Contribuciones a las Ciencias Sociales
Noviembre 2013

TERRITÓRIOS E TERRITORIALIDADES NO URBANO DE PARINTINS - AM: AV. GENY BENTES, DAS RELAÇÕES DE TROCA AO ESPAÇO VIVIDO



Francisco Alcicley Vasconcelos Andrade (CV)
falcicley@gmail.com
George Cruz dos Santos (CV)
Tatiana da Rocha Barbosa (CV)
UFAM






RESUMO
O artigo apresenta análise acerca do conceito território o discutindo como um espaço de relações embutido de disputas de poderes. Para esboçar um entendimento por meio do conceito, o trabalho discute os territórios e territorialidades da Av. Geny Bentes em Parintins – AM. Para tanto, primeiramente, buscou-se enfatizar um pouco sobre o território na geografia clássica utilizando de dois autores de correntes de pensamento diferentes. Em seguida, buscou-se explicar o que é territorialidade, poder e a diferenciação de território para espaço geográfico. Como resultado principal constatou – se que o uso da Av. Geny Bentes reflete por um lado, as relações de troca devido ao forte circuito inferior da economia que nela existe e por alguns momentos, as relações de uso. Neste sentido, se constatou que a avenida é utilizada de diferentes formas se caracterizando como um verdadeiro espaço vivido e a par das diferenças de cada relação, palco de múltiplos conflitos.

Palavras-chave: Espaço Urbano, Território, Territorialidades.

ABSTRACT

The paper presents analysis of the concept discussing the territory as a space of embedded power relations disputes. To sketch an understanding through the concept, the paper discusses the territories and territoriality of Av Geny Bentes Parintins - AM. To do so, first, we tried to emphasize a bit over the territory in classical geography using two streams of different authors thought. Next, we sought to explain what is territoriality, power and differentiation of territory for geographic space. The main result found - that the use of Av Geny Bentes reflects on the one hand , the terms of trade due to strong lower circuit of the economy that is in it and for a few moments , the relationships of use. In this sense, it was found that the avenue is used in different ways been characterized as a true lived space and differences of each pair of relationship, scene of many conflicts.

Keywords: Urban Space, Territory, Territorialities.



Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Vasconcelos Andrade, F., Cruz dos Santos, G. y da Rocha Barbosa, T.: "Territórios e territorialidades no urbano de Parintins - Am: Av. Geny Bentes, das relações de troca ao espaço vivido", en Contribuciones a las Ciencias Sociales, Noviembre 2013, www.eumed.net/rev/cccss/26/espacio-urbano.html

INTRODUÇÃO
A concepção teórica referente ao urbano pré-estabelece que ele está para além da cidade. O urbano concretiza-se no espaço geográfico que o torna produto de suas ações e traz em detrimento das divergências entre pensamentos e ações dos membros da sociedade, contradições oriundas da sua desigualdade gerando conflitos por sua vez, contribuintes para a configuração do espaço geográfico.
Partindo desta perspectiva, a produção engendrada pelo homem no espaço promove múltiplos espaços, fragmentados territórios e territorialidades que geram espacialidades peculiares cada qual com seu teor de complexidade.
Por meio desta concepção, buscou-se com esta pesquisa identificar os muitos territórios da Avenida Geny Bentes, popularmente conhecida como rua larga que se localiza na zona sudoeste da cidade de Parintins entre os bairros de Itaúna I, Itaúna II e Paulo Corrêa (ver figura 01).
Para a realização da pesquisa se fez levantamento bibliográfico para compreender as espacialidades que se forma na avenida, reconhecimento da área como a catalogação de seus elementos, visitação nesta em dias e horas alternadas para identificar seus territórios e territorialidades, representação cartográfica destes territórios, além de pesquisa documental oficiais em órgãos públicos sobre a produção dos bairros onde se localiza a avenida.

POR UMA REFLEXÃO DO TERRITÓRIO
A noção de território embutido no discurso científico já tem longa história. No entanto, Saquet (2009, p. 73) sintetiza que somente “nos últimos anos, tem-se reforçado consideravelmente, no Brasil e noutros países, estudos de geografia, sociologia, economia e antropologia centrados nos conceitos de território e territorialidade”.
Segundo o autor as novas reflexões sobre o território abriram novos caminhos para sua apreensão, pois possibilitaram ir além do significado clássico que a ele era empregado de apenas um espaço físico de governança face ao Estado. Para o autor o território detém de um significado muito mais profundo e complexo devido às múltiplas territorialidades que se criam pelas ações dos indivíduos e grupos a qual se falará mais adiante.
Segundo Souza (2000) as primeiras abordagens do território são advindas da Geografia Tradicional Clássica especificamente da Geografia Política, cujo principal autor foi o geógrafo alemão Friedrich Ratzel, que em sua obra em particular “Geografia Política” trabalhava o termo como conceito sinônimo de Estado-Nacional. Segundo o autor em Ratzel a territorialidade se dava no contexto geral da nação nacional, de um povo único: de mesma ideologia, política, economia e cultura (como se não houvesse classes e grupos diferentes dentro do território nacional).
Segundo Costa (2008) em sua “Geografia Política” Ratzel considerava o Estado como um organismo vivo como sintetiza o autor:

A ideia de organismo foi emprestada por Ratzel à biogeografia, para qual o solo condiciona as formas elementares e complexas de vida. Nesse sentido, o Estado, como forma de vida, tenderia a comportar-se (por analogia) segundo as leis que regem os seres vivos na terra, isto é, nascer, avançar, recuar, estabelecer relações, declinar etc (COSTA, 2008, p. 35).

Neste sentido, para Ratzel por ser como um organismo vivo, o elemento que seria primordial para que um Estado se mantivesse vivo, forte, e capaz de sobreviver a qualquer crise, seria o território (para Ratzel solo).
Para Costa (2008) o verdadeiro objetivo de Ratzel com suas reflexões sobre um Estado forte, estava no fato de que o autor sonhava que o seu “ideal nacional” em ver o povo alemão unificado sobre um mesmo território que seria “espaçoso” e “próprio”, se realizasse, formando o Estado Alemão que na época do autor estava fragmentada devido ao sistema feudal que vivia.
Friedrich Ratzel era de postura determinista. Neste sentido vejamos por outra corrente de pensamento o significado de território. Assim, tomemos como referência as reflexões de cunho possibilista do geógrafo francês CamilleVallaux, para demonstrar que em seus primórdios o território já era um conceito bastante debatido.
Segundo Costa (2008) foi em especial em sua obra “Geografia Social – O Solo e o Estado” que CamilleVallaux realiza um diálogo rico com Friedrich Ratzel concordando ou não em alguns pontos com o geógrafo alemão.
Segundo o referido autor, para Vallaux era fundamental separar fenômenos sociais e naturais, fato que ia de encontro com o forte pensamento da geografia tradicional alemã de que sociedade e natureza formavam uma unidade intrínseca onde o homem estaria submisso a natureza.
Costa (2008) menciona que para Vallaux, o solo, de fato, podia ter influência no desenvolvimento das sociedades e dos Estados, pois é um elemento que se distribui de modo irregular na superfície terrestre onde alguns Estados teriam benefícios positivos (principalmente político e econômicos) do que outros com essa diferenciação.
No entanto, apesar de o solo se distribuir de modo desigual na superfície terrestre, para Vallaux, isso não se faria de modo a determinar a história de cada povo e Estado, pois, acreditava que as sociedades poderiam intervir ativamente no meio, criando condições mais propícias ao seu desenvolvimento. Neste sentido, diferente de Ratzel, não era a quantidade de território (solo) que determinava o crescimento ou o declínio de uma sociedade e de um Estado.
Segundo Costa (2008) devido à interferência no meio, nas concepções de Vallaux o espaço detinha de uma produção social.
Essa característica é importante observar, pois demonstrava (mesmo que não explícito) que os grupos podem criar territórios como fruto das relações sociais e não somente como solo, permitindo refletir que a territorialidade não é algo “homogenia” a nação-nacional, como em Ratzel, mas híbrida.
Como se percebeu ao parafrasear as reflexões desses dois autores (Friedrich Ratzel e CamilleVallaux), o território em seus primórdios clássico da geografia já era muito debatido. Se pôde perceber que intrínseco ao território nacional do Estado (de ordem política) existe aqueles que são produzidos pelos indivíduos cotidianamente (de ordem social).
Por tanto, ao pensar em território segundo Souza (2000) não se deve levar em consideração apenas o de escala estatal, mas o proveniente de todas as relações configurado nas mais diversas escalas.

TERRITÓRIO E TERRITORIALIDADE
Deve-se também discutir intrínseco ao conceito território o que é territorialidade.
Segundo Saquet (2009) ao trabalhar o termo territorialidade se está colocando o homem como síntese, ou, de outro modo como elemento central na produção territorial, exatamente segundo o autor porque se trata de uma abordagem centrada nas relações sociais que os indivíduos impõem sobre o espaço
            Neste sentido, fica obvio compreender que por traz da homogeneidade do espaço de governança do Estado quando levado em consideração as territorialidades sociais, territórios existem e são construídos nas mais diversas escalas. É por isso que Fernandes (2009, p. 200) menciona que “o território, compreendido apenas como espaço de governança, é utilizado como forma de ocultar os diversos territórios [...]” que são produzidos cotidianamente pela vida que anima o espaço.
            Enfim segundo, apesar de que a territorialidade, assim como o poder e o território tenham vários significados no discurso de diversos autores, segundo Saquet (2009, p. 90) esta de modo geral está relacionada à “[...] todas as nossas relações cotidianas, ou melhor, ela corresponde às nossas relações sociais cotidianas em tramas, no trabalho, na família, na rua, na praça, na igreja, no trem, na rodoviária, enfim, na cidade-urbano, no rural-agrário e nas relações urbano-rurais de maneira múltipla e híbrida”.

TERRITÓRIO E O PODER
Nas abordagens atuais o que define o território é o poder. Souza (2000, p. 78), menciona muito bem essa questão ao dizer que “o território [...], é fundamentalmente um espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder”.
Com relação ao termo, Raffestin (1993) menciona que é ambíguo em significados. Mas o autor busca defini-lo por aproximação mencionando que existe um poder escrito com o “P” maiúsculo e de outro com o “p” minúsculo. O poder de “P” maiúsculo é o representado pelo Estado, seus aparelhos políticos, repressivos, suas leis, é o poder que se manifesta visivelmente para manter a ordem na sociedade, entre suas classes e seus grupos. Já o poder com o “p” minúsculo é simbólico pertencente a todos os indivíduos e considerado pelo autor como o mais perigoso, pois os indivíduos podem usá-lo da forma que quiserem a qualquer momento contribuindo ou ferindo as relações sociais.
Raffestin (1993) ressalta que o “poder” de escrita minúscula é anterior ao “Poder” de escrita maiúscula exatamente porque o Estado como entidade maior é soberano sobre toda a sociedade podendo usar de seu poder para reprimir os conflitos que por ventura ameace a ordem social.
De modo geral, para Raffestin (1993) o poder é parte intrínseca de toda relação, sendo exercido por todos os indivíduos em qualquer lugar, sendo, por tanto, multidimensional constituindo, assim, múltiplos territórios.

TERRITÓRIOS E TERRITORIALIDADES DA AV. GENY BENTES
A Av. Geny Bentes é uma das vias mais conhecidas na cidade de Parintins principalmente devido ao grande número de bares e casas de shows que possui o que torna um dos pontos mais atrativos de pessoas advindas de todos os lugares da cidade principalmente aos finais de semana. A avenida, também, é fortemente conhecida devido ao intenso número de estabelecimentos comerciais que desde grandes lojas de roupa até pequenas oficinas.
Historicamente, a origem da avenida está atrelada a um conflito social que atinge muitas cidades brasileiras: a luta por moradia. Os bairros que a Av. delimita são oriundos de ocupações que ocorreram no período da década de 90, em uma área denominada na época de “Gleba Itaúna” pertencente ao empresário de nome Paulo Corrêa. Depois de requerer na justiça a posse de suas terras o Sr. Paulo Corrêa acabou sendo ressarcido por elas pelo poder público1 .
Durante o dia, a Av. Geny Bentes é tomada por uma determinada paisagem humana com pessoas trabalhando em comércios de todo tipo, fazendo compras ou indo fazer compras. O trânsito é agitado, além da presença dos próprios moradores e de seus transeuntes. Ao cair à noite, a maioria dos comércios que funcionam durante o dia fecha, com exceção dos bares e das lanchonetes que a noite funciona com mais intensidade, entrando também em cena os vendedores ambulantes e as igrejas.
Segundo Saquet (2009, p. 84) espacialmente “há múltiplos arranjos [...] territoriais, que vão desde o indivíduo, passando pela família e organização de bairros ou de localidades rurais, até grandes organizações políticas e/ou culturais e/ou empresariais”.
Com base na citação de Saquet, relacionando ao contexto da Av. Geny Bentes, um desses arranjos territoriais se dá na escala dos indivíduos-moradores da própria rua, que comumente tem hábitos de sentarem em frente suas residências principalmente nos fins de tarde e nas primeiras horas da noite (ver figuras 02 e 03).
Há de ressaltar, que em alguns momentos moradores junto com outras pessoas produziam também territorialidades na calçada central da avenida, geralmente para realizar o consumo de bebidas alcoólicas o que prejudicava por um determinado tempo o fluxo de pessoas por sua vez obrigadas a transitarem pela rua em função de obstáculos (mesas, cadeiras, caixas de isopor) inseridos no calçamento central.
Neste sentido, as territorialidades produzidas pelos moradores da própria Av. Geny Bentes não se caracterizava apenas como relações simétricas em alguns momentos elas também se configuravam como dissimétricas aos demais usuários da rua.

De outro modo, é preciso destacar que tais comportamentos são produzidos por grupos que promovem o cotidiano da Av. Geny Bentes e são esses grupos que, de acordo com Saquet (2009) criam no espaço territorialidades para satisfazer suas necessidades. Necessidades que relacionado ao contexto daqueles moradores estava mais em criar, mesmo que por algumas horas junto a familiares e conhecidos um espaço de lazer, do descanso devido à correria do dia-a-dia e no geral, são usuários antigos da avenida, que devido ao tempo que estão ali, já adquiriram um sentimento de pertencimento, de identificação com aquele lugar demonstrando que por traz de seu caráter comercial, a avenida ainda preserva fortemente relações de vizinhança, que naquele pequeno fragmento do espaço urbano resiste aos vetores que transformam a cidade.
No dizer de Fernandes (2009, p. 201) “[...] a partir de diferentes relações [...] territórios são produzidos e destruídos em permanentes conflitos [...]”.
Com relação a Av. Geny Bentes, uma dessas relações conflituosas se dá com relação a determinados grupos de jovens e adolescentes2 , que principalmente aos finais de semana à noite, territorializam certos trechos da calçada central quase sempre para consumirem bebidas alcoólicas, fato que contribui bastante para que ocorra na área atos de vandalismos (figuras 04 e 05).
Vale ressaltar segundo Souza (2000, pp. 89-90), que “[...] gangues de rua constituídas por adolescentes e jovens podem apresentar territorialidades [...] de grande mobilidade dos limites territoriais”. Ou seja, são territorialidades flexíveis, onde seus limites instáveis podem se expandir sobre outros substratos materiais da cidade (outras ruas, praças, becos).
Apesar de territorializarem de uma forma que aos olhos de quem está de “fora” pareça errado, esses grupos juvenis assim como os demais, apenas buscam satisfazer necessidades que são próprias de suas relações, mas que não deixa de entrar em conflitos com o meio social da avenida e com o próprio aparelho repressor do Estado (a polícia).
Uma moradora mencionou, que problemas com jovens na avenida não é algo atual. Segundo ela, durante algum tempo principalmente no inicio das ocupações da “Gleba Itaúna”, havia um problema muito grande com gangues de rua de jovens e adolescentes (no vocabulário dos moradores galeras) que de hora e momento se confrontavam violentamente em seu espaço em alguns casos ocorrendo mortes.
            Segundo a moradora, conflitos entre “galeras” como ocorriam antes, até então não existem mais devido à maior presença de policiamento. No entanto, ainda é freqüente, jovens e adolescentes praticarem atos ilícitos na avenida. Estes, por sua vez, se “apropriam” de certos trechos da calçada gerando, por conseguinte, um ambiente hostil a permanência dos moradores.
Outra situação de territórios conflitantes na Av. Geny Bentes se dá através da relação entre igrejas e bares (figuras 06 e 07).
Ambos os segmentos pertencem ao seleto grupo dos territórios-propriedades trabalhados por Fernandes (2009).
Sobre esses territórios, assim sintetizou Fernandes (2009, p. 208) “nossa casa pode ser o ponto de partida de referência para a compreensão de propriedade [...]. Estamos nos referindo à propriedade como espaços de vida, que pode ser particular ou comunitária”.
Com relação às igrejas, todas são evangélicas, de ordens religiosas diferentes, tendo seus horários de funcionamento principalmente no período noturno das 18 às 21 horas.
Nesses horários, é possível observar que enquanto estão em atividades, às igrejas inevitavelmente acabam entrando em conflito com o ambiente produzido pelos bares. De fato, enquanto nas igrejas ecoavam cantos religiosos e discursos dos pastores, dos bares ao contrário, são as músicas que fazem apologia a bebida, sexualidade e palavras de duplo sentido que imperam evidenciando, assim, a existência de territórios diferentes que se confrontam num mesmo espaço e tempo.
Ressalta-se que o número de bares (18) é superior ao de igrejas (5), entretanto, no decorrer do trabalho de campo, observou-se a existência de novas igrejas sendo edificadas.
Por trás dessa contradição existe uma explicação, que está ligada ao fato que as igrejas (segundo alguns membros dessas instituições) estão apenas cumprindo sua missão de adentrar aqueles lugares para eles considerados profanos, hostis a vida, buscando, assim, aproximar a palavra de “Deus” às pessoas.
Para os religiosos, a Av. Geny Bentes é o lugar da promiscuidade em função de nela existir ambientes que contribuem para afetar negativamente a vida das pessoas, pois, os bares, para eles, podem servir de porta de entrada fácil para que jovens e adolescentes se aproximem do mundo do alcoolismo, drogas e prostituição. Neste sentido, pode-se dizer que há uma luta por parte das igrejas com os bares, enquanto para os proprietários dos bares a presença de pessoas que os freqüentam significa a continuidade de seus negócios, para essas instituições o significado é outro: vidas precisam ser “salvas”.
Cabe aqui uma discussão frente à “luta” travada entre estes segmentos, pois tendo em vista que os bares se apresentam como única alternativa de lazer entre as pessoas que freqüentam a Av. Geny Bentes, onde está o Estado que não interfere promovendo políticas públicas para ampliar o leque de atividades que gerem lazer aos freqüentadores deste território?
            Assim, percebe-se que a relação entre igrejas e bares na Av. Geny Bentes é muito complexa, não se dá apenas no campo dos sons que são emitidos, vai além, indo para o campo da disputa pela vida, vidas que para os bares significa fregueses, a entrada de dinheiro, mas que para as igrejas são pessoas que estão “perdidas” e que precisam ser “encontradas” através da palavra de Deus.
Enfatizando um pouco mais sobre os bares esses territórios têm participação significativa na configuração espacial da Av. Geny Bentes principalmente aos finais de semana.
Com ênfase aos finais de semana os bares são os responsáveis maiores por atraírem um público considerável de pessoas para a avenida, em seus espaços se produzem uma territorialidade marcada pelo prazer da festa, do consumo e também do ilegal, pois foi nítida a presença de menores de idade nesses estabelecimentos principalmente aqueles de ambientes fechados consumindo bebidas alcoólicas.
Mencionando brevemente, de acordo com relatos de alguns moradores da avenida, ocorre não de maneira nítida, a questão de prostituição, além de venda de drogas em determinados bares. Segundo eles, há certa associação entre as garotas de programas e alguns donos de bares, que permitem que elas dentro de seus estabelecimentos conquistem seus clientes, desde que os façam gastar ali com o consumo de bebidas. Depois disso as garotas podem levar seus clientes para os motéis que existem próximos a avenida.
Com relação aos conflitos gerados pelos bares ao meio social da avenida, uma moradora relatou que quando as pessoas se sentem muito prejudicadas com os sons altos desses estabelecimentos, ocorre delas chamarem a polícia para amenizar o problema. No entanto, isso não adianta muita coisa, pois é só a policia se retirar do local que os proprietários dos bares voltam a aumentar o volume dos sons novamente. Segundo ela, além de serem barulhentos, de vez em quando ocorrem brigas nos bares, com incidência de algumas mortes já terem ocorridos principalmente quando envolvia membros de galeras.
Em campo, também foi possível constatar que durante o dia um dos bares e também uma churrascaria em determinados momentos territorializam alguns trechos da calçada central da avenida para obterem melhores vendas como indica às figuras 08 e 09.

Deve-se salientar que a territorialização feita pelo bar ocorrem (com exceção das segundas-feiras) todos os dias a partir dos fins de tarde entre as 16 e 17 h até algumas horas da noite. Já a territorialização feita pela churrascaria ocorre somente aos domingos no horário do almoço entre às 11 h da manhã e às 13 h da tarde.
Com relação à churrascaria, por exercer sua territorialização no horário em que o calor amazônico é excessivo, o proprietário se beneficia da sombra de algumas árvores para “criar” ambiente agradável a seus fregueses. Em outros termos, tanto o bar como a churrascaria praticam um exercício de poder que por algumas horas transformam um espaço público em um espaço privado para o consumo e o comércio.
Essas expressões de poder envolto as práticas de territorialização desses estabelecimentos por um determinado espaço de tempo neutralizam o pedestre de utilizar esses espaços agravando, por sua vez, um dos maiores problemas das cidades brasileiras: a acessibilidade.
No entanto, mesmo sendo práticas conflitantes ao se apropriar de um espaço público, as ações praticadas pelos proprietários de ambos os segmentos pertencem segundo Souza (2009, p. 67) “[...] a escala, por excelência, dos oprimidos e de suas táticas, com suas resistências quotidianas inscritas no espaço ou expressas espacialmente”. Ou seja, são pessoas que por meio dessas práticas buscam ganhar o necessário para sobreviver na cidade. Como não há fiscalização por parte do poder público sobre essas ações na avenida, abrisse a possibilidade para que outros estabelecimentos também façam o mesmo no calçamento central da rua.
Em grande parte, a maioria dos territórios-propriedades pertencentes aos moradores da avenida possui de uma dupla utilização, servindo tanto como lugar do abrigo (moradia), da privacidade, das relações familiares, do descansar como também para realizar algum tipo de comércio como meio de subsistência, do trabalho, das relações de troca fato que faz que a avenida tenha uma grande predominância comercial.
Outra situação de formação de territórios com uma temporalidade bem definida se dá através da ocupação, também, de certos trechos da calçada central da avenida por vendedores ambulantes.
Como bem salienta Souza (2000, p. 87) “territórios [...] podem [...] ter existência regular, mas apenas periódica, ou seja, em alguns momentos [...]”.
Com relação aos ambulantes de modo geral, eles só se apresentam na avenida com mais intensidade no período noturno possuindo, então, o que Souza (2000) chama de territorialidade cíclica que são relações que se realizam em um determinado período de tempo contribuindo, assim, para a alternância habitual dos usos diurnos e noturnos da Av. Geny Bentes.
Deve-se ressaltar, também, que em campo constatou-se, que há ambulante que já deixa demarcado com um objeto o “ponto” onde trabalhava o que servia como um modo de defendê-lo contra outros concorrentes ambulantes e demonstrar, assim, que aquele lugar já “tinha” dono (ver figura 10).
Segundo um ambulante, muitos deles trabalham na avenida há bastante tempo (em média mais de 5 anos), e independente do movimento nunca se deixa de vender algo na avenida e que há respeito entre os ambulantes, no sentido, que um não se apropria do território do outro.
Nos dizeres de Souza (2009), na escala dos oprimidos, não se deve negar que os ambulantes da avenida também contribuem para transformar seu espaço público em privado causando, neste sentido, por algumas horas da noite uma determinada segregação as demais pessoas que se utilizam daquele espaço.
Deve-se ressaltar que mesmo trabalhando cotidianamente é aos finais de semana que os ambulantes se apresentam em maior número na avenida, se concentrando a grande maioria em frente de casas de shows devido ao grande movimento de pessoas que esses estabelecimentos atraem.
Com relação a essa situação, aparentemente não há conflitos ao ponto de gerar brigas entre os proprietários das casas de shows com os ambulantes que territorializam trechos da calçada enfrente a seus estabelecimentos. Talvez essa convivência só seja possível, porque os ambulantes comercializam produtos que as casas de shows não oferecem (churrascos, doces, salgados, cachorros-quentes).
De outro modo, mesmo geradores de conflitos não se pode deixar de considerar que assim como em outros lugares, os ambulantes da Av. Geny Bentes são apenas um dos reflexos das contradições impostas pelo sistema capitalista, de uma economia desigual que se realiza no espaço urbano entre aqueles que dominam (classe dominante) e aqueles que são dominados (grupos excluídos).
É dessa forma através do exercício de atividades informais ou banais segundo Santos (2008) que os pobres buscam subsistir na cidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
            A partir das análises dos dados obtidos na pesquisa, se constatou que a Av. Geny Bentes, de fato, possui de diferentes expressões territoriais cada qual com sua peculiaridade que, por conseguinte, produziam diferenças, logo, conflitos.
A referida avenida apresenta questões dinâmicas, híbridas, que estão intrínsecas a lógica do próprio contexto urbano da cidade de Parintins, e, portanto, está em constante mudança.
Vista as várias situações vivenciadas com a pesquisa se pôde compreender que, as relações sociais ao se produzirem articulam o espaço, produzindo o vivido, os lugares e o cotidiano das pessoas.
Embutida na totalidade urbana de Parintins a Av. Geny Bentes se projeta como espacialidade, onde as relações sociais acontecem e também produzem/reproduzem o cotidiano local dos indivíduos. Ela é também lugar dos encontros, dos múltiplos significados do vivido.
De outro modo, a Av. Geny Bentes se configura de várias facetas, sejam pelo comércio, pela festa, ou no sentido de satisfazer as necessidades que os grupos possuem. Ou seja, a Av. Geny Bentes por um lado tem o sentido do mercado, dá troca, mas também do lugar territorializado por grupo de pessoas que ali impõem seus comportamentos que a par de suas particularidades fazem com que ela seja um cenário de múltiplas ações sociais, que geram muitas formas de uso. Em outro sentido, a Av. Geny Bentes é um complexo “espaço de liberdade”, ela é vivida, experimentada e conhecida de várias formas e por vários motivos.
            Enfim, as práticas sociais ou as relações de poder que se realizam na Av. Geny Bentes são caracterizadas como relações efêmeras e fragmentadas que resultam na produção de um território repleto de complexidade. De outro modo, se pode compreender através do estudo feito na referida avenida que o território é móvel, mutável, passível de tensão e que sua escala como relações de poder não se interliga apenas ao Estado, mas também a vida que anima o espaço.


REFERÊNCIAS
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FERNANDEZ, Bernardo Mançano. Sobre a tipologia de territórios. In: SAQUET, Marcos Aurélio; SPÓSITO, Eliseu Savério (orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. 1. ed. São Paulo: Expressão popular, 2009, p. 197-213.

RAFFESTIN, Claude. Por Uma geografia do Poder. Trad. Maria Cecília França.SãoPaulo:Ática.1993.

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: Técnica e tempo, Razão e Emoção. 4. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008.

SAQUET, Marcos Aurelio. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, Marcos Aurélio; SPÓSITO, Eliseu Savério (orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. 1. ed. São Paulo: Expressão popular, 2009, p. 73-93.

SOUZA, Marcelo José Lopes de. O território: sobre espaço e poder. Autonomia e
desenvolvimento. In CASTRO, I. E. de; GOMES, P. C. da C.; CORRÊA, R. L.
(Orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000, p.77-116.

SOUZA, Marcelo Lopes de. “Território” da divergência (e da confusão): em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. In: SAQUET, Marcos Aurélio; SPÓSITO, Eliseu Savério (orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. 1. ed. São Paulo: Expressão popular, 2009, p. 57-72.

1 As informações do processo de fundação dos bairros Itaúna I, Itaúna II e Paulo Corrêa foram adquiridas na Câmara Municipal de Parintins.

2 Tentou-se conseguir registros fotográficos desses grupos, mas sempre havia a recusa por parte dos indivíduos. Neste sentido, respeitando e evitando confusões com aqueles grupos o que poderia atrapalhar o andamento da pesquisa se preferiu não retira-las mais.