Contribuciones a las Ciencias Sociales
Marzo 2013

ABANDONO INTELECTUAL: O TÊNUE LIMITE ENTRE PODER OU NÃO PODER ENSINAR NO LAR



Andressa Thiemy Balbino Fujiki (CV)
Carla Liliane Waldow Esquivel (CV)
Elizângela Treméa Fell (CV)
elizangelatremea@hotmail.com
Universidade Estadual do Oeste do Paraná

RESUMO: O direito-dever dos pais de educarem seus filhos em âmbito domiciliar assinala o tênue limite entre a configuração do crime de abandono intelectual e o cumprimento da obrigação de proverem uma educação de qualidade para o desenvolvimento de seus filhos, preparo para o exercício da cidadania e a qualificação desses para o trabalho. É nessa seara que reside o embate entre o espaço público e o privado. Espaço público este que entende ter para si o monopólio do direito de educar, percebendo a escola como única instituição capaz de assegurar a formação cidadã da criança, do adolescente e do jovem, garantindo a segura travessia do âmbito privado para o público e, por isso, refuta a educação ministrada fora da estrutura formal por ele supervisionada e a conceitua como insuficiente, uma vez que esses pais estariam transgredindo a lei, privando seus filhos do convívio social e da instrução ministrada por professores qualificados. Em contrapartida, o espaço privado, representado pelos defensores do ensino domiciliar, contrapõe os argumentos do Estado, afirmando que a rede escolar institucionalizada não cumpre com a função que lhe foi atribuída, pois os baixos índices de desempenho dos alunos brasileiros em pesquisas educacionais, os casos de violência recorrentemente estampados nos jornais, a insegurança vivenciada pelos pais em decorrência do contato com drogas e a proliferação de valores incondizentes com os praticados no âmbito familiar, transparecem, aos olhos desses pais, que o Estado, ao invés de garantir o direito fundamental à educação, está ferindo-o. Para se alcançar os objetivos a que se propôs este estudo pautou-se no método de abordagem dialético, que elabora uma representação que parte sempre do concreto, tendo em conta a totalidade do fenômeno estudado, e a técnica de pesquisa utilizada foi a de pesquisa bibliográfica e legislativa, além de artigos de revista e internet.

Palavras-chave: Abandono intelectual - Direito à educação - Ensino domiciliar.

ABSTRACT: The right and duty of parents to educate their children in the household marks the thin line between setting of the crime of intellectual abandonment and enforcement of obligation to provide a quality education for the development of their children, preparation for citizenship and qualification of them to work. It's in this array that the conflict between the public and private space are kept. This public space understand that has the monopoly of the right to educate, noticing the school as the only institution capable of ensuring the civic education of children, adolescents and youth, ensuring the safe passage from the private to the public and, therefore, refutes the education offered outside the formal structure supervised by it and conceived as insufficient, since these parents would be breaking the law, privating their children of social interaction and education taught by qualified teachers. In contrast, private space, represented by advocates of home education, opposes the State's arguments, stating that the institutionalized school system fails to comply with the function assigned to it, because low levels of student performance in Brazilian educational researches, the violence repeatedly printed in the newspapers, the insecurity experienced by parents as a result of the contact with drugs and the proliferation of  mistaken values with those practiced in the family, seems, to the eyes of these parents, that the state, instead of guaranteeing the fundamental right to education, is hurting it. To achieve the goals it has set itself this study was based on the dialectical approach method, which produces a representation that always starts with the concrete, taking into account the totality of the phenomenon, and the technique used was the literature and legislative survey, besides magazine articles and the internet.

Key words: Intellectual abandonment - Right to education - Home school  


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Balbino Fujiki, A., Waldow Esquivel, C. y Treméa Fell, E.: "Abandono intelectual: o tênue limite entre poder ou não poder ensinar no lar", en Contribuciones a las Ciencias Sociales, Marzo 2013, www.eumed.net/rev/cccss/23/abandono-intelectual.html

1. Introdução

O crime de abandono intelectual apresenta-se como um tema controverso e discutível, uma vez que, questiona-se a abrangência do tipo penal disciplinado pelo artigo 246 do Código Penal, o qual prevê punição aos pais que não proverem a instrução primária de filhos em idade escolar sem que apresentem causa justificável.
A problemática centra-se não no fato de os pais proverem ou não a instrução dos filhos, já que quanto a isso há entendimento pacífico entre o ordenamento jurídico e a sociedade brasileira, mas sim reside em compreender o que o Estado entende por instrução, de que forma a instrução deve ser ministrada aos seus olhos, quem tem a responsabilidade de provê-la, em que frequência e de que forma.
A Constituição Federal brasileira de 1988 dispõe em seu artigo 205 que “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) complementa a Constituição Federal disciplinando que a criança, o adolescente e o jovem têm direito a educação e aos pais ou responsável incumbe a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino, além de acompanhar sua frequência escolar.
Se, partindo dos dispositivos supracitados, fizéssemos uma análise parcial do ordenamento jurídico brasileiro, poder-se-ia concluir que a educação concebida pelo Estado é aquela exclusivamente institucional, ministrada por professores graduados e, por isso, restaria inegável que aos pais que não cumprissem com a obrigação que esses institutos lhes impõe estariam automaticamente incorrendo no crime de abandono intelectual e, dessa forma, deveriam arcar com as penalidades descritas em lei.
Caminhando por este entendimento, percebe-se que o Estado toma para si, exclusivamente, a responsabilidade de educar, fiscalizar e punir, deixando a família, que deveria atuar em patamar de igualdade com o Estado, em situação subsidiária, não lhe conferindo a liberdade de contribuir e questionar o sistema por ele imposto, conforme lhe assegura a Constituição.
Contudo, se a mesma análise for feita de forma sistemática, isto é, observando-se a completude do ordenamento jurídico pátrio e as normas internacionais por ele recepcionadas, que, consequentemente, adquirem força de lei interna, pode-se extrair percepção mais abrangente quanto à o que pode ser considerada instrução de qualidade ministrada à infância e à juventude, bem como, qual seriam os padrões aceitáveis para seu desenvolvimento e quem seriam sujeitos capazes de provê-la.
A Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de dezembro de 1989 e ratificada pelo Brasil em 24 de setembro de 1990, objetiva, conforme dispõe em seu preâmbulo, reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, almejando promover o progresso social e a elevação do nível de vida com mais liberdade, concebendo a família como grupo fundamental da sociedade que deve assumir plenamente suas responsabilidades dentro da comunidade e, em especial, promover o crescimento, o bem-estar das crianças, adolescentes e jovens e o pleno e harmonioso desenvolvimento de sua personalidade em um ambiente de felicidade, amor e compreensão. Essa responsabilidade permanece evidenciada em seus artigos, dos quais se ressalta o artigo 18, que estabelece que incumbe, primordialmente, aos pais a obrigação de promover a educação e o desenvolvimento da criança.
Nesse mesmo viés, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da  Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948 e assinada pelo Brasil na mesma data,  a qual considera que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, estabelece em seu artigo 26, III, que toda pessoa tem direito a ser educada, pertencendo aos pais, com prioridade, o direito de escolher o gênero de educação a dar aos seus filhos.
Com base na diversidade de postulados jurídicos que permeiam o ordenamento pátrio e na dificuldade apresentada pelo Estado em assegurar à criança o seu pleno desenvolvimento, a dignidade, o respeito, a liberdade e colocá-las a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, conforme garante a Constituição, é que algumas famílias brasileiras, descontentes com o ambiente que a escola propicia a seus filhos, em razão da orientação pedagógica nem sempre condizente com as suas convicções filosóficas, éticas e religiosas, receosas pela integridade física de seus filhos devido à crescente onda de violência urbana à que as crianças, adolescentes e jovens ficam sujeitas na escola, como em situações de bullying, uso drogas, e o mal-estar em relação ao baixo desempenho dos alunos em avaliações, buscam uma forma de educação alternativa fora do sistema regular de ensino, denominada, no Brasil, educação domiciliar.
  Essa situação de descontentamento das famílias e a opção de educarem seus filhos em casa vêm ensejando ações judiciais movidas pelo Estado que quer qualificar os pais que elegem essa forma alternativa de educação como a apropriada para desenvolver plenamente seus filhos e prepará-los para o exercício da cidadania, em sujeitos ativos do crime de abandono intelectual e ações movidas pelos pais em face do Estado, pelo pleito da legalização dessa forma de educação alternativa.
A partir do visível desafino de interesses, que enseja a situação descrita acima, conquanto a uma visão criminalista de análise, cumpre questionar se há um (des)compasso entre a conduta prevista como crime pelo artigo 246 do Código Penal – deixar, sem justa causa, de prover a educação de filhos e pupilos –  e o comportamento dos pais que optam por ministrar educação de qualidade em ambiente domiciliar, tomando como referência para o estudo os argumentos tecidos como justificativa por defensores e opositores a esse sistema de ensino.   
Diante dessa dialética entre família e Estado, o aparato jurídico jurisprudencial brasileiro não assume ainda posição una, o que pode ser percebido pelas divergências existentes tanto entre a legislação quanto entre os operadores do direito, o que acarreta a ocorrência de projetos legislativos, julgamentos díspares e a recorrente dúvida dos pais que optam pela educação domiciliar e temem ficar a margem da lei.

2. A Família como ente desqualificado da competência educativa

            A educação domiciliar, tema de debate recorrente na atualidade, consiste em uma forma de ensino escolar ministrado fora da estrutura formal supervisionada pelo Estado, pela qual crianças, adolescentes e jovens recebem a formação fundamental em seus próprios lares, sob a supervisão dos pais.
            Essa discussão ganha destaque com o surgimento do movimento norte-americano intitulado homeschooling, liderado por John Holt, professor da Univerisadade de Harvard, que passou a editar em 1977 uma revista denominada Growing without schooling, a qual buscava aconselhar os pais sobre como efetivar a educação no lar e divulgar o movimento em âmbito internacional. Holt pautou-se nos pressupostos críticos das teorias da desescolarização que lhe foram apresentadas por Alexander S. Neill, precursor da experiência da escola de Summerhill, na Inglaterra, e Ivan Illich, autor da obra que critica a institucionalização da educação nas sociedades contemporâneas, Sociedade sem escolas (1971), que ao lado de Marshall Mcluhan, Everett Reimer, Paul Goodman e Carl Rogers incentivaram, em meio ao cenário pedagógico na década de 1970, sob diferentes perspectivas, o fim da escola. 1
            Essa vertente pedagógica crítica circulou por diversos países, encontrando respaldo, segundo HSLDA (Home School Legal Defense Association) 2, no ordenamento jurídico norte-americano, inglês, português, espanhol, italiano, russo, canadense, colombiano, mexicano, entre outros. Ressalta-se que em vários outros países a prática do ensino domiciliar se faz presente, porém ainda não encontra o reconhecimento legal. Esse é o caso da Argentina, do Peru, do Japão, da Alemanha, do Brasil e outros.
No Brasil, a ocorrência dessa forma de ensino vem causando descompasso entre os limites do Estado e da família, acarretando discussões em âmbito jurídico, como é vivenciado pelas famílias Faria da Silva de Maringá-PR, Bueno de Jardim-MS, Nunes de Timóteo-MG, Coelho de Anápolis-GO, Schürmann de Florianópolis-SC, que encontram barreiras para legalizar essa forma de ensino que já vêm sendo ministrada aos seus filhos.
            O empasse quanto à legitimidade desse modelo de ensino, remonta as discussões ocorridas no período imperial, quando de forma inversa, era o Estado quem buscava legitimar a educação escolar institucionalizada em um cenário em que a educação era, costumeiramente, dirigida pela família no recinto doméstico e sob sua estrita responsabilidade.
            Até o século XIX, a educação ministrada no lar era característica de uma sociedade, que segundo Jurandir Freire Costa 3, era até então, apegada às tradições e às práticas coloniais, reclusas em seu meio, e que secularizavam seus costumes, racionalizavam suas condutas, administravam suas riquezas e reforçavam seus vínculos de solidariedade interna.   
          Conforme salienta Maria Celi Chaves Vasconcelos4 , a educação na casa afirmava um estatuto de diferenciação social, vista pelas elites da época como a modalidade mais adequada para o ensinamento de seus filhos, uma vez que os afastava dos males existentes na sociedade, como preconceitos, questões de saúde, exposição à heterogeneidade de hábitos e demais influências negativas que pudesse advir do âmbito externo.
          Dessa forma, como bem lembra Carlos Roberto Jamil Cury, “a família teria, além do dever que lhe cabe no princípio de autoridade advindo do ex generatione em ser um lócus de educação, uma instituição capaz da liberdade de ensino a qual, por sua vez, seria indicativo do direito do governo da casa”. 5
As famílias possuíam um universo familiar próprio, o que representava um entrave para as pretensões do Estado, dificultando a sua administração política, econômica e social, de forma que nem as normas estatais conseguiam transpor essas tradições patriarcais. Diante dessa situação, o Estado percebeu que não bastava ter novos espaços públicos e urbanizar as famílias, mas, além disso, precisava estatizar os indivíduos e demonstrar a importância do governo para o bom andamento do país. Um dos mecanismos utilizados pelo governo para conseguir adentrar na privacidade dos grupos familiares foi a implementação da educação institucionalizada.       
No entender de Maria Celi Chaves Vasconcelos, a institucionalização da educação fazia-se necessária para,

delimitar a fronteira entre a área privada e a autoridade pública, ou seja, inaugurar outras relações, especialmente no cenário educacional, nas quais estivessem definidos até onde a Casa permaneceria soberana e até onde dividiria seu domínio e se subordinaria ao Estado. 6

Essa educação, a partir do momento que afastava o filho do âmbito doméstico, dos costumes familiares, tinha como finalidade inculcar os novos hábitos civilizados, numa estratégia de centralização do poder estatal e fragilização do monopólio familiar.  
Neste momento, a escola pública se tornaria o meio capaz de dar ao governo a hegemonia e a unidade nacional pretendida, inculcando nas famílias novos hábitos ditos “higiênicos” e “civilizados”, reorganizando a vida cotidiana em família, aproximando-a do governo, inserindo novas formas de coesão capazes de compensar as deficiências da lei.
Marcus Vinícius da Cunha7 realça que a escola, ao longo da história, foi incorporando saberes científicos em oposição aos saberes domésticos tradicionais, tornando-se instância de poder, como dispositivo normalizador do agrupamento familiar. Todavia, antes da escola estar revestida dessa roupagem estatal, ela foi pensada como lócus de apoio a família, tendo como função - em sua gênese – complementar os saberes transmitidos pela família e suprir a falta de tempo dos pais, que deveriam assumir outras ocupações relevantes na sociedade.
Assim, a escola estatal, pensada sob a ótica de uma sociedade organicista pré-moderna, surgiu como instância de auxílio, agente subsidiário do poder familiar, em que a família era vista como celula mater da sociedade e como lugar de identificação entre o natural e o social, tendo poder hierárquico e conatural sobre o Estado, podendo optar nas questões educacionais 8.
No mesmo sentido, o Ministro Franciulli Netto, no voto proferido em sede de Mandado de Segurança nº 7.407 - DF (2001/0022843-7), argumenta que a família tem direito preexistente ao Estado quando se trata de educar sua prole:

É certo que as crianças não são nem dos pais e nem do Estado. Menos verdade não é que, antes do Estado, pertence aos pais a responsabilidade para proporcionar educação a seus filhos e, parafraseando Planiol, poder-se-á dizer, mutatis  mutandis,  que o Estado não é soberano sobre a família, porque a família precedeu o próprio Estado e lhe preexistiu, como instituição de natureza definida e como célula mater da sociedade (e não célula mártir).9

De olhos atentos na trajetória da historiografia brasileira, em que a família foi apresentada como o lócus de poder e, em que a escola estatal aparece como uma extensão do lar, mantida pelo Estado, que deve prestar auxílio quando solicitado, percebe-se que a estrutura educacional se envereda por caminhos de forma a não seguir sua ordem natural, o qual converte a família em ente desqualificado no tocante à educação de seus filhos e submisso às imposições estatais. De tal modo, o Estado constrói nas mentes brasileiras a concepção de que educação é sinônimo de frequência à rede institucionalizada de ensino e, portanto, assunto de competência estatal.
A desqualificação da família, como ente capaz de educar seus filhos, permanece na contemporaneidade e justifica-se pela vida atribulada dos pais, pela falta de conhecimentos pedagógicos adequados, pela necessidade premente de formação profissional sólida e pela necessidade de interação social.
Nessa dialética entre Estado e família, educação pública e educação domiciliar, o locus institucionalizado aparece como alvo de muitos embates, pois, se no passado o Estado desqualificou a família como ente capaz de educar, hoje são as famílias que questionam a capacidade do Estado em educar seus filhos.

3. Educação no lar: uma dialética entre estado e família

            A questão problematizada pelos pais quanto à capacidade do Estado em educar com qualidade as crianças, os adolescentes e os jovens, com o intuito de torná-los aptos para o regular exercício da cidadania e qualificá-los para o trabalho, encontra respaldo nos dados apresentados pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos – Pisa –, que testou em 2009 os conhecimentos de alunos de 15 anos pertencentes aos 34 membros da Organização de Cooperação dos Países Desenvolvidos – OCDE – e a 31 nações parceiras comerciais.
Nessa avaliação, em que foram testados 460 mil jovens, sendo 20 mil desses brasileiros, o nosso País se classificou na 53ª colocação, num total de 65 países, sendo que em uma escala de 0 a 6, a média obtida pelo Brasil equivale ao nível 2 em leitura, 1 em ciências e 1 em matemática, o que, segundo reportagem da revista Veja, publicada em 15/12/2010, revela que o Brasil se encontra muito aquém da média mundial nos pilares da educação básica, ficando atrás de nações como Chile, Trinidad e Tobago, Colômbia, México e Uruguai. 10
Esses dados demonstram a dificuldade da escola brasileira em desempenhar o papel que chamou para si – o de garantir uma educação nacional com padrão de qualidade (artigo 3º, IX, da Lei nº 9.394/1996). Ao lado desse aspecto, famílias brasileiras demonstram-se descontes com os conteúdos ministrados e a forma como são abordados, por algumas escolas, temas polêmicos como a religião, a cultura e a sexualidade.
Outro argumento favorável à legalização do ensino domiciliar no Brasil encontra respaldo na sensação de insegurança que as famílias vivenciam diariamente ao enviarem seus filhos à escola, uma vez que nesses locais ficariam expostos ao envolvimento com drogas, ataques, brigas e bullying.  Pesquisa realizada pelo Paraná Pesquisas e veiculada no jornal Gazeta do Povo, em 14/08/2011, revela que 52% dos paranaenses não veem a escola como local seguro.
Número esse pode ser vislumbrado pelo resultado da coleta de dados promovida pelo Grupo Paranaense de Comunicação (GRPCom), em decorrência da campanha “Paz Sem Voz é Medo”, que elenca as causas mais corriqueiras da violência na escola:

62,1% dos entrevistados afirmam que elas ocorrem por causa de bullying. As causas seguintes seriam disputa feminina (14,4%) e disputa por poder (10,6%). Na relação aluno-professor, também indagada na pesquisa, o bullying também predomina, liderando com 35,5%.11
 
Rubem Alves, partilhando da mesma opinião dos entrevistados, afirma que “A provisão legal da possibilidade de estudar em casa eliminaria esse sofrimento que atinge milhares de crianças e adolescentes”.12 É em decorrência desses fatos que cada vez mais as famílias brasileiras vêm pleiteando pela liberdade de optar por uma forma alternativa de educar seus filhos. 
Pleito esse que já se encontra disciplinado no ordenamento jurídico pátrio, quando na Constituição Federal, em seu artigo 206 preceitua que o ensino será ministrado com base nos princípios do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas. Com base no texto legal pode-se entender, a partir de uma análise sistêmica, que é facultado à sociedade a utilização de outras ferramentas e métodos para educar seus filhos, a par da escola institucionalizada. Nesse mesmo sentido é o entendimento do ministro Franciulli Netto, que na deliberação quanto a concessão do Mandado de Segurança nº 7.407 – DF, em 26/09/2001, ao argumentar quanto ao pedido de legitimação do ensino ministrado em âmbito doméstico, afirma que “tem o indivíduo a faculdade de se educar segundo a própria determinação, desde que o método escolhido proporcione seu pleno desenvolvimento, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”.
            Ainda em seu discurso, o ministro assevera que
 
o conteúdo  das  normas  constitucionais disciplinadoras do direito à educação deve ser investigado em consonância com  os  preceitos  relativos  à  família,  de  maneira  a  evitar  qualquer contradição. Se é dever do Estado e da família garantir a educação e ao Estado a promoção do bem-estar da família, a vontade familiar prevalece na determinação dos métodos e concepções pedagógicas.13

            Essa concepção de que o interesse da família deve prevalecer ao do Estado, bem antes de estar positivada, já encontrava respaldo no direito natural, uma vez que a organização familiar é preexiste a estatal e esta nasceu única e exclusivamente para servir aquela. Como bem lembra Ives Gandra Martins “Nenhuma construção artificial pode prevalecer sobre os seus inalienáveis direitos e liberdades, posto que o Estado é um meio de realização do ser humano e não um fim em si mesmo”.14  
Sendo a educação um direito inalienável, a construção artificial do Estado não pode sobrepor-se à família e ao direito natural de educar os seus, mas sim atua auxiliando-a na consecução dessa garantia. Esse mandamento natural perdura na atualidade e teve sua importância reconhecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, que em seu artigo 26 afiança aos pais a prioridade do direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada aos seus filhos.
            Além dos fatos e fundamentos jurídicos acima aludidos, a defesa do ensino doméstico agrega forças com o surgimento de novas tecnologias, principalmente o da internet, que assegura maior acessibilidade a materiais didáticos, como vídeos, jogos, recursos audiovisuais, livros didáticos, revistas educativas, módulos de ensino (instrução programada), cursos por correspondência, comunidades online, etc.
Carlota Boto 15, ao analisar a incidência do homeschooling nos Estados Unidos da América, evidenciou que o avanço da rede mundial de computadores contribuiu nitidamente para intensificar a procura por essa prática, elevando o percentual de famílias que optam pela educação no lar aumentou em 29% no período entre 1999 e 2003.
            Contudo, apesar do descontentamento de famílias com a realidade pedagógica vivenciada pela escola formal, dos dados que demonstram o desempenho dos alunos aquém da média mundial, dos altos índices de violência presentes no ambiente escolar, da presença de valores laxos, da discordância quanto a forma e conteúdos abordados, da existência de normas que dão força legislativa a este direito natural, da facilitação do acesso a materiais didáticos proporcionado pelo avanço tecnológico, essas famílias encontram resistência na materialização desse direito, tido ainda pela maioria como monopólio estatal.
            Essa resistência pela materialização da educação nos lares brasileiros pauta-se em argumentos como o da incapacidade dos pais, em âmbito doméstico, propiciarem a seus filhos uma vivência social ampla e cidadã, uma vez que, protegidos por uma “redoma”, esses estariam privados da oportunidade de aprender a se defender de problemas sociais corriqueiros, como a violência e as drogas, e distantes de credos e religiões preteridas pelos pais, permanecendo na órbita da família, do particular, sem conhecer e vivenciar o diferente. Assim, o acautelamento excessivo dos pais, nessa perspectiva, deixa de ser algo positivo e se torna uma barreira à diversidade e à socialização, impedindo o pleno desenvolvimento de seus filhos e o preparo deles para o exercício da cidadania.
Na defesa desse argumento, imprescindível se faz lembrar as palavras de Carlota Boto:

A família é de fato um refúgio que resguarda a criança dos malefícios pelos quais o mundo a ameaça. Mas, se a família protege, é necessário que a escola paulatinamente aproxime a criança das coisas desse mundo comum, contra o qual ela não poderá - e não deverá - ser protegida a vida inteira. Sair da família é, então, uma forma de emancipar a criança das amarras da vida doméstica.16  

O primeiro passo para que ocorra essa aproximação da criança ao ambiente comum e sua consequente emancipação, segundo os defensores do ensino em escolas institucionalizadas, é propiciar o convívio com mais de um professor desde a infância, pois esses cumprirão o papel de representar a  diversidade social a que as crianças, adolescentes e jovens estarão submetidos a vivenciar em sociedade, fator esse que, em contrapartida, não pode ser preenchido pelos pais que são únicos, detentores de uma só crença, etnia e ideologia.
Outra faceta desse argumento está centrada na formação especializada do professor, o que o torna capacitado para ensinar embasado em técnica, munido de recursos educacionais e científicos específicos do conteúdo a ser lecionado e apto a perceber a melhor metodologia e abordagem para auxiliar o aluno em sua formação. Ao passo que os familiares que não são formados no magistério, além de estarem sujeitos a ceder aos encantos dos filhos e valorar o ensino mais com a paixão do que com a racionalidade que a instrução básica deve ser observada, não possuem conhecimento específico de todo o currículo previsto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais como essencial.
Além disso, ao receberem o ensino em ambiente coletivo, as crianças, adolescentes e jovens têm a liberdade de reclamar para seus pais se forem constrangidos moral ou fisicamente pelos professores em sala de aula ou se queixar por esses não estarem se esmerando o suficiente para lhes oferecer o ensino com qualidade, e esses pais poderão intervir na escola requisitando uma solução para o problema levantado, o que, por outro lado, não é possível se os pais forem professores de seus próprios filhos, pois na incidência dessas dificuldades, os filhos não terão para quem recorrer e serão obrigados a suportar calados e com desgosto esse momento especial de formação intelectual e cidadã.17
Nesse diapasão, imprescindível apresentar também o argumento jurídico em que se calca a defesa da escola institucionalizada. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9.394/96), ao versarem quanto ao dever de educar, enfaticamente, dispõem que os pais têm a obrigação de matricular e acompanhar a frequência de seus filhos na rede regular de ensino. É com base nessas legislações brasileiras que os opositores ao ensino domiciliar afirmam que esses pais que ensinam seus filhos em casa incorrem em crime de abandono intelectual, uma vez que não estão cumprindo com a expressa obrigação de matricular em escolas regulares aqueles por quem são responsáveis.  
Por fim, embasados nesses argumentos, os opositores da educação doméstica alegam que sendo autorizado o ensino no lar, o Estado estaria ratificando a concepção de que os filhos pertencem aos pais e, por isso, esses poderiam os modelar conforme apenas seus valores e crenças, o que para esses opositores é um erro, uma vez que os filhos são pessoas com direitos e deveres, que tem por fim integrar uma sociedade plural e que, por isso, devem ser instruídos desde a infância para viver nela.
Diante desses argumentos a favor e contra o ensino domiciliar, muito além de apenas se defender a onipotência ora do Estado, ora da Família, compete-nos analisar a realidade vivenciada pelo ensino brasileiro, vislumbrando um caminho para melhor prover as necessidades das crianças, adolescentes e jovens ao serem instruídos.

4. Homeschooling e o crime de abandono intelectual

O crime de abandono intelectual está previsto no artigo 246 do Código Penal, nos seguintes termos: “Deixar, sem justa causa, de prover a instrução primária de filho em idade escolar”. A pena prevista para esse comportamento é de detenção de quinze dias a um mês, ou multa.
A tutela penal em apreço leva em consideração a proteção dos filhos, em primeiro lugar, uma vez que tal disposição encontra-se inserta no rol dos crimes contra a assistência familiar e, especialmente, a instrução dos filhos menores de 14 (quatorze) anos.
Importa consignar que o bem jurídico pode ser concebido como o valor essencial ou fundamental para a coexistência e desenvolvimento do homem em sociedade. Trata-se de valor extraído da própria realidade social e reconhecido, expressa ou implicitamente, no texto constitucional, servindo como norte para o legislador ordinário. Em se tratando do reconhecimento de um valor pré-jurídico, ou seja, existente na realidade e tão-somente reconhecido pelo legislador, é igualmente um valor que tem nuanças de acordo com a época e o contexto social em que se apresente (conceito valorado e relativo).18
Dessa maneira, o legislador não é livre para “criar” valores e decidir-se por sua tutela. O Texto Magno estabelece restrições ao direito de punir. São diretrizes a serem seguidas pelo legislador ordinário na formulação do injusto penal, tais como os princípios próprios do Estado Democrático de Direito e Social, sobretudo a liberdade e a dignidade humana. Sendo assim, o bem jurídico opera uma verdadeira limitação ao direito repressivo. 19 20
Ao legislador cabe a eleição de bens caros à coletividade, os quais requerem a mais severa modalidade de proteção21 ; mas para isso aquele deverá ter como parâmetro as indicações constitucionais, além da suscetibilidade de ataque e a necessidade de intervenção penal.
De outra parte, ainda que exista o reconhecimento de determinados valores jurídicos por parte do texto constitucional, não deverá ocorrer a intervenção penal se outros meios forem satisfatórios para sua proteção. Desse modo, além de serem dignos, devem tais valores ser carentes de sanção, e o mecanismo penal, capaz de dar essa tutela.22
Nesse sentido, os crimes contra a Assistência Familiar encontram seu paradigma fundamental na Constituição Federal, não obstante as primeiras constituições prescindissem do tratamento da família. 23 Quanto a isso, dispõe o artigo 226 da Carta Política de 1988 que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Fazendo essa previsão, o Estado estendeu sua proteção a todos os integrantes da entidade familiar. Além disso, do mesmo dispositivo ressaem, entre outros valores, a dignidade humana e a paternidade responsável.
De outra parte, a Carta Constitucional de 1988 dispõe, em seu artigo 205, que “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Procedendo uma interpretação a partir desses dispositivos, verifica-se que a Constituição Federal reconheceu a família e sua evolução, bem como todos os demais direitos a ela referentes, de forma a garantir os valores fundamentais relativos ao pleno desenvolvimento da personalidade e dignidade dos seus membros, como é o caso da educação.
 Considerando a própria concepção de bem jurídico e sua função, é possível observar que, em razão de sua importância fundamental, a família merece a proteção jurídico-penal. Não só, é possível igualmente afirmar que os valores familiares são dignos de tutela e, portanto, a intervenção penal é necessária.
De conseguinte, importa verificar o que vem a ser o abandono intelectual e quais são  as condutas que se amoldam ao tipo de injusto e, por fim, analisar se as famílias que optarem pelo homeschooling podem ser incursos no art. 246 do Código Penal.
O abandono intelectual é um crime próprio, em que somente os pais, ou seja, os responsáveis pela instrução dos filhos em idade escolar poderão ser sujeitos ativos do delito.24 Os sujeitos passivos, por sua vez, são os filhos em idade escolar, ou seja, entre 06 a 14 anos de idade, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.25
Criminaliza-se, nesse dispositivo, uma omissão, ou seja, a conduta de deixar de prover, de não providenciar ou omitir-se o agente das medidas necessárias para que seja ministrado ao filho o ensino fundamental.26 Além de omissivo, referido preceito indica um crime formal e permanente, perpetuando-se enquanto não for conferida instrução primária em idade escolar.
A instrução primária, indicada no tipo de injusto, refere-se ao período de alfabetização e “[...] transmissão dos conceitos básicos e fundamentais da sua formação educacional”. 27 28
Além do verbo nuclear e do elemento normativo do tipo (instrução primária), o crime de abandono intelectual prevê um elemento normativo referente a uma possível causa de justificação. De acordo com o magistério do Professor Luiz Regis Prado, “A justa causa, portanto, torna a conduta não só atípica como permitida”.29 Nesse sentido, a expressão sem justa causa exprime a omissão de “[...] medidas necessárias para que seja ministrada instrução ao filho em idade escolar, indevidamente, injustificadamente”.30
Agregue-se a isso que o tipo penal é doloso, não se admitindo a punição a título culposo. Significa dizer que é preciso consciência e vontade dos agentes, in casu, dos pais, em deixar de prover a instrução fundamental ao filho em idade escolar, sem justa causa. Desse modo, não obstante tratar-se de crime formal, é “indispensável a demonstração do dolo do agente, sendo insuficiente a demonstração do resultado para que o delito se concretize”.31  
Mister que, para que se visualize a consumação, a falta da instrução fundamental do filho se dê por tempo juridicamente relevante.32 E, cuidando-se de delito omissivo próprio, não admite-se a tentativa.
Consoante se disse supra, importa, nesse trabalho, analisar se a opção dos pais pela instrução no lar (homeschooling) está ou não incluída no crime de abandono intelectual.
Verifica-se que o direito à educação, e nesse sentido, à educação formal, é um direito assegurado no texto constitucional. Deixou o legislador constituinte claro que se trata de um direito-dever, ou seja, não é suficiente prever esse direito, mas assegurá-lo. O Estado chamou para si a oferta da educação básica obrigatória, no art. 207 da Constituição Federal. 33 No entanto e, antes disso, deixou expressamente consignado que esse dever será compartilhado entre o Estado e a família (art. 205, CF). E no art. 227, novamente indicou o dever do Estado, da família e da sociedade em geral, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, entre outros aspectos, o direito à educação e, inclusive, a profissionalização. Por fim, o art. 229 dispõe que “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores”.
Não obstante o fenômeno da homeschooling não seja propriamente considerado educação formal, ou seja, aquela que se realiza nos bancos escolares, é possível vislumbrar que a sua realização não ensejará a responsabilidade penal dos pais que fizerem esta opção, ou seja, não é plausível que estes respondam por abandono intelectual. 34 35
Tocante a isso, verifica-se que visou o legislador tutelar “o direito de os filhos receberem o ensino fundamental”. 36 Nesse sentido, os pais que instruem seus filhos no âmbito doméstico estão cumprindo o comando constitucional, e a ser compartilhado com o Estado, de assistir e educar os seus filhos.
Além disso, o tipo de injusto impõe sanção penal àqueles que deixarem de prover instrução fundamental aos filhos em idade escolar. Desse modo, se os pais providenciarem a instrução do filho, em casa, não praticam nenhuma omissão punível e, portanto, é impossível tal conduta enquadrar-se no art. 246 do Código Penal.37
Igualmente, os pais que asseguram a educação dos filhos, ainda que fora do âmbito escolar, não possuem dolo em deixar de instruir os seus filhos. Se assim fosse, não providenciariam outros meios para que essa instrução pudesse efetivamente atender às necessidades e ao direito dos mesmos.
E ainda que se argumente que a instrução primária a que se refere o tipo penal seja unicamente aquela ministrada na escola, é possível argumentar a existência de justa causa. A doutrina reconhece a justa causa, especialmente quando não for possível o acesso à escola, pela distância ou até mesmo falta de vagas38 . No entanto, consoante se disse supra, alguns pais fazem a opção pelo homeschooling na tentativa de assegurar aos filhos que outros bens sejam preservados, como a sua vida e a integridade física. Nesse caso, optam por educar seus filhos no ambiente do lar para colocá-los a salvo da violência, ameaça, acesso às drogas, etc.
Nessas situações, igualmente não há que se falar em abandono intelectual, uma vez que os pais ao optarem por ministrar aulas aos seus filhos em âmbito domiciliar, ou seja, ao serem partidários do sistema do homeschooling, estão suprindo a necessidade de garantir a formação da criança, adolescente e jovem ao mesmo tempo em que angariam proteção àqueles aos quais têm o dever de cuidar.
Nesse diapasão, há que se ponderar que os pais adeptos do homeschooling, muito além de buscarem se esquivar da obrigação de proverem a educação aos seus pupilos, atuam em consonância com o princípio do melhor interesse da infância e adolescência ao passo que buscam garantir a sadia qualidade de vida e a formação escolar. Princípio esse que deve servir de norteador quando o que está em voga é a tipificação da conduta tutelada pelo artigo 246 do Código Penal.

5. Considerações Finais

O debate sobre a possibilidade de a família educar no lar é recorrente. Há aqueles que defendem com veemência a ideia dessa forma alternativa de ensino e outros tantos, ainda em maior número, rechaçam a proposta. O delicado limite entre poder e não poder ensinar no lar, entre o cumprimento de uma legislação nacional e outra internacional, entre a esfera pública e privada deve ser analisado sob uma ótica diferente – a do melhor interesse da criança, e não do melhor interesse do Estado ou dos pais.
 Não se pode afirmar que as famílias que lutam em prol do direito de educar seus filhos em casa estão certas ou erradas, incorrem ou não no crime de abandono intelectual. Em análise aos argumentos mais fortes utilizados pelas famílias contra a escola institucionalizada, como a insegurança vivenciada pelas crianças que na escola ficam sujeitas a vários tipos de violências (psicológica, moral, física), a circulação de valores laxos às vezes até discordantes com os da família, a péssima qualidade do ensino e o baixíssimo grau de aprendizagem dos alunos, verifica-se que os aspectos pedagógico, social e cultural se sobressaem, em grau de importância, ao legal.
A mesma temática, se analisada sob a perspectiva estatal, recebe uma roupagem diversa da conferida pelos defensores da educação domiciliar, uma vez que o Estado argumenta que não basta educar as crianças, adolescentes e jovens, mas é necessário educá-los em/para e na sociedade e a escola institucionalizada, munida de corpo docente especializado, é quem tem a capacidade de transformar os indivíduos em cidadãos, guiando-os na passagem do âmbito individual-familiar para o âmbito sociocoletivo, ensinando-os a compartilhar o mesmo espaço e respeitar as diferenças.
Afastando-se dos fundamentos pedagógico, social e cultural, percebe-se que o ordenamento jurídico pátrio possibilita tanto a interpretação favorável quanto contraria a essa prática alternativa de educação, o que enseja divergências quanto à aplicabilidade ou não da punição prevista aos pais que não proveem a educação escolar de seus filhos, uns calcados na prevalência das normas internacionais, como o artigo 26.3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que garante o direito aos pais de escolher o gênero de instrução dos filhos e outros embasados no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069\90) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9.394/96), que obrigam os pais a matricularem e observarem a frequência de seus filhos na rede regular de ensino.
            Contudo, uma mera análise fragmentada não é suficiente para findar as discussões que giram em torno dessa temática, pois nem a simples matrícula em rede regular de ensino, nem o ensino ministrado em âmbito domiciliar garantem que as crianças, os adolescentes e os jovens estarão acobertados pelo manto do direito fundamental à educação, pois estar matriculado não significa estar livre do abandono intelectual, o que conduz a pensar que uma vez ministrada a educação com qualidade, independentemente do local em que ela ocorra, estar-se-á caracterizado o desabandono intelectual, que é o fim maior da educação.
            Essa percepção deve coadunar a interpretação da norma jurídica pátria. Nesse sentido, voltando os olhos para uma ponderação jurídica penal, sustenta-se pela impossibilidade de se intentar arrogar o crime de abandono intelectual previsto pelo artigo 246 do Código Penal como sendo a conduta de deixar, sem justa causa,de prover a instrução fundamental aos filhos em idade escolar, àquele sujeito que, visando proteger seu filho de fatores sociais adversos e garantir educação de qualidade à este, portanto, preocupando-se com seu melhor interesse, opta pelo sistema alternativo de ensino, denominado homeschooling.

6. Referências

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1 BOTO, Carlota. Os lugares da criança. Revista Educação, São Paulo: Segmento, 134 ed.  n. 06, jun. 2008. Disponível em: <http://aprendersemescola.blogspot.com/2009/10/ensino-domiciliar-direito-ou-desvio.html>. Acesso em: 01 ago. 2011.

2 Disponível em: <http://www.hslda.org/hs/international>. Acesso em: 10  jul. 2011.

3 COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. 5. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2004.  P. 52-57.

4 VASCONCELOS, Maria Celi Chaves. A casa e os seus mestres: a educação doméstica como uma prática das elites no Brasil de oitocentos. 2004. 313 f. Tese (Doutorado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, RJ, 2004. P. 268.

5 CURY, Carlos Roberto Jamil. Educação escolar e educação no lar: espaços de uma polêmica. Educação & Sociedade, Campinas, SP, v. 27, n. 96, out. 2006. P. 679.

6 CURY, Carlos Roberto Jamil, op. cit., p. 270.

7 CUNHA, Marcus Vinicius da. A escola contra a família. In: LOPES, Eliane Marta Teixeira et. al. 500 anos de educação no Brasil. 3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. P. 448-450.

8 CURY, Carlos Roberto Jamil, op. cit., p. 675-676.

9 STJ, Mandado de Segurança nº 7.407 – DF. Disponível em: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/42/docs/ms-ensino_fundamental-7407_stj.pdf. Acesso em: 02 ago. 2011.

10 GASPAR, Malu. Na turma dos Piores. Revista Veja, São Paulo: Editora Abril,  2195 ed. n. 50, ano 43, 15 dez. 2010. P. 142-43.

11 Disponível em: < http://www.gazetadopovo.com.br>. Acesso em: 14 ago. 2011.

12 ALVES, Rubem. Homeschooling. Revista Educação, São Paulo: Segmento, 134 ed. n. 06, jun. 2008. Disponível em: <http://aprendersemescola.blogspot.com/2009/10/ensino-domiciliar-direito-ou-desvio.html>. Acesso em: 01 ago. 2011.

13 STJ, Mandado de Segurança nº 7.407 – DF. Disponível em: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/42/docs/ms-ensino_fundamental-7407_stj.pdf. Acesso em: 02 ago. 2011.

14 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Lei Positiva e Lei Natural.  Caderno de Direito Natural. Centro de Estudos Jurídicos do Pará, Pará, 1. ed. n. 1, 1985. P. 27.

15 BOTO, Carlota, op. cit.

16 BOTO, Carlota, op. cit.

17 BOTO, Carlota, op. cit.

18 Para Luiz Regis Prado, “o bem jurídico vem a ser um ente (dado ou valor social) material ou imaterial haurido do contexto social, de titularidade individual ou metaindividual reputado como essencial para a coexistência e o desenvolvimento do homem em sociedade e, por isso, jurídico-penalmente protegido. E, segundo a concepção aqui acolhida, deve estar sempre em compasso com o quadro axiológico (Wertbild) vazado na Constituição e com o princípio do Estado Democrático e Social de Direito. Assim, a ordem de valores constitucionalmente relevantes e inerentes a essa especial modalidade de Estado constitui o paradigma do legislador penal infraconstitucional. A idéia de bem jurídico fundamenta a ilicitude material, ao mesmo tempo em que legitima a intervenção penal legalizada” (PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. P. 52-53).

19 PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal de Constituição, op. cit., p. 95.

20 A definição de bens jurídicos como valores não criados pelo direito, mas por ele reconhecidos como fundamentais para a vida comunitária é repetida por TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2002. P. 16; DIAS, Jorge de Figueiredo. O direito penal entre a “sociedade industrial” e a “sociedade do risco”. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 9, n. 33, jan./mar. 2001, p. 41-42; LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Teoria constitucional do Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. P. 100 e 329; COPETTI, André. Direito penal e estado democrático de direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. P. 91-98.

21 Para Janaína Pascoal “O Direito Penal não priva o indivíduo somente de sua liberdade, furtando-o, ainda, entre outras coisas, do contato com seus familiares, do direito de participar da vida política de sua comunidade, do prazer de acompanhar o desenvolvimento dos filhos, que também sofrem os efeitos da punição, ao se verem impedidos de compartilhar o quotidiano com o pai, e condenados a passar restrições financeiras durante sua ausência” (Constituição, criminalização e Direito Penal mínimo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. P. 25). Nessa trilha, COPETTI, André, op. cit., p. 88 e LOPES, Maurício Antonio Ribeiro, op. cit., p. 318.

22 PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal de Constituição, op. cit., p. 95. Acerca do tema, Manuel da Costa Andrade define dignidade penal como “um juízo qualificado de intolerabilidade social” e carência de tutela penal como necessidade de intervenção penal por inexistência de outros mecanismos não penais eficazes (A “dignidade penal” e a “carência de tutela penal” como referências de uma doctrina teleológica-racional do crime. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Coimbra, v. 2, n. 2, abr./jun. 1992, p. 50, 73-76, 122). 

23 De acordo com José Sebastião de Oliveira “O assunto família no Brasil praticamente passou despercebido pelos responsáveis pela elaboração das duas primeiras Constituições nacionais, pois a primeira, de 1824, nenhuma referência fazia à família em particular e a segunda apenas passou a reconhecer o casamento civil como o único ato jurídico capaz de constituir a família, determinando que sua celebração fosse gratuita” (Fundamentos constitucionais do direito de família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. P. 25)

24 Júlio Fabbrini Mirabete o classifica como crime próprio, no entanto, lamenta a não inclusão, no tipo de injusto, de outros possíveis agentes, como  tutores e depositários (Manual de Direito Penal: parte especial. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2005. P. 78.) Nesse mesmo sentido, André Estefam, mencionando que há um descompasso entre a lei civil e a lei penal ao não prever, o tipo de injusto, os tutores (op. cit., p. 299). Em sentido contrário, NORONHA, Edgar Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2000.  v. 3. P. 301.

25 De acordo com o art. 6º, da Lei n. 9.390/1996 (Dei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, é “dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos menores, a partir do 06 (seis) anos de idade, no ensino fundamental”.

26 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte especial. 9. ed. rev. atual. e ampl..São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. v. 2. P. 774.

27 NICCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. P.881.

28 Para Júlio Fabbrini Mirabete, a instrução primária é a formação intelectual mínima, ou seja, educação de primeiro grau. (Op. cit., p. 78.)

29 PRADO, Luiz Regis, op. cit., p. 775.

30 BITENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 4. P. 120.

31 BITENCOURT, Cézar Roberto, op. cit., p. 121.

32 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte especial, op. cit., p. 775. Nesse mesmo sentido, vide Cézar Roberto Bitencourt, op. cit., p. 121.

33 Art. 207. CF. “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: [...] I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;”

34   Magalhães Noronha afirma, categoricamente, que “Não se escusam, pois, os pais com a impossibilidade de enviar o filho à escola pública, quando a instrução puder ser ministrada em casa” (op. cit., p. 301).

35 Para André Estefam, a obrigação dos pais ao provimento da educação fundamental aos filhos menores pode ser cumprida de dois modos: matriculando o filho em escola ou ensinando-o no seio do lar (homeschooling). (Direito Penal: parte especial. São Paulo: Saraiva, 2011. P. 298).

36 PRADO, Luiz Regis, op. cit., p. 774.

37 Cézar Roberto Bitencourt  reconhece que “Não há configuração do delito quando a educação do menor é ministrada em casa”, embora se antecipe em argumentar a existência de justa causa, como é o caso da dificuldade de acesso ou a falta de escolas para instrução fundamental dos filhos em idade escolar  (op. cit, p. 120-121).

38 De acordo com Guilherme de Souza Nucci: “É natural que situações extremadas, com a pobreza ou miserabilidade dos pais e mesmo a falta de instrução destes, podem servir de justificativa para o não preenchimento do tipo penal. O mesmo se pode dizer da falta de vagas em escolas públicas, uma vez que cabe ao Estado proporcionar educação a todos os brasileiros, especialmente aos menos favorecidos economicamente”. (Op. cit., p. 881). Nesse mesmo sentido, vide Luiz Regis Prado, op. cit., p. 775; Cézar Roberto Bitencourt, op. cit., p. 121; MIRABETE, Júlio Fabbrini, op. cit., p. 79.