Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


A JUSTIÇA AMBIENTAL E A DESTRUIÇÃO DO SUBDISTRITO DE BENTO RODRIGUES NO MUNICÍPIO DE MARIANA/MINAS GERAIS – BRASIL.

Autores e infomación del artículo

Letícia Severina de Quadros*

Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Rio Claro/SP - Brasil.

leticia_unesp@yahoo.com.br

Resumo
O presente trabalho busca discorrer sobre o desastre socioambiental que ocorreu no subdistrito de Bento Rodrigues no município de Mariana (Minas Gerais, Brasil), e também sobre a justiça ambiental. O desastre foi decorrente do rompimento da barragem de rejeito de mineração do Fundão que ocorreu no dia 05 de novembro de 2015 e que até o momento (Junho 2017) e a população não está instalada em imóveis adequados. Assim, buscamos analisar como esse desastre afetou a população do distrito de Bento Rodrigues, através do arcabouço teórico metodológico da ciência geográfica e da justiça ambiental, buscamos compreender os conflitos socioambientais decorrentes desse desastre. Para tanto, foi realizada uma revisão bibliográfica de autores que trabalham com essa temática, as buscas mostraram que os conflitos socioambientais não são consequências espontâneas dos processos de exploração dos recursos minerais, mas são produzidos a partir das diferentes formas de apropriação do meio que são mediadas pelas relações desiguais de poder.
Palavras-chave: Subdistrito de Bento Rodrigues; Rompimento da Barragem do Fundão, Justiça Ambiental; Mariana – Minas Gerais - Brasil.
Resumen
El presente trabajo busca discurrir sobre el desastre socioambiental que ocurrió en el subdistrito de Bento Rodrigues en el municipio de Mariana (Minas Gerais, Brasil), y también sobre la justicia ambiental. El desastre se debió a la ruptura de la represa de minería de Fundão que se produjo el día 5 de noviembre de 2015 y que hasta el momento (Junio ​​2017) y la población no está instalada en inmuebles adecuados. Así, buscamos analizar cómo ese desastre afectó a la población del distrito de Bento Rodrigues, a través del marco teórico metodológico de la ciencia geográfica y de la justicia ambiental, buscamos comprender los conflictos socioambientales derivados de ese desastre. Para ello, se realizó una revisión bibliográfica de autores que trabajan con esa temática, las búsquedas mostraron que los conflictos socioambientales no son consecuencias espontáneas de los procesos de explotación de los recursos minerales, sino que se producen a partir de las diferentes formas de apropiación del medio que son mediadas Por las relaciones desiguales de poder.
Palabras clave: Subdistrito de Bento Rodrigues; Rompimiento de la Represa del Fundão, Justicia Ambiental; Mariana - Minas Gerais - Brasil.
Abstract
This paper seeks to describe the socioenvironmental disaster that occurred in the Bento Rodrigues subdistrict in the municipality of Mariana (Minas Gerais, Brazil), as well as environmental justice. The disaster was caused by the disruption of the Fundão mining tailings dam that occurred on November 5, 2015 and so far (June 2017) and the population is not installed in adequate properties. Thus, we seek to analyze how this disaster affected the population of the district of Bento Rodrigues, through the theoretical framework of geographic science and environmental justice, we seek to understand the social and environmental conflicts resulting from this disaster. For this, a bibliographical review of authors working on this theme was carried out, the researches showed that the socioenvironmental conflicts are not spontaneous consequences of the exploitation processes of the mineral resources, but are produced from the different forms of appropriation of the environment that are mediated By unequal relations of power.
Keywords: Bento Rodrigues Sub-district; Breaking of the Fundão Dam, Environmental Justice; Mariana - Minas Gerais - Brazil.


Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Letícia Severina de Quadros (2017): “A justiça ambiental e a destruição do subdistrito de Bento Rodrigues no Município de Mariana/minas Gerais – Brasil”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (julio-septiembre 2017). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2017/03/justica-ambiental.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1703justica-ambiental


 

  1. Introdução

O presente artigo busca realizar uma discussão e uma reflexão sobre o rompimento da barragem do Fundão e a destruição do subdistrito de Bento Rodrigues no Município de Mariana – Minas Gerais (Brasil). Buscamos analisar esse desastre socioambiental de grandes proporções sob a perspectiva da justiça ambiental, pois foi o maior desastre socioambiental da história do nosso país. E demonstrar como a justiça ambiental pode ser um instrumento de cidadania que pode auxiliar a população atingida a resolver seus problemas socioambientais.
Essa pesquisa foi desenvolvida pois acredita ser necessário estudar mais, analisar e compreender o desastre socioambiental e a destruição do subdistrito de Bento Rodrigues no Município de Mariana/Minas Gerais – Brasil, visto que se passaram um ano e sete meses e a empresa não começou a construir as casas da população do distrito de Bento Rodrigues, e as empresas Samarco S.A, Vale S.A, e anglo-australiana BHP Billinton não estão cumprindo  os acordos judiciais para ações de remediação ao meio ambiente e na construção de um novo subdistrito de Bento Rodrigues.

  1. Objetivos

O presente artigo busca descrever e analisar a injustiça ambiental que ocorreu e ainda ocorre no distrito de Bento Rodrigues, que foi destruído pelo rompimento da barragem de rejeito de mineração do Fundão que ocorreu no município de Mariana – Minas Gerais/Brasil. Esse desastre ambiental ocorreu no dia 05 de novembro de 2015, assim, para analisa-lo, utilizaremos o arcabouço teórico metodológico da ciência geográfica e da justiça ambiental.

  1. Procedimentos Metodológicos

Para a elaboração e realização dessa pesquisa realizamos uma revisão bibliográfica sobre a temática abordada, buscando artigos nacionais e internacionais que abordavam a temática sobre o rompimento da barragem de rejeitos do Fundão e a destruição do distrito de Bento Rodrigues, e ainda artigos nacionais e internacionais e livros sobre a justiça ambiental. Além de outros documentos que embasam nossa pesquisa, são eles: Laudo técnico preliminar do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), dados do IBGE, dados do Relatório Técnico da Agência Nacional de Águas (2015), Relatório de Demonstração Financeira da Samarco S.A (2014), Atlas Digital das águas de Minas Gerais, Informações da empresa Samarco S.A e informações da prefeitura Municipal de Mariana, além de foto aéreas do IBAMA, Google Earth.

  1. O Subdistrito de Bento Rodrigues

O Subdistrito de Bento Rodrigues pertence ao distrito de Santa Rita Durão, no município de Mariana – Minas Gerais - Brasil. Bento rodrigues está há 51,2 km distante do município de Mariana-MG, e está a 2,5 km da empresa de mineração Samarco S.A, e está a 124 km de distância de Belo Horizonte a capital do Estado.
O Subdistrito de Bento Rodrigues tinha a mineração e o turismo como principais atividades econômicas, possuía ainda um hotel fazenda na entrada do subdistrito, tinha como belezas naturais a Cachoeira do Ouro Fino, que é uma queda d’água de 15 metros, com lago de 5×3 metros e profundidade máxima de 1,5 m.
Nas proximidades do subdistrito, está o rio Gualaxo do Norte, e estão localizados os povoados e distritos de Paracatu, Paracatu de Baixo, Rio Doce, Camargos, Barra Longa, Santa Rita Durão, Barreiro e Gesteira que foram seriamente afetados pela grande carga de rejeito de mineração. Em 2015, Bento Rodrigues tinha uma população estimada em 600 habitantes, que ocupavam cerca de 200 imóveis. (IBGE, 2015)
No subdistrito estão localizadas as barragens de rejeitos de mineração que pertencem a empresa Samarco S.A, denominadas Germano, Santarém e Fundão. (Figura 1)

Em relação ao seu contexto histórico, Bento Rodrigues foi um centro de mineração relevante durante o século XVIII e faz parte da histórica Estrada Real, que atravessava o seu antigo centro urbano. Ainda nos dias atuais, a área em que o subdistrito está localizado, se caracteriza pela intensa atividade de extração mineral principalmente de minérios de Ferro, e a presença de garimpeiros que trabalham buscando ouro de aluvião. 
O Subdistrito de Bento Rodrigues surgiu com a febre de ouro que se imperava pelos rincões de minas gerais durante o século XVII, no município de Mariana, no Estado de Minas Gerais. O distrito possuía monumentos de relevância histórica, arquitetônica e cultural, pois, possuía igrejas centenárias com obras sacras relevantes para a história de Mariana – MG. Além disso, o distrito fazia parte da rota da Estrada Real no século XVII.
Segundo o “Dicionário histórico-geográfico de Minas Gerais” de Waldemar de Almeida Barbosa (1907-1999), descreve o distrito de Bento Rodrigues com as seguintes características:
Famoso arraial, centro de mineração, surgido na época do bandeirismo, no termo de Ribeirão do Carmo. ´Com a mesma emulação, fez sua tropa o Pe. João de Faria Fialho e, em breve tempo, descobriu o ribeirão de seu nome, porém, como os que tinham mais armas e mais séquito eram sempre nestes descobrimentos os mais aquinhoados, determinaram-se os mal contentes a formarem novas bandeiras. Uma destas descobriu e socavou o ribeirão que se chamou Bento Rodrigues,nome do cabo, de tanta grandeza, que tiraram nele bateia de 200 e 300 oitavas, sendo a pinta geral de duas e três oitavas e tanta a gente que concorreu, que; no ano de 1697, valeu o alqueire e milho sessenta e quatro oitavas e o mais na proporção` (Notícia Práticas que dá ao Revmo. Pe. Diogo Soares o Mestre de Campo José Rebelo Perdigão, sobre os primeiros descobrimentos das Minas Gerais do Ouro, in ´Vila Rica do Ouro Preto`, Augusto de Lima Júnior, pág. 50). (Grifo nosso)
De acordo com o dicionário histórico-geográfico de Minas Gerais (1971), o surgimento da capela de S. Bento foi construída em 1718. No mesmo dicionário mostra dados sobre a quantidade de população que moravam no distrito, Barbosa (1971) afirma que, “Num recenseamento verificado em 1831, o ´distrito de paz de Bento Rodrigues` apresentava 318 livres, 136 cativos, num total de 454 habitantes e 91 fogos (Avulsos, A.P.M)”.
 Dessa forma, o distrito de Bento Rodrigues nos mostra parte da sua história, e parte dessa história se perdeu com o desastre socioambiental do rompimento da barragem de rejeito de mineração, que além de perdas humanas, ocorreu a contaminação do solo, da vegetação, das águas dos rios, da ictiofauna, dos córregos da área afetada e grande parte do patrimônio histórico e cultural, que foi construído ao longo de décadas, foi destruído pela grande carga de rejeitos de mineração da empresa Samarco S.A..

  1. O Desastre Socioambiental no subdistrito de Bento Rodrigues

O desastre socioambiental ocorreu no dia 5 de novembro de 2015, o rompimento da barragem de rejeito de mineração do Fundão, pertence a mineradora Samarco (que pertence as empresas Vale do Rio Doce e a anglo-australiana BHP Billiton), no município de Mariana – MG, o rompimento despejou sessenta milhões de m3 de rejeitos de mineração de ferro por mais de 650 km ao longo da bacia do rio Doce até o município de Linhares no Estado do Espirito Santo e desaguou no Oceano Atlântico.
O rompimento da barragem de Fundão e os seus rejeitos de mineração de ferro contaminaram e destruíram o subdistrito de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo no município de Mariana, e o distrito de Gesteira na cidade de Barra Longa, e também a própria cidade de Barra Longa. Nesse cenário lunar cerca de 300 produtores rurais dessas regiões tiveram suas atividade agrícola, comercial, pecuária, de pesca prejudicada, deixando muitas famílias desalojadas e sem a matéria prima para adquirir seu sustento. E também foi impactado cerca de 2.200 hectares de área, dessas 500 hectares nas calhas dos rios atingidos e o restante nas suas margens. (Figura 2).

Na imagem aérea acima podemos observar como era o subdistrito de Bento Rodrigues antes do desastre, e após o desastre socioambiental. Após o rompimento da barragem de rejeito de mineração o subdistrito de Bento Rodrigues possui a paisagem caracterizada por um horizonte marrom criado por toda lama que escoou das duas barragens, essa lama destruiu tudo por onde passava, desde casas, carros, escolas, igrejas, ruas, praças, pequenas plantações e muitas vidas, além dos bens materiais dessa população (figuras 3 e 4).
Esse desastre socioambiental nos mostra como a paisagem do subdistrito foi completamente transformada e é resultado de ações antrópicas no território, sem a fiscalização ambiental efetiva do poder público seja ele, municipal, estadual e federal. (Figuras 5 e 6).

As imagens aéreas nos mostram como foi o maior desastre socioambiental da história do Brasil.  A figura 7, nos mostra a imagem área de antes e depois do rompimento da barragem de rejeito de mineração do Fundão, no município de Mariana (MG) e ao norte da imagem observa-se as barragens de contenção de rejeito de mineração.
Nesse cenário, as propriedades rurais nas proximidades da bacia do rio Doce foram intensamente atingidas. A avalanche de lama de rejeito de mineração contaminou a rede de água de vários municípios que eram abastecidos pelo rio Doce e seus afluentes. A bacia hidrográfica do rio Doce é a quinta maior bacia do Brasil, o Atlas Digital das águas de Minas Gerais (2010), descreve que,
A bacia hidrográfica do rio Doce apresenta uma significativa extensão territorial, cerca de 83.400 km2, dos quais 86% pertencem ao Estado de Minas Gerais e o restante ao Estado do Espírito Santo. Abrange, total ou parcialmente, áreas de 228 municípios, sendo 202 em Minas Gerais e 26 no Espírito Santo e possui uma população total da ordem de 3,1 milhões de habitantes. (2010)
            Sobre a importância da bacia do rio Doce para o setor produtivo, o referido atlas salienta que,
A bacia abriga o maior complexo siderúrgico da América Latina. Três das cinco maiores empresas de Minas Gerais no ano de 2000, a Companhia Siderúrgica Belgo Mineira, a ACESITA e a USIMINAS, lá operam. Além disso, lá se encontra a maior mineradora a céu aberto do mundo, a Companhia Vale do Rio Doce. Tais empreendimentos industriais, que apresentam níveis de qualidade e produtividade industrial que estão entre os maiores do mundo, desempenham papel significativo nas exportações brasileiras de minério de ferro, aços e celulose. Além deles, a bacia contribui na geração de divisas pelas exportações de café (MG e ES) e polpa de frutas (ES).
Sobre a constituição da bacia do rio Doce, e sobre os danos ambientais decorrentes do rompimento, Jacobi (2016) afirma que,
O rio Doce tem extensão de 879 quilômetros e suas nascentes estão em Minas, nas Serras da Mantiqueira e do Espinhaço. O dano ambiental de tamanho irreparável, tem como um dos mais graves efeitos do despejo do rejeito nas águas, o assoreamento pela lama de rios e riachos da bacia do rio Doce.
A onda de lama de rejeito de mineração desaguou no rio Doce e percorreu a bacia do rio doce e chegou ao oceano atlântico no dia vinte e um (21) de novembro de 2015, a onda de rejeito levou 16 dias para chegar ao oceano atlântico (Relatório Técnico Agencia Nacional de Águas, 2015). Dessa forma, todo o percurso da pluma de rejeito de minério impactou e contaminou os recursos hídricos, o solo, ar, e a grande biodiversidade que a bacia do rio Doce possuía, peixes, insetos, pequenos repteis, além de impactar de forma significativa o abastecimento de água de vários municípios nos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, através dos 650 quilômetros que a avalanche de lama percorreu.
O subdistrito de Bento Rodrigues ficou destruído e a avalanche de rejeitos causou danos ambientais, econômicos e culturais de grandes proporções e irreversíveis. O subdistrito possuía uma população estimada em 612 habitantes, e 85 famílias perderam suas casas ou tiveram o imóvel afetado pela ocorrência do rompimento, e 19 pessoas morreram com o desastre socioambiental. Todos os sobreviventes ficaram desabrigados, pois, suas casas, igreja e colégios foram destruídos pelo desastre socioambiental.
     Sobre os danos o Laudo técnico preliminar do IBAMA (2015) afirma que,
Os danos causados pela onda de lama de rejeitos foram degressivos, ou seja, quanto mais próximos a barragem maior foi o dano e, por conseguinte, suas consequências. Em um primeiro momento o Distrito de Bento Rodrigues foi dizimado. Seguindo o curso do rio, a força da lama foi diminuindo seu poder de destruição impactando os Rios Gualaxo do Norte, Carmo e Rio Doce. (IBAMA, 2015. p.24)
Sobre o desastre o Laudo técnico preliminar do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), que foi publicado em dezembro de 2015, apresenta os danos do desastre socioambiental,
[...] o desastre resultou, dentre outras coisas, na morte de trabalhadores da Samarco e de moradores das comunidades afetadas; no desalojamento de populações; na devastação de localidades, com a perda de estruturas públicas e privadas; na destruição de 1.469 hectares de vegetação, incluindo Áreas de Preservação Permanente (APP); na mortandade de biodiversidade aquática e fauna terrestre; na perda e na fragmentação de habitats; na interrupção da pesca por tempo indeterminado; na interrupção do turismo; na alteração dos padrões de qualidade da água doce, salobra e salgada; na interrupção do abastecimento de água e na dificuldade de geração de energia elétrica pelas hidrelétricas atingidas. (BELCHIOR; PRIMO, 2016, p. 11)
            Neste cenário, todos os municípios que são banhados pelos rios Gualaxo do Norte, Carmo e Rio Doce foram afetados, mas, com intensidades diferentes. E todos os municípios que estão localizados na bacia do rio doce sofreram influência direta do desastre socioambiental.
                 Sobre o impacto nas habitações, a nota Técnica 02001.002155/2015-91 CSR/IBAMA (2015), mostra que o uso do solo foi afetado e salienta que,
 “Das 251 edificações mapeadas em Bento Rodrigues, 207 apresentaram sobreposição com o polígono da área atingida, ou seja 82% das edificações atingidas. Das 87 edificações mapeadas em Camargos, 10 apresentaram sobreposição com o polígono da área atingida, ou seja 11% das edificações atingidas. O Centro de Sensoriamento Remoto do IBAMA convalida esse mapeamento e informa que ainda não foram mapeadas as edificações nos demais trechos, como Paracatu de Baixo, Gesteira e Barra Longa.” (IBAMA, 2015. p.25)
                 De todos os distritos e municípios afetados, o subdistrito de Bento Rodrigues foi o mais afetado pois 82% das edificações foram destruídas. De acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA,2015) os municípios de Governador Valadares (MG) e Colatina (ES) ficaram por vários dias no mês de novembro sem a distribuição pública de água.
Sobre as medidas mitigatórias a empresa Samarco S.A (2016) e suas acionistas, salientam que,
Tem conduzido, desde o primeiro momento, diversas ações de remediação e mitigação ao longo dos 650 quilômetros de extensão dos impactos sociais, ambientais e econômicos. No dia 2 de agosto, entrou em operação a Fundação Renova, criada pela Samarco, Vale e BHP Billiton para a condução dos programas de reparação e recuperação socioeconômica e socioambiental nas áreas impactadas. (Samarco S.A, 2016, p.01)
                 No entanto, segundo o ministério público e o IBAMA as ações de mitigação da empresa não são considerados eficientes, pois a empresa não está tirando a grande quantidade de rejeito das margens dos rios, e estava plantando plantas arbustivas em cima da camada de rejeito.

  1. O crescimento sem responsabilidade social e ambiental da empresa Samarco S.A

A empresa Samarco S.A é uma grande empresa de capital fechado, que pertence a empresa brasileira Vale do Rio Doce S.A e da empresa australiana BHP BIllinton, a empresa trabalha com a extração de minérios de ferro para a exportação. De acordo com o relatório de Demonstração Financeira da empresa no ano de 2014, esse afirma que, 
Nossa produção de 2014 alcançou 25,075 milhões de toneladas de pelotas de minério de ferro e finos, 15,4% a mais que no ano anterior. Esse volume ainda não corresponde a todo o aumento que projetamos, em função de ajustes naturais ao processo de ramp-up da expansão – que permitirá um salto de 37% na capacidade nominal de produção anual. Nossas vendas, por outro lado, alcançaram 25,1 milhões de toneladas e se distribuíram de forma equilibrada no exterior, alcançando 36 clientes, de 19 países. O lucro líquido alcançou R$2.805,5 milhões, resultado que se destaca no setor e que vemos com satisfação, dadas as previsões atuais e futuras para a mineração. (Relatório de Demonstração Financeira Samarco. S.A, 2014)
                 Esse Relatório de Demonstração Financeira do ano de 2014 nos mostra que a empresa estava em um processo de aumento da sua produtividade, ou seja, estava extraindo mais minérios de ferro e consequentemente precisava de um local maior para armazenar os rejeitos da mineração. Fato esse, que se deu através da obra que ocasionou o rompimento da barragem do Fundão.
     Os dados apresentados nos mostram que a empresa estava em processo de crescimento acentuado, pois, alcançou um lucro líquido alcançou R$ 2.805,5 milhões de reais.

  1. A Justiça Ambiental e o desastre socioambiental no subdistrito de Bento Rodrigues

O Movimento por Justiça Ambiental surgiu nos Estados Unidos da América, através da articulação das lutas por equidade nos direitos civis, direitos ambientais e sociais. Já na década de 1970, organizações sindicais se articulavam para elaborar pautas que estudavam e desenvolviam estudos que mostravam a distribuição espacialmente era desigual da poluição e da raça das populações mais expostas aos danos ambientais e sociais.
A partir de estudos reunidos, conseguiram mostrar ao poder público essa problemática de lixo toxico e perigoso afetada diretamente a saúde dessa população. Sobre o conceito de justiça ambiental, Moura (2010) salienta que,
É centrado na luta travada por grupos étnicos afetados pelo racismo ambiental, pois em 1987, um relatório científico divulgado pelo Comitê para a Justiça Racial da Igreja Unida de Cristo denunciou as ligações entre a degradação ambiental e a discriminação racial. O estudo utilizava dados estatísticos para demonstrar que a localização de lixeiras com resíduos tóxicos coincidia com a das comunidades de negros, hispânicos e asiáticos. Trata-se de um marco histórico, fortemente ligado com o surgimento de movimentos de justiça ambiental nos EUA que relacionaram a luta anti-racista com a defesa do meio ambiente. (Moura, 2010, p. 04)
Na declaração da ONU- Rio 1992 afirma que, um ambiente saudável é um direito básico de todos os habitantes da Terra (ONU, 1992). No entanto, é notório que os riscos ambientais não possuem equidade. Para Cutter (1995) a justiça ambiental,
É a ação política e a mobilização social que mobiliza o compromisso público e privado de mudança. Ao unir os movimentos ambientais, de igualdade social e direitos civis em uma poderosa força política, os defensores da justiça ambiental têm uma influência considerável na política pública em todos os níveis. (Cutter, 1995; p. 112)
Para Acselrad (2002) o conceito de justiça ambiental,
Está associado à emergência de um movimento de caráter social nos anos de 1980 nos Estados Unidos. Sua definição se relaciona com a ideia de igualdade de direitos entre os diferentes grupos sociais, independentemente de suas características culturais, econômicas ou étnicas. (Acselrad,2002, p.10)
Em relação a definição de Justiça ambiental Herculano (2002, p. 2) define como:
[...] o conjunto de princípios que asseguram que nenhum grupo de pessoas, sejam grupos étnicos, raciais ou de classe, suporte uma parcela desproporcional das consequências ambientais negativas de operações econômicas, de políticas e programas federais, estaduais e locais, bem como resultantes da ausência ou omissão de tais políticas. (Herculano, 2002, p. 2)
Dessa forma, a justiça ambiental possui uma forma revolucionária, que busca minimizar e combater as desigualdades socioambientais e culturais na distribuição dos prejuízos e dos benefícios que são desenvolvidos pelo capitalismo. Nesse sentido, Acselrad (2005) salienta que a Justiça Ambiental, é
Uma noção emergente que integra o processo histórico de construção subjetiva da cultura dos direitos no bojo de um movimento de expansão semântica dos direitos humanos, sociais, econômicos, culturais e ambientais. Na experiência recente, a justiça ambiental surgiu da criatividade estratégica dos movimentos sociais, alterando a configuração de forças sociais envolvidas nas lutas ambientais e, em determinadas circunstâncias, produzindo mudanças no aparelho estatal e regulatório responsável pela proteção ambiental (ACSELRAD, 2005, p. 223).
A Justiça Ambiental no contexto brasileiro se apresenta como um movimento de ressignificação da questão ambiental. Essa ganhou mais espaço através da criação em 2001 da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA), que tem como finalidade combater a injustiça ambiental no País, e é uma articulação formada por representantes de movimentos sociais, sindicatos, ONGs e pesquisadores do Brasil que tem a necessidade de pensar e desenvolver ações nas lutas ambientais articuladas com as lutas por justiça social.
 No Brasil, a discussão da temática justiça ambiental é recente, e deve ser estudada, pois, grande parte da população brasileira de baixa renda está exposta a riscos ambientais, em diferentes lugares, seja no lugar onde mora, no local de trabalho, ou em espaços que essa população frequenta, até mesmo na falta de saneamento básico, as ocupações irregulares nas encostas de morros, em áreas de várzea e que estão sujeitas a desmoronamento e a enchentes.
Uma das causas da injustiça ambiental presente em nosso país é a concentração de capital e do poder que algumas empresas multinacionais possuem no cenário político nacional e também na apropriação dos recursos naturais e ambientais no nosso país.
Uma concentração de poder que tem se revelado a principal responsável pelo que os movimentos sociais vêm chamando de injustiça ambiental, de acordo com o Manifesto de Lançamento da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (2001) compreende que,
A injustiça ambiental o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de vista econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às populações de baixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos povos étnicos tradicionais, aos bairros operários, às populações marginalizadas e vulneráveis.
Dessa forma, é necessário que a população brasileira se preocupe e busque seus direitos ambientais e sociais para uma melhor qualidade de vida para todos.
No caso do subdistrito de Bento Rodrigues uma das ações que o poder público realizou foi, tentar preservar a transformação da paisagem que ocorreu no distrito, para isso, o município de Mariana e o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana (Compat), realizou no ano de 2016 o,
Tombamento provisório de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo como forma de criar diretrizes para a preservação e gestão dessa paisagem atual como memorial de um dos maiores desastres ambientais do país, uma vez que a paisagem atual formada pela tragédia é testemunho da transformação vivida naquele espaço dentro do contexto da tragédia e se constituem como memória e marco histórico na vida dos que foram atingidos pelo rompimento da barragem. (Prefeitura Municipal de Mariana, 2016)
O memorial a ser criado nas localidades mais atingidas tem como objetivo conservar e recordar a história do desastre nessas localidades. O memorial no subdistrito tem como objetivo relembrar a destruição ocasionada pela mineração de forma inconsequente, que causou a destruição do subdistrito e também da maior tragédia socioambiental do Brasil.
O tombamento será um importante meio de proteção do patrimônio material e imaterial do espaço e das pessoas que foram diretamente afetadas; é uma forma também de preservar o pouco de paisagem que restou, e não deixar a sociedade esquecer desse desastre. Pois, mesmo que a mineradora reconstrua outro distrito com características semelhantes, nunca será o mesmo.
Nesse contexto, a paisagem está em constante renovação, e essa é formada por vários elementos e conhecimentos individuais e coletivos de construção da identidade que são construídas por seus moradores no decorrer do espaço e do tempo.

  1. Considerações Finais

Através dos informações e reflexões apresentadas podemos salientar que a empresa Samarco S.A causa uma grande injustiça ambiental com a população atingida, e ainda com toda a sociedade que é indiretamente afetada. Pois o desastre socioambiental do subdistrito de Bento Rodrigues deve ser discutido, refletido e cobrado ações de forma efetiva da empresa causadora do desastre, para que essa ofereça subsídios para a construção de um novo subdistrito.
Para ter justiça ambiental nesse caso abordado, devem ser realizadas várias ações dos órgãos regulamentadores e também do poder público das esferas municipal, estadual e federal para tentar minimizar a injustiça ambiental que essa população está sofrendo.
     Sob essa perspectiva acredita-se que os impactos sociais que a população do distrito  de Bento Rodrigues sofreu e ainda sofre merece atenção especial, pois essa população está sofrendo uma injustiça ambiental muito grande, pois após um ano e sete meses do desastre a população está morando em locais provisórios, em casas e apartamentos, a população do distrito estava acostumada com outro ritmo de vida, pois grande parte da população tinha sua horta e plantava seus produtos orgânicos, existia uma convivência social e cultural com os vizinhos, as propriedades eram amplas e bem equipadas com água e luz.
 Sendo assim, após todo esse período a população do subdistrito está alocada em apartamentos e casas na cidade de Mariana-MG, essa população sofre com problemas de saúde, alergias da poeira tóxica, problemas respiratórios e pulmonares, além de outros problemas e distúrbios psicológicos, e com a baixa qualidade de vida.
Uma pesquisa desenvolvida pelo Greenpeace (2016) e pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade denominada “Avaliação dos riscos em saúde da população de Barra Longa/MG afetada pelo desastre (2017) analisaram o município vizinho de Mariana, o município de Barra Longa que também foi gravemente afetado, pois atingiu a área central da cidade, além de destruir plantações. De acordo com a pesquisa, afirma que
A população do município está exposta a uma série de riscos decorrentes da degradação do meio ambiente e por um longo período desde o desastre. O derramamento dos rejeitos causou o revolvimento e aumento da biodisponibilidade de uma série de componentes tóxicos - inclusive metais - demonstrado por uma série de análises - em vários componentes naturais; água, solo e fauna (peixes e crustáceos), em níveis superiores aos preconizados para segurança segundo as leis brasileiras; em mais de um local e em diferentes períodos. A bacia aérea da cidade também se tornou tóxica devido ao pó proveniente da lama seca, exacerbado pelas obras de reconstrução da cidade. (Greenpeace, p.05)
Sobre os níveis de particulados (MP10), que foram realizados pelo Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, durante uma semana, em outubro de 2016, mostram que,
Os níveis de particulados (MP10), determinados por uma campanha de monitoramento de qualidade de ar na cidade, chegaram a atingir níveis de concentração altos, superiores aos encontrados nas grandes metrópoles brasileiras. Além do exposto, uma parte da população teve contato direto com a lama que invadiu a cidade e a água contaminada do rio. Sua atividade econômica principal é a agropecuária, mantendo parte dos seus moradores em contato constante com o ambiente para cultivo de plantações e a criação de animais. Os participantes do estudo conhecem bem a questão da exposição a que estão submetidos - 61% deles afirmam estarem expostos à alguma fonte de contaminação próxima a sua moradia. Escassas são as informações públicas de saúde desde o desastre.  (Greenpeace, p.05)
Sobre a motivação para o desenvolvimento da pesquisa sob responsabilidade do Greenpeace, salientam que,
Nesse contexto, a partir da iniciativa da sociedade brasileira e Greenpeace, o Instituto Saúde e Sustentabilidade realizou-se esta pesquisa, exploratória transversal e descritiva, com o intuito de se avaliar a situação de saúde da população residente na área urbana e rural (comunidades de Gesteira e Barreto), que representam cerca da metade dos habitantes do município. Trata-se da aplicação de questionários estruturados de autoavaliação em saúde e as necessidades de assistência local em saúde para 507 indivíduos participantes do estudo. (Greenpeace, p.05)
Em relação aos resultados diagnosticados na população (Greenpeace, 2017) afirma que,
Os dados de saúde encontrados espelham o sofrimento da população a multivariadas queixas e doenças e que a sua saúde está comprometida e de diversas formas. Entre os participantes, 37% deles referem sua saúde pior que antes do desastre. Dentre os problemas de saúde que relatam espontaneamente, 40% são respiratórios (para as crianças de 0 a 13 anos, o índice alcançou 60%); 15,8% são afecções de pele; 11% transtornos mentais e comportamentais; 6,8% doenças infecciosas; 6,3% Doenças de olho; e 3,1% problemas gástricos e intestinais. Foram relatados 31 casos (6,6%) de Dengue, apenas na área urbana e entre 2 a 6 meses - que, de fato, um surto ocorreu na cidade. Dos respondentes com problemas, 56% afirmam terem deixado de realizar alguma de suas atividades habituais. Perguntados de forma direcionada a sintomas físicos, desde o desastre, 77,9% da população do estudo (396) os apresentavam. Os três primeiros, entre os 14 primeiros relatados; a dor de cabeça, tosse e dor nas pernas ocorrem em 24 a 30% da população total do estudo. Seguidos a esses, ansiedade (20,9%), coceira (20,5%); alergia de pele (18,1%), abatimento (17,9%), febre (15,4%), alergia respiratória (15,4%), rinite (14,6%), cãibras (13,6%), falta de ar, falta de apetite, diarreia e emagrecimento. Deste conjunto, 72,3% dos sintomas se iniciaram após o desastre com pico entre 2 a 6 meses. Em estudos de auto referência em saúde, a cefaleia e a ansiedade estão entre os mais comuns, chamando a atenção os demais sintomas. Observa-se maior vulnerabilidade dos moradores do bairro Volta da Capela, tanto mais expostos a riscos, como maior chance, por análise estatística, de apresentar alguns sintomas ou doenças, comparados aos moradores de outras áreas - vômitos, afecções de pele, dor nas pernas, cãibras e “dor nos ossos”.
Sobre as questões relacionadas a transtornos mentais ou neurológicos, a pesquisa apresenta os seguintes resultados,
O número afirmativo de acometimento por Ansiedade, Estresse e Depressão, juntos, representam 23% dos respondentes. Em relação aos sintomas emocionais, 83,4% os apresentam. A insônia é o mais frequente (36,9%, inclusive presente em 19% das crianças entre 6 a 13 anos.); seguido por preocupação ou tensão (21,7%); assustar-se com facilidade; alteração do humor, entre outros. Há a ampla cobertura da assistência em saúde no município, mesmo diante do aumento da demanda, com 87% de resolutividade referida pelos respondentes, inclusive do ponto de vista de assistência psiquiátrica e psicológica. A população avalia o serviço de saúde local com a nota 7,2. Sugere-se o monitoramento e vigilância da área afetada e da população exposta como parte dos problemas de avaliação de riscos, bem como estudos futuros, que possam elucidar eventual associação de intoxicação e o comprometimento de saúde. (Greenpeace, p.06)
Através dos dados apresentados podemos afirmar que esse desastre socioambiental afetou de forma significativa a vida social, econômica e cultural da população atingida e o poder público precisa resolver com urgência os problemas dessa população.
Nesse cenário, a sociedade nacional e internacional deve cobrar ações efetivas das empresas brasileiras Samarco S.A e Vale S.A e da empresa anglo-australiana BHP Billinton para que essas cumpram os acordos feitos com o Ministério Público, paguem as referidas multas e iniciem a construção do novo distrito de Bento Rodrigues para dar dignidade para as pessoas atingidas.
Agradecimentos
A primeira autora agradece a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de mestrado concedida.
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* Maestría en el Programa de Postgrado en Geografía por la Universidad Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Campus de Río Claro - São Paulo / Brasil. Graduada en Licenciatura Plena en Geografía por la Universidad Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Campus de Río Claro - São Paulo / Brasil. Graduada en Bachillerato en Geografía por la Universidad Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Campus de Río Claro - São Paulo / Brasil. Graduada en Historia por el Centro Universitario Claretiano. Campus de Río Claro - São Paulo / Brasil. Especialista en Gestión Pública por el Centro Universitario Claretiano. Campus de Río Claro - São Paulo / Brasil.

Recibido: 29/07/2017 Aceptado: 05/09/2017 Publicado: Septiembre de 2017

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