Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


RISCOS EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: UM ENFOQUE NO ACORDO DE BASILEIA III*

Autores e infomación del artículo

Mariana Domingues de Almeida Lopes Emidio

Glenda de Almeida Soprane

Cristiane Mallmann Huppes

Rafael Martins Noriller

Docentes Assistente - Universidade Federal da Grande Dourados, Brasil

rafael.mnoriller@gmail.com

Resumo
Com o objetivo de fazer face ao risco de crédito, foi publicado no ano de 1988 o Acordo de Basileia, que propunha a criação de exigências mínimas de capital e patrimônio líquido para as instituições financeiras. O Basiléia II procurou ser mais abrangente que o primeiro. Em 2008/9, com a eclosão da crise que se iniciou no sistema financeiro e se espalhou rapidamente pela economia real, iniciou-se a elaboração do Acordo de Basileia III, que teve sua versão final publicada em 2010, vigente no Brasil a partir de 1º de outubro de 2013. O Basileia III manteve-se atrelado aos pilares de Supervisão Bancária e Disciplina de Mercado criados anteriormente, mas trouxe inovações quanto aos requerimentos de capital e introduziu os índices de alavancagem e de liquidez. A pesquisa cobriu o objetivo principal de apresentar as mudanças trazidas pelo Acordo de Basileia III e para isso foi necessário um estudo preliminar do contexto histórico do surgimento da necessidade de se criar esse Acordo e ainda os Acordos precedentes, o Basileia I e II. A metodologia de pesquisa combinou uma revisão bibliográfica com uma documental, caracterizando-se assim como uma pesquisa qualitativa.
Palavras-Chaves: Basileia III, Riscos, Instituições Financeiras.

Abstract
In order to deal with credit risk, the Basle Accord was published in 1988, which proposed the creation of minimum capital requirements and shareholders' equity for financial institutions. Basel II sought to be more comprehensive than the first. In 2008/9, with the outbreak of the crisis that began in the financial system and spread rapidly through the real economy, the Basle III Agreement was started, which had its final version published in 2010, in force in Brazil from October 1, 2013. Basel III remained tied to the previously established Banking Supervision and Discipline pillars, but brought innovations regarding capital requirements and introduced leverage and liquidity ratios. The research covered the main purpose of presenting the changes brought about by the Basle III Agreement and for this it was necessary a preliminary study of the historical context of the emergence of the need to create this Agreement and also the previous Agreements, Basel I and II. The research methodology combined a bibliographical review with a documentary, characterizing itself as a qualitative research.
Keywords: Basel III; Risk; Financial Institution.



Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Mariana Domingues de Almeida Lopes Emidio, Glenda de Almeida Soprane, Cristiane Mallmann Huppes y Rafael Martins Noriller (2017): “Riscos em instituições financeiras: um enfoque no Acordo de Basileia III”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (enero-marzo 2017). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2017/01/basileia.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss1701basileia


1.INTRODUÇÃO

O Acordo de Basileia III foi criado como resposta à crise de 2008/9, que se iniciou no sistema financeiro e se espalhou rapidamente pela economia real. De acordo com Santin (2010, p.52), para entender a origem da crise faz-se necessário o entendimento do contexto histórico desde 1997, quando nos Estados Unidos começou um crescimento elevado da demanda por imóveis e uma consequente valorização dos preços destes, a qual foi em grande parte sustentada pela expansão do crédito imobiliário que manteve um forte crescimento até 2006. Para Torres (2008, p.3), esse crescimento foi determinado “em boa medida, pela incorporação ao mercado de um contingente expressivo de devedores subprime 1, ou seja, de pessoas físicas de elevado risco de crédito”.
Torres (2008, p. 4) explica que eram feitos derivativos de crédito para esses títulos subprimes, com o objetivo de melhorar a classificação de risco dos mesmos através do processo descrito aqui:
O processo se iniciava com a transferência de diferentes contratos de hipotecas para um único fundo de investimentos – mortgage pool. Esse fundo, por sua vez, emitia cotas (tranches) de classes diferentes. Cada um tinha uma taxa de retorno que era tanto maior quanto maior fosse o risco que seu cotista estivesse correndo.
[…] A parcela que assumia as primeiras perdas com atrasos ou inadimplência era chamada de Capital (equity), mas também era conhecida como “Resíduo Tóxico” (Toxic Waste), pela dificuldade de ser descartada. Os detentores dessas cotas recebiam, em troca, a taxa de remuneração mais elevada e serviam, assim, como amortecedores de risco para os demais investidores.
Esse processo corria normalmente até atingir um pico em 2006, quando o preço dos imóveis começou a cair e os juros, que vinham subindo desde 2004, encareceram o crédito e afastaram compradores. Com isso, a oferta começou a superar a demanda e desde então o que se viu foi uma espiral descendente no valor dos imóveis. Com os juros altos, a inadimplência aumentou e o temor de novos calotes fez o crédito sofrer uma desaceleração expressiva no país como um todo (FOLHA DE SÃO PAULO, 2008).
Com o acúmulo de prestações em atraso, foram comprometidas as remunerações das cotas de todas as categorias de risco, e não apenas as do “Resíduo Tóxico” como de costume, o que fez os investidores correrem para resgatar suas aplicações em fundos imobiliários e pararem de renovar as mesmas. Isso deixou os grandes bancos americanos e europeus expostos ao risco imobiliário (TORRES, 2008, p.8).
O Banco de Compensações Internacionais (BIS) em seu conjunto de regras conhecido como Basileia III (Basel III: a global regulatory framework for more resilient banks and banking systems), explica que:
The weaknesses in the banking sector were rapidly transmitted to the rest of the financial system and the real economy, resulting in a massive contraction of liquidity and credit availability. Ultimately the public sector had to step in with unprecedented injections of liquidity, capital support and guarantees, exposing taxpayers to large losses (BIS, 2010, p.9).
Apesar de não se posicionar quanto às origens do colapso, o Comitê de Basileia destaca que a profundidade e a severidade da crise foram amplificadas por fragilidades do setor bancário, tais como alavancagem 2 excessiva, capital3 inadequado e de baixa qualidade e colchões de liquidez4 insuficientes, conforme explicado pelo informe técnico 015/2011 emitido pela Anbima (2014, p.2).
O Acordo de Basileia III tem como principal objetivo a ampliação da capacidade do setor bancário em absorver choques econômicos e financeiros, contribuindo na redução e gerenciamento dos riscos (ANBIMA 2014, p.2).
Assim, considerando as recentes mudanças na regulação financeira e seus possíveis impactos na sociedade, esse trabalho tem o seguinte problema da pesquisa: Quais são as mudanças incorporadas pelo Acordo de Basiléia III?
A contabilidade e o contador estão ganhando um novo enfoque nas instituições financeiras, pois além de manter os registros das operações passaram a atuar no sistema bancário de controles internos e de riscos, monitorando e fornecendo sugestões e recomendações. (COSTA, 2011, p.16).
Em 2012 a empresa de auditoria Ernest & Young realizou uma pesquisa que entrevistou os diretores de risco, e outros executivos sêniores da área, de 69 dos maiores bancos dos Estados Unidos e da Europa para avaliar o progresso das práticas de gestão de risco em um cenário de pressões econômicas e um ambiente regulatório em mudança, verificando que nos últimos três anos em que esta pesquisa foi realizada, os resultados ano a ano demonstram que a estrutura de gestão de riscos dos bancos mudou muitas vezes e já estão sendo corrigidas as áreas que foram identificadas como pontos fracos antes da crise financeira de 2008 (ERNEST & YOUNG, 2012).
Assim sendo, o objetivo geral dessa pesquisa é apresentar as principais mudanças incorporadas pelo Acordo de Basiléia III. Para isso, será feito uma breve contextualização histórica e apresentação dos acordos que antecederam o Basiléia III, o Basiléia I e II.

2. METODOLOGIA

A última atualização do Acordo de Basileia, conhecida como o Basileia III, passou a vigorar no Brasil em 2013 e como ainda existem poucas pesquisas a respeito faz-se necessário o aprofundamento do estudo dos impactos que tais atualizações irão acarretar.
Assim, por se tratar de tema pouco abordado, a pesquisa quanto aos objetivos classifica-se como exploratória, uma vez que busca “conhecer com maior profundidade o assunto, de modo a torná-lo mais claro” (BEUREN, 2010, p.80).
Para consecução do objetivo do trabalho foram desenvolvidas pesquisas bibliográfica e documental. A pesquisa bibliográfica foi realizada principalmente como fundamentação teórica, a fim de reunir informações dos acordos anteriores que possibilitassem o entendimento completo do Basileia III.
De acordo com Beuren (2010, p.87), em uma pesquisa bibliográfica o material consultado “abrange todo o referencial já tornado público em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, dissertações, teses, entre outros”.
A pesquisa enquadra-se também como documental, pois, no tocante ao estudo do Basileia III, valeu-se em parte de “materiais que ainda não receberam nenhuma análise aprofundada” (BEUREN, 2010, p.89), vez que parte precisou ser traduzida diretamente da publicação original por não possuir pesquisas detalhadas sobre o assunto.
Na pesquisa documental foram utilizadas fontes primárias, tais como legislações e o documento oficial do Acordo de Basileia III, e fontes secundárias, como algumas análises de tais documentos.
Trata-se de pesquisa qualitativa, visto que pretende analisar mais profundamente o fenômeno em estudo. Richardson (1999, p.80) apud Beuren (2010, p.91) menciona que “os estudos que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a complexidade de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais”.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1. O Acordo de Basileia – Contextualização Histórica

O conhecido Acordo de Basileia teve o início de sua arquitetura quando em 1930 foi criado o BIS (Bank for International Settlements), o Banco de Compensações Internacionais. “O BIS é uma organização internacional que fomenta a cooperação entre os bancos centrais e outras agências, em busca da estabilidade monetária e financeira” (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2014).
No ano de 1975, foi estabelecido o Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia (Basel Committee on Banking Supervision – BCBS), ligado ao BIS, composto pelos presidentes dos bancos centrais do Grupo dos Dez – G-10 –, tendo como objetivo a criação de um fórum de discussão para estabelecer as melhores práticas de supervisão bancária, entre elas, de requerimento mínimo de capital para as Instituições Financeiras (CARVALHO; SANTOS, 2014).
Em 1987 este comitê apresentou uma proposta de definição de capitais e categorias de risco de ativos, devendo ser utilizada para a determinação dos padrões mínimos de capital e de patrimônio líquido para os bancos que operassem, principalmente, no mercado internacional (NIYAMA; GOMES, 2006, p.191).
No ano seguinte, em julho de 1988, o Comitê de Basiléia divulgou o primeiro Acordo de Capital da Basileia, oficialmente denominado International Convergence of Capital Measurement and Capital Standards (Convergência Internacional de Capital e Padrões de Capital), com o objetivo de criar exigências mínimas de capital para instituições financeiras como forma de fazer face ao risco de crédito. (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2014).

3.2. Basileia I
Conforme Neto e Ribeiro (2006, p.315), apud Santin (2010, p. 8), o primeiro acordo visava:
Minimizar os riscos de insucesso dos bancos; ii) garantir a solvência e a liquidez do Sistema Financeiro Internacional; iii) uniformizar normas aplicáveis às instituições financeiras; e iv) estabelecer limites operacionais para os bancos internacionalmente ativos.
O acordo trouxe a ideia de que cada banco mantivesse um capital mínimo para fazer frente aos riscos de crédito, minimizando os riscos de insolvência das instituições. Segundo Niyama e Gomes (2006, p.192), o capital classificava-se em duas categorias: capital básico e capital suplementar. O primeiro era composto pelo capital contábil e reservas, devendo representar no mínimo 50% do total enquanto o segundo era composto por reservas ocultas e não divulgadas, variáveis em função do regime contábil adotado em cada país, como exemplo as reavaliações de ativos.
Para a definição de capital mínimo, o Comitê de Basileia estabeleceu um critério geral baseando-se em um coeficiente de responsabilidade, classificando os ativos em diferentes categorias de riscos. Segundo ONO (2012, p.12) apud SANTIN (2010, p.39), a metodologia consiste em atribuir pesos, que podem ser 0%, 20%, 50% ou 100% para ativos que constituem o patrimônio da instituição, de acordo com o seu risco de crédito.
Assim, em agosto de 1994, através da Resolução nº 2.099 de 17/08/1994, foi adotada uma forma simplificada de atender os princípios no modelo proposto pelo Comitê de Basileia, usando como metodologia de cálculo do patrimônio líquido como consta no Quadro 1.
De acordo com SANTIN (2010, p. 41), o primeiro Acordo de Basileia marcou uma mudança relevante na regulação prudencial, pelo fato de inserir o capital próprio do banco como garantia, de modo que a solidez do sistema depende da solidez de cada banco que o compõe, tornando a estabilidade do sistema financeiro mundial uma responsabilidade de todos os bancos. Ainda afirma que apesar da melhoria proporcionada, este acordo não deixou de ser alvo de críticas, principalmente a respeito dos itens que não foram inclusos trazendo com isso a necessidade de reavaliação do acordo.


PLE  = 0,08 (APR)

 PLE = Patrimônio Líquido mínimo exigido em função do risco das operações ativas

APR = Ativo Total ponderado pelo risco - Total do produto dos títulos do Ativo Circulante e Não Circulante pelos fatores de risco correspondentes + Produto do Ativo Permanente pelo fator de risco correspondente + Produto dos Títulos de Coobrigações e Riscos em Garantias prestadas pelos fatores de riscos correspondentes

Quadro 1: Fórmula do Patrimônio Líquido Mínimo
Fonte: Niyama e Gomes (2006, p.194)

3.3. Basileia II

Devido às transformações ocorridas no mercado financeiro e nas metodologias de gestão de risco desde a criação do primeiro acordo em 1988 e posteriores alterações, o Comitê de Basileia decidiu lançar em junho de 1999 uma proposta de substituição do mesmo, tendo sua versão final divulgada em junho de 2004, chamada de Basileia II (NIYAMA; GOMES, 2006, p.196).
Santin (2010, p.43) ressalta que:
As principais mudanças foram quanto à elevação da liquidez e do volume de transações financeiras internacionais; quanto à deflagração de crises cambiais e financeiras; e quanto à constatação de que estas crises financeiras não tinham como principal determinante o risco de crédito, mas sim fraudes, controles ineficazes e operações não autorizadas dentro da administração dos bancos.
No desenvolvimento do Novo Acordo, o Comitê buscou ser mais abrangente que o Acordo de 1988, definindo requerimentos de capital mais sensíveis ao perfil de risco de cada instituição e incentivando a utilização de modelos internos para gerenciamento de risco e cálculo de requerimentos de capital (BIS, 2005 apud COIMBRA, 2006, p.37).
De acordo com Niyama e Gomes (2006, p.196), a nova estrutura estabelece que a adequação de capital seja alicerçada em três pilares:
Pilar 1, composto pelos requerimentos de capital propriamente ditos; Pilar 2, a revisão, pela autoridade supervisora, da adequação de capital de cada instituição individualmente; e Pilar 3, atribuindo à divulgação de informações e à transparência importante papel em fomentar incentivos de mercado na verificação e valorização de níveis de risco.
Conforme explicado por Coimbra (2003, p.14) na visão do Comitê de Basileia, os três pilares são complementares e, atuando conjuntamente, são elementos essenciais de um sistema de exigibilidade de capital que tem o objetivo de assegurar a solidez e a estabilidade do sistema financeiro.

3.4. Basileia III

O Acordo de Basileia III é uma resposta às principais vulnerabilidades apresentadas pelo setor bancário durante a crise financeira de 2008/9 e introduz uma série de mudanças relativamente aos acordos anteriores, com destaque para a reformulação de estrutura de capital das instituições financeiras, visando à ampliação da resiliência e solidez dos bancos (ANBIMA, 2013, p.1).
O objetivo do Acordo de Basileia III é: “[…] melhorar a capacidade do setor bancário em absorver choques decorrentes de estresse financeiro e econômico, independente da fonte, reduzindo o risco de transbordamento do setor financeiro para a economia real” 5 (BIS, 2011, p.9, tradução nossa).
­De acordo com Cardoso (2013, p.56), o Acordo de Basileia III encontra-se estruturado de forma semelhante ao acordo anterior, contudo, além das questões relacionadas com o Capital, apresenta ainda uma nova e importante área de intervenção: a Liquidez e sua supervisão. Assim, é importante destacar que “as bases da nova regulação bancária mantiveram-se atreladas à Basileia II” (ANBIMA, 2013, p.3) de forma que os Pilares 2 (Supervisão Bancária) e 3 (Disciplina de Mercado) permanecem.
O documento do novo Acordo apresenta medidas para fortalecer os requisitos de capital para exposições de crédito de contraparte decorrentes de derivativos dos bancos, reposições e atividades de financiamento de valores imobiliários. Estas reformas vão aumentar os buffers 6 de capital que apoiam estas exposições, reduzir a pró-ciclicidade e fornecer incentivos adicionais para mover os contratos derivativos OTC (contratos de balção) para contrapartes centrais, ajudando assim a reduzir o risco sistêmico no sistema financeiro. Eles também oferecem incentivos para fortalecer o gerenciamento de risco das exposições de crédito de contraparte (BIS, 2011, p.11).

3.4.1 Requerimentos Mínimos de Capital e Buffers

O documento “Basel III: A Global Regulatory Framework for More Resilient Banks and Banking Systems” agrega o conjunto de medidas que têm como objetivo dimensionar o capital das instituições financeiras de acordo com os riscos de crédito, de mercado e operacional a que estão sujeitas no decorrer da sua atividade. É possível distinguir-se no Pilar 1 três dimensões de intervenção: Capital, Cobertura de Riscos e Contenção de Alavancagem (CARDOSO, 2013, p.83).

3.4.1.1 Definição de Capital

A reestruturação da base de capital visa à constituição de um colchão de capital de alta qualidade pelas instituições, que lhes permita absorver adequadamente eventuais choques. A divisão existente desde Basileia I, entre capital de Nível I e Nível II 7 foi mantida, ficando a cargo do primeiro nível assegurar efetivamente a solvência da instituição financeira, garantindo a continuidade de sua operação (going-concern), enquanto o segundo constitui um capital contingente, passível de conversão em capital efetivo na ocasião da insolvência da instituição, dando suporte aos depositantes e demais credores no caso de falência ou liquidação da instituição (gone-concern) (ANBIMA, 2013, p.3).

O BIS (2011, p.12, tradução nossa) detalha os limites mínimos pra cada elemento de capital:
- Capital Principal Nível 1 deve ser de pelo menos 4,5% dos ativos ponderados pelo risco em todos os momentos;
- Total do Capital Nível 1 deve ser de pelo menos 6,0% dos ativos ponderados pelo risco em todos os momentos.
- Capital Total (Capital Nível 1 mais Capital Nível 2) deve ser de pelo menos 8,0% dos ativos ponderados pelo risco em todos os momentos.8
De acordo com o informe 015/2011 da Anbima (2011, p.4), o Basileia III passa a incluir também a constituição de colchões adicionais ao capital regulamentar tradicional. O chamado colchão de capital de conservação 9, que ao fim do período de adaptação adicionará 2,5% ao requerimento mínimo padrão, ampliando o colchão de capital que pode ser acessado em situações de estresse. O requerimento do capital contra cíclico 10, por sua vez, flutuará num intervalo de 0% a 2,5%, de acordo com o cenário econômico.

O índice de Basileia mínimo exigido das instituições brasileiras sempre foi mais elevado que o internacional, vez que o fator de ponderação aplicado ao ativo ponderado pelo risco definido pelo BCB (Banco Central do Brasil) era de 11,0% (ANBIMA, 2011, p.7).
O informe 015/2011 da Anbima (2011, p.7-8) baseia-se na Resolução nº 4.193/13 para explicar que com a adoção de Basileia III, o BCB irá promover a convergência dos requerimentos aplicados no Brasil aos padrões internacionais de forma que o patrimônio de referência convirja, paulatinamente, dos 11,0% atuais para 8,0% a partir de 2019, tendo como contrapartida a introdução gradual dos colchões de capital de conservação e anticíclico que foram reunidos numa única rubrica, intitulada adicional de capital principal, que deverá ser observada a partir de 2016 e elevará o requerimento mínimo de capital principal ao intervalo de 7,0% a 9,5%, a partir de 2019, e o requerimento mínimo de patrimônio de referência ao intervalo de 10,5% a 13,0%, a partir da mesma data.

3.4.1.2 Buffer de Capital de Conservação

O Basileia III traz a concepção de buffer de capital de conservação como sendo algo concebido para assegurar que os bancos acumulem reservas de capital fora dos períodos de estresse, que podem ser sacados se perdas forem incorridas. A exigência é baseada em regras simples de conservação de capital, destinadas a evitar o descumprimento dos requisitos mínimos de capital (BIS, 2011, p.54).
Fora dos períodos de estresse, os bancos devem manter buffers de capital acima do mínimo regulamentar e quando estes forem sacados, uma das maneiras para tentar reconstruí-los é através da redução das distribuições de ganhos, podendo incluir a redução do pagamento de dividendos e bônus aos funcionários. Os bancos também podem optar por levantar capital do setor privado como uma alternativa para conservar o capital gerado internamente (BIS, 2011, p.55).
O acordo estabelece que o buffer de conservação de capital deverá ser de 2,5%, composto pelo capital principal nível 1. Serão impostas restrições de distribuição de capital quando os níveis de capital caírem abaixo dessa faixa, mas os bancos serão capazes de conduzir seus negócios normalmente, vez que as restrições dizem respeito apenas às distribuições e não ao funcionamento do banco (BIS, 2011, p.55). A Tabela 1 traz os padrões mínimos de Conservação de Capital em Bancos:

3.4.1.3 Buffer Anticíclico

Quando uma crise é precedida por um período de excesso de crescimento de crédito as perdas incorridas no setor bancário podem ser extremamente grandes. Tais perdas podem desestabilizar o setor bancário e desencadear um círculo vicioso, em que os problemas no sistema financeiro podem contribuir para uma desaceleração da economia real, que então alimenta de volta o setor bancário. Essas interações acentuam a importância particular do setor bancário construir defesas adicionais de capital em períodos em que os riscos de estresse em todo o sistema estão crescendo acentuadamente (BIS, 2011, p.57).
As autoridades nacionais irão controlar o crescimento de crédito e de outros indicadores que possam sinalizar um crescimento no risco sistêmico e fazer avaliações se o crescimento de crédito é excessivo e se está levando à acumulação de riscos para todo o sistema. Com base nessa avaliação será imposta uma exigência de um buffer anticíclico, quando as circunstâncias os justificarem. Essa exigência cessará quando o risco de todo o sistema cristalizar ou se dissipar (BIS, 2011, p.57-58).
Cada membro da jurisdição do Comitê de Basileia irá identificar uma autoridade com a responsabilidade de tomar decisões sobre o tamanho do buffer de capital anticíclico. Se a autoridade nacional competente julgar que um período de crescimento excessivo do crédito irá levar à acumulação de riscos de todo o sistema, ela irá considerar, juntamente com quaisquer outros instrumentos macro prudenciais à sua disposição, a pôr em prática uma exigência do buffer anticíclico. Este buffer irá variar entre zero e 2,5% dos ativos ponderados pelo risco, de acordo com seu julgamento quanto à extensão da acumulação de risco para todo o sistema (BIS, 2011, p.58).

A exigência do buffer anticíclico é implementada como uma extensão do buffer de conservação de capital. A Tabela 2 apresenta os índices mínimos de conservação de capital que um banco deve atender em vários níveis do capital principal nível 1, estando o banco sujeito a um buffer anticíclico de 2,5%. Se a exigência do buffer anticíclico for zero, os níveis de capital e restrições serão os mesmo que os estabelecidos na Tabela 1 do buffer de capital de conservação.

3.4.1.4 Índice de Alavancagem

Durante a parte mais grave da crise, o setor bancário foi forçado pelo mercado a reduzir sua alavancagem, pressionando o preço de seus ativos para baixo, agravando ainda mais o ciclo de perdas, quedas no capital dos bancos e contração na disponibilidade de crédito (BIS, 2014a, p.1).
Por isso, o Comitê decidiu introduzir uma forma simples e transparente de índice de alavancagem, não ponderado pelo risco (non-risk based), que é calibrado para funcionar como uma medida complementar credível aos requisitos mínimos de capital ponderados pelo risco (BIS, 2014a, p.1).
A introdução de um índice de alavancagem foi primeiramente apresentada na seção V do documento “Basileia III: um quadro regulatório global para maior resiliência dos bancos e sistemas bancários” e em janeiro de 2014, o Comitê de Basileia publicou o documento “Basel III Leverage Ratio Framework and Disclousure Requeriments” (Basileia III: Estrutura do Índice de Alavancagem e Exigências de Divulgação), que substitui o que foi apresentado anteriormente.
O índice de alavancagem procura atender dois objetivos:
- Restringir a acumulação de alavancagem no setor bancário, ajudando a evitar processos de desalavancagem desestabilizadores que possam prejudicar o sistema financeiro e a economia; e
- Reforçar os requisitos baseados em risco com uma simples medida de recuo não ponderada pelo risco (BIS, 2014a, p.1).
O Comitê de Basileia é da opinião de que uma estrutura de índice de alavancagem simples é fundamental e complementar à estrutura de capital ponderada pelo risco e um índice de alavancagem credível é aquele que garanta a captura ampla e adequada tanto das fontes de alavancagem de dentro e fora do balanço (BIS, 2014a, p.1).
O documento (BIS, 2014, p.1) define o índice de alavancagem Basileia III como a “medida de capital” (numerador), dividido pela “medida de exposição” (denominador), expressando uma porcentagem como descrito no Quadro 2:

A medida de capital para o índice de alavancagem é o capital nível 1. A medida de exposição geralmente deve seguir o valor contábil, incluindo a exposição a não derivativos líquida de provisões específicas ou ajustes contábeis de avaliação, não sendo permitida a compensação de empréstimos e depósitos (BIS, 2014a, p.2).
A menos que seja especificado, os bancos não devem levar em consideração as garantias físicas, financeiras ou outras técnicas de mitigação de risco de crédito para reduzir a medida de exposição (BIS, 2014a, p.2).
A medida de exposição de um banco é a soma das seguintes exposições: (a) exposições de dentro do balanço; (b) exposição à derivativos; (c) exposições à transações de valores mobiliários; (d) itens de fora do balanço (BIS, 2014a, p.2).
No acordo de 2010, o Comitê estipulou que de 2013 à 2017 seria utilizado o percentual de 3% para testar um mínimo de alavancagem do capital nível 1(BIS, 2011, p.61), sendo esta decisão mantida no acordo complementar de 2014.
A implementação destes requerimentos começou em janeiro de 2013 com o envio, por parte dos bancos para os seus supervisores nacionais, de relatórios com os níveis do índice de alavancagem e seus componentes e vai continuar com a divulgação pública a partir de janeiro de 2015. A calibração final, e quaisquer outros ajustes à definição, será concluída até 2017, tendo em vista a migração para um tratamento de Pilar 1 (requerimento de capital mínimo) em 2018 (BIS, 2014a, p.1).

3.4.1.5 Índice de Liquidez

Um dos pontos inovadores do Acordo de Basileia III foi a instituição de um índice de liquidez, que na realidade começou com a publicação dos “Princípios para uma gestão sadia do risco de liquidez e sua supervisão” (Principles for sound liquidity risk management and supervision) em 2008,que fornecem orientações detalhadas sobre a gestão e supervisão do risco de liquidez (BIS, 2014c, p.1).
Para complementar esses princípios, o Comitê tem fortalecido ainda mais a sua estrutura de liquidez através do desenvolvimento de dois padrões mínimos de financiamento e liquidez, que visam atingir dois objetivos distintos, mas complementares:
O primeiro objetivo é o de promover a resiliência de curto prazo do perfil de risco de liquidez de um banco, assegurando que este tenha recursos líquidos suficientes e de alta qualidade para sobreviver em um cenário de estresse agudo com duração de um mês. O Comitê desenvolveu o índice de cobertura de liquidez (Liquidity Coverage Ratio – LCR) para atingir este objetivo.
O segundo objetivo é o de promover resiliência ao longo de um horizonte de tempo mais duradouro, através da criação de incentivos adicionais para um banco financiar suas atividades com fontes mais estáveis de financiamento em uma base estrutural em curso. O índice de financiamento estável líquido (Net Stable Funding Ratio – NSFR) tem um horizonte temporal de um ano e foi desenvolvido para fornecer uma estrutura de vencimento sustentável de ativos e passivos 11(BIS, 2010, p.8).   
Para atingir os objetivos supracitados, o Comitê publicou dois documentos que tratam detalhadamente sobre cada um destes objetivos, sendo o primeiro “Basileia III: O Índice de Cobertura de Liquidez de as Ferramentas de Monitoramento do Risco de Liquidez” (Basel III: The Liquidity Coverage Ratio and liquidity risk monitoring tools) e o segundo “Basileia III: O Índice de Financiamento Estável Líquido” (Basel III: The Net Stable Funding Ratio), publicados respectivamente em 2013 e 2014 (BIS, 2014c, p.1).
No primeiro documento (BIS, 2013, p.2) o Comitê detalha que, especificamente, o Índice de Cobertura de Liquidez (LCR) será introduzido em 1º de janeiro de 2015, tendo o requisito mínimo fixado em 60% aumentando gradativamente em etapas anuais até chegar em 100% em 1º de janeiro de 2019, conforme apresentado no Quadro 3:
A norma exige que, na ausência de uma situação de estresse financeiro, o valor do índice não poderá estar abaixo de 100%, ou seja, o estoque de ativos líquidos de alta qualidade deve ser no mínimo igual ao total das saídas de caixa líquidas, em uma base contínua, vez que este estoque é destinado a servir como defesa contra o potencial surgimento de dificuldades de liquidez (BIS, 2013, p.4).
Em relação ao segundo objetivo, o documento publicado em 2014 apresenta o Índice de Financiamento Estável Líquido (NSFR), que irá exigir que os bancos mantenham um perfil de financiamento estável em relação à composição de seus ativos e atividades extrapatrimoniais. A estrutura de financiamento sustentável se destina a reduzir a probabilidade de interrupções de fontes regulares de financiamento de um banco, o que corroeria sua posição de liquidez, aumentando seu risco de fracasso e, potencialmente, levar a um estresse sistêmico mais amplo (BIS, 2014b, p.1).

O NSFR é definido como a quantidade de financiamento estável disponível em relação ao montante de financiamento estável necessário. Essa relação deve ser pelo menos igual a 100%, numa base contínua. “Financiamento estável disponível” é a parcela de capital e passivos que espera-se ser confiável ao longo de um horizonte de tempo de um ano. O valor de tal financiamento estável necessário de uma instituição é a função de suas características de liquidez e prazos residuais dos diferentes ativos detidos pela instituição, bem como de suas exposições extrapatrimoniais (BIS, 2014b, p.2).

3.4.1.6 O Acordo de Basileia III no Brasil

O primeiro conjunto de normativos finais foi publicado no dia 1º de março de 2013, quando foram editadas as Resoluções nº 4.192 à 4.195, do Conselho Monetário Nacional, complementadas pelas Circulares de nº 3.634 à 3.638, do Banco Central do Brasil, divulgadas em 4 de março de 2013, passando a vigorar a partir de 1º de outubro de 2013, data na qual o Basileia III entrou efetivamente em vigor no Brasil. (ANBIMA, 2013, p.6)

4. Considerações Finais

O Acordo de Basileia III foi criado como resposta às principais falhas e fraquezas apresentadas pelo setor bancário durante a crise financeira de 2008, tendo o objetivo de melhorar a capacidade do setor bancário em absorver choques, reduzindo o risco de transbordamento do setor financeiro para a economia real, visando à ampliação da resiliência e solidez dos bancos.
O Novo Acordo mantém-se atrelados aos pilares de Supervisão Bancária e Disciplina de mercado, mas introduz uma série de mudanças relativamente aos acordos anteriores, com destaque para a reformulação de estrutura de capital das instituições financeiras e introdução dos índices de liquidez e alavancagem.
Foi elaborado o Quadro 5, que resume as principais mudanças incorporadas pelo Acordo de Basileia III, bem como seu status de implantação no Brasil:

Vê-se a importância do tema escolhido para apontar o viés do gerenciamento de riscos dentro da Contabilidade e, considerando que a gestão de riscos vem se tornando uma preocupação mundialmente compartilhada, o contador deve ser um conhecedor de suas especificações, bem como o fator risco merece um aprofundamento de seus estudos.
Por fim, como sugestão de investigação futura, tem-se o estudo de possíveis impactos que os requisitos de capital, liquidez e alavancagem, introduzidos pelo Acordo de Basileia III, poderão ter sobre a concessão de crédito dos grupos bancários, analisando-se um horizonte temporal pré e pós Basileia III.

5. Referências Bibliográficas

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* Artigo apresentado no 6° Congresso UFSC de Controladoria e Finanças - http://dvl.ccn.ufsc.br/congresso_internacional/anais/6CCF/67_16.pdf
1 Subprime é um crédito de risco que é concedido a um tomador que não oferece garantias suficientes para se beneficiar de taxas de juros mais vantajosas (prime rate). O termo subprime é utilizado para designar uma forma de crédito hipotecário para o setor imobiliário, surgida nos Estados Unidos, destinada a tomadores de empréstimos que representa maior risco. O subprime tem como garantia o imóvel do tomador do empréstimo. (ESCOSSIA, 2009)

2 Quantas vezes uma Instituição Financeira assume obrigações e riscos (ativos) em relação à sua base patrimonial (capital) (RODRIGUES, 1998, p.50).

3 Composto fundamentalmente pelo capital social, constituído por cotas ou ações ordinárias e ações preferenciais não resgatáveis e sem mecanismos de cumulatividade de dividendos, e por lucros retidos, deduzindo os valores referentes aos ajustes regulamentares (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2011).

4 Colchão de Liquidez é o nível mínimo de ativos líquidos a ser mantido pelo Banco, compatível com a  exposição ao risco decorrente das características das suas operações e das condições de mercado(BNY MELLON, 2013, p.3).

5 Texto original: “[…] improve the banking sector’s ability to absorb shocks arising from financial and economic stress, whatever the source, thus reducing the risk of spillover from the financial sector to the real economy.”

6 O termo utilizado pelo Comitê de Basileia pode ser traduzido como “amortecedores”.

7 Termo original: Tier 1 e Tier 2

8 Texto original:
- Common Equity Tier 1 must be at least 4.5% of risk-weighted assets at all times.
- Tier 1 Capital must be at least 6.0% of risk-weighted assets at all times.
- Total Capital (Tier 1 Capital plus Tier 2 Capital) must be at least 8.0% of riskweighted assets at all times.

9 Ou “buffer de conservação de capital”.

10 Ou “buffer anticíclico”

11 Texto original: The first objective is to promote short-term resilience of a bank’s liquidity risk profile by ensuring that it has sufficient high quality liquid resources to survive an acute stress scenario lasting for one month. The Committee developed the Liquidity Coverage Ratio (LCR) to achieve this objective. The second objective is to promote resilience over a longer time horizon by creating additional incentives for a bank to fund its activities with more stable sources of funding on an ongoing 20 (continuação) structural basis. The Net Stable Funding Ratio (NSFR) has a time horizon of one year and has been developed to provide a sustainable maturity structure of assets and liabilities.


Recibido: 16/03/2017 Aceptado: 21/03/2017 Publicado: Marzo de 2017

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