Contribuciones a las Ciencias Sociales
Noviembre 2013

A REALIDADE QUE O BRASIL NÃO QUER VER



Márcio Machado Rocha (CV)
Eduardo Mauch Palmeira (CV)
marcioucpel@gmail.com
Universidade Católica de Pelotas





RESUMO
Este ensaio teórico se propõe a discutir a importância dos Programas de Transferência de Renda implementados pelo Governo Federal, mais especificamente do Programa Bolsa Família, para tanto, para a sua realização, foram utilizados referenciais e pesquisas em sites oficiais, bem como da legislação, com a finalidade de levantar dados para a discussão proposta. O tema Política Social é complexo e contraditório, e a assistência social não está isenta de críticas, justamente pela complexidade que a envolve. Boa parte da sociedade ainda oferece resistência aos PTRs, mesmo diante da realidade dos fatos e dos números expostos através do cadastro único. Portanto, os assuntos que permeiam este trabalho buscam respostas para uma realidade que o país não quer ver e para uma justiça social ainda pouco presente em nosso país.   

Palavras-Chave: Programas de Transferência de Renda. Bolsa Família. Justiça Social.

ABSTRACT
This test theoretical proposes to discuss the importance of Income Transfer Programs implemented by the Federal Government, more specifically the Bolsa Familia Program, for both, for its implementation, have been used references and research in official sites, as well as the legislation, with the purpose of getting data to the discussion proposal. The theme Social Policy is complex and contradictory, and the social assistance is not exempt from criticism, precisely by the complexity that surrounds it.

Keywords: Income Transfer Programs. Bolsa Familia. Social Justice.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Machado Rocha, M. y Mauch Palmeira, E.: "A realidade que o Brasil não quer ver", en Contribuciones a las Ciencias Sociales, Noviembre 2013, www.eumed.net/rev/cccss/26/bolsa-familia.html

INTRODUÇÃO

Para nos situarmos melhor na contemporaneidade, pode-se dizer que no Brasil, somente após a constituição federal de 1988, é que o cidadão de fato passou a ter os seus direitos sociais garantidos e reconhecidos por Lei, e este fato legal e jurisdicional, foi na verdade um divisor de águas para a política social, e junto com esta garantia assegurada pela constituição veio à percepção de que muito ainda deveria ser feito para que os cidadãos pudessem ter os seus direitos garantidos, “O contexto político, econômico e cultural brasileiro é marcado pelo ingresso no campo dos direitos sociais só ao final do século XX. Antes disso só a legislação social do trabalho – cercado de privilégios [...], é que se constituíam campo de direitos sociais. (SPOSATI, 2000, p. 1).
Diante do fato da extrema pobreza no país, e das enormes desigualdades sócio-econômicas o Governo Federal lançou alguns programas de transferência de renda, dentre eles poderíamos citar: o Bolsa Família, Plano Brasil sem miséria, Ação Brasil Carinhoso, e outros planos e programas voltados a beneficiar famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo país. Mas não caberia aqui, e nem haveria possibilidade de nos aprofundarmos em cada um deles, o que se quer na verdade é encontrar subsídios para levantar alguns questionamentos e nos atermos mais ao Bolsa Família que na atualidade tornou-se o principal programa de transferência de renda em termos numerários.
Segundo (WEISSHEIMER, 2006), em seu livro intitulado: Bolsa Família, Avanços, Limites e Possibilidades que está transformando a vida de milhões de famílias no Brasil, expõe que o Bolsa Família conseguiu talvez pela primeira vez, modificar significativamente a tendência histórica de concentração de renda e de propriedade no Brasil, e o programa tem dois objetivos básicos que seriam combater a miséria e a exclusão social, e também promover a emancipação das famílias mais pobres. Uma das novidades do programa em relação a iniciativas similares anteriores foi à unificação de todos os benefícios sociais do governo federal (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio Gás) em um único programa. O objetivo da unificação foi garantir maior agilidade na liberação do dinheiro, reduzir a burocracia e melhorar o controle dos recursos.
Partindo-se do pressuposto que os dados públicos da transparência colocados à disposição dos cidadãos pelo governo federal em seus sites oficiais são verídicos, então podemos verificar e constatar que realmente estamos diante de uma realidade cruel em nosso país, pois apenas como exemplo, para o beneficiário para fazer parte do programa é necessário que ele possua uma renda per capita de R$70/mês1 , conforme dados retirados do cadastro único, onde esta exigência seria apenas uma das condicionalidades impostas ao recebimento do benefício.
Segundo (SPOSATI, 2010), quando se afirma que um programa de transferência de renda se ocupa dos “pobres” e não da “pobreza” em uma sociedade que está marcada pela desigualdade socioeconômica e baixa cobertura de direitos sociais isto nos leva a uma perspectiva residual e, portanto, este fato leva a uma política residual, ou seja, aquilo que sobra é colocado aos pobres, o tratamento despendido a eles é de uma forma que acaba por tentar isentar o Estado da responsabilidade de oferecer subsídios a uma garantia plena de sobrevivência, mas os colocando em uma situação de desfavorecimento.
Iremos expor alguns dados que comprovam a importância do programa bolsa família, e a partir disto propor uma discussão acerca do tema, verificando também através do cadastro único, por exemplo, a quantidade enorme de cidadãos e famílias que ainda passam fome e encontram-se em condições precárias de sobrevivência.

1 PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA

              O Programa Bolsa Família foi criado pela Lei 10.836/2004, onde foram unificados benefícios com vistas à redução das desigualdades sociais e econômicas em nosso país, destinado às ações de transferência de renda com condicionalidades.
Mesmo com todos os dados e números expressivos a favor do bolsa família, parte da sociedade oferece resistência ao programa, o que caberia uma discussão mais aprofundada, mas geralmente esta parte da sociedade alega que este tipo de benefício poderia estar estimulando o ócio dentre outras coisas, sem considerar, inclusive as várias condicionalidades exigidas pelo programa federal.

A forte dimensão da desigualdade socioeconômica brasileira é que define perversamente a forte abrangência do programa brasileiro de transferência de renda. Cabe aqui a ressalva: esta dimensão exige o exame da relação de compromisso de um programa de transferência de renda não como efeito demonstrativo de uma ação social, mas com a efetivação da direção de cobertura universal entre aqueles que estão na mesma situação. (SPOSATI, 2010, p. 3).

Cabe aqui então um desafio, buscar a compreensão daquilo que está envolto nos programas de transferência de renda, mais especificamente no programa bolsa família, suas condicionalidades, suas perspectivas futuras e seus limites, bem como, da sua importância para os cidadãos brasileiros.
             
1.1 Cadastro Único

O Cadastro Único é coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), devendo ser obrigatoriamente utilizado para seleção de beneficiários de programas sociais do Governo Federal, como o Bolsa Família. O Decreto Nº 6.135/2007, já trazia algumas definições de forma que pudesse garantir a unicidade das informações cadastrais, a integração, por meio do cadastro, dos programas e políticas públicas que o utilizam; e também a racionalização do processo de cadastramento pelos diversos órgãos. De acordo com o Decreto, a família é considerada uma unidade nuclear composta por um ou mais indivíduos, eventualmente ampliada por outros indivíduos que contribuam para o rendimento ou tenham suas despesas atendidas por aquela unidade familiar, todos moradores em um mesmo domicílio.
Também é considerada família de baixa renda aquela com renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo, ou a que possua renda familiar mensal de até três salários mínimos, no caso do domicílio é considerado o local que serve de moradia à família, não estão sendo incluídos no cálculo aqueles percebidos dos seguintes programas: Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano, Programa Bolsa Família e os programas remanescentes nele unificados, Programa Nacional de Inclusão do Jovem - Pró-Jovem, Auxílio Emergencial Financeiro e outros programas de transferência de renda destinados à população atingida por desastres, residente em Municípios em estado de calamidade pública ou situação de emergência, e demais programas de transferência condicionada de renda implementada por Estados, Distrito Federal ou Municípios.

Desde o início do Bolsa Família a imprensa tem feito uma marcação cerrada em torno do tema do cadastramento e da concessão de benefícios a pessoas que não
se enquadram nos critérios do programa. No início, essa foi, provavelmente, a forma como o Bolsa Família mais apareceu na mídia. De um modo geral, a concessão irregular de benefícios deve-se a dois fatores: problemas de atualização de cadastro e irregularidades envolvendo a esfera local do poder público. Esse problema continua a existir, embora já tenha sido consideravelmente reduzido. (WEISSHEIMER, 2006, p. 35-36)

Percebe-se, que o CadÚnico é de suma importância para que haja um enorme controle Social por parte do governo federal, e com isto, seja possível verificar as condições em que se encontram boa parte dos cidadãos brasileiros, podendo determinar melhor a participação do indivíduo na gestão pública, na fiscalização, no monitoramento e no controle das ações da administração pública no acompanhamento das políticas, portanto, um importante mecanismo de fortalecimento da cidadania. 

1.2 Condicionalidades

     Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (BRASIL, 2013), o Programa Bolsa Família prevê condicionalidades de saúde, educação e assistência social aos beneficiários, por exemplo, em relação à saúde, as crianças menores de sete anos devem estar em dia com o calendário de vacinação, e obter um acompanhamento do seu crescimento e desenvolvimento, em relação a educação, as crianças e os adolescentes entre seis e quinze anos, devem possuir freqüência escolar mensal de no mínimo 85%, já os jovens de 16 e 17 anos devem ter freqüência escolar mensal de 75%, em relação as condicionalidades de assistência social, as crianças e os adolescentes de até 15 anos em risco ou retiradas do trabalho infantil devem participar de serviços sócioeducativos com freqüência mensal de 85%, existem portanto várias exigências para que o cidadão se enquadre como beneficiário do programa bolsa família, e o que o governo federal alega é de que o objetivo não é punir com as condicionalidades, e sim responsabilizar as famílias e o poder público pelo compromisso assumido e pela oferta dos serviços, respectivamente. “Essas dificuldades de cumprimento de condicionalidades têm gerado mais penalizações aos usuários do que indicações de correções nas irracionalidades de cobertura das políticas sociais. (SPOSATI, 2010, p. 4).
Se compararmos as condicionalidades impostas pelo Bolsa Família, as exigências por exemplo, quando da declaração do imposto de renda pessoa física, na inclusão de dependentes para dedução com as despesas em educação, poderemos perceber que não há toda uma gama de exigências para a inclusão deste dependente, apenas será informado no programa gerador do imposto que houve uma despesa “x”, comprovada por tais recibos e será dado o abatimento pelo Governo Federal no valor devido a Receita Federal.
Em uma exposição rápida, de um exemplo hipotético, pode-se dizer que há um tratamento desigual por parte do governo em relação aqueles mais necessitados.
Conforme a Emenda Constitucional nº. 64/2010, em sua nova redação ao art. 6º da Constituição Federal (CF): “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Só que estes direitos precisam ser igualmente estabelecidos, respeitando a Constituição, mas de forma que todos tenham o mesmo acesso e obtenham o mesmo tratamento por parte do Estado, visando a redução das desigualdades impostas por um regime onde geralmente, quem possui maior renda, acaba sendo beneficiado e sendo menos exigido em suas condicionalidades e comprovação dos seus gastos com a educação, por exemplo.

1.3 Benefícios e Números do Bolsa Família na atualidade

A composição do Bolsa Família é composto com cinco tipos de benefícios definidos pela Lei 10.836/04, são eles: o benefício básico, benefício variável, benefício variável vinculado ao adolescente (BVJ), benefício variável de caráter extraordinário (BVCE), Benefício para Superação da Extrema Pobreza na Primeira Infância (BSP), cada um deles tem uma particularidade e faixas de valores correspondentes a cada benefício estabelecido no programa. “O recebimento de benefícios sociais pelas famílias empobrecidas na maioria das vezes é tido como um ‘favor’ dos agentes públicos investidos em funções governamentais, [...] principalmente com a troca pelo voto nas eleições”. (SEIDEL, 2006, p. 2).
No Brasil não há como se negar que com a implementação dos Programas de Transferência de Renda, houve uma sensível redução da extrema pobreza em dois anos no Brasil.
              Quando o problema social do país é exposto em números, onde estatisticamente, 22 milhões de pessoas já teriam superado a situação de extrema pobreza, conforme dados oficiais acima, mesmo assim, muitos brasileiros ainda tendem a oferecer resistência as ações implementadas pelo governo federal, isto faz com que além de todos os entraves e dificuldades que já são encontradas nas implantações de políticas públicas e de proteção social esbarrem também na opinião pública.
             
CONSIDERAÇÕES FINAIS
              O que quisemos expor com o presente trabalho, não é que a população brasileira deva aceitar, tudo aquilo que é implementado pelo governo federal em termos de medidas para combater a fome e a miséria, pelo contrário, o que se quer na verdade é que ela busque discutir aquilo que precisa ser melhorado e não apenas se opor, colocando para cima do Estado toda a responsabilidade, se eximindo de dar a sua contribuição participativa.
              Há uma realidade exposta dos números que são inegáveis, e é preciso enxergar isto, existem ainda muitas famílias em situação de extrema pobreza que necessitam de medidas que possam vir ao encontro dos seus anseios. Pois em muitos casos, elas sozinhas não conseguem sair do estado em que se encontram, é necessário que se encontrem mais alternativas, e melhorias no que já está posto nos programas atuais, para a inclusão daqueles cidadãos que estão a margem da sociedade, de forma que eles se sintam verdadeiramente capazes de dar a sua contribuição ao país.
              O Bolsa Família possui convergências e divergências, e somente com o diálogo franco e aberto, entre a sociedade e o poder estatal, é que poderemos estabelecer metas para erradicar a pobreza, evidente que com este breve trabalho, propôs-se apenas a levantar algumas questões e expor alguns dados, mas não suficiente para definir precisamente essa problematização envolto em torno dos programas de transferência de renda.
              De qualquer modo, consideramos que houve sim, um avanço significativo em relação a redução da pobreza no país, onde mais de 22 milhões de pessoas, já teriam superado esta situação, e parece-nos que o aparelho estatal quer contribuir cada vez mais,  melhorar a sua imagem perante a sociedade e o mundo, onde evidentemente há um jogo político, mas que também cabe a nós nos impormos e exigirmos nossos direitos enquanto cidadãos.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988
BRASIL. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE À FOME.
Bolsa Família. 2013. Disponível em http://www.mds.gov.br/bolsafamilia.
BRASIL. Medida provisória n. 132 de 20 de outubro de 2003, 2003. Cria o Bolsa Família,
2003.
___________________; Presidência da República. Lei 10.836 de 9 de janeiro de 2004.
Institui o Programa Bolsa Família, 2004.
___________________; Presidência da República. Decreto 5.209 de 17 de setembro de
2004. Regulamenta o Programa Bolsa Família, 2004.
BRASIL. Decreto nº 6.135, de 26 de junho de 2007. Dispõe sobre o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal e dá outras providências. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6135.htm>. Acesso em: 05 mar. 2013.

SEIDEL, Carlos Daniel. Políticas sociais e relações de gênero. Brasília, UnB, 2006.
SPOSATI, Aldaíza. - Painel: Programas de renda focalização e condicionalidades. Transferência de renda para família: de política residual a direito incondicional de crianças e adolescentes. BIEN 2010.

WEISSHEIMER, Marco Aurélio. Bolsa Família: Avanços, limites e possibilidades do
Programa que está transformando a vida de milhões de famílias no Brasil. São Paulo.

Editora Perseu Abramo: 2006.

1 Portal do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/bolsafamilia>. Acesso em: 04 mar. 2013.