Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO E SAÚDE MENTAL DA EQUIPE DE ENFERMAGEM: REFLEXÕES SOBRE A ATUAÇÃO DO RH

Autores e infomación del artículo

Cinthia Virginia Alves Coelho *

Jane Coelho **

Rickardo Léo Ramos Gomes***

Universidade de Fortaleza, Brasil

rickardolrg@yahoo.com.br

RESUMO

A categoria Enfermagem é perpassada pelos inúmeros elementos estressores, porque lida com o sofrimento do outro, com a dor, angústia, morte. A escolha por este tema deve-se às experiências profissionais que tivemos na realização de trabalhos desenvolvidos com profissionais de saúde. Este estudo tem como objetivo geral verificar os aspectos que favorecem ou dificultam as relações interpessoais no ambiente de trabalho na Equipe de Enfermagem. Quantos aos específicos, criar espaço de diálogo e trocas de experiências; trabalhar a comunicação interpessoal entre as colaboradoras; e promover reflexão sobre a saúde e a qualidade de vida no ambiente de trabalho. Para coleta de dados, utilizamos a técnica “roda de conversa”. Os resultados indicam que é possível pensar num ambiente de trabalho que potencialize as qualidades da equipe e a qualidade de vida nos âmbitos pessoal e profissional. Concluímos que relevante o papel do psicólogo hospitalar e do gestor em RH para, juntos, trabalharem as demandas das equipes atuantes, como forma preventiva de doenças relacionadas ao trabalho.

Palavras-chave: Equipe de Enfermagem. Saúde do trabalhador. Atuação do psicólogo e do gestor em RH.

RESUMEN

En la categoría de Enfermería es perpassada por los numerosos elementos estresantes, porque tiene que convivir con el sufrimiento del otro, con el dolor, la angustia, la muerte. La elección de este tema se debe a las experiencias profesionales que hemos tenido en la realización de trabajos desarrollados con profesionales de la salud. Este estudio tiene como objetivo general verificar los aspectos que favorecen o dificultan las relaciones interpersonales en el ambiente de trabajo en el Equipo de Enfermería. Cuanto a los específicos, crear un espacio de diálogo e intercambio de experiencias; trabajar la comunicación interpersonal entre las colaboradoras; y promover la reflexión sobre la salud y la calidad de vida en el ambiente de trabajo. Para la recolección de datos, utilizamos la técnica de la "rueda de conversación". Los resultados indican que es posible pensar en un ambiente de trabajo que potencie las cualidades del equipo y la calidad de vida en los ámbitos personal y profesional. Concluimos que relevante el papel del psicólogo del hospital y del gestor de recursos humanos para, juntos, trabajar las demandas de los equipos activos, como forma preventiva de enfermedades relacionadas con el trabajo.
Palabras clave: Equipo de Enfermería. La salud del trabajador. Actuación del psicólogo y del gestor en recursos humanos.

ABSTRACT

The Nursing category is permeated by the numerous stressors, because it deals with the suffering of the other, with pain, anguish, death. The choice for this theme is due to the professional experiences we had in carrying out works developed with health professionals. This study has as general objective to verify the aspects that favor or hinder the interpersonal relations in the work environment in the Nursing Team. How many specific ones, create space for dialogue and exchanges of experiences; working the interpersonal communication between the collaborators; and promote reflection on health and quality of life in the workplace. For data collection, we use the "talk wheel" technique. The results indicate that it is possible to think of a work environment that enhances the qualities of the team and the quality of life in the personal and professional spheres. We conclude that the role of the hospital psychologist and the HR manager in order to work together the demands of the working teams as a preventive form of work - related illnesses is relevant.

Keywords:
Nursing team. Worker's health. Performance of the psychologist and the manager in HR.

 


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Cinthia Virginia Alves Coelho, Jane Coelho y Rickardo Léo Ramos Gomes (2017): “Qualidade de vida no trabalho e saúde mental da equipe de enfermagem: reflexões sobre a atuação do RH”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (octubre-diciembre 2017). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2017/04/qualidade-vida-trabalho.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1704qualidade-vida-trabalho


1 INTRODUÇÃO
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Mediante a tantos desafios das exigências mercadológicas, do ambiente de trabalho, dos fatores facilitadores e dificultadores de produção e das relações interpessoais dos colaboradores, soma-se, ainda, o desafio maior quando este ambiente é promotor de saúde e seus colaboradores vistos como cuidadores dos pacientes e dos familiares, o que possibilita aumentar as barreiras nas relações interpessoais dos atores do cuidado (cuidador e cuidado), o que ocorre com os profissionais da Enfermagem.
A categoria Enfermagem é perpassada pelos inúmeros elementos estressores, pois quem procura um cuidador em Enfermagem busca muito mais que um atendimento, uma técnica, um procedimento. Isto significa dizer que o cuidado prestado pela equipe de Enfermagem é para além de um corpo, para além do orgânico, da fisiologia (Seguro; Neves; Branquinho; Souza, 2006).
Sabemos que a rotina de trabalho gera níveis de estresse, o que frequentemente conduz a adoecimentos das mais diversas espécies. Só que os profissionais de saúde lidam, cotidianamente, com o sofrimento do outro, com a dor, angústia e, na maioria dos casos, veem-se nas zonas fronteiriças entre a vida e a morte de sua clientela.
Diferentemente dos profissionais de outras áreas, aqueles são perpassados pelos atravessamentos de subjetividades que os sujeitos envolvidos, considerando ser o espaço laboral em saúde repleto de dor, sofrimento, morte e luto.
A escolha por este tema deve-se às experiências profissionais que tivemos (Eu como profissional de RH e a Psicóloga Organizacional) na realização de trabalhos desenvolvidos com profissionais de saúde, mais diretamente com equipes de enfermagem, cujo intuito estava voltado a trabalhar-se o ambiente organizacional, as relações interpessoais e o nível de (in)satisfação dos grupos.
Este estudo tem como objetivo geral conhecer a relevância da atuação do RH no contexto hospitalar da saúde mental da equipe de enfermagem. Quanto aos objetivos específicos, verificar o sentido do trabalho e sua relação com a saúde do trabalhador; refletir sobre a importância da qualidade de vida no trabalho para a saúde mental de seus colaboradores; e avaliar as relações interpessoais e o nível de satisfação no ambiente de trabalho.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Lane (2001) afirma que a função de um grupo é definir papéis em que se constrói a identidade social dos sujeitos envolvidos, além de garantir a produtividade coletiva e social. Ela ainda nos remete à importância da história e seus eventos na sociedade, destacando, sobretudo, a história da aprendizagem que cada indivíduo se depara com os outros dentro do mesmo grupo, influenciando e sendo influenciado, simultaneamente.
Quando se fala sobre grupo (equipe), atenta-se também para a relevância das relações interpessoais que estão sendo traçadas dentro do espaço do grupo em si. Yalom e Leszcz (2008) referem que as relações interpessoais sempre foram de teor adaptativo, numa perspectiva evolutiva, levando-se em consideração que o homem é essencialmente um ser social.
Não se concebe, então, contemplar sua sobrevivência sem a manutenção de tais relações. Não é uma questão de pura agregação de corpos, mas, acima de tudo, de sobrevivência de si mesmo e da própria espécie.
Zimerman e Osório (1997) destacam que o grupo poderá atuar como um lugar também de “sofrimento”, ou seja, um espaço em que seus integrantes possam falar de suas demandas, de suas rotinas de trabalho, desafios e frustrações.
Por se tratar de um grupo, que poderá vir a ser um grupo de autoajuda, o qual se denomina de “grupo de mútua ajuda”, em que a eficácia terapêutica se dará no largo âmbito das áreas beneficiadas, da saúde mental, organizacional e social.
Oliveira (1994) refere que Vygotsky trabalha com a noção de que a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas, fundamentalmente, uma relação mediada. Essa interação social fornece a matéria-prima para o desenvolvimento psicológico do indivíduo. Fala-se da vida social como sendo um processo dinâmico, onde cada sujeito é ativo e acontece a interação entre o mundo cultural e o mundo subjetivo de cada um.
De acordo com Dejours (2009), a relação homem-trabalho procura evidenciar os vários modos de expressão de sofrimento e prazer, oriundos da inserção desses indivíduos no mundo do trabalho, onde essa relação está entrelaçada com três questões:
1) o organismo do trabalhador não poderá ser visto como um “motor humano”;
2) o trabalhador, na chegada de seu local de trabalho, não poderá ser visualizado como uma máquina nova, pois cada um possui uma história de vida, que se caracteriza por suas aspirações, seus desejos, suas motivações, necessidades psicológicas, as quais são características únicas e pessoais; e
3) o trabalhador possui uma razão de sua história de vida, e por meio dela elabora descargas preferenciais, que não são as mesmas para os demais trabalhadores que participam da formação daquilo que denominamos de estrutura da personalidade.
Dejours (2009, p.26) “relata que o trabalho torna-se perigoso para o aparelho psíquico quando ele se opõe à sua livre atividade”. Então, a carga psíquica surge em definitivo como regulador da carga global de trabalho, onde a carga psíquica é um instrumento de equilíbrio para o trabalhador, fazendo em algumas vezes entravar o jogo do sistema “motivação-satisfação (ou desejo-prazer)”.
Esse conflito põe o desejo do trabalhador à sua realidade do sistema que o trabalho formal impõe, ou seja, face a face, a espontaneidade do trabalhador e a organização do trabalho delimitam a realização e prescreve o modo operatório preciso. Assim sendo, a psicodinâmica de Trabalho de Dejours (2009) evidencia, assim, as formas de expressão do sofrimento e prazer oriundos da inserção do indivíduo no mundo globalizado do trabalho.
Propondo uma análise no tocante à necessidade de situar-se a relação entre saúde mental e trabalho dentro do contexto das relações sociais, aponta-se também para o deslocamento da loucura para normalidade, pois afirma que a maioria dos trabalhadores, apesar da pressão psicológica que enfrenta no trabalho e no seu dia-a-dia, não descompensa psiquicamente (DEJOURS, 2009).
Assim sendo, os colaboradores quando expostos a situações estressoras, de sofrimento e insatisfação quanto ao trabalho em si e ao ambiente laboral, tendem a desenvolver mecanismos de defesa, direcionando todo esse sofrimento e angustia para uma dimensão velada, ou seja, recalcada, conforme a teoria freudiana (Freud, 1915; 2005).
Uma vez esse sofrimento depositado na dimensão velada, disfarçada, ou seja, recalcada (Freud, 1915; 2005), buscará um modo de liberação, sendo a mais provável pela via do adoecimento, sobretudo, com sintomas físicos e psíquicos, frisando-se que os sintomas, na maioria dos casos, manifestam-se principalmente pela via psíquica para, depois, apresentarem-se no corpo, características das doenças psicossomáticas. Convém destacar-se que cada campo de atuação profissional poderá gerar formas específicas de adoecimento de seus colaboradores.
Dejours (2009) afirma também que o sofrimento que é vivenciado, mas não reconhecido, traz mais prejuízos para o sujeito, pois a função dos mecanismos de defesa é aliviar o sofrimento, e isto finda em não permitir sua visibilidade, tornando-o, portanto, mais difícil de ser solucionado.
Torna-se imprescindível salientar que o os ambientes laborais também podem apresentar-se como lócus saudável de atuação e convívio de seus colaboradores, onde se constata espaços de boa convivência, flexibilidade quanto as regras e normas, reconhecimento das competências e habilidades individuais e coletivas.
Verifica-se, assim, que o ambiente de trabalho pode – e deve – ser promotor de homeostase entre saúde mental e saúde física de todos os seus atores. Para alcançar tais objetivos, a organização necessita disponibilizar condições, sobretudo que estas estejam diretamente voltadas as demandas dos colaboradores, com intuito de que as tarefas executadas possam proporcionar satisfação e prazer a quem as executa.
Vale ressaltar que essas características aqui mencionadas não eximem, em algum momento, que o trabalho não venha a apresentar um conteúdo de sofrimento, mas que o prazer do e pelo trabalho permita uma melhor estruturação e defesa física e psíquica, individual e coletivamente, pelo menos em tese (Dejours, 1992).
Machado e Merlo (2008) afirmam que o sofrimento psíquico causado entre os profissionais da área de saúde, especificadamente auxiliares e técnicos de Enfermagem, gera uma demanda de adoecimento, tendo em vista que a estrutura organizacional hospitalar é um ambiente, por si mesmo, gerador de dor e sofrimento, pois dentro desse contexto existe a constatação mais forte e enfática da finitude humana, vivenciada pelo adoecimento e, consequente e rotineiramente, pela morte.  
Embora o adoecimento seja algo esperado para/pelo profissional da saúde, uma vez que este estuda e capacita-se para lidar com essa atividade no exercício de seu trabalho, existem outras questões que podem originar sofrimento psíquico, como, por exemplos, a própria estrutura hierárquica, a centralização de poder nas mãos do chefe de equipe, a competição entre os profissionais do setor, o cooperativismo de alguns profissionais, a falta de comunicação entre equipe e familiares, dentre outros.
De acordo com Osório (2003), os profissionais de Enfermagem tendem a oferecer bem-estar físico, moral, psicológico, ético aos pacientes assistidos, adquirindo e adotando uma postura que vai para além de suas competências técnicas de lidarem com o sentimento de dor, de perda e, principalmente, com o sofrimento que esses pacientes levam consigo pela distância de seus familiares e pela perda da saúde.
Para Machado e Merlo (2008), os profissionais de Enfermagem convivem com inúmeros eventos estressores, tais como o sofrimento da doença, a possibilidade da perda do paciente (morte), as causas da doença (dores), o medo de errar, considerando-se que neste ambiente não há espaço para dúvidas e inseguranças, menos ainda para erros.
A agilidade, a rapidez e eficácia são verbos conjugados diariamente por esses profissionais, sendo uma obrigação e dever, pois o risco de morte é algo real nessa estrutura de trabalho, possibilitando para o trabalhador de Enfermagem experienciar sentimentos de angústia, medo e desamparo.
Constatando que o ato de cuidar exige um grau elevado de investimento afetivo desses cuidadores, torna-se por vez natural o fato de sofrer com o paciente ou pela morte deste.
Esse sofrimento pode remeter os profissionais de saúde à sua própria história de vida, ou até mesmo à sua morte, onde o profissional poderá negar o fato ignorando, mas essa morte já o afetou pelo simples fatos de não querer pensar sobre o acontecido (morte), levando-o a um esforço psíquico que demandará um pensamento rápido que mude de imediato uma forma de distraí-lo para não pensar no paciente que faleceu.
Muitos profissionais de saúde fingem não se incomodarem e escondem o sofrimento, por vezes fingindo que eles não existem. Porém, pode ser algo que gere prejuízo incalculável, tendo em vista que provoca uma alta sobrecarga de acúmulo de tensão, dificultando a descarga psíquica e, consequentemente, poderá vir a ocorrer um desequilíbrio psíquico do trabalhador, pois o ambiente de trabalho, que deveria ser um lugar promotor de satisfação e prazer individual e coletivo, acaba gerando desconforto, angústia e sofrimento (Machado; Merlo, 2008).
Parece compreensivo o sofrimento desses profissionais, mas é relevante pensarmos que “o importante é tornar esse sofrimento significativo o suficiente para que ele possa fazer sentido e não provocar um desequilíbrio psíquico no profissional, levando a doença” (Machado; Merlo, 2008, p. 449). Ou seja, é preciso perceber quando esses sentimentos emergem, pois escondê-los ou ignorá-los poderá ser perigoso. Portanto, é urgente reconhecê-los para não se tornarem um elemento devastador da saúde psíquica dos profissionais da enfermagem.

3 METODOLOGIA

Este estudo privilegiou a pesquisa de caráter qualitativo, considerando que favorece aprender e ensinar outras possibilidades de se perceber o fenômeno estudado, descrevê-lo e refletir acerca dessas possibilidades (Lakatos; Marconi, 2001; Minayo, 2008), o que, por sua vez, proporciona também o refletir sobre as ações humanas e questões que os informantes formulam em seu dia a dia dentro de um determinado contexto temporal e espacial.
Possibilita, ainda, a análise dos fenômenos observados na perspectiva dos atores sociais, uma vez que favorecem as crenças, valores, atitudes e interesses de ambos os sujeitos envolvidos no processo investigativo.
A equipe de Enfermagem participante foi composta de onze (11) profissionais, sendo quatro (4) auxiliares, cinco (5) técnicos e duas (2) enfermeiras-chefe. Ainda permanece a prevalência feminina na formação do quadro de profissionais em Enfermagem.
Quanto ao salário, elas recebem pelos serviços prestados de acordo com a faixa salarial da categoria determinada por lei e de mercado. Referente à carga horária de trabalho, prevalece o sistema de escala.
Para resguardar o sigilo e a identidade das coparticipantes, estas foram especificadas pela letra C (colaboradora), com o respectivo número (de 1 a 11, uma vez que foram 11 o total das que participaram).
Para a coleta de dados, foi utilizada a técnica “roda de conversa”, tendo em vista que possibilita aos atores sociais a viabilidade de um espaço seguro, adequado e agradável de escuta e troca de experiências e de sentimentos dos coparticipantes, locus em que se favorecem vir à tona questões de dimensões individuais e/ou coletivas, a partir de eixos temáticos geradores de discussão e reflexão (Campos, 2010).
Também facilita a tomada de consciência dos temas trazidos à discussão e a promoção de reconhecimento de si e do outro, dentro dessa forma dialógica, como sujeitos de saberes, crenças, opiniões, valores e verdades, uma vez que todo o elenco sente-se resguardado quanto à identidade e às informações concedidas.
A pesquisa foi realizada num hospital localizado na periferia de Fortaleza, o qual atende a um público particular e do Sistema Único de Saúde (SUS). Oferece serviços em Ginecologia e Obstetrícia, tanto particulares, convênios e SUS. Além disso, tem parceria com a UNIMED em outros serviços, como laboratoriais e exames de raios-X.

3 RESULTADOS

Os resultados foram distribuídos no eixo temático “Cuidando do cuidador”, abrangendo-se cinco categorias temáticas, determinadas e analisadas conforme a fluência dos significados e de conteúdos de aproximação das narrativas das participantes desta pesquisa. Para ilustrar os campos temáticos, foram extraídos fragmentos dos discursos das colaboradoras

  1. Reflexões sobre a escolha pela Enfermagem: “Eu sempre cuidei dos outros”

Na roda de conversa, a proposta de discussão gerou em torno da escolha profissional. As colaboradoras falaram sobre suas escolhas, trazendo à discussão, colocações bem diferentes:
Eu propriamente não escolhi. Eu acho que a Enfermagem me escolheu. Desde pequena sempre cuidei de meus irmãos pequenos. (C2)
Eu era bem novinha. Estava terminando os estudos. Então, certo dia ia passando e vi um anúncio: “Precisa-se de auxiliar de Enfermagem”. Fiz uma prova e passei. (C3)
Eu tive influência de uma tia que já exercia a profissão. Ela dizia pra mim: “Vá ser enfermeira”. E eu achava bonito (C4)
Eu sempre cuidei dos outros. Acho que foi por isso que escolhi Enfermagem. Parece que está no sangue (C2)
Intervenção: É possível vocês descreverem como é fazer parte de uma equipe de Enfermagem, numa unidade cardiológica.
Elas foram se “soltando” mais na roda de conversa. Foram unânimes quando colocaram que não era fácil, devido, sobretudo, a alguns fatores:

  1. São muitos os pacientes, em média de 40 internações, mas em períodos mais lotados, chagavam até 70 leitos.
  2. O estresse de lidar com pessoas doentes, com problemas graves, muitos deles abandonados, “esquecidos”, pelos familiares.
  3. A falta de maqueiro disponível: muitas vezes, elas mesmas fazem o transporte do paciente admitido ou dado alta.

Intervenção: Vocês mencionaram os familiares. Como é lidar com a família, quer como acompanhante, quer nas visitas? Facilita ou dificulta o trabalho da equipe?
Na maioria dos casos, facilita, pois nos chamam quando precisam ou vêm aqui. (C2)
Às vezes, o acompanhante ajuda, mas já tivemos casos que dificultaram. (C3).
Então, perguntamos se ela poderia comentá-los para discutirmos juntas. Ela concordou:
A maioria das vezes, porque os familiares já estão estressados; muitos deles já passaram várias vezes por aqui. Outras vezes, reclamam porque demoramos. (C3)
Intervenção: E como vocês reagem em tal situação?
Explicamos a eles que são muitos os pacientes e somos poucas. Colocamos que, sempre, vamos ao leito quando solicitadas. (C4)
Estamos sempre atentas quando um acompanhante ou paciente nos chama ou nos pede alguma coisa. (C5)
Intervenção: Como vocês se sentem quando essas situações ocorrem?
Às vezes, eu fico um pouco triste, pois a gente faz sempre o melhor, e muitas vezes quase o impossível. (C2)
Intervenção: Existe alguma de vocês que ainda que se sinta abalada, estressada, quando um familiar ou paciente reclama da demora da equipe? Vocês conversam entre si sobre esse sentimento?
Claro, a gente sempre fica triste porque as pessoas não reconhecem o nosso esforço. (C4)
A gente até chega umas pras outras e comenta, mas depois isso passa, e a gente está de novo, fazendo o que é preciso. (C5)
É fundamental entender-se o processo de escolha e as demandas que o profissional tem pelo trabalho, considerando-se que o trabalho, enquanto atividade humana, perpassa para além das necessidades de sobrevivência e sustento (BECK, 2001). Significa, então, compreender a relação entre a tríade vida, trabalho e saúde (ou adoecimento) do trabalhador.
Os recortes das falas das participantes mostram sujeitos que, ao falarem de suas escolhas profissionais, resgatam também suas relações no tocante às influências familiares e sociais e compartilham essas experiências, possibilitando em transformar esses conteúdos e ressignificando-os em suas próprias vidas e nas relações dentro da própria equipe. É, portanto, uma proposta do pensar coletivamente as questões individuais.

  1. Enfrentando desafios e percalços da rotina laboral: “Ver alguém sofrendo ou morrendo, ninguém se acostuma”

Quando sugerido o tema da “roda de conversa” – A Enfermagem: Desafios e percalços da rotina laboral -, inicialmente as colaboradoras trouxeram questões relacionadas principalmente quanto o percurso da profissão:
Antes não era preciso muito estudo, às vezes só o 1º grau. Foi assim comigo. (C6)
No começo, era preciso mais ter noções básicas de Enfermagem, como fazer um curativo, dar injeção, medir a pressão. (C7)
Ah, era diferente! Era exigido mais o básico, noções básicas, pois o restante aprendia-se na prática. (9)
Ao indagar acerca das exigências mercadológicas da contemporaneidade, elas colocaram:
O Conselho passou a exigir o 2º grau completo, mais um curso técnico de Enfermagem. (C1)
Passaram a exigir o 2º grau completo. Então, todos nós tivemos de correr atrás para fazer. (C6)
Eu já entrei na Enfermagem tendo essas exigências. Entrei já com o 2º grau. (C10)
Quanto aos desafios e percalços, falaram a respeito das complicações dos horários (plantões), como se verifica nas falas a seguir:
O maior desafio é a questão de termos os plantões. São puxados, e também algumas de nós saem daqui e vão para outro plantão. (C8)
Intervenção: Como fica a situação de vocês, quanto aos plantões, por exemplo, para quem ainda estuda, o período de provas, se precisa faltar?
Umas quebram o galho das outras. (C6)
Quem tem mais tempo, porque não estuda, troca de plantão com quem tem estudo, prova. (C7)
Surpreendeu-nos essas respostas, uma vez que se contrapõe à queixa inicial colocada pela Direção (dificuldade de relacionamento entre elas mesmas). A colega que mais colabora é a C2, inclusive substituindo a colega que cursa faculdade.
Intervenção: Como vocês estão lidando, então, com essas questões: plantões, sobrecarga, dor e morte do outro, ir para casa?
Sei que chamamos de rotina de trabalho tudo que fazemos no plantão, mas não tem como pensar em ser rotina a morte de uma pessoa. Então, é melhor nem pensar nisso [...]. (C6)
No começo, a gente sofre mais, porque tudo é muito novo para gente. Depois, a gente vai se acostumando. (C9)
Intervenção: E como é, para vocês, profissionais da saúde, lidarem com a morte do outro que, obviamente, nos faz lembrar a nossa própria finitude?
Eu acho que até pensamos, mas evitamos, pois é doloroso demais lidar com a morte do outro, e ainda pensar na sua! Ninguém conseguiria trabalhar assim! (C1)
Sabe, os plantões são tão movimentados, que eu acho que não paramos pra pensar nisso. (C7)
Intervenção: Então, se pensar na morte – do outro ou na nossa – é muito doloroso, pode chegar a dificultar a execução das atividades laborais, sobre o que pensam, então?
É, pensar que estamos sempre ajudando, cuidando deles [pacientes], nos ajuda a continuar nossa rotina de trabalho. (C7)
Pensar em Deus, em nossa missão como enfermeiras, de lembrar que depois de tudo isso, vamos para casa. (C9)
Nos relatos, percebemos várias manifestações emocionais que emergem quando as colaboradoras falaram sobre a morte, relacionando-a à possibilidade de perda de ente querido e o contato com sua própria finitude.
Um dos assuntos trazidos à tona referiu-se à morte e como elas se deparam com a finitude do outro e de si mesmas. Além disso, falaram do “Paredão Branco”, referindo-se ao pavilhão branco destinado aos cardíacos, devido à gravidade da maioria dos pacientes dessa unidade e, consequentemente, aos casos de óbito.
Verificamos que a morte e o morrer são realidades permanentes de sofrimento à equipe de Enfermagem. É relevante colocar que a morte, no passado, era considerada um evento natural e vivenciada no âmbito privado. No entanto, na pós-modernidade, ela é concebida como acontecimento escondido, resguardado nos hospitais (Pitta, 1994).
Porém, mesmo que a afaste do espaço social e familiar, ainda assim sabemos que a morte existe. Negá-la não significa que ela deixe de existir ou que não gere um mal-estar a quem presencia e, principalmente, a quem tem como ambiente de trabalho um lugar onde a morte é companheira frequente
Os profissionais de Enfermagem podem vir a adoecer, físico e psiquicamente, porque a exposição a fatores estressores como o sofrimento, a dor e a morte dos pacientes evocam sentimentos e formas de enfrentamento que podem não ser criativos, e sim patológicos, deixando o trabalho de ser uma atividade estruturante para se tornar patogênica (Dejours, 2001).
Verificamos a necessidade de espaço em que o afeto, o convívio e o diálogo tornem-se práticas diárias no ambiente de trabalho, possibilitando à equipe falar de seus medos, receios, angústias, sofrimento, o que, consequentemente, promoverá o empoderamento do grupo.
Significa dizer, portanto, haverá uma otimização das competências coletivas, sobretudo pela comunicação interpessoal promovida nesses momentos de interação.
Constatamos também os fatores que facilitam e dificultam o trabalho da equipe de Enfermagem, os quais, com o decorrer do tempo de atuação profissional, podem favorecer um ambiente gerador de indiferença às demandas individuais, coletivas e dos clientes (pacientes e acompanhantes).
Não percebemos nenhuma indiferença ao sofrimento, à dor e à morte do outro, inclusive uma participante mencionou que, mesmo com tantos anos de atuação, ainda se emociona quando vê um de seus pacientes morrerem, relembrando, inclusive, um dos casos de pacientes que passaram por muitas internações durante muitos anos.
Convém registrar que tal constatação contrasta com o senso comum, quando se refere que os profissionais de saúde tornam-se indiferentes com o passar dos anos na área de atuação.
Atividades laborais em ambientes de saúde infligem uma rotina de altos  índices de desgaste físico e emocional à equipe de enfermagem sobretudo, pois está diretamente em contato queixas dos pacientes e familiares, ansiedade, além de sentimentos de tristeza, dor, finitude (Esperidião; Munari, 2000; Esperidião et al., 2002; Damas; Munari; Siqueira, 2004; Shiratori et al., 2003).

  1. Assumindo o lugar do paciente: “É, são pessoas idosas, faz a gente se lembrar do pai, da mãe”

Solicitamos que elas pensassem como é estar do outro lado, assumindo lugar de paciente: quem já passou por internação, cirurgia, dependeu de outros profissionais da saúde?
Duas delas afirmaram que sim (uma fez um exame; a outra teve filhos). Então, perguntamos como se sentiram. A primeira respondeu que muito mal devido a modo como fora tratada num hospital público; a outra disse que foi bom, pois teve os filhos ali (neste hospital).
Refletimos, juntas, que há possibilidades de estarmos, durante nossa existência, nos dois lados – ora como profissional da saúde (detentor de poder), ora como paciente.
Algumas das participantes lembraram experiências que passaram quando familiares estiveram hospitalizados. Expuseram suas aflições, preocupações, sentimentos de perda, tão comuns àqueles que vivenciaram tais eventos.
O médico de plantão também se aproximou. Perguntou sobre nosso trabalho ali. Explicamos. Depois, ele falou de sua experiência em outro país.
Uma das colaboradoras trouxe à roda de conversa como se sentia quando um dos pacientes voltava a se hospitalizar:
A gente se apega, principalmente aqueles que sempre voltam. (C2)
Também me deparamos com o dispositivo que a equipe utiliza como modo de enfrentamento: diante de permanentes quadros de sofrimento psíquico, as colaboradoras ainda conseguem utilizar-se do sofrimento e reelaborá-lo de forma criativa, colocando-se no lugar do doente ou de seus familiares e, a partir extrair recursos de promoção de saúde, detectados nos fragmentos a seguir:
Pensando assim, a gente fica mais humana; a gente não pode deixar de pensar neles [pacientes]. (C2)
É, são pessoas idosas, faz a gente se lembrar do pai, da mãe. (C3)
Os relatos mostram que a equipe de Enfermagem depara-se frequentemente com o sofrimento, a dor e a morte dos pacientes que estão sob seus cuidados.
Encontrar-se, diariamente, diante de tamanhos desafios e tensões, e buscar dispositivos de enfrentamento, possibilita à equipe de Enfermagem a possibilidade de autoconhecimento, autorrealização, construção e/ou reconstrução de questões pessoais e coletivas (Beck, 2001).
Pelos discursos, constatamos também que os encontros propostos e a técnica de “roda de conversa” favoreceram a abertura de um espaço de diálogo, de encontro, escuta, vivências e de trocas no grupo, promovendo o empoderamento da equipe, maior amplitude de percepção de si mesmas e do outro, seus limites, mas também suas potencialidades, retomando reflexões sobre o processo de humanização no ambiente hospitalar.

  1. Ser mulher com tantas atribuições: “O trabalho muda só de endereço”

Nesse encontro, propusemos que pensassem como é lidar com o trabalho e os afazeres de casa, se alguém ajudava, se elas descansavam quando retornavam para casa ou iam cuidar da casa, dos filhos e do marido, constatados nas falas, a seguir:
Não é nada fácil! Trabalho aqui, e quando chego em casa, trabalho mais ainda. (C6)
A gente conversando aqui, é que eu vejo que continuo cuidando dos outros, aqui ou em casa. O trabalho muda só de endereço (C8)
Somente uma delas mencionou que o marido ajuda com a casa e os filhos, porque ela vai à faculdade (está cursando Enfermagem). As solteiras não se manifestaram, pois ainda não têm esse tipo de trabalho.
Intervenção: Percebemos que vocês colocam que os dois trabalhos (profissional e o doméstico) assemelham-se em alguns pontos. Isto facilita ou dificulta a vida de vocês?
Aqui, é trabalho; lá, é mais obrigação, pois não tem quem faça. (C6)
Às vezes até facilita, pois cuidamos aqui e lá, mas isso também dá uma sensação de rotina, da mesma coisa todo dia. (C10)
Os fragmentos das falas das colaboradoras enfatizam que ambos os trabalhos – no hospital e em casa – são, além de exaustivos, similares nos aspectos “duro”, “difícil”, “sem folga”, rotina repetitiva, transmitindo a concepção de continuidade de um e do outro, havendo, portanto, pontos convergentes entre essas atividades.
É imprescindível colocar que o trabalhador executado pela equipe de Enfermagem modificou-se ao longo dos anos. Antes, restringia-se a dar medicação prescrita ao paciente, alimentá-lo, cuidar de sua higiene, suporte físico e emocional ao paciente e aos familiares. Atualmente, além das atividades mencionadas, ainda precisam dar conta do estoque, débitos e registros (Machado; Merlo, 2004).
Mediante ao exposto, averiguamos que esses fatores também afetam o bem-estar e a saúde da equipe de Enfermagem, direta ou indiretamente, tendo em vista que ela tem de lidar diariamente com situações adversas e conflitos diversificados (Hoga apud Oliniski; Lacerda, 2006).

  1. Cuidando do cuidador: “Não dá tempo a gente se cuidar, mas eu sei que é preciso”

A equipe de Enfermagem cuida dos pacientes e familiares, da própria família, dos amigos. Contudo, quem cuida desse cuidador? Com base nessa concepção, propus na roda de conversa o tema “Cuidando do cuidador”, para as colaboradoras refletirem sobre o cuidar de si.
Propusemos, então, as perguntas norteadoras da discussão: De que modo vocês estão cuidando de si mesmas? Como estão extravasando o estresse ocasionado pelo desgaste da rotina de trabalho no hospital?
Não dá tempo a gente se cuidar, mas eu sei que é preciso. (C2)
Não tenho quem cuide de mim [...]. (C3)
Vou à igreja, lá extravaso isso tudo. (C5)
Considerando as experiências vivenciadas e os fatores estressores no ambiente hospitalar, exige-se dos profissionais de saúde equilíbrio emocional e cuidados pessoais, sociais e ambientais (Oliniski; Lacerda, 2006).
Dentre as dimensões perpassadas pelos atravessamentos psíquicos que comprometem os profissionais de saúde, sobretudo a equipe de Enfermagem, está a não-percepção de si como um sujeito que necessita também de cuidados, chegando, não raros os casos, a comprometer a saúde física e mental individual, com repercussões no coletivo, na equipe em si.
As colaboradoras tendem a sofrer imenso desgaste emocional, esquecendo-se, na maioria das vezes, de cuidar de sua própria saúde, como se não pudessem adoecer também (Fernandes et al, 2003; Kovásc, 2010). Então, torna-se imprescindível trabalhar esse grupo quanto a necessidade de se perceberem, com suas limitações e possibilidades de adoecimento, caso não comecem a investir nesse âmbito.
Observamos que esse ambiente de trabalho não favorece que as cuidadoras cuidem de si mesmas. Comungando dessa tese, Jesus e colaboradores (2001) sugerem que as instituições proporcionem espaços de trabalho comprometidos com a saúde do trabalhador, contemplando os atores sociais em sua totalidade e singularidades.
Corroborando com essa questão, Neves (2002) atenta ao fato de que é necessária a prática do autocuidado no espaço vivenciado pela equipe, como dispositivo para melhor lidar com fatores estressores, o que favorecerá melhor qualidade de vida no ambiente laboral.
Convém destacar que três fatores contribuem para o surgimento da Síndrome de Burnout, os quais já podem ser observados na rotina da equipe em estudo: exaustão emocional, despersonalização e diminuição da realização pessoal (Tamayo apud Carvalho, 2010). A síndrome atinge profissionais que estão submetidos a situações de estresse crônico, o que leva ao surgimento de sintomas psicológicos e comportamentais (Carvalho, 2010).
Dentre os sintomas citados por Carvalho (2010), na equipe observada há prevalência de exaustão e fadiga, visivelmente percebidas, sobretudo pelas posturas, corpos meio “arrastados” enfatizados principalmente no andar pelos corredores, olhos cansados e tristes. Inclusive, uma das colaboradoras mencionou que engordara 17k, provavelmente decorrente do estresse gerado pela rotina laboral e a falta de atividades físicas.
Outro fator que compromete as saúdes física e mental da equipe de Enfermagem diz respeito ao luto não-reconhecido, já que os profissionais de saúde vivenciam constantemente a morte e o morrer, contudo não lhes é concedido tempo e lugar de trabalhar esse luto, de expressarem seus sentimentos (Doka apud Carvalho, 2010; Kovásc, 2010), havendo, assim, uma contenção das emoções, o que poderá gerar esgotamento psíquico e, consequentemente, maior probabilidade de comprometimento na qualidade do trabalho executado.
Em decorrência dessas observações, Intervimos: Como cuidar do cuidador da equipe de Enfermagem? Foram, então, sugeridas algumas propostas de atividades promotoras de saúde e bem-estar no ambiente de trabalho, tais como minutos de aquecimento (alongamento nos horários pela manhã), momentos de conversa sobre as demandas do grupo (espaço de escuta e troca de vivências), exercícios de relaxamento (ao término dos plantões).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa foi para além os objetivos traçados, galgando um percurso não-esperado, tendo em vista que a própria equipe de Enfermagem conduziu o estudo para as demandas pessoais e coletivas do grupo.
A técnica “roda de conversa” foi bem aceita pela equipe, o que favoreceu que emergissem temas e discussões produtivas, promovendo uma coleta de dados muito rica.
Os encontros promovidos geraram momentos de conversações, discussão, reflexões sobre os temas propostos, autoconhecimento, troca de experiências pessoais e profissionais, contato com as demandas do outro e de si mesma, promovendo uma rede social de fortalecimento ao grupo, por meio das intervenções realizadas e das estratégias de ação para melhor lidar com os eventos estressores que a profissão gera.
Foi possível pensar num ambiente de trabalho que potencialize as qualidades da equipe e a qualidade de vida nos âmbitos pessoal e profissional, pela proposta de desenvolvimento de atividades laborais, como técnicas de aquecimento, alongamento, relaxamento, dentre outras.
Os pontos fortes deste trabalho foram a disponibilidade da direção, em se colocar à nossa disposição, e o acolhimento da equipe, agradável e assertivo. Ambos facilitaram plenamente tanto a pesquisa quanto as intervenções e estratégias realizadas.
O fator que nos dificultou em todos os encontros é porque a rotina da organização de saúde é atípica: fomos interrompidas inúmeras vezes, porque um paciente, ou familiar, ou até mesmo o médico de plantão, solicitava a presença e assistência de uma das colaboradoras. Quando retomávamos a atividade proposta, havia sempre uma quebra no ritmo da discussão.
É imprescindível que a instituição pense no cuidar do cuidador como forma preventiva de doenças relacionadas ao ambiente de trabalho, como exaustão, fadiga, estresse, dificuldade de concentração, dentre outras.
Torna-se necessário pensar que a equipe de Enfermagem poderá, num futuro bem próximo, vir a cometer erros decorrentes da exaustão e fadiga do trabalho exercido, tais como dificuldade de concentração, diminuição na percepção, atenção e memória.
É, portanto, relevante o papel do psicólogo hospitalar e do gestor em RH para, juntos, trabalharem as demandas das equipes atuantes, como forma preventiva de doenças relacionadas ao trabalho.
Constatamos, também, que não há caminhos prontos quando falamos de ser humano; existem percursos a serem construídos por dois sujeitos – o que investiga e o investigado; o pesquisador e o pesquisado; o psicólogo e o gestor em RH (ou outro profissional) e o cliente. As teorias e aparatos científicos e tecnológicos são, portanto, orientações, e não receitas prontas.
Concluímos, portanto, que existe a necessidade urgente de as organizações investirem no seu potencial humano, principalmente os que lidam com os limiares entre vida e morte, saúde e doença, interior e exterior, pessoal e coletivo.
Recomendamos à Instituição implantação de um programa com exercícios físicos e/ou atividades laborais nos horários pela manhã (aquecimento e alongamento) e à noite (massagem), como uma das possibilidades de promoção de saúde e bem-estar dos cuidadores para que possam voltar aos seus lares em condições físicas e emocionais adequadas para um melhor convívio familiar e pessoal.

REFERÊNCIAS

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*Pós Graduanda MBA em Administração de Recursos Humanos pela Faculdade Ateneu; Administradora de Empresas pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Graduanda em Psicologia pela Faculdade Estácio de Sá.
** Psicóloga Clínica pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). M. Sc. em Psicologia pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Spec. em Psicologia e Práticas de Saúde pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR); Spec. em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA). Formação em Psicologia Hospitalar pela Universidade Federal do Ceará (UFC); Formação em Psicodiagnóstico pela Núcleo de Avaliação Psicológica (NAP); Formação em Terapia Familiar Sistêmica pelo Espaço Viver Cursos e Treinamentos. Professora de Pós-graduação e Tutora na Universidade das Américas (UNIAMÉRICAS) e San Lourenzo (Paraguai). Autora de artigos nacionais e internacionais. Graduada em Letras pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
*** Professor da Disciplina de Metodologia do Trabalho Científico (Orientador) – Faculdade Ateneu. Dr. (Tít. Cult.) em Ciências Biológicas pela FICL; M. Sc. em Fitotecnia pela Universidade Federal do Ceará (UFC); Spec. em Metodologia do Ensino de Ciências pela Universidade Estadual do Ceará (UECe); Spec. (Tít. Cult.) em Paleontologia Internacional pela Faculdade Internacional de Cursos Livres (FICL). Graduado em Agronomia pela Universidade Federal do Ceará (UFC); Licenciado em Matemática, Biologia, Física e Química pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA); Consultor Internacional do BIRD para Laboratórios Científicos.


Recibido: 18/12/2017 Aceptado: 27/12/2017 Publicado: Diciembre de 2017



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