Contribuciones a las Ciencias Sociales
Febrero 2014

DIREITOS HUMANOS VERSO CONTRATOS INTERNACIONAIS MERCANTIS: A INSERÇÃO DE CLÁUSULAS SOCIAIS NA EFETIVA PROTEÇÃO E COMBATE AO TRABALHO INFANTIL



Jane Gombar (CV)
jane_gombar@hotmail.com
Universidade Federal de Pelotas






Resumo
A história dos direitos humanos, assim como a do trabalho infantil, está intimamente relacionada com a própria existência humana. Trabalho e direitos humanos estão de tal forma interligados que qualquer abordagem séria  acerca da concretização dos direitos não pode deixar de fora  as clausulas sociais  que envolvem a exploração do trabalho no âmbito internacional. Sabe-se que  a exploração  deste trabalho representa uma fonte   rentável para aqueles que o manipulam, repercutindo diretamente  na competitividade no mercado de trabalho internacional e no custo de mão de obra. Assim, este estudo pretende  trabalhar a possibilidade de inserção de clausulas sociais, coibindo este trabalho, visando a efetivação dos direitos fundamentais.
Palavras Chaves: Direitos humanos. Trabalho infantil. Cláusulas Sociais.

Abtract
The history of human rights, as well as child labor, is closely related to human existence. Labor and human rights are so intertwined that any serious approach regarding the concretion of rights can not leave out the social clauses that involve the exploitation of labor in the international ambit. It is known that the exploitation of this work represents a cost effective source for those who handle direct impact on the competitiveness in the international job market and cost of labor. Thus, this study intends to work the possibility of insertion of social clauses, curbing this work, aimed at enforcement of fundamental rights.
Keywords: Human Rights. Child Labor. Social Clauses.

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Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Gombar, J.: "Direitos humanos verso contratos internacionais mercantis: a inserção de cláusulas sociais na efetiva proteção e combate ao trabalho infantil", en Contribuciones a las Ciencias Sociales, Febrero 2014, www.eumed.net/rev/cccss/27/trabalho-infantil.html
  1. Introdução

Os direitos  humanos  evoluíram de forma considerável nos últimos três séculos. As condições de possibilidades históricas e os movimentos sociais em busca de fragmentos materiais de igualdade e liberdade, protagonizados pelos segmentos humanos oprimidos foram alguns fatores que se conjugaram nessa evolução de  forma que eles devem ser entendidos a partir de uma perpectiva histórica. Seu reconhecimento e positivação, como resultado de lutas travadas pela sociedade ao longo de sua evolução refletem as conquistas que o ser humano realiza em sua própria aventura de viver. Por conta desta historicidade, este artigo pretende  relatar rapidamente, em grandes linhas, o estado da problemática  jurídica na sociedade complexa que estamos vivendo desde o início do milênio, que se refletem no mundo do trabalho sob o viés do trabalho infantil.
Não é de hoje que se afirma que   a pratica do trabalho infantil fere a dignidade da criança e do adolescente, impedindo o livre exercício de seus direitos  fundamentais  constitucionalmente assegurados, além de ferir seus direitos  natos, inerentes  aos cidadãos.
A propósito destes direitos,  J. J. Gomes Canotilho aponta para   os direitos  do homem enquanto direitos validos para todos os povos  e em todos os tempos revelando uma dimensão jusnaturalista-universalista, encontrando sua justificação na própria natureza humana e daí seu caráter inviolável , intemporal e universal(CANOTILHO, 2003).
Ingo Sarlet estabelece que os direito humanos seriam aqueles positivados na esfera internacional, que reconhecem o ser humano independente de sua vinculação á determinada ordem constitucional, tendo, dessa forma, validade universal para todos os povos e tempos, assumindo conceitos mais amplos e imprecisos que os direitos fundamentais, os quais na medida em que constitucionalmente reconhecidos e garantidos pelo direito positivo de determinado Estado, assumiram um sentido mais restrito e preciso(SARLET, 2009).
Apesar  dos avanços  reconhecidos  e de uma  evolução legislativa no sentido de sua proteção e efetivação, ao analisarmos a esfera da economia global, constatamos pela ótica dos direitos humanos que o   trabalho infantil  ainda continua a ser uma das piores formas de exploração, seja pela prostituição e no trabalho em si e por si, através  do trabalho doméstico “entre muros”, da exploração dos trabalhos em fabricas, minas, campos agrícolas, em contatos com produtos insalubres, atividades perigosas e degradantes, entre outras.
A história, já velha, nos mostra o caminho percorrido do trabalho infantil, a sua  evolução, declínio e avanços, não só nos chamados países industrializados, mas também daqueles  considerados  excluídos do sistema global e capitalista.
O problema da exploração de mão-de-obra infantil é global, talvez ocorrendo em cada ângulo do nosso planeta. Milhares de fotografias em preto e branco aparecem diante dos nossos olhos, recontando a história milenar desta exploração: dos cortadores de cana ao trabalho nos sisais do Brasil, os tecelões de tapetes indianos, os esgotos das bolas de futebol no Paquistão, entre outros.
Este problema emerge tanto nos países ricos como nos países pobres e decorre de inúmeros fatores, tais como a exploração, a pobreza, a miséria, a infância negada, a deficiência do setor educacional, as restrições impostas pela tradição, o custo baixo da sua força de trabalho, padrões e expectativas de comportamentos  culturalmente estabelecidos,   acirrados  pela  globalização do mercado e oferta  no mercado internacional de produtos  com preços cada vez mais competitivos, desaparecimento de  barreiras alfandegárias  e fiscais.
Para  interromper este mecanismo que se auto realimenta na pratica, nas escolhas,  nas expectativas  das famílias  e sociedade é necessário  uma reconstrução  das redes sociais naturais, englobando neste espaço políticas publicas nacionais e internacionais orientadas  pelos viés dos  direitos humanos, combinando a ação visível da lei com a ação  invisível do mercado.  
Assim, o objetivo do presente artigo é contemplar um tema que vem ganhando relevância nas abordagens internacionais quando analisamos os direitos internacionais fundamentais: a cláusula social nos tratados de comércio internacional com abordagem no trabalho infantil, bastante significativa nos países da América Latina, tanto importadores para países menos desenvolvidos, como exportadores.

  1. O trabalho infantil  protegido: a inserção da cláusula social nos contratos internacionais mercantis

A proteção  contra o trabalho infantil nos diplomas internacionais demonstra um cenário  de preocupação  com a pratica cotidiana  desta forma de exploração de trabalho  que se funda provavelmente  em um paradigma culturalmente enraizado de um mecanismo funcional , isto é, de um adaptamento sócio-economico  condicionado a estrema pobreza, mecanismos de exclusão e  marginalização social.
Dentre as principais soluções apresentadas, a temática sobre a cláusula social, recorrente no cenário internacional, é mais uma das tentativas de minimização dos efeitos da exploração do mercado sobre o trabalho, através da inclusão de padrões-normas trabalhistas nos contratos internacionais mercantis, gerando polemicas ao ponto de Celso Lafer estabelecer que

nele se mesclam preocupações com a ‘concorrência desleal’; respostas políticas à agenda da opinião pública ao problema muito mais complexo de desemprego estrutural nos países desenvolvidos, por força da lógica de uma economia globalizada; sensibilidades éticas em matéria de direitos humanos, hoje prevalecentes no campo dos valores em escala mundial, e fundamentados receios de que tudo isso se converta em novas formas de protecionismo, prejudiciais aos países em desenvolvimentos (LAFER, 1998, p. 35).

Assim, podemos definir a cláusula social como uma forma de controlar os problemas e as conseqüências advindas da competitividade do mercado internacional, ou seja, do mundo capitalista, assegurando assim, respeito e a aplicação dos direito e das garantias dos trabalhadores.
O marco histórico que assinala a discussão sobre os direitos trabalhistas no plano internacional deu-se pela OIT, criada em 1919, por meio do tratado de Versalhes, cujo prefacio condutor da sua criação, de ordem humanitária, tem por compromisso a preservação da dignidade dos trabalhadores, acompanhada de fatores políticos e econômicos, relacionados ao mercado e competição, salvaguardado que  o crescimento econômico deveria ser acompanhado de um mínimo de regras de funcionamento social.
O grande problema era fazer vigorar as leis trabalhistas universais sem o trabalho escravo, infantil, jornada extenuante a fim de harmonizar as relações de trabalho e o comércio internacional, já que os países que adotassem tais regras se sentiam prejudicados se comparados àqueles que não as adotavam, gerando um desequilíbrio nas relações comerciais quanto a competitividade e preço.  
A fim de complementar o acima disposto:
Entre os diversos fundamentos apontados para a existência e desenvolvimento do Direito Internacional do Trabalho, encontramos os relacionados a fatores de ordem econômica. Estes se caracterizam por uma preocupação de universalização das normas protetivas aos trabalhadores, ao cabo de impedir que Estados com baixo nível de respeito às condições de trabalho aufiram vantagens comerciais a custa da exploração de seus obreiros. Diante do menor custo da produção, alguns países ofertam no mercado internacional produtos com preço competitivo, mas isto em decorrência de salários aviltantes, jornadas de labor intermináveis, trabalho infantil ou mesmo escravo. Denomina-se esta prática de dumping social, ou seja, a busca de vantagens comerciais através da adoção de condições desumanas de trabalho(OLIVEIRA, 2001).
Há que se destacar que a competitividade no mercado de trabalho internacional não está apenas vinculada com o custo da mão-de-obra, no entanto, temos que ter em mente que tal elemento contribuiu significativamente para a elevação do custo final do produto, podendo sofrer uma grande diminuição, variação de preço quando utilizada uma mão-de-obra mais barata(OLIVEIRA, 2001).
Em face a esta realidade  surge a idéia da inter relação  entre o capital  e a justiça social, da inter relação entre o comércio e direitos trabalhistas, com reflexo direto na  melhoria do padrão de vida dos trabalhadores envolvidos nesta estrutura, embasada no princípio de que as ações individuais devem ser voltadas ao interesse social, assim como as relações comercias  deveriam enfocar  uma função social para toda uma comunidade e não para  um grupo de pessoas somente.
Dessa forma, não podemos esquecer os direitos assegurados aos seres humanos, ou seja, “das premissas maiores quanto a condição humana” e da mesma forma lembrar que não há o desenvolvimento de uma região, país com a exploração, submissão de sua população a exaustivas jornadas de trabalho, beneficiando apenas uma minoria, enquanto outra grande parte da população continua vivendo e se sujeitando a condições precárias de trabalho para sustentar suas famílias(OLIVEIRA, 2001).
Embasados nesta filosofia, “colocou-se em marcha uma campanha destinada a conseguir a ratificação universal das sete Convenções Universais da OIT, sob a ótica dos direitos dos trabalhadores”(CRUZ, 2001, p.45), que em uma linha evolutiva ganhou reforço com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, estabelecendo os primeiros princípios inegociáveis da pessoa humana, posteriormente estruturado no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, enunciando um extenso catálogo de direitos, universais e indivisíveis,  interagindo de forma ampla entre a liberdade econômica e direitos sociais  pois “a efetivação dos direitos econômicos, sociais e culturais não é apenas uma obrigação moral  dos estados, mas uma obrigação jurídica”(PIOVESAN, 2003, p. 244).
Adicionalmente, como resultado e conseqüência, em 1998, aprovou-se durante a conferencia internacional da OIT a Declaração sobre princípios fundamentais e Direitos ao trabalho, contendo os direitos básicos a serem respeitados internacionalmente e que já existiam em outras de suas convenções,  constituída de  quatro princípios:

a)livre associação e reconhecimento do direito da negociação coletiva; b)eliminação de todas as formas de trabalho forçado; c) efetiva eliminação do trabalho infantil; d)eliminação da discriminação com relação ao emprego e ocupação(CACCIAMALI, 1999, p. 207).

Tais princípios além de estruturarem a base universal do direito do trabalho  para todos os países membros, independente  da sua ratificação nas Convenções a elas pertinentes(Liberdade de associação e proteção ao direito de organização, 1948, nº. 87; Direito de organização e convenção coletiva, 1949, nº.98; Trabalho forçado, 1930, nº. 29, Abolição do trabalho forçado, 1957, nº. 105; Igualdade de remuneração, 1951, nº.100; Discriminação, 1958, nº. 111; Idade mínima, 1973, nº.138; Piores formas de trabalho infantil, 1999, nº. 182),   criou as condições para o atual contorno  sobre a cláusula social hoje existente, expressando,  ainda,  o compromisso  a ser adotado por todos os Estados membros sobre o mercado de comércio internacional ao impor-se  a cláusula social em um tratado comercial.
José Pastore afirma que:

os que defendem a cláusula social dizem que o respeito as normas  mínimas de trabalho  ajudará a elevar o padrão de vida de todos os povos que participam do comércio internacional...quanto mais altas forem as normas mínimas de trabalho, maior será a renda, a poupança, a produção e o emprego...Os que rejeitam a cláusula social dizem que o nível de  vida das populações  não pode ser melhorado através  de cláusulas nos tratados  internacionais. A melhoria de vida decorre  do desenvolvimento de cada nação. Uma  elevação artificial das normas mínimas no campo do  trabalho pode  destruir as vantagens comparativas dos países mais pobres, mantendo-os no seu estado de pobreza – o que não deveria interessar nem mesmo aos países ricos, pois restringe as suas possibilidades de exportação. Afinal, não há como exportar para gente que não tem como pagar (PASTORE, 1997, p. 14)

Os países em desenvolvimento alegam que a adoção de cláusulas sociais apenas prejudicaria os trabalhadores, porquanto acarretaria mais desemprego, pobreza, o que viria a prejudicar ainda mais a vida destes. Também sustentam “que os Estados mais industrializados na verdade não estariam preocupados com a melhoria das condições de trabalho, mas sim com a reafirmação, através do véu das cláusulas sociais, de seus interesses protecionistas.” Já os países desenvolvidos pleiteiam a inserção das cláusulas sociais a todos os países, ou seja, insistem para que as cláusulas passem a vigorar como normas supranacionais(OLIVEIRA, 2001).
Ressaltamos que a cláusula social pode possuir tanto um viés positivo quanto negativo, sendo que “como forma negativa, ela preveria a aplicação de sanções retaliatórias ao país que não respeitasse as condições mínimas apresentadas; e como forma positiva ela ajudaria os países que a cumprissem, favorecendo-os de alguma maneira no comércio internacional”( RIBAS, 2005).
Enfim, a adoção da cláusula social nos contratos internacionais pode ocasionar tanto conseqüências negativas como positivas, no entanto, é uma forma de controlar a exploração da mão-de-obra, tanto infantil quanto adulta, garantindo aos indivíduos a aplicação de seus direitos e garantias, bem como uma forma de fiscalização e repressão, tendo em vista a possibilidade de penalização dos países que violarem tais normas.
           
3. O instrumento de justificação  em torno da cláusula social: a justificação da dignidade da pessoa humana
Podemos afirmar que as primeiras iniciativas de se propor o tema de padrões trabalhistas no espaço internacional foi da Alemanha e da Suíça, sendo que estes países foram também os primeiros a regular internamente as relações entre capital e trabalho(Regis, 1997), que chegaram ao ápice durante a reunião da Organização Mundial do Comércio em Cingapura, em 1996.  Neste encontro estabeleceu-se, como princípio que os direcionamentos aos temas comerciais ligados as questões trabalhistas, deveriam ser tratados em seu fórum apropriado, ou seja: a Organização Internacional do Trabalho(REGIS, 1996), renovando-se, nesta oportunidade, o compromisso de respeito as normas internacionais de trabalho  internacionalmente reconhecidas:

Renovamos nosso compromisso de respeitar as normas de trabalho fundamentais internacionalmente reconhecidas, sendo a Organização Internacional do Trabalho o organismo competente para estabelecer essas normas e ocupar-se das mesmas. Consideramos que o crescimento e o desenvolvimento econômico impulsionados pelo crescimento do comércio e a maior liberalização comercial contribuirão para a promoção dessas normas. Rejeitamos a utilização de padrões trabalhistas para propósitos protecionistas, e acordamos que a vantagem comparativa de alguns países, especialmente os países em desenvolvimento que mantêm salários baixos, não deve de maneira alguma ser posta em questão. Sobre este tema, os secretários da OMC e da OIT continuarão a colaborar mutuamente(DECLARAÇÃO MINESTERIAL DA OMC, 1996).

Além dos fatores políticos, culturais e históricos condicionantes de tal compromisso, destacamos, neste estudo, o enfoque econômico, que inicialmente perpassava somente nos impactos sobre o custo de produção originados pelo  “dumping” praticado  por diversos países, destacados por Welber Barral como  sendo uma  prática onde “pode ser definida como a discriminação de preços entre dois mercados nacionais, entre o mercado exportador e o importador”( BARRAL, 2000, p. 217).
Na medida em que essa nova configuração toma corpo, um novo quadro conjuntural irrompe através do dumping social.  A sua recomendação pragmática, estruturada no dumping, seria sobretudo:

a existente oferta de mão-de-obra a preços mais baixos nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, e principalmente o uso nestes de mão-de-obra infantil, seria a causa do desemprego dos trabalhadores menos qualificados em seus países, conseqüentemente aumentando a desigualdade econômica entre suas classes sociais(LAFER, 1994, P. 160).

            Nesse sentido, caracteriza-se dumping social quando negado aos trabalhadores seus direitos e garantias, estabelecendo a estes exaustivas e desumanas jornadas de trabalho, negando aos operários “direitos laborais e previdenciários mínimos”, objetivando dessa forma, aumentar os lucros, ocasionando assim, no mercado internacional uma concorrência desleal(COURA, 2013).
            Segundo este raciocínio a vantagem emergida do baixo custo de sua mão-de-obra desarmonizaria o sistema internacional, desqualificando-o, e urgindo por medidas de correção(LAFER, 1998).
Nesta linha, mantido tal desenho, a teoria do dumping social para o Tribunal Superior do Trabalho viabilizou-se no contexto de globalização da economia, com o conseqüente desmembramento das plantas industriais, como nos casos da produção de tênis e de bolas esportivas. Em tais conhecidos exemplos identificaram que as grandes indústrias desses materiais, transferiram a maior parte de sua produção para os países asiáticos, em que a mão-de-obra é sabidamente barata, alijada de qualquer direito que regulamente as relações de trabalho, que motivou um movimento mundial destinado a restringir o mercado para tais produtos resultantes da força de trabalho infantil de Bangladesh.
Tais reminiscências comprobatórias testemunham que a mercadoria é produzida em desrespeito aos direitos dos trabalhadores, o que geraria um plus para a empresa, demonstrativo de sua responsabilidade social. Amparada nos conceitos político-filosóficos o dumping social, segundo Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas, se configura pelas agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas que geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência.

Alega-se, sob esse aspecto, que a vantagem derivada da redução do custo de mão-de-obra é injusta, desvirtuando o comércio internacional. Sustenta-se, ainda, que a harmonização do fator trabalho é indispensável para evitar distorções num mercado que se globaliza(LAFER, 1994,p.162).

Oferecendo uma espécie de certidão de reconhecimento para a coibição de tal prática, o artigo 404 do Código Civil Brasileiro guarda a medida eficaz que impulsiona a dinâmica da tendência de dar máxima efetividade a dignidade da pessoa humana, confirmando a amplitude da indenização a ser paga pela empresa que é partícipe deste cenário(FONSECA, 2013). Segundo Jorge Souto Maior,

a pertinência desses dispositivos no direito do trabalho é gritante, pois, normalmente, as agressões ao direto do trabalho acabam atingindo uma grande quantidade de pessoas, sendo que destas agressões o empregador muitas vezes se vale para obter vantagem na concorrência com outros empregadores. Isso implica, portanto, dano a outros empregadores que, inadvertidamente, cumprem a legislação trabalhista, ou, de outro modo, acaba forçando-os a agir da mesma forma, precarizando, por completo, as relações sociais(SOUTO MAIOR, 2013).

            Dessa forma, visando uma concorrência mais justa, os países desenvolvidos “propugnam por medidas antidumping social” com a inclusão de cláusula social que estabeleceria um padrão trabalhista e buscaria preservar o cumprimento dos direitos e garantias assegurados aos operários(QUEIROZ,  2013).
              Com isso, verificamos que embora a adoção da cláusula social possa acarretar alguns problemas aos países que utilizariam o “dumping social”, precisamos defender e preservar os direitos assegurados aos trabalhadores, porquanto estão acima de qualquer valor.

4. Um empenho de justiça:  a recuperação e prevenção de erradicação do trabalho infantil

Apesar de toda evolução legislativa, cultural e tecnológica, ainda nos deparamos com a exploração do trabalho infantil, porquanto é visto como um fator que contribuiu para a formação do infante, ou seja, como uma solução, uma forma de afastar a criança da violência e de educar para a vida e não como um fator que prejudica o seu desenvolvimento, contribuindo inclusive para a formação de tantos outros problemas sociais, como o desemprego e a pobreza.
A exploração do trabalho infantil ocasiona a criança uma série de seqüelas e problemas, como por exemplo, dificuldade de aprendizagem, baixo auto-estima e principalmente inúmeras doenças, as quais podem ser físicas e psicológicas. No entanto, algumas conseqüências são percebidas apenas com o passar dos tempos, ou seja, quando a criança se torna um adulto, porquanto o trabalho infantil não qualifica o infante, mas apenas prejudica.
Em que pese seja expressamente proibido a utilização da mão-de-obra infantil, salvo quando realizado com o intuito de aprendizagem, ainda é muito utilizada, tendo em vista a forte contribuição de fatores “econômicos, culturais e políticos”(CUSTÓDIO, 2009, p. 77).
            Embora a pobreza seja considerada a principal contribuinte para a exploração do trabalho infantil, o que faz necessária a contribuição financeira de todos os seus integrantes, não podemos esquecer a influência do aspecto cultural, porquanto “o trabalho de crianças e adolescentes está arraigado nas tradições, comportamentos de diversos locais, como um vestígio do passado, com uma forte resistência às mudanças”(CUSTÓDIO, 2009, p.P.77-78).
No entanto, para a nossa triste realidade o trabalho infantil está fortemente enraizado na cultura e nos valores da grande maioria da população, o que de certa forma dificulta seu combate e a atuação das medidas utilizadas para a sua erradicação.
Assim, com o intuito de acabar com esse problema, houve a necessidade de implantação de programas que visam erradicar a exploração da mão-de-obra infantil, através da utilização de cláusulas sociais e também do desenvolvimento de outras políticas públicas as quais pretendem amenizar a pobreza, incentivar e garantir o acesso a educação, ou seja, combater os fatores que contribuem para a exploração do trabalho infantil.
Numa visão macroscópica, a mecânica de funcionamento e a filosofia inspiradora da técnica de atuação da proibição do trabalho infantil fixam-se em critérios estabelecidos na Convenção de 1919, da Convenção 138(1973) e Convenção 182(1999), da Organização Internacional do Trabalho.
Suas condicionalidades, requisitos exigidos, perpassam pelas políticas públicas desencadeadas e defendidas dentro do âmbito das cláusulas sociais que  são a proibição do trabalho infantil por meio da imposição  de uma idade mínima para o indivíduo ingressar no mercado de trabalho e o estabelecimento de sanções  comerciais contra aqueles países que utilizam o trabalho infantil na produção de bens e serviços que, tecnicamente, dependem de uma série de  fatores e ajustes para a sua formação.
Esta simbiose de compromissos, ordenando político-juridicamente a organização das relações comerciais, inclusive no plano estratégico-econômico, no ponto de vista das políticas sociais potencializa buscar um sistema de proteção social no sentido amplo que, nas suas interações com o tecido econômico, opere como uma alavanca tanto para o crescimento da economia quanto e ao mesmo tempo para a promoção da maior igualdade entre os cidadãos, apoiada em processos para

definir conceitos e metodologias de pesquisa primária para a produção e melhoria de dados e informações sobre o trabalho infantil [...] Fortalecer as instituições existentes incumbidas de realizar pesquisas sobre o tema [...] Estabelecer um sistema de monitoramento e avaliação, atrelado a um sistema de informações e de comunicação interna e externa aos programas existentes de prevenção e erradicação(SILVA, 2001, p. 118).

A complexificação deste fenômeno exige a complexificação das práticas de enfrentamento ao trabalho infantil, que pode ser, em primeiro lugar, trilhado através da imposição de sanções comerciais, na forma da cláusula social, contra aqueles países que fazem uso do trabalho infantil, que depende de uma série de fatores.
Segundo o coordenador do “Programa Empresa Amiga da Criança” da Fundação Abring, as cláusulas sociais podem contribuir significativamente para a eliminação do trabalho infantil, bem como para a proteção dos trabalhadores em geral, tendo em vista que podem ser utilizadas como uma forma de impedir que países mais pobres obtenham vantagens comerciais através da exploração da mão-de-obra de sua população(ANAMATRA, 2013).
Em segundo, a instrumentalização na linha com os princípios e valores expressos nas políticas de responsabilidade social, contidos nas convenções internacionais de trabalho integrados a norma interna, como é o caso da  Constituição Brasileira  que  empenha-se em  proibir o trabalho infantil para as idades inferiores a 16 anos, com exceção para o aprendiz, proibido para idade inferiores a 14 anos.
Todavia, a mudança da faixa etária dos 14 para os 16 anos de idade, operacionalizada pela Emenda Constitucional 20, aprovada em dezembro de 1998, não teve efeitos sobre o declínio do trabalho infantil.
Desta forma, em terceiro lugar podemos destacar o desenvolvimento e a implantação de políticas públicas, as quais visam conscientizar e garantir aos cidadãos a aplicação de seus direitos.
Nesse sentido, verificamos o seguinte entendimento:

As medidas de combate do trabalho infantil, realizadas através de entidades multilaterais, governos e organizações da sociedade civil, podem ser classificados em três frentes: a) fixação de regulamentos (restringindo e disciplinando o trabalho infantil); b) diretrizes para a ação dos governos propostas pelos organismos multilaterais e entidades nacionais; e c) implementação de medidas concertas de ação (conscientização da sociedade a cerca do problema, apoio técnico para a elaboração de leis e a implantação de programas, denúncia de abusos no trabalho infantil, implementação de programas de profissionalização e de formação de crianças e adolescentes entre outras) (GONÇALVES, 2013).
                    
O Governo Brasileiro tem adotado inúmeras ações para erradicar a utilização da mão-de-obra infantil, “através de ONGs, empresas, entidades patronais, sindicatos, governos locais e, mais recentemente, pelo Governo Federal”. Estas ações visam combater a exploração do trabalho infantil, à prostituição, melhorar a qualidade de ensino, a profissionalização de infantes e o provimento de recursos financeiros a famílias carentes, como uma forma de complemento da renda familiar, visando oportunizar aos infantes um desenvolvimento digno(GONÇALVES, 2013).
Podemos destacar como políticas públicas utilizadas pelo sistema brasileiro com o intuito de preservar e de proteger os direitos das crianças, a política de atendimento, de proteção, de promoção dos direitos, e a de justiça(CUSTÓDIO, 2009).
            A proteção e a devida concretização dos direitos da criança e do adolescente competem à família, Estado e sociedade, mas com o passar dos tempos e as constantes mutações necessitou-se da criação de um sistema que assegurasse a proteção do infante de forma integral, contra qualquer tipo de ameaça, agressão, ou de violência. Com essa intenção, o sistema brasileiro criou um órgão competente para garantir, zelar os direitos e a proteção das crianças, intitulado Conselho do Tutelar, assegurado pelo artigo 133 do Estatuto da Criança e do Adolescente(CUSTÓDIO, 2009). As medidas de proteção aos infantes estão expressamente dispostas no Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 101 e podem ser aplicadas sempre que necessário, desde que a criança esteja desprotegida, ou seja, sofrendo algum tipo de ameaça ou violência, nesses casos o órgão competente (Conselho do Tutelar) tomará as medidas cabíveis.
            Também temos que ressaltar a contribuição do programa denominado “Bolsa Escola” para a diminuição da exploração da mão-de-obra infantil, porquanto desde a sua criação “os avanços tem sido expressivos”, uma vez que o número de crianças e adolescentes com menos de 16 anos de idade que trabalham e não estudam é muito pequena e a cada ano vem diminuindo(PASTORE, 2013).
Ademais, a ação acima mencionada, é uma forma de inserir os infantes na sociedade e não apenas um meio de retirá-los da realização do trabalho infantil, garantindo assim, a realização de seus direitos.
Outra ação que deve ser destacada é a criação da “Bolsa Criança Cidadã”, criada pelo Governo Federal, que visa proporcionar as famílias carentes benefícios materiais para complementar a renda familiar, no entanto, a criança deve reingressar ou ingressar no ambiente escolar(RIBEIRO, 2013).
O Governo Federal também tem desenvolvido vários programas na área da educação que contribuem significativamente para a erradicação do trabalho infantil, tais como “Toda Criança na Escola, Educação Profissional Básica, Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental, Alfabetização de Jovens e Adultos, Aceleração da Aprendizagem, Plano de Valorização do Ensino Fundamental e do Magistério"(RIBEIRO, 2013).
Embora todos os meios utilizados e criados para controlar e retirar os infantes do mercado de trabalho sejam ações válidas, há que se destacar que a educação é a principal questão a ser trabalhada pelos governos, pois essa é a base de qualquer sujeito, sendo uma forma de tratar o problema pela raiz.
Da mesma forma, políticas públicas estão sendo desenvolvidas nas áreas da saúde e da assistência social como objetivo de alertar e conscientizar as entidades familiares, bem como toda comunidade sobre os riscos, conseqüências e problemas que a atividade precoce pode causar a criança.           
Em que pese à constante preocupação e criação de normas, ações, legislações e programas que visam prevenir e erradicar a exploração do trabalho infantil, ainda nos deparamos com crianças e adolescentes abandonando as salas de aula, as brincadeiras e principalmente sua dignidade para efetuar trabalhos forcados, pesados e desgastantes, visando um único objetivo, contribuir financeiramente com o sustento de suas famílias.
Por fim, temos que ter em mente que as medidas adotas para a erradicação do trabalho infantil, não são soluções imediatas, mas sim investimento de longo prazo e a única maneira de atingirmos o  tão sonhado objetivo, qual seja, o fim da utilização da mão-de-obra infantil.

5. Conclusões finais
           
            A questão referente a exploração da mão-de-obra está enraizada em nosso mundo, porquanto a constante briga pelo crescimento e desenvolvimento dos países se tornou  maior e mais importante que o respeito e consideração pelo bem estar de suas nações.
            Contudo, objetivando controlar e impor limite a tais atos desumanos, que violam tanto os direitos das crianças, dos adolescentes e dos adultos, os quais são obrigados, devido a pobreza e a desigualdade social a se submeterem a exaustivas jornadas de trabalho, houve a necessidade de criação de programas, ações, normas que visam combater a exploração, estabelecendo a igualdade tanto perante os indivíduos como perante o mercado internacional.
            Embora, verificamos a adoção das cláusulas sociais pelo mercado internacional como uma medida extremamente sensata, correta, há que se destacar que se trata de um tema extremamente polemico e de duas facetas, porquanto pode ocasionar tanto benefícios como malefícios.
Realmente, temos que ter em mente que a adoção de tais cláusulas poderá contribuir para o desemprego, protecionismo dos países desenvolvidos, mas também trará muitas coisas boas aos países e principalmente aos seus trabalhadores, uma vez que garantirá a aplicação de seus direitos.
Assim, as cláusulas sociais devem ser adotadas pelo mercado internacional, pois acima de tudo precisamos ponderar e defender pelos direitos e garantias dos trabalhadores, tendo em vista que são seres humanos, os quais possuem valores e sentimentos que precisam ser considerados e respeitados.
A adoção das cláusulas sociais pelo mercado internacional contribuirá para o crescimento e desenvolvimento dos países mais pobres, ou seja, beneficiará seus cidadãos, que usufruíram de uma vida melhor, mais digna, pois não há crescimento de um país enquanto sua população encontra-se submetida a explorações e exaustivas jornadas de trabalho.
O desenvolvimento de um país, de uma sociedade, de um estado não surge com a exploração do trabalho adulto ou infantil, ou seja, com práticas extremamente desumanas, mas sim com a proteção do ser humano, preservando e aplicando seus direitos.
Outro problema que terá solução com a adoção das cláusulas sociais é a erradicação e prevenção do trabalho infantil, pois infelizmente, embora toda tecnologia e desenvolvimento, ainda nos deparamos com crianças e adolescentes abandonando as salas de aula para se submeter a exaustivas jornadas de trabalho, com o intuito de colaborar com o sustento de suas famílias.
Temos que acabar com essa triste realidade que presenciamos todos os dias nas ruas, televisões, porquanto se visamos um mundo melhor, com menos violência e mais desenvolvido, precisamos de crianças e adolescentes nas escolas, brincando, aproveitando essa fase maravilhosa de suas vidas, porquanto esses representam o futuro do nosso país e do nosso mundo.
Por fim, podemos dizer que embora estejam sendo adotadas inúmeras medidas, através de ações e programas, a caminhada em prol da erradicação do trabalho infantil ainda é longa, uma vez que se faz necessário abandonar o egoísmo, o excessivo capitalismo, e passar a pensar no ser humano como uma pessoa de direitos e sentimentos, valores esses que precisam ser respeitados por todos.

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