao questionarmos se a comunidade apresenta algum problema ambiental, cerca de 95% dos entrevistados mostraram se sensibilizados da realidade ambiental que vive a comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, apenas 5% dos entrevistados forma contrários a essa opinião. Como mostra o gráfico 04.
Portanto, no contexto geral a comunidade apresenta crescentes problemas ambientais, e poucas possíveis medidas de solução, no entanto, pôde-se compreender uma negação aos fatores ambientais que fazem parte desta comunidade, como se estes não estivessem altamente ligados. O equilíbrio entre meio ambiente e sociedade seria o caminho mais viável para o desenvolvimento sustentável. Contudo, ao se fazer uma análise do desenvolvimento espacial da comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, torna-se complicado impor um modelo de sustentabilidade nesse contexto, pois se trata de uma comunidade rural amazônica, onde a vulnerabilidade ambiental está mais presente.
2.1 – Uma análise dos Impactos Ambientais no Lago do Zé Açu
A região do Zé Açu apresenta-se em destaque no crescimento espacial da cidade de Parintins, pois nessa região concentra-se uma das maiores jazidas de areia do município, portanto, cabe ressaltar aqui os impactos socioambientais que sofre o Lago do Zé Açu, este sendo um dos retentores dessa riqueza mineral, pois a maioria da areia que é retirada da região do Zé Açu concentra-se as margens do lago (figura 08), acarretando em impactos ambientais em toda a extensão do mesmo, pois como afirma Brum (2001 apud SAMPAIO E ALMEIDA 2002, p.2) “A extração de areia natural, que no passado era prática comum nos vales e nos leitos de rios, agora se concentra em baixadas, provocando impactos ambientais em consequências da remoção de coberturas vegetais nas áreas a serem lavradas”.
Nesse sentido devemos nos redirecionar aos reais problemas ambientais ocasionados pela extração de areia às margens daquele lago devido a sua importância aos ribeirinhos da região do Zé Açu como um fator socioambiental. Nesse contexto, o Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (2007), apresenta o relato do ribeirinho J.S.M, morador da comunidade de N.Sª de Nazaré 4.
Nós não temos o apoio do IBAMA, do INCRA. Vem aqui tá cheio de balsa cheia de areia, levam madeira, levam tudo daqui da nossa área. Nós fica olhando. Não tem o IBAMA, o INCRA pra nos apoiar pra fazer reunião com nós e debater com algo que nós pode procurar as leis.
Ainda nesse contexto, Simas (2000) afirma ainda que:
O lugar pacato e conservado, o lago do Zé Açu, passou a ser ameaçado e agredido. Era um lago limpo e farto em época de verão. A abundância de peixes e caças permitiram a seu povo, uma alimentação variada e farta. (SIMAS, 2000, p.17)
Sendo assim é possível associarmos o crescimento urbano da cidade de Parintins com os impactos ambientais no Lago do Zé Açu, uma vez que grande parte da areia utilizada em construções civis na cidade é oriunda dessa região. Ou seja, a demanda por areia da cidade para a construção de casas, infraestrutura urbana entre outros, fez com que as empresas de construção voltassem seus olhos para esse recurso natural existente na localidade do Zé Açu, e assim passassem a explora-los de forma intensa e sem nenhum controle por parte dos órgãos ambientais, como SEMA5 , IBAMA6 e IPAAM 7.
Outra problemática evidente as margens do lago do Zé Açu, é a intensificação da pecuária, pois existem muitas propriedades que são destinadas a criação de bovinos e bubalinos em torno do lago (figura 09), sendo o desmatamento, praticados por muitos fazendeiros, um dos principais impactos ambientais naquela localidade, mas especificamente, nas margens do Lago do Zé Açu. Nesse sentido, Simas (2000, p.17), afirma que:
Com o progresso vieram também suas mazelas. Hoje as fazendas predominam as margens do lago. Os campos foram construídos sem nenhum cuidado, com devastação da mata marginal e dos igapós que serviam de viveiro natural para os peixes e outros serem aquáticos.
Ainda sobre os impactos socioambientais naquela região, o Sr. C.M.N, comunitário da comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, argumenta que o desmatamento pela ação de fazendeiros é um dos principais responsáveis pelos impactos ambientais no lago:
Eu classifico dois problemas ambientais muito sério, primeiro é o desmatamento provocado pelos pecuaristas da região, esses são os principais responsáveis pela desertificação de uma boa área do Zé Açu, ta? Nós temos só na ultima pesquisa da UFAM, 26 fontes que morreram devido ao desmatamento, por aí você tira, o lago do Zé Açu no verão, ele ta secando cada vez mais devido a essa situação, as fontes estão morrendo devido ao quê?, É o comunitário que vai lá cortar uma árvore? Não! O comunitário as vezes corta uma árvore pra fazer a sua casa, enquanto que o pecuarista destrói 20, 30 hectares pra colocar o seu gado, então um dos pontos principais é o desmatamento provocado pelos pecuaristas. Os grandes pecuaristas são os principais responsáveis por esse impacto ambiental na região do Zé Açu. Inclusive essa situação você vê que seria o quê? Uma média de 50m né, pra se desmatar próximo ao lago, não é isso? Isso é uma lei federal, a questão do desmatamento das matas ciliares, então você vê que uma boa parte dessas fazendas aqui, quase não tem mais matas ciliares, causando o assoreamento, a erosão com a enxurrada vai aterrando cada vez mais o lago. (pesquisa de campo, 2013).
Brown (2003) ressalta que a economia está em conflito com os sistemas naturais do planeta, é uma evidência que vem das informações cotidianas sobre o desaparecimento das zonas de pesca, a redução das florestas, a erosão do solo. Nesse aspecto, sendo um subproblema do desmatamento, a figura 10 mostra o processo de erosão decorrente da intensificação da pecuária na região.
A partir dos impactos ambientais motivados pela expansão da pecuária, o assoreamento como resultado das erosões manifesta-se como um incômodo para muitos ribeirinhos que utilizam o Lago do Zé Açu para sua subsistência, através das atividades pesqueiras e até mesmo para o consumo da água, pois os mesmos sofrem no período da estiagem, devido ao lago apresentar uma cor suja e barrenta, onde fica impossível a prática da atividade da pesca, assim como o consumo da água. Partindo da problemática da intensificação dos fazendeiros nas margens do Lago do Zé Açu, o assoreamento mostra-se de forma crescente, segundo relato de alguns moradores, antigamente o lago era farto em pescado, hoje o mesmo não oferece condições de manter as comunidades que estão no seu entorno. Nesse contexto, Costa (2012, p. 30-31), argumenta que:
(...) o lago do Zé Açu é bastante escasso do pescado na atualidade pelo fato de no passado e mesmo recentemente ter sofrido um intenso processo de pesca predatória ilegal, mencionando ainda que a intensa devastação das matas ciliares e os processos de erosão que são impostos pela derrubada da floresta também contribuíram para que o lago do Zé Açu não seja mais farto como era antigamente.
Segundo o Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (2007), coordenado pelo antropólogo Alfredo Wagner, a morte das nascentes é devido às erosões que causam o assoreamento das cabeceiras 8, a morte do rio e dos peixes, fazendo com que os ribeirinhos saiam de sua terra. Nesse Contexto, Simas (2000) diz que, as águas, antes negras e claras, hoje apresentam cor turva, suja, pelo assoreamento e pela erosão, pois as margens não têm mais como conter as enxurradas. A figura 11 mostra o processo de assoreamento de uma das cabeceiras do lago do Zé Açu:
Entretanto, a partir de uma análise acerca dos impactos ambientais no Lago do Zé Açu, buscou-se evidenciar os principais conflitos socioambientais emergentes da atuação capitalista na região. Nesse sentido procurou-se analisar a opinião dos moradores, buscando a compreender quem seriam os principais responsáveis pela degradação ambiental no Lago do Zé Açu, como mostra o gráfico 02.
O Gráfico 05 mostra que 44% dos entrevistados, responsabilizaram os fazendeiros como os principais agentes causadores da degradação ambiental no Lago do Zé Açu, os mesmos afirmaram que existe conflitos entre comunitários e fazendeiros. Segundo o depoimento do Sr. S.S.M exposto no Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia, 2007:
Na região do Paraíso, entre Nossa Senhora das Graças e Paraíso, tem uma área de Dono o fazendeiro, mas não é não, é da União é do INCRA né? É da União, tem os parceleiros que têm mais de 30 anos que eles passam, bem próximo, lá onde tem umas crateras grandes né? Ele colocou uma cerca elétrica e impediu dos parceleiros passarem pro seus lotes pra buscar sua produção.
Um fator interessante nos resultados do gráfico 05 foi que 28 % dos entrevistados puseram esta responsabilidade aos próprios comunitários, o Sr. R.J.L.S afirma que “os comunitários tem que dar exemplo primeiramente, para depois cobrar dos outros.”
Ainda o gráfico 05, mostra que 17% dos entrevistados apontam as mineradoras como as principais responsáveis pela degradação do lago, uma vez que, segundo alguns moradores as mesmas levam riqueza e deixam pobreza, não se referindo apenas à pobreza social, mas também a pobreza ambiental. E apenas 11% declararam culpados os banhistas que frequentam aquela região nos fins de semana. Banhistas esses que geralmente são da sede do município de Parintins, que buscam nas praias do Lago do Zé Açu uma forma de lazer para os fins de semana (figura 12), mas é comum esses banhistas poluírem o lago devido o despejo se sacolas plásticas e latas de bebidas alcoólicas.
Contudo, buscou-se analisar os impactos ambientais no Lago do Zé Açu, compreendendo as especificidades que compõe os aspectos socioambientais inseridas nessa localidade, evidenciando a importância deste para os ribeirinhos daquela região. Sobretudo apontando soluções que venham amenizar esses problemas ambientais que se fazem presentes na Região do Zé Açu, especificamente na comunidade de Bom Socorro, onde o maior problema apresentado foi o descontrole no que tange ao depósito dos resíduos sólidos. Assim como no lago que banha essa comunidade, pois segundo os moradores o lago vem apresentando mudanças no seu estoque de peixes, fato este decorrente da grande atuação de fazendeiros e empresas mineradoras que retiram as matas ciliares, como forma de crescimento econômico, acarretando ainda em grandes erosões que leva ao assoreamento deste lago que apresenta como a única fonte na busca de alimento e água potável, pois muitas famílias moram ao entorno do Lago do Zé Açu.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa buscou a compreensão das dimensões ambientais na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, evidenciando os impactos ambientais naquela região. Portanto foi importante identificar os principais problemas ambientais na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, pois esta localidade está em um processo de urbanização na sua espacialidade, acarretando um descontrole socioambiental na mesma. Portanto o lixo foi destacado como principal problema na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, pois a comunidade não detém de uma área que atenda as necessidades socioambientais básicas para que se possa ter um equilíbrio ambiental. Necessitando aí, de uma atenção do poder público municipal, pois os moradores encontram nesse órgão público uma das únicas alternativas de amenizar essa situação.
No entanto para se compreender as dimensões ambientais na comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, fez se necessário estabelecer uma relação dos problemas socioambientais encontrados na comunidade com a discussão sobre o desenvolvimento sustentável e sustentabilidade. Pois o processo de desenvolvimento espacial/econômico faz se presente nessa localidade, necessitando de instâncias voltadas à preocupação na manutenção correta dos recursos naturais desta comunidade, para que se possa alcançar o desenvolvimento sustentável, onde os objetivos econômicos, sociais e ambientais possam desfrutar de uma sensibilização ecológica/social que seria um dos caminhos da sustentabilidade.
Porém, pelos dados obtidos, os moradores da comunidade ainda não se mostram totalmente preocupados com os problemas de âmbito ambientais que vêm ocorrendo na localidade, então a localidade precisa de apoio dos órgãos competentes, tal qual, a prefeitura. É necessário que haja um diálogo entre estes, na perspectiva de buscar soluções a esses problemas.
Contudo, segundo alguns moradores, a comunidade precisa unir-se a escola, para que juntas possam reivindicar do poder público municipal palestras de cunho socioambientais a fim de sensibilizarem os moradores a preservar os recursos naturais existentes na comunidade.
Outro fator que cabe aqui ressaltar, são os impactos ambientais que estão ocorrendo às margens do lago do Zé Açu, pela falta de planejamentos dos fazendeiros, onde os mesmos buscam apenas o crescimento de sua atividade sem o devido cuidado com o ecossistema local, enquanto isso, os mesmos deixam o lago poluído, devido às erosões como consequências da derrubadas das matas ciliares para a plantação de pasto. Assim como as grandes empresas da construção civil, que fazem daquela região sua principal fonte de retirada de areia. Nesse sentido é alarmante a falta de pescado nesta região, sendo que a maioria dos moradores alimenta-se de produtos industrializados, como frango, calabresa salsicha, sardinha enlatada, entre outros, pois segundo os mesmos, o lago não tem mais peixe em abundancia, assim um fator ambiental acaba influenciando diretamente um aspecto cultural e histórico que é o consumo de peixe pelas populações ribeirinhas na Amazônia. Agora a mesma é abastecida por pescado oriundo de outras comunidades fora da região do Zé Açu ou até mesmo por vendedores que vem da cidade vender pescado, sendo que em alguns momentos o valor cobrado pelos pescadores e atravessadores que vendem seu peixe em Bom Socorro é bem elevado, não sendo possível para o comunitário adquirir o pescado. Observa-se aí que as mudanças nos padrões alimentares estão sendo ocasionado por um fator ambiental ligado diretamente a carência de peixe no lago do Zé Açu, que, segundo moradores antigos da comunidade, ele tinha bastante fartura em peixes de várias espécies, e agora, devido aos impactos oriundos de degradação de seu ecossistema, já não há mais peixes suficientes para manter a alimentação regular de todos seus moradores.
Portanto, é preciso que haja um diálogo entre as instancias institucionais públicas e sociedade civil, na discussão sobre a sustentabilidade para os territórios rurais, a fim de buscarem soluções que beneficiem não só a comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, como muitas outras comunidades da Amazônia que vem passando por situação parecida.
Com este trabalho de iniciação cientifica, procurou-se demonstrar as dimensões ambientais no contexto da sustentabilidade na comunidade pesquisada. Percebeu-se que a mesma tem vários problemas socioambientais, mas que podem ser resolvidos ou amenizados com políticas públicas voltadas para as questões ambientais em comunidade rurais, mas especificamente para a comunidade de Bom Socorro do Zé Açu, no município de Parintins. Dentre essas ações podemos citar, a fiscalização mais eficiente de órgãos ambientais sobre a atividade da pecuária e de extração de areia, um projeto na área de educação ambiental para amenizar o problema com os resíduos sólidos, e um programa voltado à valorização e apoio as atividades agrícolas e de geração de renda.
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1 ACS – Agente Comunitário de Saúde.
2 Nome este atribuído pelos moradores da comunidade.
3 Termo usado para indicar por vezes um estado de decomposição de certas rochas, no qual elas se acham semi-agregadas. Exemplo: areia grosseira; outras vezes usa-se para designar o cascalho que aparece no solo, ou ainda, para as concreções ferruginosas. (GUERRA & GUERRA, 2011, p.483).
4 Comunidade ribeirinha pertencente ao Lago do Zé Açu.
5 Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
6 Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e recursos naturais.
7 Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas.
8 Área onde existem os olhos d’água que dão origem a um curso fluvial; é o oposto de foz. (GUERRA & GUERRA, 2011, p.97).
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