Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


OS FLUXOS, A MOBILIDADE E O PLANEJAMENTO URBANO EM TRÊS LAGOAS/MS

Autores e infomación del artículo

Angela De Souza Brasil *

Edima Aranha Silva **

Universidade Federal de Mato Grosso do sul, Brasil

angelabrasil@gmail.com

RESUMO
Este trabalho trata das dinâmicas territoriais desencadeadas em Três Lagoas/MS, que com o processo da industrialização tem sido objeto de estudo, em decorrência das profundas mudanças estruturais e funcionais que se dão no território, em especial após 2006. Ano em que o processo de industrialização se acentuou em Três Lagoas. O referido processo  desencadeia transcursos que aumentam e aprofundam as diferenças socioespaciais. Os novos construtos sociais se materializam espacialmente e em diferentes escalas. Objetivamos portanto, analisar a dinâmica do sistema viário e do fluxo nas vias urbanas da cidade de Três Lagoas/MS,  no período 2006 a 2016. Para tanto, realizamos observações sobre a mobilidade urbana e sua fluidez em pontos estratégicos da cidade, além de levantamento documental e posterior tabulação e análise dos dados.  Ao finalizarmos a pesquisa apontamos que, simultâneo à dinâmica territorial urbana, decorrente do processo industrial, houve expressivo aumento da frota veicular, pois em 2005 eram 26 mil veículos e em 2016 registravam 69 mil, para uma cidade com 117.477 habitantes (IBGE, 2017). Esse contingente veicular e de pessoas, aliado às precárias condições estruturais e de gestão da cidade, contribuem para a precarização da qualidade de vida.

Palavras-chave: Fluxos, Fluidez no trânsito, Industrialização, Mobilidade urbana, Três Lagoas.

ABSTRACT
This work deals with the territorial dynamics unleashed in Três Lagoas / MS, which after the industrialization process has been the object of study, as a result of the profound structural and functional changes that take place in the territory, especially after 2006. Year in which the process of industrialization was accentuated in Três Lagoas. The industrialization process triggers transitions that increase and deepen socio-spatial differences. The new social constructs materialize spatially and at different scales. The objective of this work is to analyze the dynamics of the road and flow system in the urban roads of the city of Três Lagoas / MS, from 2006 to 2016. For this purpose, we make observations about urban mobility and its fluidity in strategic points of the city, documentary and subsequent tabulation and analysis of the data. At the end of the research, we pointed out that, simultaneously with the urban territorial dynamics resulting from the industrial process, there was a significant increase in the vehicular fleet, since in 2005 there were 26 thousand vehicles and in 2016, 69 thousand vehicles were registered in a city with 117.477 inhabitants. This contingent vehicle and people, together with the precarious structural conditions and management of the city, contribute to the precariousness of the quality of life.

Key words: Flows, Flow in traffic, Industrialization, Urban mobility, Três Lagoas.

RESUMEN 

Este trabajo trata de las dinámicas territoriales desencadenadas en Três Lagoas / MS, que tras el proceso de la industrialización ha sido objeto de estudio, como consecuencia de los profundos cambios estructurales y funcionales que se dan en el territorio, en especial después de 2006. Año en que el proceso de la industrialización se acentuó en Três Lagoas. El proceso desencadena traslados que aumentan y profundizan las diferencias socioespaciales. Los nuevos constructos sociales se materializan espacialmente y en diferentes escalas. Objetivos para esto trabajo analizar la dinámica del sistema viario y del flujo en las vías urbanas de la ciudad de Três Lagoas / MS, en el período 2006 a 2016. Para tanto realizamos observaciones sobre la movilidad urbana y su fluidez en puntos estratégicos de la ciudad, además de levantamiento documental y posterior tabulación y análisis de los datos. Al finalizar la investigación apuntamos que simultáneamente a la dinámica territorial urbana resultante del proceso industrial hubo expresivo aumento de la flota vehicular, pues en 2005 eran 26 mil vehículos y en 2016 registraban 69 mil, para una ciudad con 117.477 habitantes (IBGE, 2017). Esto contingente vehicular y de personas, y con las precarias condiciones estructurales y de gestión de la ciudad, contribuyen a la precarización de la calidad de vida.

Palabras clave: Flujos, Fluidez en el tránsito, Industrialización, Movilidad urbana, Três Lagoas. /


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Angela De Souza Brasil y Edima Aranha Silva (2018): “Os fluxos, a mobilidade e o planejamento urbano em três lagoas/MS”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (enero-marzo 2018). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2018/01/mobilidade-planejamento-urbano.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1801mobilidade-planejamento-urbano


INTRODUÇÃO

O artigo representa uma parte da Dissertação de Mestrado em Geografia realizado na UFMS/Campus de Três Lagoas, e intenta apresentar as transformações pelas quais a referida cidade vivencia pelas complexas interações entre pessoas, comércio e indústrias, que afetam o cotidiano das pessoas. Essas transformações nos levam em busca de caminhos metodológicos capazes de interpretar e explicar essa dinamicidade, principalmente no que tange à fluidez no trânsito. Esse processo se relaciona à necessidade de pensar as transformações, abordando as singularidades existentes mediante tais mudanças.
Três Lagoas, situada na porção leste de Mato Grosso do Sul passou e ainda passa por inúmeras transformações desde 1997, pois mudou sua base econômica da pecuária para indústria, aumentou o número de habitantes e consequentemente a frota de veículos. Portanto, cresceu também o número de acidentes nas vias públicas. A pesquisa aponta que, simultâneo à dinâmica territorial urbana decorrente do processo industrial, houve expressivo aumento da frota veicular, pois em 2005 eram 26 mil veículos e em 2016 registravam 79.579 mil, para uma cidade com 117.477 habitantes (IBGE, 2017). Esse contingente veicular e de pessoas, aliado às precárias condições estruturais e de gestão da cidade, contribuem para a precarização da qualidade de vida.

TRÊS LAGOAS E SUA MOBILIDADE URBANA

Três Lagoas, em que pese a sua dinâmica econômica, também apresenta severos e graves problemas urbanos vivenciados cotidianamente pela população.
Nesse sentido, o EBAC (Estudo de Base Adicional de Competitividade) (2016), em parceira com a Prefeitura Municipal, elaborou um diagnóstico com destaque para a questão da mobilidade urbana como fraqueza, sinalizando como FOFA - Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças, como se apresenta na Figura 01.

Destaca-se nesse diagnóstico, em se tratando deste estudo, a mobilidade urbana como fraqueza e aliada a esse aspecto negativo, outro ponto merece destaque, a infraestrutura logística, como uma das limitadoras para o crescimento, conforme se apresenta.

Os modais de transporte de Três Lagoas constam tanto como uma força para o desenvolvimento do Município como uma fraqueza, que limita ganhos de produtividade das empresas instaladas na região, visto suas limitações e nível de utilização. A sua classificação como uma força para o Município é o fato de existir uma gama variada de meios de transporte de cargas, o que, no caso do Brasil, tem como principal fator de limitação de sua competitividade, a logística, pode ser considerado positivo (EBAC, 2016, p. 119).

Isso significa dizer, que por mais que existam forças como competitividade fiscal, que fomenta a economia e oportunidades como estrutura fundiária, isso não reduz as dificuldades encontradas no que se refere à mobilidade urbana.

O governo de Três Lagoas utiliza da política fiscal, através da concessão de benefícios fiscais às empresas, para a atração de investimentos na cidade. Visando ao mesmo objetivo, a prefeitura local também se utiliza da cessão de lotes de terrenos, em propriedade do Município, às empresas que desejam se instalar na cidade, de forma a tornar ainda mais atrativa a instalação de um empreendimento no local. Dessa forma, a disponibilidade de terras, em propriedade do Município, para esta finalidade, consta como uma importante oportunidade para o desenvolvimento econômico da cidade, e figura como uma vantagem competitiva frente à demais cidades que possuem uma maior concentração fundiária (EBAC, 2016, p. 122).

Após o diagnóstico do EBAC (2016), foram traçadas estratégias para cada área diagnosticada. Em relação ao plano de melhoria de transporte e logística do município o EBAC propõe elaboração e execução de um Plano de Melhoria da Infraestrutura de transporte e logística atual, tais como projetos de construção de ciclovia, duplicação de vias, reativação da ferrovia e porto seco. Para execução dessa estratégia, o EBAC sugere que deva ser investido aproximadamente US$ 400.000.
Os agentes envolvidos para análise e execução serão o município, por meio da SEPLAN (Secretaria de Estado e Planejamento) – Secretaria de Infraestrutura, Transporte e Habitação e Secretaria de Desenvolvimento Econômico; do governo estadual, com a SEMADE- Secretaria de Infraestrutura; pelo governo federal, por intermédio do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil e Ministério das Cidades; e, outros atores, como Representantes do Plano Diretor, Representantes do Conselho da Cidade e Representantes de grandes empresas.

PLANEJAMENTO URBANO

As transformações territoriais urbanas observadas em Três Lagoas, iniciadas na década de 1990, podem ser consideradas uma decorrência de políticas econômicas globais, haja vista a abertura para empresas de todos os portes e nacionalidades. Essa abertura afetou e afeta a economia e as condições socioeconômicas da população, além de interferir direta ou indiretamente na mobilidade urbana. Essas transformações produzem uma nova espacialidade da desigualdade na cidade. Uma das principais desigualdades observadas é o distanciamento entre o local de moradia e atividades socioeconômicas, e que agrava ainda mais a dificuldade de mobilidade das pessoas.
Nessa perspectiva, referindo-se ao aumento populacional, assim preconiza o PLAMOB Três Lagoas (2017, p. 7):

A partir da década de 1950, o padrão de deslocamentos da população brasileira passou por uma transformação, resultado do crescimento acelerado observado nos grandes centros urbanos em decorrência do processo de industrialização do País. Em um curto período de tempo, o Brasil deixou de ser rural para tornar-se predominantemente urbano.

O aumento do fluxo de pessoas e de bens tem implicado em impactos negativos sobre a mobilidade local. Esses impactos incluem emissão de poluentes, dificuldade na fluidez do trânsito, acidentes, dentre outros. Considerando esse aspecto Cardoso (2008, p.56) afirma que:
A frota de automóveis cresceu substancialmente, alardeada como única alternativa eficiente de transporte para as populações de níveis de renda mais alto. O sistema viário sofreu ampliações e adaptações e órgãos públicos foram implantados para garantir boas condições de fluidez para o automóvel.

O EBAC (2016) identificou também que a mobilidade urbana é uma fraqueza da cidade, haja vista que a oferta de serviços públicos, como o transporte coletivo, é considerada inadequada às necessidades da população.
Dessas acepções, ressalta-se que as “relações dinâmicas existentes entre os componentes sociais (economia, cultura, instituições e poder) e os elementos materiais e imateriais, vivos e inertes, que são próprios dos territórios onde se habita, se vive e se produz” (DEMATTEIS,2008 p. 34).
Em se tratando dessas relações dinâmicas entre os componentes sociais e levando em conta, o capítulo sobre Política Urbana da Constituição Federal de 1988, houve então a necessidade de traçar uma nova institucionalização no Brasil. Seguiu-se, após a aprovação da constituição, uma série de eventos importantes, como a aprovação da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), a criação do Ministério das Cidades e do Conselho das Cidades, a realização das Conferências das Cidades, dentre outros.  Ficou estabelecida então, a relevância da participação da população como um elemento central nessa nova institucionalização. O Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU), por meio de uma reflexão crítica sobre os problemas urbanos brasileiros, afirma que:
[...] o direito à Cidade, àqueles historicamente excluídos das políticas urbanas das cidades brasileiras só aconteceria a partir de uma mudança radical na maneira de acesso à terra urbana e na maneira de planejar e gerir as cidades. A gestão e o planejamento das cidades precisariam ser democratizados de forma a permitir que os grupos excluídos dos processos decisórios pudessem assumir a condição de cidadãos plenos de direito (PEREIRA, 2015, p. 199).

Com a implementação do Estatuto da Cidade regimentado pela Lei Federal nº 10.257/20101, o Plano Diretor passou a ser exigido para maioria dos municípios brasileiros. Não só o Plano Diretor constitui obrigatoriedade, mas também a elaboração de planos urbanísticos setoriais, como bem elucida o autor.
Os processos sociais, como o planejamento urbano e seus produtos, são gerados a partir da forma, da estrutura e das funções que a cidade previamente apresenta. A cidade, sua forma e sua dinâmica são condições para a expressão espacial das relações na sociedade. O planejamento urbano nasce, nesse sentido, a partir daquilo que já existe e já exerce influência (PEREIRA, 2017, p. 242).

Sendo assim, a Lei Federal nº 12.587/2012 institui a Política Nacional de Mobilidade Urbana, estabelecendo princípio e objetivos para o desenvolvimento do Plano Diretor de Mobilidade Urbana. A lei exige que aborde e discuta questões ligadas aos deslocamentos nas cidades, como a acessibilidade universal, o incentivo a utilização do transporte público não motorizado e preservação do meio ambiente natural com o controle da emissão de poluentes (PLAMOB TRÊS LAGOAS, 2017).
As diretrizes instituídas pela Lei Federal nº 12.587, de 03 de janeiro de 2012, objetiva contribuir para o acesso universal à cidade, o fomento e a concretização das condições que permitam a efetivação dos princípios, objetivos e diretrizes da política de desenvolvimento urbano.
O artigo 24, da referida Lei, dispõe a obrigatoriedade da elaboração do Plano Diretor de Mobilidade Urbana, para os municípios que possuem mais que 20.000 (vinte mil) habitantes, integrado e compatível com os respectivos planos diretores, e ainda, no artigo 6º, com as políticas de desenvolvimento urbano e respectivas políticas setoriais de habitação, saneamento básico, planejamento e gestão do uso do solo. Isso significa dizer que Três Lagoas já deveria ter contemplado o Plano Diretor de Mobilidade Urbana em 2012, ano que instituiu a Lei nº 12.587 e que já contava com 105.224 (IBGE).
O artigo 5º da Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587) apresenta os seguintes princípios:
I. Acessibilidade universal;
II. Desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais;
III. Equidade no acesso dos cidadãos ao transporte público coletivo;
IV. Eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços de transporte urbano;
V. Gestão democrática e controle social do planejamento e avaliação da Política Nacional de Mobilidade Urbana;
VI. Segurança nos deslocamentos das pessoas;
VII. Justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do uso dos diferentes modos de serviço;
VIII. Equidade no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros;
IX. Eficiência, eficácia e efetividade na circulação urbana.

Já o artigo 6º da Lei nº 12.587, sobre Política Nacional de Mobilidade Urbana, preconiza as seguintes diretrizes:
I. Integração com a política de desenvolvimento urbano e respectivas políticas setoriais de habitação, saneamento básico, planejamento e gestão do uso do solo no âmbito dos entes federativos;
II. Prioridade dos modos de transporte não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado; III. Integração entre os modos e serviços de transporte urbano;
IV. Integração dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade;
V. Incentivo ao desenvolvimento científico-tecnológico e o uso de energias renováveis e menos poluentes;
VI. Priorização de projetos de transporte público coletivo estruturadores do território e indutores do desenvolvimento urbano integrado; e 
VII. Integração entre as cidades gêmeas localizadas na faixa de fronteira com outros países sobre a linha divisória internacional.

Não menos importante, o artigo 7º da Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana (nº 12.587) possui os seguintes objetivos: 
I - reduzir as desigualdades e promover a inclusão social; 
II - promover o acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais; 
III - proporcionar melhoria nas condições urbanas da população no que se refere à acessibilidade e à mobilidade; 
IV - promover o desenvolvimento sustentável com a mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades; e 
V - consolidar a gestão democrática como instrumento e garantia da construção contínua do aprimoramento da mobilidade urbana. 

Em 2016, Três Lagoas avançou rumo à necessidade de realizar estudos relacionados ao planejamento urbano. Vasconcellos (2000, p. 251) corrobora com nossa análise, quando diz que muitas estratégias podem ser adotadas em se tratando de engenharia e operação de tráfego, “principalmente as pequenas adaptações e alterações físicas para reapropriar o espaço para os papéis mais vulneráveis e melhorar as condições de segurança” . O autor destaca as ações possíveis:

  1. A construção e alargamento das calçadas;
  2. O estreitamento das intersecções próximo às passagens de pedestres, para reduzir a velocidade de aproximação dos veículos;
  3. O uso de dispositivos de restrição de velocidade dos veículos (p.ex., a “lombada”);
  4. O uso de pavimentos que reduzam a velocidade dos veículos;
  5. A iluminação dos locais de travessia de pedestres;
  6. A construção de ilhas intermediárias em travessias muito longas, para permitir o descanso e a salvaguarda do pedestre;
  7. O controle de intersecções com muitos acidentes, por meio de dispositivos especiais (p.ex., a mini-rotatória);
  8. A criação de facilidades para o uso seguro e confortável da bicicleta, principalmente em cidades pequenas e médias (VASCONCELLOS 2000, p. 251).

Quando bem planejadas, o autor afirma que terão grande eficiência e o custo beneficio é observado em pouco tempo, sem contar que as medidas se pagam facilmente frente aos benefícios gerados. Essas estratégias requerem uma mudança relevante, no que tange novas politicas de uso do solo e, considerando os obstáculos estruturais, as ações devem ser cuidadosamente planejadas.
No dia 07 junho de 2017, às 19 horas,  realizou-se na Câmara Municipal, uma audiência pública para apresentação dos resultados desses estudos, bem como estabelecer o debate entre os diferentes segmentos e atores sociais interessados na temática e nos resultados obtidos.
Para corroborar com nossa análise recorremos a Lüchmann (2003), que explicita:
[...] experiências participativas adquirem um caráter de inovação institucional em direção à efetivação da democracia deliberativa, faz-se necessário não apenas que se introduza um conjunto mais amplo e representativo dos diferentes segmentos e atores sociais [...] como também que se introduza um conjunto de práticas, regras e critérios (procedimentos) que interfiram positivamente nas condições subjacentes de desigualdades socais [...], ampliando tanto as possibilidades de participação aos setores historicamente excluídos quanto ampliando a densidade e a qualidade da representação (p. 169).

Ainda preconiza Vasconcellos (2000, p. 251):
(...) a garantia de um espaço de circulação seguro e equitativo nos países em desenvolvimento depende da consolidação da democracia e da redução das desigualdades sociais e econômicas, o que não pode ser considerado em uma possibilidade de curto prazo.

 

ANÁLISE DOS FLUXOS E DA MOBILIDADE URBANA

A evolução da frota de veículos nos últimos anos em Três Lagoas é vertiginosa. Tomou-se como parâmetro do universo, o estado de Mato Grosso do Sul, e comparamos os dados referentes a Três Lagoas, com as outras duas maiores cidades do estado, no caso Campo Grande, a capital e Dourados, a segunda maior cidade.
Foram analisados os dados relativos à frota de veículos dessas cidades, de 2006 a 2016, com intervalo de 4 anos, pois o volume de informações é muito grande, sendo que o intervalo de 2014 a 2016 foram de 2 anos, pois é o ano fim da nossa análise.

Ao analisar os dados dos Gráficos 1, 2, 3 e 4, averiguamos o quanto aumentou o total de veículos em Três Lagoas, no período de 2006 a 2016, senão vejamos: em 2006 o estado de Mato Grosso do Sul contava com 663.972 veículos, Campo Grande tinha 277.350, Dourados 64.883 e Três Lagoas contava com 32.097 veículos, ou seja, tinham apenas 4,83%, em relação à Campo Grande que eram 41,77% e 9,77% do total da frota de Dourados.
No ano de 2010, o estado contava com 972.527 veículos, Campo Grande tinha 392.157 veículos, em Dourados haviam 95.893 e Três Lagoas dispunha de 50.025 veículos, havendo um aumento de 17.928 veículos no período de 4 anos. Significa dizer que Campo Grande, Dourados e Três Lagoas, representam percentualmente, 40,32%, 9,86% e 5,14% respectivamente.
Já no ano de 2014, houve um aumento de 23.418 veículos, pois saltou para 73.443 veículos, representando 5,48% do total de Mato Grosso do Sul que era de 1.339.401.
Quanto ao ano de 2016, após 2 anos, houve um aumento de apenas 6.136 veículos, perfazendo um total de 79.579 veículos, ou seja, 5,45% do total do estado.
Observa-se que o quantitativo de veículos licenciados com registro no DETRAN-MS de Três Lagoas, em relação ao estado não demonstra aumentos significativos. No entanto devemos considerar que houve aumento se comparado ao número de veículos de um ano para o outro em Três Lagoas. Ainda ressaltamos que a frota de veículos que circula na cidade é muito superior ao que mostram os dados oficiais, ou seja, são veículos de transporte não registrados no estado, como caminhões/carretas, vans, ônibus, veículos utilitários, carros de passeio, dentre outros.
Três Lagoas, como foi salientado anteriormente, possui uma das maiores médias de veículos por habitante do país, sendo que uma em cada duas pessoas possui veículo automotor. Com 79.579 veículos em 2016 (DETRAN-MS) para 117.477 habitantes (IBGE 2017), correspondendo a um veículo para cada 6,88 pessoas, sendo que a média do estado é de um veículo para cada 0,54 habitantes, levando em consideração que o estado possui, segundo o IBGE (2017), 2.682.386 habitantes e um quantitativo de 1.459.464 veículos.
Com esse aumento de veículos no trânsito urbano, os acidentes têm aumentado de forma exorbitante. Essas estatísticas dão visibilidade a Três Lagoas de forma negativa no contexto regional, no que tange ao número de acidentes.  A violência no trânsito urbano tem aumentado significativamente, com destaque para o dinamismo do comércio local e as facilidades de crédito para a aquisição de veículos ciclomotores. Esse fator tem transferido o fluxo de bicicletas, que era grande, para os de motos, crescendo significativamente o número de motociclistas que se envolvem em acidentes no trânsito de Três Lagoas.
O que explica as razões pelas quais as pessoas compram a motocicleta, é que com um pequeno valor pago como entrada, já que possuem facilidade creditícia, saem dirigindo o seu veículo, haja vista que as concessionárias não fazem exigência no tocante às legislações de trânsito no ato da venda. Tornando-se, na verdade, os primeiros infratores das leis do trânsito. “No ano de 2017, até o mês de junho, dos quatro acidentes com vítimas fatais, três estavam de motocicletas” (DEPTRAN/TRÊS LAGOAS, 2017).
O aumento de veículos em um curto espaço de tempo trouxe problemas para a cidade. Os congestionamentos na porção central são diários, especialmente nos pontos de cruzamento entre as principais avenidas. As observações em 3 pontos estratégicos (Ver Figura 01) revelaram o fluxo do trânsito, nos horários de pico (17:00 às 18:00).

Nesse horário, 17 às 18 horas, o fluxo é significativo, conforme observa-se no gráfico 5. O fluxo estava intenso e não observamos ônibus urbanos  na via. No sentido centro-bairro registramos 920 carros de passeio (60,43%), 151 motocicletas (16,41 %) e 143 camionetes (15,54%). Outro ponto que destacamos é o quantitativo de veículos no sentido bairro centro. Foram 304 carros de passeio (52,3%), seguido de 109 camionetes (19%) e motocicletas 96 (17%). Destacamos que no dia observado o clima estava propicio a chuva e talvez seja um dos motivos pelo qual o fluxo tenha sido intenso.

No Gráfico 6, o maior quantitativo de veículos se dá no sentido ponte-centro-bairro, período em que os condutores voltam do trabalho nas unidades fabris do Distrito Industrial II. O número de carros de passeio, um total de 472, perfazendo 55,40% do total de veículos, seguido por 132  (15,5%) camionetes e utilitários e um número significativo de motocicletas que apresenta um número de 121 unidades ou 14,2%.
O número de caminhões e carretas nesse horário permanece substancial, conforme se observa no Gráfico 6. Tanto em um sentido Bairro-Centro-Ponte que é na ordem de 31 caminhões e 55 carretas ou 4,8% e 8,5% sucessivamente quanto no sentido Ponte-Centro-Bairro que apresenta 43 caminhões (5%) e 47 carretas (5,6%).
Conforme podemos observar, as bicicletas não circulam tanto quanto no Ponto de observação 1 (Clodoaldo Garcia/Maria Guilhermina Esteves), mesmo tendo ciclovia. Isso pode se dar devido ao fluxo intenso de caminhões e carretas e o número crescente de acidentes. No entanto, as motocicletas continuam expressivas quanto ao uso e envolvimento em acidentes na via.

Ao finalizar a observação, conforme o Gráfico 7, no sentido Bairros para a avenida Ranulpho Marques Leal, continua a predominância de veículos de passeio num total de 190 (49%), do mesmo modo no sentido Ranulpho para os bairros, totalizando 158 veículos ou 44,13%. As motocicletas ocupam um percentual significativo nesse ponto tanto quanto nos demais. No sentido Bairros/Ranulpho são 104 motocicletas em 1 hora de observação, perfazendo 26,7% do total de veículos na via. Não muito diferente no sentido Ranulpho-Bairros que são de 93 motocicletas (26%).
Chama atenção o número reduzido transporte urbano nas vias.  Outro ponto que merece atenção é que os horários da manhã e tarde realmente são os mais críticos nas vias. Sendo assim, merece atenção para um planejamento e implementação adequados de um plano de mobilidade urbana para melhoria no fluxo no trânsito de Três Lagoas. Tão importante quanto realizar um estudo e planejamento urbano é a efetivação do mesmo.
A análise dos fluxos de veículos aponta para a ausência de transporte urbano coletivo, como alude Vasconcellos (2000, p.170), “com maiores distâncias a percorrer e com serviços precários de transporte, a maioria da população precisa aumentar seus gastos de tempo e de espaço para realizar suas atividades essenciais”.
Há necessidade do planejamento urbano, considerando uma melhor acessibilidade por meio de políticas de trânsito, visando fomentar o desenvolvimento da cidade, já que há iniquidades percebidas, haja vista, que em todos os 3 pontos de observação notou-se pouco ou nenhum transporte urbano coletivo.
Esse fato desdobra no aumento do fluxo de veículos de passeio, motos e bicicletas, principalmente, que coaduna com Vasconcellos quando enfatiza “(...) a consequência mais importante, além das sobrecargas física e psicológica, é que os setores de renda mais baixa tem sua acessibilidade grandemente limitada, com quase todas as viagens feitas apenas para os motivos de trabalho, escola e compras” (VASCONCELLOS, 2000, p.170).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Três Lagoas desde muito tempo vislumbra ser uma cidade próspera. Ofereceu aberturas e benefícios para que várias empresas se instalassem para que o crescimento e ou o desenvolvimento acontecessem. No entanto, para que a referida cidade realmente se torne próspera, não pode apenas abrir oportunidades de instalações de novas empresas, é preciso que se planeje para alcançar um desenvolvimento ordenado com esforços coordenados.
Uma cidade que planeja é sinônimo de cidade preparada para não apenas o futuro, mas principalmente o futuro. Em se tratando desse planejamento, os gestores da cidade precisam se predispor e se disporem a enxergar as oportunidades, bem como gerenciar os riscos.
Além de moradia, emprego, acessibilidade e segurança oferecer mobilidade urbana e melhor fluxo no trânsito devem ser preocupações a serem oferecidas para os habitantes. Oferecer abundância de empregos em uma cidade não deve ser a única preocupação para gestores. Além de atrair investimentos objetivando  gerar atividade econômica é fundamental que hajam planejamento e coordenação de todas as áreas, inclusive a mobilidade urbana.
Este trabalho demonstra que os gestores, bem como os elaboradores do plano de mobilidade urbana devem priorizar os transportes coletivos e os transportes não motorizados para que possam diminuir o grande fluxo de veículos em Três Lagoas.
Muitos acidentes, poucos transportes coletivos, número reduzido de ciclovias, número exagerado de veículos de passeio e motocicletas, grande fluxo de caminhões e carretas em via urbana foram apontados como problemas neste trabalho. Percebemos que as grandes causas desses problemas estão acontecendo em decorrência do aumento de empresas e consequentemente o crescimento populacional desordenado, que levou a exacerbada frota de veículos que há hoje em Três Lagoas.
Adequar essa realidade às necessidades populacionais deve ser primordial para a gestão pública, por meio de políticas públicas adequadas, cujo objetivo maior seja priorizar o cidadão na efetivação de seus anseios e necessidades, melhorando as condições gerais de deslocamento na cidade.
O estudo e levantamento do PLAMOB foram realizados no decorrer de 2017, no entanto, foi apenas apresentado em audiência pública e não implementado até então. Logo, o que se registra é, não se faz apenas um planejamento, é fundamental que haja a implementação e acompanhamento efetivo do mesmo.
Um fluxo adequado no trânsito e a mobilidade urbana são atributos do território e um direito do cidadão três-lagoense . Solucionar os problemas apresentados, tanto no fluxo quanto na mobilidade, é necessário compreender toda a dinâmica da cidade e seus elementos complexos. Sendo assim, solucionar os problemas da mobilidade urbana e do fluxo no trânsito necessita transpor a visão meramente técnica, ou seja, do puro planejamento e perpassar para a realidade constitutiva da sociedade, o que significa dizer, sair do papel e transformar em realidade.
O trabalho mostrou que os problemas de mobilidade não dizem respeito apenas ao sistema viário, outros elementos, como o fato da cidade ter uma mobilidade baseada no transporte predominantemente rodoviário individual (carros de passeio e motocicletas) há a insuficiência de transporte público, há número reduzido de ciclovias e há deficiência nas vias públicas (calçadas, rampas de acesso, sinalização adequada, dentre outros). Todos esses elementos dificultam uma melhor mobilidade em Três Lagoas e mostram a necessidade de abordar ações constituintes que possam melhorar essa questão.
Concluímos portanto, que a solução para a mobilidade urbana e o melhor fluxo no trânsito requer a harmonia, conduta e efetividade de uma série de iniciativas, que unam os agentes públicos e privados e a partir daí traçar procedimentos que imbriquem o interesse dos agentes privados com as políticas públicas relacionadas ao transporte e trânsito adequados à população três-lagoense, como as questões de oferta de infraestrutura, monitoramento do trânsito e mobilidade urbana.

BIBLIOGRAFIA

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* Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso do sul. E-mail de contato: angelabrasil@gmail.com
**Docente do programa de pós-graduação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail de contato: edimaranha@gmail.com

Recibido: 22/01/2018 Aceptado: 29/01/2018 Publicado: Enero de 2018



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